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VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA JOÃO PAULO II AO BRASIL
[12-21 DE OUTUBRO DE 1991]

HOMILIA DO PAPA JOÃO PAULO II
DURANTE A CELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA
 NA ESPLANADA DOS MINISTÉRIOS

Brasília, 15 de Outubro de 1991

 

Sem a fé é impossível agradar a Deus” (Hb 11, 6).

1. A leitura da carta aos Hebreus mostra-nos vários personagens do Antigo Testamento: homens com quem Deus se comprazia precisamente por causa da sua fé: Abel, Enoc, Noé, Abraão e Sara, Isaac e Jacó.

Na Nova Aliança, seguindo a Cristo, que é “o autor e consumador” da nossa fé (Cfr. ibid. 12, 2), aquela lista se prolonga e se estende a todos os povos e nações da terra. Na vossa grande pátria brasileira como são numerosos aqueles que “são agradáveis a Deus mediante a fé”, que a Ele “se achegam”, conforme as palavras da carta aos Hebreus: “pois para se achegar a Ele, é necessário que se creia primeiro que Ele existe e que recompensa os que o procuram” (Ibid. 11, 6).

Ora, a fé é a “procura” de Deus. É significativo o que escreve Pascal: “não me procurarias se já não me possuísses” (B. Pascal, Pensées, cap. II, 9). “Antecedente”, à “procura” de Deus por parte do homem, é o dom divino da fé, com o qual “buscamos continuamente a sua face” (Cfr. Sl 105 (104), 4).

2. O que é a fé? O Apóstolo responde: “A fé é o fundamento das coisas que se esperam, e o argumento das que não se vêem” (Hb 11, 1). Portanto, pela fé, de certo modo, superamos o limiar da realidade visível, para entrarmos na invisível. O visível, de certa maneira, testemunha o invisível (Ibid. 11, 3). O universo presta testemunho de Deus como seu Criador. Lemos na carta aos Hebreus: “Pela fé reconhecemos que o mundo foi formado pela palavra de Deus, de sorte que o visível foi feito pelo invisível”. O testemunho da palavra de Deus Criador está de certo modo, inscrito em toda a criação.

Além deste testemunho, acessível a todos, a fé encontra seu apoio nos testemunhos humanos de divina Revelação. Os antepassados, com efeito, “receberam... o testemunho” ( Ibid. 11, 2). “Deus, tendo falado outrora muitas vezes e de muitos modos a nossos pais pelos profetas, ultimamente, nestes dias, falou-nos por meio do seu Filho” ( Ibid. 1, 1-2).

3. O Concílio Vaticano II ensina: “A Deus que revela deve-se prestar a "obediência da fé" (Rm 16, 26; cfr. ibid. 1, 5; 2Cor 10, 5-6), pela qual o homem se entrega livre e totalmente a Deus, oferecendo-Lhe "a plena submissão da inteligência e da vontade" e dando voluntariamente assentimento à revelação feita por Ele. Para professar esta fé, é necessária a graça de Deus que previne e ajuda, e os auxílios internos do Espírito Santo, que possam mover e converter para Deus os corações, abrir os olhos da alma, e dar "a todos a suavidade no aderir e dar crédito à verdade". Para que a inteligência da revelação seja cada vez mais profunda, o mesmo Espírito Santo aperfeiçoa constantemente a fé, por meio dos seus dons” (Dei Verbum, 5).

A fé, pois, é um dom do mesmo Deus, que vem ao homem com a palavra da Verdade absoluta, mas é, ao mesmo tempo, a resposta do homem, que procura sinceramente encontrar esta Verdade: o encontro com Deus.

4. Hoje, na medida em que nos aproximamos do Terceiro Milênio da Era cristã, são necessários homens de fé. Homens que sejam luz e força para uma nova sociedade: políticos, técnicos, administradores, educadores, funcionários públicos, empresários, trabalhadores da cidade e do campo... Como eu disse na minha primeira viagem, em Salvador, aos construtores da sociedade pluralista - homens que pertencem a “uma sociedade que deve responder às exigências humanas, tanto ao nível dos bens materiais quanto dos bens espirituais e religiosos, uma sociedade fundada sobre um sistema de valores que a defenda das manipulações do egoísmo individual ou coletivo” (Discurso às autoridades e ao povo em Salvador, 3, 6 de julho de 1980).

Para esta tarefa, é necessária a educação permanente da fé dos cristãos, especialmente dos que têm uma responsabilidade maior e mais direta na construção da sociedade. Exige-o a mesma dimensão da sua natureza, constituída de alma e corpo, pois ele foi chamado pelo Pai a tomar posse do reino dos céus, que lhe foi preparado (Cfr. Mt 25, 34). Decorre daí sua preocupação por descobrir o significado mais profundo deste mundo, que é obra do Criador. Se o mundo saiu das mãos de Deus, se Ele criou o homem à sua imagem e semelhança ( Gn 1, 26), deve desentranhar o sentido divino que naturalmente possuem todas as coisas. Não existe, nem nunca existiu, incompatibilidade entre o saber humano e a fé. Desde o esforço intelectual mais profundo até o mais simples ofício manual, tudo pode e deve levar a Deus. Por isso, é necessário cultivar a fé de acordo com o nível cultural de cada um, com sua responsabilidade social e com sua própria capacitação profissional.

5. A grande santa de Ávila, que a Igreja celebra hoje no Calendário litúrgico, pode ser lembrada como uma mulher cuja fé a levava a preocupar-se pelos milhões de seres humanos, que ainda não conheciam a Jesus Cristo e aos quais a Igreja deveria anunciá-lo. Em Santa Teresa, a fé em Jesus Cristo era inseparável do amor à Igreja. Suas últimas palavras foram: “Graças a Deus, morro como filha da Igreja”. Pessoas de fé assim, são luz para os outros, centro de irradiação espiritual e religiosa, sal da terra. Nossos tempos necessitam da presença atuante e benéfica de homens e de mulheres que saibam mostrar a própria fé com suas obras (Cfr. Tg 2, 8).

