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 DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II
AO PRIMEIRO GRUPO DE BISPOS DA FRANÇA
 EM VISITA "AD LIMINA APOSTOLORUM"

10 de Janeiro de 1997

 

Caros Irmãos no Episcopado

1. Depois de alguns meses da minha última visita pastoral à França, da qual conservo uma vivíssima recordação, é-me grato começar hoje os encontros que terei com os Bispos das diferentes Regiões apostólicas, por ocasião da peregrinação aos túmulos dos Apóstolos, sentido primeiro da visita ad Limina. Os vossos encontros com o Sucessor de Pedro e os seus colaboradores, constituem um gesto de comunhão eclesial e uma expressão do espírito colegial que nos une. Estes contactos são também a ocasião duma reflexão aprofundada sobre os diversos aspectos da vossa missão.

Agradeço a Dom Michel Moutel, Bispo de Nevers e Presidente da Região apostólica do Centro, os sentimentos de afecto que acaba de me manifestar, em vosso nome, e a visão panorâmica da situação eclesial das vossas Dioceses. Saúdo cordialmente cada um de vós e, em particular, D. Jean Honoré, Arcebispo de Tours, que me acolheu com muita delicadeza na sua cidade episcopal, em Setembro passado, fazendo da minha peregrinação ao túmulo de S. Martinho um grande momento, que não posso deixar de recordar ao encontrar-vos aqui.

Nós saudamos neste dia a memória de D. Jean Cuminal, Bispo de Blois, que prematuramente nos deixou, antes de poder celebrar o terceiro centenário da fundação da sua Diocese. Pedimos ao Senhor que conceda a este servidor fiel a sua recompensa na paz.

2. D. Moutel recordou muitas características das vossas dioceses, que estão associadas no quadro duma Região extensa e de grande diversidade. Apesar da relativa dispersão, é bom que possais colaborar mediante diversas iniciativas. Penso em particular no Seminário de Orleães, que concerne a quase todas as vossas Dioceses e ao qual destes recentemente melhores condições de vida.

Numerosos fiéis demonstram muita generosidade e participam de maneira activa e lúcida na vida eclesial. Isto constitui verdadeiros motivos de esperança e sinais da presença activa do Espírito Santo no coração dos baptizados e nas suas comunidades. Peço-vos que leveis aos vossos diocesanos a saudação cordial e os encorajamentos do Bispo de Roma. De modo especial, quereria exprimir aos sacerdotes, aos diáconos, às pessoas consagradas, aos responsáveis leigos, a minha estima e confiança, pois, à custa de grande dedicação, todos juntos compartilham, ao vosso lado, a missão confiada por Jesus aos seus discípulos.

Com os diferentes grupos de Bispos da França que virão para a visita ad Limina nas próximas semanas, tenho a intenção de abordar muitos temas significativos para a Igreja hoje, desejando dar-vos alguns elementos de reflexão, no espírito daquilo que o Senhor pediu a Pedro: «Confirma os teus irmãos» (Lc. 22, 31). Hoje, deter-me-ei mais em alguns aspectos do vosso ministério episcopal, sem contudo querer apresentar um panorama completo.

3. D. Moutel ressaltou as principais dificuldades que encontrais. Menciono dois aspectos, que se referem ao conjunto da Igreja no vosso País: em primeiro lugar, o facto de que uma parte importante da população permanece distante da Igreja e não recebe facilmente a sua mensagem; em segundo lugar, a diminuição do número dos sacerdotes condiciona as actividades pastorais, que se tornam mais difíceis de ser asseguradas, ainda que numerosos leigos assumam responsabilidades crescentes.

Como em muitas outras nações, também vós deveis fazer frente a diferentes formas de empobrecimento ou enfraquecimento da Igreja, as quais tornam árdua a missão episcopal. Como apóstolos de Cristo, sois os primeiros a experimentar a cruz da indiferença, da incompreensão e por vezes da hostilidade. Numa sociedade que muitas vezes duvida de si mesma e sofre uma crise económica e social prolongada, vedes muitas pessoas, e muitos baptizados, afastarem-se da comunidade eclesial, através duma espécie de rejeição da instituição, em benefício dum fechamento individualista: cada um se sente árbitro das suas regras de vida e, se conserva um sentido religioso e se considera a Igreja um longínquo ponto de referência, ele não vive uma fé pessoal em Jesus Cristo e desconhece a sua dimensão eclesial.

