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INTERVENÇÃO DA DELEGAÇÃO DA SANTA SÉ NA ONU
 SOBRE O PROBLEMA DOS REFUGIADOS,
DOS REPATRIADOS E DOS DESLOCADOS

20 de Novembro de 2001


Senhor Presidente

O debate sobre as questões relativas aos refugiados, aos repatriados e aos deslocados está centrado sobre dois documentos muito importantes: o Relatório do Alto Comissariado e o Relatório do Secretário-Geral, intitulado Assistência aos refugiados, aos repatriados e aos deslocados no continente africano. Além destes dois Relatórios, que foram oferecidos de maneira específica para este debate, as várias Delegações podem contar com os relatórios relativos às diversas questões sobre os direitos humanos:  a Nota do Secretário-Geral acerca das pessoas deslocadas no interior de um determinado território e o Relatório sobre a salvaguarda dos migrantes. Estes documentos oferecem uma ampla visão da obra realizada pela Organização das Nações Unidas, a respeito destas pessoas que vivem ou que foram separadas dos seus lares e das suas famílias. A minha Delegação agradece a todos aqueles que nos prepararam estas informações.

Naturalmente, neste debate, a Santa Sé dirigir-se-á a mais de 22 milhões de pessoas, que constituem o objecto directo da solicitude do UNHCR.

Senhor Presidente

Durante as últimas semanas, a nossa atenção voltou-se de maneira acentuada para o Afeganistão, embora a crise dos refugiados que diz respeito a milhões de cidadãos afegãos tenha continuado por mais de vinte anos. Os últimos relatórios emanados do Alto Comissariado informam-nos que mais de três milhões e meio de refugiados do Afeganistão procuraram refúgio no Paquistão e no Irão. Aqueles mesmos relatórios indicam a dificuldade de definir um número específico e exacto, narrando também a tragédia que continua em acto, enquanto as nações procuram ajudar essas populações obrigadas a abandonar os seus lares e países.

Durante uma declaração pronunciada no dia 11 de Novembro, Sua Santidade João Paulo II voltou a chamar a atenção para esta situação: "Enquanto damos graças a Deus por tudo aquilo que os campos produziram durante o corrente ano, não devemos esquecer os irmãos e as irmãs que, em várias partes do mundo, estão privados dos bens essenciais, como a alimentação, a água, a casa e a assistência médica. De modo especial, neste momento de grande preocupação internacional, penso nas queridas populações do Afeganistão, às quais é urgente fazer chegar toda a ajuda necessária. Trata-se de uma emergência mundial que, todavia, não nos pode fazer esquecer que noutras partes do mundo, infelizmente, ainda subsistem situações de grave indigência e de urgente necessidade" (Mensagem no Angelus de 11 de Novembro 2001).

O que é que se pode fazer para mitigar ou resolver o problema mundial dos refugiados? A curto prazo, a resposta encontra-se na defesa dos refugiados, mediante a oferta da segurança e da assistência humanitária. Esta protecção deve proporcionar um alívio concreto àqueles que necessitam do alimento, da água, das roupas, do abrigo e da assistência médica básica. Sem estas provisões, qualquer plano que vise ajudar os refugiados fica desprovido de um significado e é até mesmo contraproducente.

À luz disto, a minha Delegação reconhece de bom grado a introdução do conceito básico da Nota sobre a protecção internacional, realçando o facto de que a defesa é uma função dinâmica, orientada para a acção, e não se trata de um conceito abstracto.

A compreensão concreta das exigências da protecção levará também a um melhor entendimento do modo como se hão-de abordar os motivos pelos quais as pessoas são forçadas a deixar os seus lares, ou pelos quais os indivíduos sentem que devem abandonar as suas casas.