6. O que será “ a nova sociedade” brasileira como fruto da educação na fé?

A esta pergunta, Cristo responde com as próprias palavras do Evangelho que hoje foram lembradas na liturgia: “o sal da terra, e a luz do mundo” (Cfr. Mt 5, 13-14)!

O sal que dá o bom sabor aos alimentos, é a imagem do que deve ser o fruto da educação na fé que leva saúde espiritual e moral aos mais variados âmbitos da existência humana - o homem, a família, a comunidade, a sociedade. Deste modo, todos ficam protegidos contra a depravação, contra aquilo que Cristo disse que deve “ser lançado fora e pisado pelos homens” ( Ibid. 5, 13).

É, ao mesmo tempo: a luz que resplandece para os outros, que ilumina a todos “os que estão em casa” (Cfr. ibid. 5, 15). A vossa grande casa brasileira, possui muitos milhões de moradores. A fé é luz que “não se coloca debaixo do alqueire, mas sobre o candeeiro”. Que ela “brilhe... diante dos homens, para que vejam vossas boas obras e glorifiquem vosso Pai que está nos céus” (Ibid. 5, 15-16).

Eis o que Cristo diz, respondendo à vossa pergunta: o que é a fé, e o que é educar na fé para uma nova sociedade?

7. Caríssimos Irmãos e Irmãs,

É com grande alegria que estou novamente em Brasília. O Papa está feliz vendo como cresceu, nestes últimos 11 anos, esta cidade-menina que vai se tornando, efetivamente, o centro das grandes decisões nacionais. Os amplos horizontes que ele descortina do alto deste planalto, recordam-lhe o sonho profético de Dom Bosco que tanto inspirou os fundadores da cidade. Lembro que não longe deste lugar foi plantado o cruzeiro e celebrada a Primeira Missa que marcou o nascimento de Brasília. Que esta cidade cresça sempre à sombra da cruz e protegida pelas bênçãos maternas de sua padroeira Nossa Senhora Auxiliadora!

De todo o coração saúdo os que vieram para celebrar esta Eucaristia. E também para participar nela. Em primeiro lugar, saúdo cordialmente o Senhor Presidente da Republica, Dr. Fernando Collor, junto com os membros do Governo, o Governador e todas as Autoridades civis e militares. Estamos agradecidos pela vossa presença nesta celebração. Aos tantos países aqui representados pelos seus Embaixadores. A todas Nações aqui representadas, formulo votos de paz e prosperidade.

Agradeço o acolhimento generoso e fraterno do querido irmão, Pastor desta Igreja em Brasília, o Cardeal Dom José Freire Falcão e de seus Bispos Auxiliares, Dom Alberto Taveira e Dom Raymundo Damasceno Assis, que é atualmente o Secretário-Geral do Conselho Episcopal Latino-Americano. Saúdo também todos os Cardeais e Bispos aqui presentes. Exprimo também minha alegria pela participação dos irmãos das outras Igrejas Cristãs. Obrigado por esta união em torno de Cristo.

8. Gostaria de aproveitar a ocasião, para expressar a satisfação que me foi dada pelo querido Irmão no Episcopado e Arcebispo Militar do Brasil, D. Geraldo do Espírito Santo d’Ávila, ao me convidar para abençoar a Primeira Pedra da futura Catedral da Arquidiocese Militar do Brasil, cujo título será Santa Maria dos Militares, Rainha da Paz. Faço votos de que a edificação deste templo sirva para congregar sempre mais a família militar do Brasil e se torne um grande centro da evangelização de todos, do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, para cumprirem sua missão própria de serem garantia da paz, da liberdade e da justiça. Aos sacerdotes que estão desempenhando sua diakonia na vilas militares, nos quartéis e nos vários destacamentos da fronteira, digo-lhes que se entreguem com amor e confiança ao trabalho, sem se poupar, levando o Evangelho onde o bem das almas os solicite.

Vão aqui, também, minhas palavras de agradecimento, ao dileto Irmão no Episcopado Dom José Newton de Almeida Baptista, que com tanta diligência e operosidade entregou-se a fundo à sua obra de Pastor, não só na nova Capital da República, como no Ordinariado militar. Que Deus o recompense e o abençoe!

9. “Sem a fé é impossível agradar a Deus”. Sem a fé não é possível que a vida humana seja semelhante à de Deus. No entanto, esta é a vocação do homem. Disto depende seu bem e sua felicidade, não só temporal, mas eterna.

Deus, que criou o homem, à sua imagem e semelhança, dele espera que seja realmente semelhante a Ele. Deus quer que ele, como Abel, Lhe ofereça o sacrifício dos frutos da fé e das boas obras. Deus espera que o homem se torne herdeiro daquela justiça, que o Evangelho lhe ensina, justiça merecida por Cristo crucificado, por Cristo ressuscitado, para a redenção dos pecados. Ao homem é concedida a justiça de Cristo, “o primogênito de toda a criatura” ( Cl 1, 15), através da fé peregrina em direção à terra prometida, à vida eterna em união com Deus.

10. Maria, a primeira que acreditou, a estrela da nova evangelização, invocada em todo o Brasil, como Nossa Senhora da Conceição Aparecida, Maria seja o modelo, seja a educadora da fé para os brasileiros, para os cristãos, comprometidos na construção da nova sociedade. Seja o modelo e a educadora da fé. Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil.

 



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