4. Esta situação, cuja análise deve evidentemente variar segundo os lugares, marca o Pastor, que não pode ficar passivo. No seguimento de São Paulo, vós dissestes, «não desanimamos neste mistério, que nos foi concedido misericordiosamente, [...] pois, nós, não nos pregamos a nós próprios, mas a Cristo Jesus, o Senhor» (2 Cor. 4, 1.5). O Bispo deposita a sua certeza nas promessas de Cristo e no dom do seu Espírito, pois «fiel é Deus, por Quem fostes chamados à comunhão com Seu Filho, Jesus Cristo, nosso Senhor» (1 Cor. 1, 9).

O múnus episcopal, convém repetir, é antes de tudo de ordem espiritual. Como guardião e sentinela, o pastor dirige aos fiéis e a toda a sociedade um olhar, iluminado pela perspectiva evangélica e pela experiência eclesial. É na escuta daquilo que «o Espírito diz às Igrejas» (Ap. 2, 7), que ele pode exercer as suas responsabilidades, a começar por um discernimento aberto e benévolo sobre o bom êxito ou sobre os revezes, sobre as iniciativas dinâmicas ou sobre as passividades lamentáveis que marcam o ritmo da caminhada do povo de Deus.

O Concílio Vaticano II enunciou de modo claro as funções mais importantes dos sucessores dos Apóstolos, na Constituição Lumen gentium sobre a Igreja e no decreto Christus Dominus acerca da missão pastoral dos Bispos. Convém retomar a meditação destes importantes textos do magistério eclesial; uma semelhante reflexão vale certamente para aquele que está investido duma missão constitutiva ao serviço do povo que lhe está confiado, mas de igual modo ela deve interessar os fiéis.

5. Quereria confirmar-vos fraternalmente na vossa missão de ensinar, de anunciar aos homens o Evangelho de Cristo (cf. Christus Dominus, 11). Como profeta que proclama a Boa Nova, o Bispo propõe-na de modo incansável, procurando a linguagem que esclarece o sentido das Escrituras, como fez o Senhor com os discípulos de Emaús. O Concílio diz sobretudo: «(Os Bispos) expliquem a doutrina cristã com métodos apropriados às necessidades dos tempos, isto é, que respondam às dificuldades e problemas que mais preocupam e angustiam os homens» (Ibid., n.13). Estas palavras são suficientes para demonstrar que o vosso ministério apostólico se dirige aos homens do tempo presente, em função das necessidades expressas ou latentes tanto dos fiéis visivelmente presentes na comunidade diocesana, como das pessoas que permanecem no limiar e têm dificuldade de encontrar o sentido da própria vida.

Em particular, o Bispo é o primeiro a empenhar-se em favor dos pobres e dos excluídos da sociedade. Ele exprime-se como defensor da dignidade da pessoa, do respeito pela vida de cada um, da justiça na caridade, da solidariedade. É aquele que chama a servir as pessoas, a quem tendes denominado os «deserdados », que sofrem por causa de doenças, de deficiências físicas, de problemas sociais ou devido à falta de fé e de esperança espiritual. À imagem do Senhor que veio como Servo, o pastor abre as vias do serviço a todos os que ele é chamado a guiar.

Na caridade, o ministério apostólico é o da unidade do povo, em colaboração estreita com os membros do presbitério, que partilham das suas funções. Retornarei ulteriormente sobre as exigências presentes do sacerdócio presbiteral, que constitui a vossa principal preocupação. É suficiente que hoje eu ressalte que os sacerdotes e, com eles, os responsáveis pelos serviços ou movimentos, contam com o Bispo para coordenar o conjunto das missões, a fim de que todos contribuam para a unidade e o dinamismo da Igreja diocesana.

O conjunto das vossas responsabilidades pode parecer muito pesado. Só o Espírito do Senhor, na comunhão de toda a Igreja, pode dar-vos a força e a luz de que tendes necessidade. Tenhamos confiança no único Espírito «que é Senhor e dá a vida». Meditemos incessantemente sobre a promessa de Jesus: «Quando vier o Consolador, que vos hei-de enviar da parte do Pai, o Espírito da Verdade, que procede do Pai, Ele testificará de Mim. E vós também testificais, pois estivestes Comigo desde o princípio » (Jo. 15, 26-27).

6. A experiência destes últimos decénios permitiu que os Bispos não se encontrassem sem apoio para cumprir a sua missão. Afirmaram-se importantes instâncias de colaboração, a nível regional e nacional. Já me referi a isto diante de vós, em Reims. O Concílio recomenda que os Bispos se reúnam «para que, da comunicação de pareceres e experiências, e da troca de opiniões, resulte uma santa colaboração de esforços para o bem comum das Igrejas» (Christus Dominus, 37). Com efeito, para além duma simples harmonia, as assembleias episcopais permitem traçar orientações comuns, fazer ouvir mensagens que são válidas para o país, pôr em comum, no plano regional ou nacional, meios de aprofundamento e de acção de que uma só diocese não pode dispor.

