The Holy See
back up
Search
riga
INTERVENÇÃO DO REPRESENTANTE PERMANENTE
DA SANTA SÉ JUNTO DA AGÊNCIA INTERNACIONAL
DE ENERGIA ATÓMICA (AEIA)NA CONFERÊNCIA MINISTERIAL
SOBRE ENERGIA NUCLEAR NO SÉCULO XXI

DISCURSO DE MONS. MICHAEL W. BANACH

Pequim, 21 de Abril de 2009

Senhor Presidente
Excelências
Senhoras e Senhores

Tenho a honra de pronunciar esta intervenção em nome de Sua Excelência o Arcebispo Dominique Mamberti, Secretário da Santa Sé para as Relações com os Estados.

Antes de tudo permiti-me expressar gratidão às autoridades competentes da República Popular da China, da Agência Chinesa para a Energia Atómica e da Agência Internacional de Energia Atómica pela organização deste evento, que se está a tornar uma Conferência cada vez mais interessante.

Senhor Presidente!

Os participantes nesta Conferência poderiam estar interessados em saber que a Santa Sé é um Membro Fundador da Agência Internacional de Energia Atómica (AEIA). O constante aumento da procura mundial de energia solicita uma reflexão séria sobre o papel da energia nuclear. As reflexões que se seguem são uma contribuição da Santa Sé, baseadas na sua natureza pacífica, para os debates sobre a energia nuclear no século XXI.

É de conhecimento geral que a tecnologia nuclear não apresenta apenas riscos, mas também grandes oportunidades para a humanidade. Nesta perspectiva, embora seja importante reconhecer o direito inalienável dos Estados a "desenvolver a pesquisa, a produção e a utilização da energia nuclear para fins pacíficos, sem discriminação" (Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, Art. IV.I), é igualmente importante reconhecer que este direito não é absoluto. Deve ser submetido à condição de um efectivo processo de desarmamento e de não-proliferação das armas nucleares. Trata-se, sobretudo, de um direito em relação àquele de cada um dos outros Estados. De facto, cada Estado é chamado a perseguir o desenvolvimento e o bem comum de povos e não o poder nacional, seja ele económico ou militar. Uma política energética sábia leva necessariamente ao desenvolvimento dos povos, a um desenvolvimento que seja respeitador do ambiente natural, como bem em si mesmo e do qual dependem também a vida e a saúde humana, e sempre atento às pessoas mais desfavorecidas (cf. Papa Bento XVI, Angelus, 29 de Julho de 2007). Como afirmou a Declaração das Nações Unidas sobre o Direito ao Desenvolvimento de 1986: "A pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento" (Art. 2/1).

Senhor Presidente!

Entre as numerosas e complexas variáveis de natureza política e económica, o ponto de referência essencial permanece, de facto, a pessoa humana, com a sua dignidade e os seus direitos fundamentais. Nesta perspectiva a segurança energética e nuclear não são apenas objectivos estratégicos, mas também, e sobretudo, instrumentos para favorecer "a contribuição da energia atómica para a paz, saúde e prosperidade em todo o mundo" (Estatuto da AEIA, Art. II).

Este possível contributo exige grande sabedoria e um sentido de responsabilidade por parte dos Estados. Principalmente, é necessário e urgente relançar o multilateralismo e as actividades de vigilância e de monitorização da AEIA. Estas últimas não são um limite aos interesses legítimos dos Estados, mas uma garantia para a segurança e o bem comum de todos os povos. Também os programas civis penso na questão do uso dual requerem uma monitorização internacional eficaz, embora no respeito da liberdade dos Estados.

É verdade que a segurança energética e a segurança nuclear exigem a adopção de medidas técnicas e legais apropriadas, mas estas nunca poderão ser, sozinhas, a única resposta àquela que é, sobretudo, uma questão relativa à natureza humana. As ameças à segurança derivam de comportamentos e acções hostis à natureza humana. Portanto é a nível humano que é preciso agir, a nível cultural e ético. Se, a curto prazo, são necessárias medidas técnicas e legais para proteger materiais e sitos nucleares e para prevenir actos de terrorismo nuclear, cujos eventuais efeitos devastadores são verdadeiramente difíceis de imaginar, então, a longo prazo, são necessárias medidas de prevenção que possam incidir sobre as raízes culturais e sociais mais profundas da actividade criminal e do terrorismo. São indispensáveis programas de formação e de difusão de uma "cultura de segurança e incolumidade" quer no sector nuclear quer na consciência pública em geral. Um papel especial deve ser reservado aos códigos de conduta para os recursos humanos que, no sector nuclear, devem ser sempre conscientes dos possíveis efeitos da sua actividade. A segurança depende do Estado, mas, sobretudo, do sentido de responsabilidade de cada indivíduo singularmente.

Senhor Presidente!

Este sentido de responsabilidade por parte dos Estados exige também uma maior coerência entre política de desenvolvimento e política de desarmamento e de não proliferação de armas nucleares. Esta coerência deve ser alimentada também por uma cooperação internacional que é a única capaz de garantir soluções equilibradas e compartilhadas e de prevenir as tensões ligadas às estratégias de isolamentos nacional ou regional.

Se, por um lado, é necessário considerar sem preconceitos o uso da tecnologia nuclear e, em particular, da energia nuclear, por outro, é também necessário renovar o compromisso para o completo e geral desarmamento nuclear. O desarmamento e a não-proliferação de armas nucleares têm um grande valor político porque afirmam a supremacia da confiança sobre as armas e da diplomacia sobre a força. Esta opção está de acordo com a regra, sancionada pela Carta das Nações Unidas, pela qual todos os Estados devem promover "o estabelecimento e a manutenção da paz e da segurança internacionais, desviando para armamentos o mínimo possível dos recursos humanos e económicos do mundo" (Art. 26). Isto tem um grande valor económico porque "os recursos liberados por medidas efectivas de desarmamento sejam usados para o desenvolvimento amplo, em particular o dos países em vias de desenvolvimento" (Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento de 1986, Art. 7).

Senhor Presidente!

O sector nuclear pode ser uma grande oportunidade para o futuro. Isto explica o "renascimento nuclear" que emerge a nível mundial. Este renascimento parece oferecer perspectivas de desenvolvimento e prosperidade. Contudo, poder-se-ia reduzir a uma ilusão sem um "renascimento cultural e moral". Infelizmente, o mero bem-estar material não elimina os riscos e os conflitos ligados à pobreza e à miséria cultural e moral dos homens e mulheres. Por este motivo, as políticas energéticas devem ser consideradas na perspectiva do "desenvolvimento integral do ser humano" (cf. Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento de 1986), que implica não só o desenvolvimento material, mas, principalmente, o cultural e moral de cada pessoa e de todos os povos. Estão todos envolvidos neste projecto ambicioso e indispensável, no exterior e no interior dos sectores nuclear e energético, nos campos público e privado, a nível governamental e não governamental. Desta maneira, um compromisso comum pela segurança e pela paz conduzirá não só a uma distribuição equilibrada dos recursos da terra, mas, sobretudo, à edificação de uma "ordem, no plano social e no plano internacional, capaz de tornar plenamente efectivos os direitos e as liberdades" de todas as pessoas humanas (Declaração Universal dos Direitos do Homem, Art. 28).

Obrigado pela cortês atenção.

top