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DISCURSO DO CARDEAL STAFFORD
NA APRESENTAÇÃO DA EXORTAÇÃO APOSTÓLICA
 PÓS-SINODAL "ECCLESIA IN OCEANIA"

Quinta-feira, 22 de Novembro de 2001

 

Introdução

Precisamente neste dia, há três anos, os Bispos da Oceânia encontraram-se numa Assembleia Especial para compartilhar as solicitudes e intuições pastorais.

Santidade, estamos-lhe profundamente gratos por nos ter congregado e ter permitido encontrá-lo e reunir-nos, para celebrar os múltiplos dons que a graça divina nos concedeu no Sínodo para a Oceânia.

Compartilhamos a sua sincera desilusão, por não ter podido promulgar a Exortação Apostólica pós-sinodal na Oceânia.

Os membros das quatro Conferências Episcopais e, em particular, os fiéis da Nova Caledónia, os seus religiosos e sacerdotes, estavam a preparar-se para o receber e lhe prestar as suas homenagens. Eles desejam que eu lhe agradeça em seu nome e lhe assegure a sua afectuosa lealdade e a sua sólida fidelidade à Sé de Pedro.

Oportunamente, o Sínodo começou com uma liturgia, que incluiu os sinais e os símbolos tirados das culturas das Ilhas do Pacífico. Esta liturgia manifestou a unidade na diversidade da fé católica e expressou a autêntica communio entre a Igreja de Roma e as Igrejas particulares da Oceânia (cf. Ecclesia in Oceania, 9).

A região da Oceânia representa um terço da superfície terrestre, mas é composta sobretudo de água, e a sua população é relativamente pequena, e distribuída de maneira irregular. Todavia, trouxemos a Roma a nossa riqueza de experiências e de tesouros culturais, caracterizada por um mosaico colorido de muitos povos diversos:  aborígenes, melanésios, polinésios, micronésios, descendentes dos emigrados do Oriente e do Ocidente (cf. Ibid., nn. 6-7).

É com sincera gratidão que hoje recebemos de Vossa Santidade o dom da Exortação Apostólica pós-sinodal Ecclesia in Oceania. Este documento revigorará ulteriormente a communio, expressa de maneira tão clara durante o Sínodo, e ajudar-nos-á a enfrentar os desafios que o Sínodo identificou e debateu (cf. Ibid., n. 9).

Tema do Sínodo e Communio

O ponto central do Sínodo foi a pessoa de Jesus Cristo e o modo como percorremos o seu caminho, anunciamos a sua verdade e vivemos a sua vida. Cristou chamou para junto de si a Igreja na Oceânia, mas a finalidade da permanência com Jesus é de continuar a partir dele. Não podemos percorrer o seu caminho sem possuir o desejo ardente e decidido de proclamar Jesus Cristo como verdade viva, a verdade que é sempre maior do que nós e que exige a nossa resposta repleta de energia e criatividade.

A communio é o fruto da iniciativa amorosa de Deus. O facto de que a Igreja é essencialmente um mistério de comunhão foi o pressuposto doutrinal e espiritual de todas as deliberações do Sínodo. A Igreja como comunhão reconhece a igualdade basilar de pertença de todos os fiéis de Cristo e a nossa compreensão acerca de nós mesmos como Povo de Deus e comunidade dos discípulos (cf. Ibid., n. 10).

O desafio para a Igreja que está na Oceânia consiste em chegar a uma mais profunda compreensão da communio local e universal e a uma mais completa realização das suas implicações práticas. O intercâmbio de dons é uma característica de muitas partes da Oceânia.

Pode servir como modelo para compreender a communio. Um paradigma análogo encoraja uma permuta de dons espirituais que promove relacionamentos recíprocos de amor, de respeito, e de confiança. As bases para um diálogo aberto são a participação e a consulta, como expressões práticas da communio que caracteriza a Igreja (cf. Ibid., nn. 11-12).

A primeira comunhão é a da fé, e o Sínodo prestou homenagem aos inúmeros missionários do passado, sacerdotes, consagrados, consagradas e leigos, que se disponibilizaram para levar o Evangelho à Oceânia (cf. Ibid., n. 13).