Tomo como exemplo disto o trabalho importante, conduzido por muitos de vós, com a ajuda de peritos, de representantes dos movimentos leigos e de numerosos fiéis, que vos levou a dirigir aos Católicos da França a Carta, intitulada Propor a fé na sociedade actual. Faço votos por que este acto dos Bispos contribua para avaliar, com lucidez, a situação dos católicos na sociedade actual, estimulando-os a ir ao âmago do mistério da fé, a fim de formarem uma Igreja que saiba, cada vez melhor, propor e partilhar os dons recebidos pela graça.

Juntos, sereis em maior medida capazes de seguir a evolução e a animação das diferentes comunidades ou grupos, que compõem o panorama actual da Igreja no vosso País. Conferireis assim dinamismo às principais instituições de serviço em que a Igreja sempre se empenhou, sobretudo no ensino, no cuidado dos doentes, na mútua ajuda concreta e prudente ao interior do País e também aos vossos irmãos das regiões mais desfavorecidas.

Juntos, sereis também melhor escutados quando agirdes como defensores da solidariedade social para com todos os habitantes da vossa terra, quaisquer que sejam as suas origens.

7. A vossa presença em Roma põe em evidência também a vossa comunhão com a Igreja universal. Estou-vos grato pela atenção que atribuís ao Magistério e à acção do Bispo de Roma, tornados por vós conhecidos e explicados. E penso também na solicitude por todas as Igrejas, a respeito da qual o Concílio Vaticano II indicou com vigor que ela compete a cada um dos sucessores dos Apóstolos (cf. Lumen gentium, 23, e Christus Dominus, 6).

Sei que as vossas dioceses se dedicam à sua grande tradição missionária, e que estabelecem, em virtude dos laços antigos ou mais recentes, relações vivas com outras Igrejas particulares, sobretudo com as jovens Igrejas muitas vezes fundadas pelos missionários vindos das vossas regiões, ou com Igrejas antigas, que renascem após tempos de prova e desejam o intercâmbio efectivo dos dons, o qual com frequência tenho almejado. Isto já foi expresso na Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Europa, do qual anunciei uma nova sessão.

A vossa comunhão com o conjunto da Igreja manifesta-se também nos Sínodos gerais, tal como o que se prepara precisamente sobre o ministério episcopal, após as reflexões feitas sobre os leigos, os sacerdotes e a vida consagrada.

8. Para os meses e os anos vindouros, competem-vos tarefas importantes. Dentro em pouco o Dia Mundial da Juventude terá lugar em Paris, depois de todas as dioceses da França terem acolhido jovens provenientes do mundo inteiro. Estou reconhecido a todos aqueles que trabalham para o bom êxito deste encontro, pois tais encontros suscitam uma grande esperança: os jovens confrontam o modo de se aproximarem à fé em Cristo, que os chamou a seguil’O: «Vinde ver» (Jo. 1, 39).

Este acontecimento do mês de Agosto próximo insere-se na preparação directa do grande Jubileu do Ano 2000, iniciada por uma reflexão renovada sobre «Jesus Cristo, único Salvador do mundo, ontem, hoje e sempre» (cf. Heb. 13, 8). Ajudai os fiéis a redescobrirem o baptismo e a vocação universal à santidade, a revigorarem a sua fé e o seu testemunho, a intensificarem a catequese em benefício de todas as gerações, a orarem com confiança à Virgem santa, com a qual «a Igreja penetra mais profundamente, cheia de respeito, no insondável mistério da Encarnação (Lumen gentium, 65)» (cf. Tertio millennio adveniente, nn. 40-43). E o Jubileu deve ser caracterizado por um novo impulso na evangelização (cf. ibid., nn. 21.40).

9. Caros Irmãos, no momento em que começam as visitas ad Limina dos Bispos da França, asseguro-vos da minha profunda comunhão na oração, numa firme esperança quanto ao futuro das vossas Dioceses, onde, apesar das provas, se manifesta uma generosidade muito viva. O Senhor Jesus Cristo vos dê a alegria de O servir, conduzindo no Seu nome as Igrejas diocesanas que vos estão confiadas! A Virgem santa e todos os Santos da França intercedam por vós!

A vós, pastores da Região apostólica do Centro, a todos os que fazem viver a Igreja convosco e aos vossos compatriotas, dou de todo o coração a Bênção Apostólica.

 

 

 

 



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