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VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA JOÃO PAULO II AO BRASIL
[12-21 DE OUTUBRO DE 1991]

HOMILIA DO SANTO PADRE
NA MISSA CONCLUSIVA
DO XII CONGRESSO EUCARÍSTICO NACIONAL

«Praça do Congresso» (Natal) - 13 de Outubro de 1991

 

Minha carne é verdadeiramente uma comida e meu sangue verdadeiramente uma bebida” (Jo 6, 55).

Confesso junto a todos vós, caros Irmãos e Irmãs, esta verdade da nossa fé e de nossa vida de fé. Nós a professamos juntos ao longo deste Congresso, que se tornou o grande altar onde o Brasil inteiro está venerando e celebrando o Mistério Eucarístico.

É uma circunstância feliz que o Congresso esteja sendo realizado em Natal. Precisamente aqui, em 1645 um homem simples, profundamente religioso, Matias Moreira, deu, com seus companheiros na região conhecida por Cunhaú e Uruaçú, um belo testemunho que lembra o dos mártires da Igreja. Quando insultado e ferido pelos hereges por sua recusa em renegar a fé na Eucaristia e a fidelidade à Igreja do Papa, exclamou, quando lhe abriam o peito para arrancar-lhe o coração: “Louvado seja o Santíssimo Sacramento!”.

Irmãos e Irmãs, esta magnífica profissão de fé, regou com sangue generoso a terra onde o Brasil inteiro veio reafirmar sua devoção na presença real de Cristo na Eucaristia.

Ao renovar, neste momento, com todos vós que aqui estais, esta mesma profissão de fé, desejo abraçar a todas as regiões deste imenso país, que é de certo modo, um continente no continente sul-americano. Venho neste dia iniciar a visita à Igreja em terras brasileiras. Mesmo sendo o percurso da minha peregrinação necessariamente limitado, sinto-me, no entanto, no meu coração e na minha oração, unido a todos. Convido os brasileiros de todas as regiões para este banquete eucarístico, preparado para nós pelo Senhor: do longínquo Amazonas e de todo o Norte e Nordeste, da costa do Atlântico e do Sul, das montanhas e dos vastos planaltos do Centro e também das fronteiras do Oeste.

Todos nos unimos numa única afirmação da fé eucarística e na adoração do mistério: “Ave verum Corpus natum de Maria Virgine”.

2. “Lembra-te de todo o caminho por onde o Senhor te conduziu” (Deut. 8, 2). Lemos estas palavras no Livro do Deuteronômio que recordam a Israel, os quarenta anos de sua Peregrinação através do deserto, quando com o poder de Deus o libertou da escravidão do Egito: “Que teu coração não caia no orgulho de te esqueceres que foi o Senhor teu Deus, quem te tirou do Egito, da casa da servidão” (Ib. 8, 14).

Aquele deserto é uma imagem da vida dos homens e dos povos. Por quais caminhos o Senhor Deus guiou o povo desta terra brasileira no decorrer dos séculos? De quantos lugares chegastes aqui? E continuais caminhando. O Brasil é o cenário de grandes migrações em busca de trabalho, de pão e de casa.

O deserto é imagem da vida humana sobre a terra - em qualquer lugar, mesmo se esta terra fosse a mais fértil e possuísse toda a riqueza da civilização moderna. Em qualquer lugar: o homem é um peregrino do Absoluto. É peregrino em direção à casa do Pai, onde tem a verdadeira morada.

Assim como o corpo humano tem necessariamente fome de pão e sede de água, para não cair na exaustão, o espírito humano, criado à imagem e semelhança de Deus, tem sede de Deus: “Minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo” (Sal 42 (41), 2).

3. A Eucaristia é a resposta de Deus a esta sede dos homens que caminham neste mundo em direção à Pátria celestial. No deserto, Deus alimentou o seu povo com o maná que caía do céu. O maná era a figura da Eucaristia. Cristo disse: “Eu sou o pão vivo que desci do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão, que eu darei, é minha carne para a salvação do mundo” (Jo 6, 51-52).

Jesus de Nazaré pronunciou estas palavras, depois da milagrosa multiplicação dos pães nas imediações de Cafarnaum. Muitos dos presentes não podiam compreendê-l’O. Diziam: “Dura é esta linguagem” (Ib. 6, 60). E saíram não querendo mais escutar aquilo que Jesus dizia, tão inverossímeis lhes pareciam aquelas palavras.

Foi preciso chegar à última ceia em Jerusalém. Foi necessário que no dia seguinte o Corpo de Cristo fosse entregue à morte na Cruz, que Seu Sangue fosse derramado em sacrifício propiciatório pelos pecados do mundo, para que a Eucaristia viesse a ser o alimento sacramental e a bebida da Igreja desde os primeiros dias, até os nossos tempos... até o fim do mundo.

4. Os apóstolos que, no dia de Pentecostes, a partir do cenáculo de Jerusalém, foram por todo o mundo anunciar que “Jesus é o Senhor” (Rom 10, 9), transmitiram-nos o Evangelho e a Eucaristia. O Evangelho é o testemunho do Filho de Deus crucificado e ressuscitado. A Eucaristia é o sacramento do Seu sacrifício redentor pela vida do mundo.

