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ARTIGO DE MONS. DOMINIQUE MAMBERTI
ARCEBISPO SECRETÁRIO DAS RELAÇÕES COM OS ESTADOS
SOBRE A LEI N. XVIII DO ESTADO DA CIDADE DO VATICANO
 EM MATÉRIA DE TRANSPARÊNCIA VIGILÂNCIA
 E INFORMAÇÃO FINANCEIRA

 

A 8 de Outubro, a Pontifícia Comissão para o Estado da Cidade do Vaticano aprovou a Lei n. XVIII que contém normas em matéria de transparência, vigilância e informação financeira. Tais normas já estavam em vigor porque foram adoptadas em caso de urgência com o Decreto n. XI do Presidente do Governatorado a 8 de Agosto de 2013 — contextualmente com o Motu Proprio do Papa Francisco para a prevenção e o combate à lavagem de dinheiro, ao financiamento do terrorismo e à proliferação de armas de destruição de massa e, portanto, foram confirmadas definitivamente em lei adquirindo carácter de estabilidade.

Trata-se de um texto muito articulado e complexo — quase único em matéria financeira — que se insere no percurso de adaptação do ordenamento vaticano aos parâmetros internacionais do Financial Action Task Force — Groupe d’action financière (FATF — GAFI) e às recomendações da Divisão Moneyval do Conselho da Europa, normalmente indicados como os melhores instrumentos normativos para predispor uma eficiente rede de protecção contra as operações de lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo.

Dada a amplidão dos seus conteúdos, a Lei n. XVIII não se limita só a substituir em larga parte a Lei n. CXXVII, relativa à prevenção e ao combate da lavagem de dinheiro proveniente de actividades criminosas e do financiamento do terrorismo, de 30 de Dezembro de 2010 (depois modificada pela Lei CLXVI, de 24 de Abril de 2012), mas introduz também disciplinas ulteriores, que na normativa precedente estavam totalmente ausentes ou só esboçadas.

Uma parte consistente da lei é dedicada às Medidas contra a lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo, que se desenvolve nos pormenores dos sujeitos obrigados, nas actividades de avaliação dos riscos (geral e particular), nas prescrições concernentes à verificação adequada das contrapartes (normalmente realizada de maneira proporcionada ao risco inerente à categoria e ao país ou área geográfica da contraparte e à tipologia de operação utilizada, mas que se reforça em caso de alto risco de lavagem de dinheiro ou de financiamento do terrorismo) e na disciplina da transferência internacional de fundos.

Presta-se atenção particular à indicação de actividades suspeitas, que os sujeitos obrigados devem efectuar à Autoridade de Informação Financeira, que por sua vez as analisa e aprofunda, inclusive com decisivos poderes instrutórios. Se, por acaso, houver um motivo fundado para suspeitar uma actividade de lavagem de dinheiro ou de financiamento do terrorismo, a Autoridade de Informação Financeira transmite um relatório pormenorizado ao Promotor de Justiça e tem também a possibilidade de suspender a execução das transações e operações suspeitas, por cinco dias úteis.

O sistema de prescrição em matéria de medidas contra a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo completa-se pela atribuição, sempre à Autoridade de Informação Financeira, de um poder de vigilância geral acerca da aplicação das medidas estabelecidas pela lei a cargo dos sujeitos obrigados, além de um articulado sistema de sanções administrativas que podem ser emanadas pela mesma Autoridade, ou seja, nos casos mais graves pelo Presidente do Governatorado, prévia recomendação por parte da Autoridade de Informação Financeira. A normativa sobre as sanções administrativas contém também uma prorrogação à disciplina geral em matéria, também ela de adopção recente com a Lei n. X, que contém normas gerais em matéria de sanções administrativas, de 11 de Julho de 2013.