Ainda hoje, depois de mais de um século de evangelização, uma das solicitudes principais consiste em encontrar os modos adequados para apresentar aos povos da Oceânia Jesus Cristo, Senhor e Salvador (cf. Ibid., nn. 4 e 14).

Inculturação

A este propósito, realçou-se a importância da inculturação para uma vida autenticamente cristã na Oceânia. A verdadeira inculturação da fé cristã está fundamentada no mistério da Encarnação. Ela nasce do respeito tanto pelo Evangelho como pela cultura em que ele é anunciado e acolhido.

Embora permaneçam inteiramente fiéis ao espírito da communio, as Igrejas particulares procuram expressar a fé e a vida da Igreja de formas legítimas, apropriadas para as culturas indígenas. A Oceânia oferece muitos exemplos de expressões culturais específicas nos campos da teologia, da liturgia e no uso dos símbolos religiosos. Os Padres sinodais identificaram uma ulterior inculturação da fé como o caminho principal para a plenitude da communio eclesial (cf. Ibid., nn. 16-17).

Nova apresentação do Evangelho

A communio é o tema e a finalidade de qualquer evangelização na Oceânia, além de constituir o fundamento para qualquer planeamento pastoral. Cada baptizado tem a responsabilidade de anunciar o Evangelho com palavras e acções. Os Bispos estão conscientes de que chegou o momento de uma renovada apresentação do Evangelho aos povos do Pacífico, através de novas sendas e renovados métodos de evangelização, e da aplicação mais acentuada das directrizes do Concílio Vaticano II (cf. Ibid., n. 18).

Reconhecemos que nós mesmos somos as primeiras pessoas chamadas a uma renovada vida e testemunho cristãos. Um estudo mais aprofundado das Escrituras e da Tradição, alimentado pela oração, levar-nos-á a um ulterior conhecimento e amor à fé.

As comunidades particulares são convidadas a contribuir para a nova evangelização, cultivando um espírito de fraternidade nas suas liturgias e nas suas actividades sociais e apostólicas, aproximando os católicos não praticantes ou distantes, reforçando a identidade das escolas católicas oferendo aos adultos a oportunidade de crescer na fé, mediante programas de estudo e de formação, ensinando e explicando a doutrina católica de maneira eficaz a quantos se encontram fora da comunidade cristã e fazendo com que o ensinamento social da Igreja influa sobre a vida civil na Oceânia. Com estas iniciativas, e outras semelhantes, o Evangelho será apresentado à sociedade de modo convincente e poderá influenciar a cultura de modo mais profundo (cf. Ibid., n. 19).

Os Padres sinodais exortaram a uma maior consciência do poder dos mass media, que oferecem uma excelente oportunidade para uma evangelização mais efectiva. Onde é possível, a Igreja deveria elaborar um plano pastoral para as comunidações, possivelmente também mediante a criação de um centro católico para a Oceânia inteira (cf. Ibid., n. 21). O impacto dos mass media sobre a vida das pessoas e o seu pensamento explica como é necessário elaborar modos inovadores de apresentar a fé (cf. Ibid., n. 22). A Igreja na Oceânia deu ao ecumenismo uma importante prioridade, consciente de que a desunião entre os cristãos constitui um grande obstáculo para a credibilidade do testemunho eclesial. O forte desejo da unidade na fé e no culto é uma das dádivas do Espírito Santo na Oceânia, caracterizada pelo vigor e pela abertura às actividades ecuménicas.

Esperança para a sociedade

A Igreja considera o apostolado social como uma parte integrante da sua missão evangelizadora. Os Bispos da Oceânia ensinaram de maneira eficaz a doutrina social da Igreja e estão unidos ao seu povo, para expressar a determinação de agir contra as injustiças, a corrupção, as ameaças contra a vida e as novas formas de pobreza, que são o resultado do chamado racionalismo económico (cf. Ibid., nn. 26-27).

Políticas e economias injustas prejudicam de modo especial os povos indígenas, as nações jovens e as suas culturas tradicionais; a tarefa da Igreja consiste em ajudar as culturas autóctones a conservar a sua identidade e a preservar as tradições que lhes são próprias.

