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INTERVENÇÃO DO OBSERVADOR PERMANENTE
DA SANTA SÉ NA 59ª  SESSÃO DA COMISSÃO
 DOS DIREITOS DO HOMEM

7 de Abril de 2003

"Globalização e pobreza extrema"

 

Senhora Presidente

A minha Delegação deseja abordar, neste contexto, a questão da pobreza extrema no âmbito da globalização. O facto de a pobreza extrema existir em todas as partes do mundo representa uma profunda advertência de que, na sua forma actual, a globalização juntamente com todos os seus benefícios e oportunidades não criou um vasto sistema de inclusão. A concentração e a intensidade da pobreza extrema em determinadas regiões do mundo são um dos símbolos mais evidentes das desigualdades inaceitáveis que ainda existem no nosso mundo contemporâneo.

A inclusão deveria ser uma marca distintiva da abordagem dos direitos humanos na redução da pobreza, uma abordagem que realce a indivisibilidade e a universalidade dos direitos do homem, pondo no centro a dignidade integral de cada ser humano e a unidade da família humana.

A abordagem dos direitos humanos na luta contra a pobreza deve distinguir-se pela promoção de políticas que tratem as pessoas como sujeitos criativos das suas próprias vidas. Cada pessoa deve ter a possibilidade de participar nos benefícios e nas oportunidades da globalização, como protagonista activo das opções fundamentais que lhe pertencem, a ele ou ela, como pessoa. É necessário debater sobre as práticas que impedem as mulheres de desempenharem um papel concreto na sociedade, com a mesma salvaguarda legal reservada aos homens.

Na era da globalização, a abordagem dos direitos humanos na luta contra a pobreza deve considerar a pessoa, como João Paulo II recorda, no âmbito das "necessidades qualitativas, que não podem ser satisfeitas exclusivamente pelos mecanismos do mercado" (Centesimus annus, 40). Neste contexto, é útil lembrar que, quando fala da remuneração pela realização de um trabalho (cf. Art. 23, 3) e de um adequado padrão de vida (cf. Art. 25, 1), a Declaração Universal dos Direitos do Homem não trata a pessoa simplesmente como um indivíduo, mas no contexto da rede de necessidades e responsabilidades vinculadas à sua família.

A pobreza extrema é uma afronta contra a dignidade humana e uma violação efectiva dos direitos humanos. A abordagem dos direitos humanos deve frisar as responsabilidades fundamentais que os Estados têm de oferecer um contexto legislativo e político apropriado, que favoreça o desenvolvimento humano de todos. Os Estados devem garantir a assistência, de tal forma que as necessidades essenciais sejam satisfeitas e que haja uma disponibilidade mínima dos serviços. Mas isto não é suficiente. A abordagem dos direitos humanos na luta contra a pobreza há-de estar na linha de vanguarda, na passagem das políticas de assistencialismo às políticas de promoção das capacidades humanas e de realização das potencialidades que todos os homens receberam de Deus.

Para fazer isto, é necessário que as pessoas pobres estejam directamente comprometidas nas decisões políticas que as atingem, tanto a si mesmas como às suas famílias. Provavelmente, só escutando os pobres é que poderemos compreender de maneira integral as consequências da pobreza. Para serem parceiros activos na luta contra a pobreza, as pessoas pobres precisam sobretudo de voz, reconhecimento, segurança e inclusão.

Por conseguinte, a abordagem dos direitos humanos na luta contra a pobreza deve comprometer e empenhar directamente as pessoas que vivem na pobreza. O facto de não dispor de uma receita, e de não ter acesso aos serviços humanos básicos, não torna o indivíduo pobre menos humano. O facto de uma pessoa viver na pobreza não significa que os outros têm o direito de decidir quais são os seus melhores interesses.

No passado, muitos programas internacionais de desenvolvimento, por exemplo no campo da redução da dívida externa, fracassaram em virtude da sua falta de sensibilidade em relação aos interesses e às condições locais. Com demasiada frequência, as políticas em favor dos pobres têm subestimado a extraordinária criatividade que as vítimas da pobreza mostram, simplesmente procurando sobreviver e oferecer um futuro melhor para os seus filhos. Esta criatividade deve visar um futuro humano mais produtivo.

Senhora Presidente, permita-me concluir, recordando que hoje em dia não se pode falar sobre a pobreza extrema sem analisar a dramática crise do HIV/Sida em determinadas regiões, de maneira especial na África. Também neste sector, um dos requisitos fundamentais consiste em reconhecer aquele/a que sofre de HIV/Sida plenamente como pessoa, como um irmão e uma irmã que, como qualquer outro indivíduo, tem direito à voz, ao reconhecimento, à segurança e à inclusão. A luta contra a pobreza deve incluir o combate contra qualquer estigmatização das vítimas do HIV/Sida e contra toda a discriminação que deixa de reconhecer a sua dignidade inata e a sua personalidade.

 

 

 

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