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INTERVENÇÃO DE MONS. ZYGMUNT ZIMOWSKI
PRESIDENTE DO PONTIFÍCIO CONSELHO
PARA A PASTORAL NO CAMPO DA SAÚDE
NA 63ª ASSEMBLEIA DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL
DA SAÚDE REALIZADA EM GENEBRA

(17-21 de MAIO DE 2010)

Senhor Presidente!

O recente relatório para o controle da realização dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (A63/7), oferece-nos uma avaliação do que foi obtido e dos desafios a enfrentar. A Delegação da Santa Sé deseja unir a sua voz à das outras delegações para louvar, entre outras coisas, o crescente sucesso que foi alcançado na redução da mortalidade infantil, no controle da malária, no aumento do acesso aos fármacos anti-retrovirais para as pessoas afectadas com vih/sida, no tratamento e na diminuição da taxa de incidência da tuberculose.

Para alcançar estes objectivos foram realizados esforços não insignificantes. Porém, é também verdade que o seu alcance é diferente de país para país, e inclusive entre um objectivo e outro. Contudo, a minha Delegação expressa a própria desaprovação a propósito dos programas que promovem o aborto e o uso de métodos contraceptivos. Devemos multiplicar as iniciativas que tendem a encorajar "a obtenção da maturidade pessoal na sexualidade e no amor recíproco, e ao assumir aquelas decisões que são próprias da relação conjugal, de acordo com as normas morais" [1]. A Santa Sé expressa o parecer de que o aborto e os métodos anticoncepcionais não devem estar contemplados entre os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.

Depois, constatamos que continuam a existir injustiças entre os sistemas de saúde dos países mais ricos e o dos países de baixo rendimento, e pior ainda, naqueles que estão em vigor nos chamados países em vias de desenvolvimento. Além disso, até nos próprios países ricos, existem grandes diferenças entre as possibilidades de acesso aos cuidados e à assistência médica. Estreitamente ligada a estes problemas está a falta de acesso, por parte dos pobres e das pessoas marginalizadas, aos medicamentos e à tecnologia denominada "essencial", que com frequência tem um preço elevado, ou porque no seu país não existem infra-estruturas adequadas.

Em 2008, dos cerca de 9,5 milhões de doentes de VIH/SIDA que vivem nos países mais pobres, mais de 5 milhões não puderam receber tratamento. Além disso, foi verificado como o acesso ao tratamento de outras doenças importantes, como a malária e a tuberculose, ainda é insuficiente, enquanto mais de 1.000 milhões de pessoas referiram danos na saúde por ter descuidado doenças tropicais [2]: estes países pobres têm uma necessidade extrema de recursos, para poder enfrentar as carências no financiamento e reforçar o seu sistema de saúde.

Na sua recente encíclica Caritas in veritate, o Santo Padre Bento XVI dirigiu um forte apelo à "Colaboração da família humana". O Pontífice ressalta que "o desenvolvimento dos povos depende sobretudo do reconhecimento que são uma só família, a qual colabora em verdadeira comunhão e é formada por sujeitos que não se limitam a viver uns ao lado dos outros" [3]. E para evitar uma assistência social de tipo paternalista, que é humilhante para quantos se encontram em necessidade, a solidariedade das Nações ricas em relação aos países pobres deve estar estreitamente ligada ao princípio da subsidiariedade. De facto, "para serem consideradas tais, as ajudas económicas não devem visar segundos fins. Hão-de ser concedidas envolvendo não só os governos dos países interessados, mas também os agentes económicos locais e os sujeitos da sociedade civil portadores de cultura, incluindo as Igrejas locais. Os programas de ajuda devem assumir sempre mais as características de programas integrados e participados a partir de baixo" [4].

Um outro factor que interfere na dificultação do acesso aos cuidados e à assistência de saúde é o facto que não se tenha conseguido encontrar uma abordagem equilibrada dos direitos sobre a propriedade intelectual e o direito de obter um lucro justo dos investimentos no campo da pesquisa e do desenvolvimento de produtos farmacêuticos e de diagnóstico, diante de situações de emergência como a que a pandemia de VIH/SIDA representou para a comunidade global, e as principais doenças que afligem as populações que vivem nos países pobres.

Gostaria de recordar o apelo que o Servo de Deus João Paulo II dirigiu às indústrias farmacêuticas por ocasião da Conferência sobre Economia e Saúde organizada pelo Pontifício Conselho para a Pastoral no Campo da Saúde. Eis as suas palavras: "Às indústrias farmacêuticas, peço que jamais deixem prevalecer o lucro económico sobre a consideração dos valores humanos, mas que se mostrem sensíveis às exigências de quantos não gozam de um seguro social, pondo em prática válidas iniciativas para favorecer os mais pobres e marginalizados. É preciso trabalhar para reduzir e, se possível, eliminar as diferenças existentes entre os vários continentes, exortando os países mais desenvolvidos a porem à disposição dos menos desenvolvidos experiência, tecnologia e uma parte das suas riquezas económicas" [5].