Um âmbito relevante da disciplina introduzida com a Lei n. XVIII está contido no título relativo à Vigilância prudencial das entidades que realizam profissionalmente uma actividade de natureza financeira, isto é, que (com base nas definições contidas no artigo 1, nn. 1 e 2) realizam habitualmente em nome e por conta de terceiros uma actividade financeira em forma económica organizada, com a finalidade de produção ou de intercâmbio de bens ou serviços. A introdução desta peculiar função — já atribuída à Autoridade de Informação Financeira com o Motu Proprio para a prevenção e o combate à lavagem de dinheiro, do financiamento do terrorismo e da proliferação de armas de destruição de massa, de 8 de Agosto de 2013 — responde a uma recomendação específica da Divisão Moneyval do Conselho da Europa e a Lei n. XVIII prescreve a sua disciplina, estabelecendo a propósito um poder difundido de regulamentação da matéria por parte da Autoridade de Informação Financeira, e de atribuir à mesma Autoridade a vigilância sobre o respeito das obrigações e a competência em matéria de sanções administrativas.

Um título feito expressamente disciplina as Medidas contra os sujeitos que ameaçam a paz e a segurança internacionais. Tais medidas já tinham sido introduzidas com a Lei n. CXXVII, mas nesta sede foram notavelmente promenorizadas. A competência para a adopção da lista foi depois atribuída ao Presidente do Governatorado, enquanto a Secretaria de Estado (competente anteriormente) continua a desempenhar um papel de coordenação essencial, em razão da própria competência fundamental nas relações diplomáticas com os Estados e com os outros sujeitos de direito internacional (cf. Constituição Apostólica Pastor Bonus, art. 46). Em relação aos sujeitos inscritos na lista vigoram automaticamente as proibições de fornecimento de bens, recursos económicos e serviços financeiros, e a Autoridade de Informação Financeira dispõe imediatamente o bloqueio preventivo dos seus bens e recursos, informando os sujeitos que praticam actividades financeiras. Além disso, podem ser adoptadas medidas cautelares também em relação aos sujeitos que ainda não foram inscritos na lista, sempre que contudo subsistam motivos fundados para julgar que um sujeito ameace a paz e a segurança internacional e contanto que no prazo de 15 dias o sujeito seja inscrito na lista.

Outras disposições da Lei n. XVIII referem-se ainda à disciplina da Transferência de dinheiro para o estrangeiro, em entrada ou em saída do Estado, por um valor igual ou superior a 10.000 euros, e as normas em matéria de Informação e cooperação, actividades em relação às quais é atribuído um papel central à Autoridade de Informação Financeira que colabora e troca informações quer com as outras autoridades da Santa Sé e do Estado da Cidade do Vaticano, quer com as autoridades análogas de outros Estados, em condições de reciprocidade e com base nos protocolos de entendimento.

Para compreender a integridade da intervenção normativa realizada com esta lei é preciso ler os seus conteúdos à luz do Motu Proprio do Papa Francisco, de 8 de Agosto de 2013. De facto, tal medida além da instituição e da atribuição à Autoridade de Informação Financeira da função de vigilância prudencial e da instituição do Comité de Segurança Financeira, tem de igual modo o efeito de estender a disciplina em matéria de combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo também aos Dicastérios da Cúria Romana e aos demais organismos e entidades da Santa Sé, às organizações sem finalidades de lucro com personalidade jurídica canónica e sede no Estado da Cidade do Vaticano (art. 1), atribuindo-lhes a jurisdição em matéria aos órgãos judiciários do Estado da Cidade do Vaticano (art. 3). Portanto, a concordada harmonização da lei vaticana e da medida canónica permite ampliar o âmbito da presente reforma do Estado da Cidade do Vaticano à Santa Sé.

Considerando também as recentes normativas em matéria de direito penal substancial e processual (com as Leis nn. VIII e IX de 11 de Julho de 2013), a introdução de uma lei geral em matéria de sanções administrativas (Lei n. X. de 11 de Julho de 2013) e o Motu Proprio do Papa Francisco sobre a jurisdição dos órgãos judiciários do Estado da Cidade do Vaticano em matéria penal, de 11 de Julho de 2013, parece visível o compromisso reformador que permitiu alcançar metas importantes no percurso empreendido a partir do pontificado de Bento XVI, com o Motu Proprio para a prevenção e o combate às actividades ilegais em campo financeiro e monetário, de 30 de Dezembro de 2010.

Hoje o percurso chegou a uma fase muito avançada e portanto é possível olhar com satisfação para o grande esforço, cuja finalidade fundamental é contribuir de modo activo para o crescimento da Comunidade internacional, em cujo seio a Santa Sé é chamada a desempenhar um papel de guia e exemplo.

 

 

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