O Sínodo encorajou vigorosamente a Santa Sé a continuar a defender a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos indígenas, apoiando a instituição das "Comissões da verdade", onde elas podem ajudar a resolver as injustiças históricas e a promover a reconciliação no interior da sociedade mais vasta ou da própria Nação. Além disso, pediu que a Igreja das regiões mais ricas da Oceânia divida os seus recursos com as várias Igrejas particulares do Pacífico (cf. Ibid., nn. 28-29).

Os Bispos estão conscientes de que é uma das suas especiais responsabilidades assumir a gestão do Oceano Pacífico, que contém mais de metade dos recursos hídricos da Terra. O bom estado de sanidade deste e de outros oceanos é crucial para o bem-estar dos povos, não somente na Oceânia, mas em todas as partes do mundo (cf. Ibid., n. 31).

O apostolado social alarga-se aos importantes contributos oferecidos pela Igreja na Oceânia, nos campos da educação, da assistência médica e dos serviços sociais. Uma das características que distinguem a educação católica é que ela está aberta para todos, especialmente para os mais pobres e os membros mais frágeis da sociedade. A contribuição dos consagrados e das consagradas, assim como dos leigos, que fundaram e dotaram de pessoal as escolas e os hospitais católicos, enfrentam com frequência grandes dificuldades e, com enormes sacrifícios, foram e ainda são inestimáveis.

Embora esteja ainda no seu início, hoje o compromisso em prol da educação estende-se à educação escolar de terceiro grau (cf. Ibid., nn. 32-33). Os hospitais e as instituições de assistência à saúde católicos encontram-se na linha de vanguarda na promoção que a Igreja faz a propósito da vida humana, desde o momento da concepção até à morte natural (cf. Ibid., nn. 30 e 34).

Infelizmente, os problemas das Igrejas particulares na Oceânia intensificaram-se. Nos três anos passados desde a realização do Sínodo, a estabilidade social, política e económica foi ameaçada por um golpe de Estado nas Ilhas Fiji, pelas consequências de dez anos de conflito em Bouganville, pela insurreição armada nas Ilhas Salomão, pela transferência forçada dos papuanos orientais de Irian Jaya, através das províncias de fronteira da Papua-Nova Guiné, pelos chamados "boat-people" asiáticos em busca desesperada de um refúgio, pela recessão económica que provocou a migração de um quarto dos habitantes das Ilhas Cook e por tudo quanto ocorreu nos vizinhos próximos da Oceânia:  os habitantes de Timor Leste, que padeceram um terrível derramamento de sangue e devastações, como vingança pelo seu voto referendário em favor da independência.

Estes são alguns dos aspectos que explicam a necessidade que temos do encorajamento e da orientação que Vossa Santidade nos ofereceu na secção do documento dedicada à aplicação da doutrina social da Igreja.

Vida interior

A evangelização não pode realizar-se sem a oração e a vida interior de união com Jesus Cristo. Os Padres sinodais reconheceram a necessidade de dar um renovado impulso e encorajamento à vida espiritual de todos os fiéis (cf. Ibid., nn. 37-38).

Os católicos da Oceânia compreendem perfeitamente o lugar central da Eucaristia na sua vida. Além disso, expressaram a sua preocupação pelo facto de que muitas comunidades da Oceânia permanecem desprovidas da celebração da Eucaristia durante longos períodos, em virtude da crescente penúria de sacerdotes disponíveis para as vastas distâncias. São necessárias muita sabedoria e grande coragem para enfrentar esta situação tão difícil (cf. Ibid., n. 40). Existem sérios desafios pastorais no que se refere ao Sacramento da Penitência. Chegou o momento de uma renovada catequese e da prática do importante Sacramento da misericórdia (cf. Ibid., n. 41).

Comunidade dos discípulos

Os Padres sinodais alegraram-se pelo trabalho e pelo testemunho de um número tão elevado de leigos, que desempenharam uma tarefa importante para o crescimento da Igreja na Oceânia e continuarão a desempenhá-la, de modo especial como catequistas, educadores na preparação para os Sacramentos, animadores das actividades juvenis e orientadores de pequenos grupos e comunidades (cf. Ibidem).