A minha Delegação espera, portanto, que a actuação da resolução sobre uma estratégia global e o plano de acção mundial para a saúde pública, a inovação e a propriedade intelectual (WHA.21) sejam aceites espontaneamente por todos os sujeitos interessados, de modo a consentir, entre outras coisas, a transferência das tecnologias concernentes à farmacêutica e à produção nos países em vias de desenvolvimento [6].

Senhor Presidente!

Gostaria de chamar a vossa atenção para o problema dos produtos médicos falsificados, que representa um notável risco para a saúde pública e que nos últimos anos aumentou até se tornar um desafio global. A este propósito, "é preciso observar que nos países em vias de desenvolvimento o nível de contrafacção é bastante elevado, principalmente por causa da insuficiência dos recursos humanos e financeiros, e depois por causa da legislação que é carente em relação à produção, distribuição e importação de produtos médicos" [7]. Nestes países, o fenómeno é preocupante sobretudo para os fármacos "essenciais" e os outros medicamentos. Além disso, a contrafacção e a falsificação dos produtos médicos atingem principalmente os sujeitos que pertencem à faixa pediátrica. Há necessidade de um código ético comum no sector da produção e da distribuição dos produtos médicos. A nossa sincera esperança é que a campanha promovida pela Organização Mundial da Saúde juntamente com o controle indispensável dos Estados-membros, contribua para combater a contrafacção dos medicamentos, considerando-a como uma prioridade em todos os países.

Em relação ao projecto de resolução sobre "Anomalias à nascença" (Birth defects (A63/10) a Delegação da Santa Sé deseja recordar que a vida humana começa no momento da concepção, e deve ser defendida também se a criança ainda não nascida apresenta doenças ou anomalias. A vida, como dom precioso, deveria ser sempre protegida e jamais lesionada ou transformada em objecto de selecção. Este importante aspecto dos programas de assistência de saúde que se ocupam das anomalias presentes desde o nascimento, especialmente os métodos de diagnóstico pré-natal, não deve ser comprometido pela formulação da resolução.

Termino recordando que estão a aumentar os problemas de saúde ligados às mudanças climáticas, e diante desta evidência seria irresponsável não ter em séria consideração a questão. O Santo Padre Bento XVI, na sua Mensagem anual para o Dia Mundial da Paz deste ano, convidou a uma acção urgente para proteger o ambiente, e observou que as mudanças climáticas e a degradação ambiental estão a ter um profundo impacto no exercício dos direitos humanos, como o direito à vida, à alimentação e ao desenvolvimento [8]. Ele acrescentou ainda que "a crise ecológica oferece uma oportunidade histórica para elaborar uma resposta colectiva tendente a converter o modelo de desenvolvimento global segundo uma direcção mais respeitadora da criação e de um desenvolvimento humano integral, inspirado nos valores próprios da caridade na verdade" [9]. Faz votos, então "de que se adopte um modelo de desenvolvimento fundado na centralidade do ser humano, na promoção e partilha do bem comum, na responsabilidade, na consciência da necessidade de mudar os estilos de vida e na prudência, virtude que indica as acções que se devem realizar hoje na previsão do que poderá suceder amanhã" [10].

Obrigado, Senhor Presidente, e que Deus vos abençoe a todos.


Notas

[1] Cf. Statement of the Holy See at the Concluding Session of the General Assembly for the Overall Review and Appraisal of the Implementation of the Programme of Action of the International Conference on Population and Development, New York, 2 de Julho de 1999.

[2] Cf. OMS, Relatório sobre o controle da realização dos Objectivos do Desenvolvimento para a Milénio no Campo da Saúde a63/7.

[3] Bento XVI, encíclica Caritas in veritate, n. 53.

[4] Bento XVI, encíclica Caritas in veritate, n. 58.

[5] João Paulo II, Discurso aos participantes na Conferência internacional promovida pelo Pontifício Conselho para a Pastoral no Campo da Saúde, 19 de Novembro de 1999, n. 5.

[6] Cf. OMS, Relatório sobre Saúde Pública, Inovação e Propriedade intelectual: estratégia global e plano de acção a63/6.

[7] Cf. Zygmunt Zimowski, Discurso ao Congresso Mundial da Federação Internacional dos Farmacêuticos Católicos, sobre: "A segurança dos produtos médicos: ética e consciência para os farmacêuticos", Poznan, Polónia, 11-14 de Setembro de 2009.

[8] Cf. Bento XVI, Mensagem para o Dia Mundial da Paz 2010.

[9] Bento XVI, Mensagem para o Dia Mundial da Paz 2010, n. 9.

[10] Bento XVI, Mensagem para o Dia Mundial da Paz 2010, n. 9.

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