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DISCURSO DO PAPA FRANCISCO
AOS PARTICIPANTES NO CONVÉNIO «A SANTIDADE HOJE» 
ORGANIZADO PELO DICASTÉRIO DAS CAUSAS DOS SANTOS  

Sala Clementina
Quinta-feira, 6 de outubro de 2022

[Multimídia]

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Queridos irmãos e irmãs, bom-dia!

Sinto-me feliz por vos encontrar no final do Convénio «A Santidade Hoje», organizado pelo Dicastério das Causas dos Santos. Saúdo e agradeço ao Cardeal Marcelo Semeraro e aos outros Superiores, aos Oficiais, Postuladores e todos os colaboradores. Saúdo a todos vós, provenientes de diversas partes do mundo, que participastes nestas jornadas de estudo e reflexão que beneficiaram do contributo de válidos relatores, expoentes do mundo teológico, científico, cultural e mediático.

O tema escolhido para o Convénio está em sintonia com a Exortação apostólica Gaudete et exsultate, que visa «fazer ressoar mais uma vez a chamada à santidade, procurando encarná-la no contexto atual, com os seus riscos, desafios e oportunidades» (nº 2). Tal chamada está no coração do Concílio Vaticano II, que dedicou um capítulo inteiro da Lumen gentium à vocação universal à santidade, onde se afirma: «Todos os fiéis, seja qual for a sua condição ou estado, são chamados pelo Senhor à perfeição do Pai, cada um por seu caminho» (nº 11). Também hoje é importante descobrir a santidade no povo santo de Deus: nos pais que crescem amorosamente os filhos, nos homens e mulheres que se empenham na realização quotidiana do seu trabalho, nas pessoas que suportam uma condição de enfermidade, nos idosos que continuam a sorrir e a oferecer sabedoria. O testemunho duma conduta cristã virtuosa, vivida no dia a dia por tantos discípulos do Senhor, constitui para todos nós um convite a respondermos pessoalmente à chamada para ser santo. São santos «ao pé da porta», que todos conhecemos.

A par, ou melhor, no meio desta multidão de crentes, que defini santos «ao pé da porta» (Gaudete et exsultate, 7), existem aqueles que a Igreja aponta como modelos, intercessores e mestres. Trata-se dos Santos beatificados e canonizados, que recordam a todos que viver o Evangelho em plenitude é possível e encantador. Com efeito a santidade não é um programa feito de esforços e renúncias, não é uma espécie de «ginástica» espiritual; é outra coisa! É, antes de mais nada, a experiência de ser amados por Deus, receber gratuitamente o seu amor, a sua misericórdia. Este dom divino abre-nos à gratidão consentindo-nos experimentar uma grande alegria, que não é a emoção dum instante ou um simples otimismo humano, mas a certeza de poder enfrentar tudo com a graça e a audácia que provêm de Deus.

Sem esta alegria, a fé reduz-se a uma prática esmagadora e triste; mas não se torna santo com «as trombas»: é necessário um coração jubiloso e aberto à esperança. Dá-nos exemplo desta santidade, rica de bom humor, o Papa João Paulo I recentemente beatificado. Para os adolescentes e jovens, é um modelo de alegria cristã também o Beato Carlos Acutis. E, no seu paradoxo evangélico, sempre nos edifica a «perfeita alegria» de São Francisco de Assis.