A defesa e a promoção da dignidade humana dos refugiados e das pessoas que são objecto da solicitude do UNHCR constituem uma parte importante da missão do Programa. Os seus direitos devem ser tutelados. Estes direitos incluem o direito à vida, assim como ao matrimónio, à família, à migração, ao asilo e à liberdade religiosa. A salvaguarda dos direitos fundamentais de todas as pessoas é a chave para a mudança da situação dos refugiados e das pessoas deslocadas.
Senhor Presidente

Actualmente o grupo de "pessoas em movimento" que cresce com maior rapidez é o dos deslocados, que não atravessam as fronteiras, mas que perambulam dentro do seu próprio país.

Trata-se de indivíduos vítimas da guerra ou da perseguição dentro dos confins da sua própria pátria, que necessitam de ajuda tanto quanto, ou talvez mais ainda que os refugiados. Contudo, o mundo reconhece com demasiada lentidão o seu doloroso flagelo. Para os refugiados é uma sorte, se é que se pode usar este termo, ser classificados precisamente como refugiados, o que lhes dá uma certa protecção legal e, nalguns casos, até mesmo um valor político. Os refugiados têm uma reivindicação legal à assistência, simplesmente porque atravessaram uma fronteira.

Embora não disponha de qualquer mandato explícito para cuidar das pessoas deslocadas no interior de um país, no passado o UNHCR, juntamente com outras entidades interessadas, ajudou a assistir estes indivíduos quando e onde era possível. A Delegação da Santa Sé deseja animar esta actividade levada a cabo pelo UNHCR e por outros organismos, encorajando um maior reconhecimento do flagelo destes seres humanos, que têm o direito à assistência humanitária, embora a sua pátria seja um território soberano e esta assistência se considere contra o beneplácito do seu governo.

Deveria ser totalmente clarividente que o reconhecimento da dignidade do homem e da protecção dos direitos humanos implica que a ajuda a curto prazo, destinada aos refugiados e às pessoas deslocadas, é necessária mas insuficiente. O objectivo deve ser a construção de sociedades mais justas e pacíficas, cuja falta constitui a principal causa do deslocamento das suas populações. Assim como fez noutras circunstâncias, também agora a Santa Sé dá expressão ao seu compromisso de participar nesta tarefa conjunta.

A minha Delegação gostaria de prestar uma homenagem aos Estados que foram suficientemente corajosos para acolher os refugiados, sem permanecer indiferentes diante desta problemática global. A generosidade demonstrada exige um reconhecimento e deve ser aprovada. Esta solidariedade para com uma porção sofredora da humanidade não tem sido isenta de sacrifícios. Nalguns casos, os refugiados chegaram a ultrapassar o número da população autóctone, apresentando assim dificuldades óbvias. Noutros casos, a economia local e, de maneira particular, onde existe uma agricultura que provê à subsistência local, sofreram devido à afluência da população dos refugiados. Em tais casos, o UNHCR e os Estados são exortados a oferecer uma indemnização para os produtores locais, de maneira apropriada a encorajar a abertura de um maior número de Estados.

Nestes tempos de dificuldade, o mundo chegou a reconhecer a importância da paz, da liberdade e da ordem. Infelizmente, ainda não aprendemos a garantir que estes bens se tornem uma realidade do dia-a-dia. Todavia, em vez de se sujeitar a um mundo de conflitos, de tirania e de perseguição, a mensagem cristã promove a esperança na habilidade que a humanidade tem, como dádiva de Deus, de incrementar a nossa sorte e alcançar resultados melhores.

Senhor Presidente

Ao dirigir-se no ano passado ao Alto Comissariado da Organização das Nações Unidas sobre os Refugiados, por ocasião do quinquagésimo aniversário da criação deste Organismo, João Paulo II afirmou: "O alvorecer de um novo milénio exorta todos os homens e mulheres responsáveis a renovados esforços em ordem a concretizar o grande ideal humanitário que se encontra no cerne da missão do UNHCR: a salvaguarda dos refugiados e a defesa e promoção da sua dignidade. A Santa Sé compartilha plenamente a solicitude do UNHCR a este propósito, e continuará a encorajar a assistência àqueles países que carregam o pesado e não raro prolongado fardo da hospitalidade às populações deslocadas" (Mensagem de 6.1.2001).

Obrigado, Senhor Presidente!

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