Em muitos paíse da Oceânia, os jovens formam a maioria da população. Desejámos fazer com que os jovens saibam que constituem uma parte vital da Igreja contemporânea, não somente no futuro, mas imediatamente, como discípulos em vias de amadurecimento. Os jovens vivem numa cultura que lhes é própria de modo singular. É essencial que os responsáveis da Igreja insiram os aspectos positivos da cultura dos mesmos na vida e na missão da Igreja. Os jovens têm o mérito do perspicaz sentido da justiça, da integridade pessoal, do respeito pela dignidade do homem, dos cuidados a dedicar aos necessitados e da preocupação pelo meio ambiente. Trata-se de sinais de uma grande magnanimidade de espírito, que não deixarão de dar frutos na vida eclesial (cf. Ibid., nn. 44-45).

De igual modo, a Igreja e a sociedade na Oceânia dependem em grande medida da qualidade da vida familiar, e isto acarreta uma grande responsabilidade para os cristãos que assumem o pacto conjugal. É necessária uma adequada preparação pastoral, que deve incluir uma explicação cuidadosa e convincente da doutrina da Igreja sobre o matrimónio e a família (cf. Ibid., n. 45).
Em virtude da preocupante escassez de sacerdotes e de consagrados, a promoção das vocações é uma responsabilidade urgente de cada comunidade católica. Cada Bispo é responsável pela formação do clero local, no contexto da cultura e da tradição do lugar, e deveria ter em séria consideração os modelos mais flexíveis e criativos de formação e de educação (cf. Ibid., n. 48).
Todos os membros do clero são convidados a renovar os esforços com vista a formar a sua vida de oração em conformidade com a de Cristo e a assumir um estilo de vida que reflicta a vida de Jesus, feita de simplicidade e de identificação com as pessoas que não têm poder (cf. Ibid., n. 49).

Conclusão

A communio, a inculturação e a nova proclamação do Evangelho de maneira adequada aos povos da Oceânia nos dias de hoje:  estes foram os três temas e intuições principais oferecidos pelo Sínodo de há três anos.

Santidade, estamos-lhe profundamente agradecidos por nos ter reunido e escutado, por ter aceite os dons que trouxemos à Igreja universal e por nos ter concedido hoje o documento Ecclesia in Oceania. Ele oferece muitas directrizes e sugestões para a orientação das Igrejas particulares na Oceânia (cf. Ibid., n. 52).

Santidade, tive o privilégio de falar em nome de todos os participantes, no encerramento da sessão conclusiva da Assembleia Especial para a Oceânia, há três anos, e fi-lo com as seguintes palavras:

"Prometemos-lhe que, quando tiver promulgado a Exortação Apostólica pós-sinodal, faremos o possível para que se torne uma guia nas nossas vidas de Pastores e nas vidas dos fiéis das nossas Igrejas locais" (Ed. port. de L'Osservatore Romano de 19 de Dezembro de 1998, pág. 16).

E hoje quero renovar com vigor esta promessa!

Os Bispos da Oceânia difundirão amplamente o conteúdo da Ecclesia in Oceania. Trabalharemos em conjunto, para preparar o material de debate nas várias línguas da nossa região, de modo que os nossos povos possam compreender e aplicar as orientações indicadas pelo seu Pastor universal.
Estamos felizes por possuir na Federação das Conferências Episcopais Católicas da Oceânia uma estrutura eficaz para a colaboração e acção conjunta.

Já decidimos encontrar-nos em Rabaul, na província oriental da Nova Bretanha (Papua-Nova Guiné), no próximo mês de Maio, para preparar uma extensiva realização da Ecclesia in Oceania e para dar continuidade à nossa programação, à luz da Novo millennio ineunte.

Santidade, esteja certo de que, mediante a nossa Federação, as nossas Conferências Episcopais e nas nossas Igrejas particulares, faremos tudo o que nos for possível para percorrer com fidelidade o caminho de Jesus Cristo, para anunciar corajosamente a sua verdade e, enfim, para viver com alegria a sua vida.

O Espírito Santo nos oriente e a Mãe de Jesus, Nossa Senhora da Paz, interceda por nós, no momento em que as Igrejas locais da Oceânia entram no novo milénio.

 

 

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