A santidade germina da vida concreta das comunidades cristãs. Os Santos não provêm dum «mundo paralelo»; mas são crentes que pertencem ao povo fiel de Deus e estão inseridos na quotidianidade feita de família, estudo, trabalho, vida social, económica e política. Em todos estes contextos, o Santo ou a Santa caminha e age sem medos nem convencionalismos, cumprindo nas várias circunstâncias a vontade de Deus. É importante que cada Igreja particular seja solícita em individuar e valorizar os exemplos de vida cristã amadurecidos no seio do povo de Deus, que possui desde sempre um particular «instinto» para reconhecer estes modelos de santidade, testemunhas extraordinárias do Evangelho. Por isso, é preciso ter em justa consideração o consenso do povo à volta destas figuras cristãmente exemplares. De facto, os fiéis estão inegavelmente dotados pela graça divina duma perceção espiritual para individuar e reconhecer, na existência concreta dalguns batizados, o exercício heroico das virtudes cristãs. A fama sanctitatis não provem, primariamente, da Hierarquia, mas dos fiéis. É o povo de Deus, nas suas diversas componentes, o protagonista da fama sanctitatis, ou seja, da opinião comum e difusa entre os fiéis a propósito da integridade de vida duma pessoa, percebida como testemunha de Cristo e das bem-aventuranças evangélicas.

Todavia, é necessário verificar que tal fama de santidade seja espontânea, estável, duradoura e difusa numa parte significativa da comunidade cristã. Com efeito aquela é genuína quando resiste às mudanças do tempo, às modas do momento e sempre gera efeitos salutares para todos, como podemos constatar na piedade popular.

Nos nossos dias, o correto acesso aos meios de comunicação social pode favorecer o conhecimento da vivência evangélica dum candidato à beatificação ou à canonização. Contudo, no uso dos meios digitais, particularmente das redes sociais, pode haver o risco de forçamentos e mistificações ditados por interesses pouco nobres. Por isso é necessário um discernimento sábio e perspicaz por parte de todos os que se ocupam da qualidade da fama de santidade. Por outro lado, um elemento que sempre comprova a fama sanctitatis ou a fama martirii é a fama signorum. Quando os fiéis estão convencidos da santidade dum cristão, recorrem – mesmo de forma maciça e apaixonada – à sua intercessão celeste; o atendimento da oração por parte de Deus representa uma confirmação de tal convicção.

Queridos irmãos e irmãs, os Santos são pérolas preciosas. Sempre vivos e atuais, não perdem jamais o seu valor, representando um comentário fascinante do Evangelho. A sua vida é como um catecismo por imagens, a ilustração desta Boa Nova que Jesus trouxe à humanidade: Deus é nosso Pai e ama a todos com imenso amor e ternura infinita. São Bernardo dizia que, quando pensava nos Santos, se sentia inflamado «por grandes desejos» (Disc. 2; Opera Omnia Cister. 5, 364ss). Que o seu exemplo ilumine a mente das mulheres e homens do nosso tempo, reavivando a fé, animando a esperança e acendendo a caridade, a fim de que cada um se sinta atraído pela beleza do Evangelho e ninguém se perca nas brumas da falta de sentido e do desespero.

Não quero terminar sem mencionar uma dimensão da santidade, à qual dediquei um subcapítulo na Gaudete et exsultate: o sentido de humor. Dizia alguém que «um santo triste é um triste santo». Devemos saber aproveitar a vida com sentido de humor, porque, tomar da vida a parte que faz rir, alivia a alma. Existe uma oração que vos recomendo rezar – há mais de 40 anos que eu a rezo todos os dias –: a oração de São Tomás Moro. É curioso que ele esteja a pedir algo para a santidade e comece dizendo: «Dai-me, Senhor, uma boa digestão e também qualquer coisa para digerir». Desce ao concreto e é precisamente daí que tira o humor. A oração encontra-se na nota 101 da Gaudete et exsultate: ide lá buscá-la para a poderdes rezar.

Faço votos de que os aprofundamentos e as solicitações saídos do vosso Convénio possam ajudar a Igreja e a sociedade a individuar os sinais de santidade que o Senhor não cessa de suscitar, às vezes mesmo pelas vias mais inesperadas. Agradeço-vos pelo vosso trabalho! Confio-o à materna intercessão de Maria, Rainha de todos os Santos, e de coração vos abençoo. E dado que o Cardeal Semeraro já instou convosco para rezardes por mim, agora já não o digo eu… Disse-o ele. Obrigado!



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