5. Quando o Senhor instituiu a Sagrada Eucaristia, na Última Ceia, era noite, o que manifestava - como comenta São João Crisóstomo - que os tempos se tinham cumprido (S. Ioannis Chrysostomi In Matthaeum homiliae, 82, 1: PG 58, 700). Abriu-se assim o caminho para um verdadeiro amanhecer: a nova Páscoa. A Eucaristia foi instituída durante a noite, preparando a manhã da Ressurreição. Ela está a indicar-nos que não voltaremos a nos alimentar do maná do deserto, nós que temos o Pão de hoje e de sempre.

Queridos Irmãos e Irmãs, o Papa quer iniciar essa Sua peregrinação por terras brasileiras, precisamente no quadro da Celebração Eucarística, porque é o portador da mensagem do Altíssimo, do “Verbo que se fez Carne” (Cf. Jo 1, 14) para anunciar esse novo amanhecer que vai despontando no horizonte. O XII Congresso Eucarístico Nacional, que teve por lema “Eucaristia e Evangelização”, foi como o sopro do Espírito Santo que “procura fazer germinar "as sementes do Verbo", presentes nas iniciativas religiosas e nos esforços humanos à procura da verdade, do bem e de Deus” (Redemptoris Missio, 28). Agradeço ao querido Irmão no Episcopado, Dom Alaír Vilar Fernandes de Melo e a toda Comissão organizadora deste Congresso, pelo carinho e dedicação que puseram na sua preparação e realização, e aproveito a oportunidade para saudar o Senhor Cardeal Dom Nicolás Lopez Rodriguez, formulando meus votos de felicidades no início de seu mandato como Presidente do CELAM.

Peço a Deus que a vigilia de oração, que contou com a participação de muitos dos que estais aqui para preparar esta solene Eucaristia, reanime a graça de Deus que está no povo desta terra, no povo brasileiro.

Cristo Nosso Senhor, é o Divino semeador que segura o trigo com suas mãos chagadas, embebe-o no Seu Sangue, limpa-o, purifica-o e lança-o no sulco do mundo. Lança os grãos um a um, para que cada cristão, no seu próprio ambiente, dê testemunho da fecundidade da Morte e da Ressurreição do Senhor.

Não percamos de vista o que eu dizia na Encíclica “Redemptoris Missio”: “A primeira beneficiária da salvação é a Igreja: Cristo adquiriu-a com o Seu Sangue (Cf. Act. 20, 28) e tornou-a Sua cooperadora na obra da salvação universal” (Redemptoris Missio, 9). A salvação, que é dom do Espírito, exige a colaboração do homem, para se salvar tanto a si próprio como aos outros. É preciso, portanto, espalhar generosamente a palavra de Deus, fazer que os homens conheçam a Cristo e, conhecendo-O, tenham fome d’Ele. “Porém - dizia São Paulo - como invocarão aquele em quem não têm fé? E como crerão naquele de quem não ouviram falar? E como ouvirão falar, se não houver quem pregue? (Rom. 10, 14) Por isso, é significativo que a introdução ao Texto-base deste Congresso, anime a todos a um “esforço maior à dimensão evangelizadora... que possa desencadear todo um trabalho missionário, não só de massas, mas também de pequenos grupos ou setores especializados”. “Ele servirá - acrescenta-se mais adiante - para preparar e capacitar os agentes pastorais: sacerdotes, religiosos e leigos que, por sua vez, levarão esta mensagem às bases”. Urge, assim, refletir e levar à prática suas conclusões, face a uma nova evangelização que represente uma penetração da fé “nos corações de todos os homens e de todas as mulheres, nas estruturas sociais e políticas, nas famílias e sobretudo nos jovens, nos ambientes do saber e do trabalho, nos grupos étnicos e indígenas, nas aldeias e cidades”.

6. Este clima de fervor apostólico, que está na base da IV Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, convocada para 1992 em Santo Domingo, é também a luz que iluminou a todos os que participaram dos trabalhos deste Congresso, que hoje tenho o prazer de encerrar, nesta solene celebração eucarística. Possa o divino Espírito Santo irradiar sobre todos, Bispos, sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos abundantes graças de ação evangelizadora, para que daqui surjam os frutos de paz, de amor e de santidade que a Igreja espera, no Brasil e desde o Brasil.

7. “A fé provém da Pregação e a pregação - nos diz São Paulo - se exerce em razão da palavra de Cristo” (Rom. 10, 17).

Em Cafarnaum os apóstolos ouviram o anúncio da Eucaristia feito por Cristo. Apesar de que muitos dos que estavam ali tenham-se retirado, os apóstolos não se foram. À pergunta de Cristo responderam: “Senhor, a quem iríamos nós? Somente Tu tens palavras de vida eterna” (Jo. 6, 68).

A verdade eucarística é a Palavra da vida eterna. Jesus diz: “Em verdade, em verdade Eu vos digo: Se não comerdes a carne do Filho do homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós mesmos. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia” (Jo. 6, 53-54). E continua: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele. Assim como o Pai que me enviou vive, e eu vivo pelo Pai, assim também aquele que comer a minha carne, viverá por mim” (Ib. 6, 56-57).

Queridos Irmãos e Irmãs, Igreja que estais no Brasil, povo do Deus vivo!

A quem iremos?

Ele - o Cristo - “somente Ele, tem palavras de vida eterna”.

 



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