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CARTA DO CARDEAL SECRETÁRIO DE ESTADO
 AGOSTINO CASAROLI AO PRIOR-GERAL
 DA CONGREGAÇÃO BENEDITINA
DOS MONGES CAMALDULENSES
(
*)

 

 

Reverendíssimo Padre

A celebração do milésimo aniversário de fundação do Mosteiro de Santa Cruz em Ponte Avellana, que se está realizando este ano por iniciativa da Congregação Beneditina dos Monges Ermitães Camaldulenses e do Centro de Estudos Avellanitos, oferece ao Santo Padre ocasião propicia para recordar aquele lugar privilegiado pelo Senhor, tornado através dos séculos ideal ponto de referência para gerações de espíritos eleitos que nele se aplicaram à perfeição evangélica e também para os especialistas de história da Igreja e da literatura.

Se continua incerto o nome do fundador do Ermo, é seguro que um carácter profundo e indelével lhe foi dado pela enérgica personalidade de São Pedro Damião, que foi monge e prior do primitivo ermitério. Ele precisamente concretizou a maneira de vida e de inspiração romualdina em regras escritas e em disposições jurídicas, preocupando-se, além do mais, em garantir ao ermo solidão, autonomia e liberdade. Foi sobretudo mérito seu ter lançado os fundamentos da futura Congregação Avellanita graças à fundação de novos ermos e mosteiros, fazendo das várias comunidades quase um corpo único, como elas aparecem no momento do reconhecimento oficial por parte de Inocêncio II, em 1139.

Esta nova instituição participando de todos os elementos essenciais do cenobitismo beneditino e do anacoretismo, reflectia fielmente a espiritualidade do grande Prior avellanito, que soube unir tão bem a vida contemplativa e a activa. Como é sabido, ele não se apartou na luta pela reforma da Igreja; mais que isso, empunhou a pena em defesa daquela nobre causa e, chegando a Cardeal, fez-se embaixador da paz e arauto do Evangelho, onde quer que houvesse necessidade da sua mediação e da sua palavra exortatória.

Mas se este Santo Doutor foi o mais ilustre dos Avellanitos e ao mesmo tempo um dos maiores homens do século XI, todavia não foi o único a ilustrar o mosteiro. Muitos outros ermitães ainda, com a santidade da vida e com o sagrado governo das dioceses, à frente das quais foram colocados, tornaram a Congregação digna de elogio e grandemente benemérita na sociedade e na Igreja. Não admira portanto que o movimento espiritual de Fonte Avellana, longe de interromper-se com a morte de São Pedro Damião, sucedida a 22 de Fevereiro de 1072, se tenha desenvolvido cada vez mais, também pelo apoio dado pela Sé Apostólica, a qual a 31 de Agosto de 1197 enviou um Legado Pontifício para consagrar a Igreja dedicada à Santa Cruz: monumento de fé e de arte que exprime ainda e reflecte, na sua forma românica, descarnada e essencial, o estilo de vida dos ermitães, que a construíram.

Nem se deve esquecer o auxilio que deu a Congregação avellanita à vida social com o trabalho e o arroteamento do território, dando vida às verdadeiras explorações agrícolas. Infelizmente a afirmação económica, devida quer a doações quer também à prudente administração, devia levar o Ermo, outrora célebre pela austeridade de vida dos seus monges, ao relaxamento da primitiva regra. Daí resultou a transformação do Ermo em Abadia, que tornou inevitável uma intervenção da Santa Sé e aconselhou que fosse agregada a Congregação Avellanita à Camaldulense, a qual se tinha conservado sempre fiel ao genuíno espírito de São Romualdo. Desta fusão se originaram energias renovadas e novo ardor espiritual. Demonstram-no as numerosas almas santas, que floresceram neste segundo período de Fonte Avellana.

Também em tempos recentes o facho do espírito avellanito esteve longe de se enfraquecer. Ainda hoje o mosteiro é um apelo aos valores superiores do espírito; e recentemente tornou-se também uma palestra cultural mediante o Centro de Estudos Avellanitos, nascido em 1965.

Ao recordar estes acontecimentos, o Sumo Pontífice exprime o voto de que a mensagem, de que São Pedro Damião foi o principal portador com o exemplo da vida penitente e com a força persuasiva dos discursos e dos escritos, continue a inspirar as almas generosas de todos quantos seguem a regra damianense ou camaldulense, na plena consciência da importância de assegurar o primado absoluto da busca de Deus acima de todos os valores contingentes. Essa mensagem, caracterizada pela oração, pelo recolhimento e pela solidão, que fazem parte da vida eremítica, não perdeu a sua actualidade. Melhor, permanecem válidas as estimulantes considerações que São Pedro Damião mencionou numa carta por ele dirigida à imperatriz Inês: "O teu piedoso coração, que ambiciona com todas as forças acender-se no amor de Deus, não se aflija por não ter a companhia humana; pelo contrário, tanto mais confie na assistência e na tutela do Espírito Santo, quanto mais reconhecer que lhe faltam os confortos humanos... O templo divino cresce de facto, no silêncio, porque quando a mente do homem não se dissipa nas conversações com os outros, levanta-se no alto o cimo do edifício espiritual; e tanto mais cresce e se levanta para o alto, quanto mais é guardada pela disciplina do silêncio e não se distrai com o que está fora" (Ep. VIII, 6; PL 144, 443-444).

Neste espírito, Sua Santidade exorta todos os membros dessa benemérita Congregação Beneditina dos Monges ermitães camaldulenses a que prossigam cada vez mais generosamente nesta luminosa tradição espiritual e cultural, dedicando-se com paixão à sagrada liturgia e aos estudos, sobretudo aos bíblicos e históricos; e que se esmerem na hospitalidade dentro dos seus Mosteiros, forma de apostolado muito eficaz; e a que insistam no colóquio com os Irmãos separados, estando especialmente prontos para se aproximarem deles e lhes mostrar qual é a verdade fielmente vivida.

Em confirmação destes votos, o Vigário de Cristo com muito gosto concede a Si e a todos os membros da família avellanita a Sua propiciadora Bênção, que torna extensiva igualmente a todos os que trabalham com os monges na acção apostólica e nas Iniciativas culturais supramencionadas, e ainda a todas as queridas populações que, com ânimo piedoso, subirão neste ano milénario ao predito Mosteiro para venerar o mistério da Cruz.

Aproveito a circunstância para mais uma vez me declarar com sentimentos de distinta estima, dev.mo no Senhor

AGOSTINO Card. CASAROLI

 

(*) Publicado no "L'Osservatore Romano" ed. italiana, de 19 de-Maio de 1982

 

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