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PONTIFÍCIO CONSELHO PARA A CULTURA

INTERVENÇÃO DO CARDEAL PAUL POUPARD
NO ENCERRAMENTO DAS CELEBRAÇÕES
DO 50º ANIVERSÁRIO DA CONVENÇÃO CULTURAL
EUROPEIA DO CONSELHO DA EUROPA

Faro, Portugal
Sexta-feira, 28 de Outubro de 2005

 

1. A Santa Sé presta homenagem ao trabalho realizado durante os 50 anos da Convenção cultural europeia. Por seu lado, não deixou de dar o seu apoio às iniciativas do Conselho da Europa para que os Europeus reconheçam o seu património comum e diferente, favorecendo a mobilidade e os intercâmbios em vista de um melhor conhecimento e compreensão recíproca entre os povos, objectivos estabelecidos pela Convenção.

2. A celebração do 50º aniversário da Convenção de cooperação cultural convida a reflectir sobre os numerosos objectivos a estabelecer para responder aos desafios que se apresentam à Europa neste início de novo milénio. O contexto histórico e cultural, sempre em evolução, leva a novos comportamentos e a mudanças de diversos tipos. O objectivo fundamental permanece contudo sempre o mesmo: construir uma cidade digna do homem. Trata-se, para o conseguir, de vigiar para que os Europeus não cedam ao indiferentismo em relação aos valores humanos universais, e de estar atentos a tudo o que pode ser contrário à sua transmissão. Mas, a crise de valores que se expande em categorias inteiras da população, sobretudo junto dos jovens, apresenta graves questões. A tentação do nacionalismo exacerbado que nasce do sentimento de perda das identidades, os derivados do fundamentalismo que se baseia na humilhação ressentida da parte de certos crentes, os fechamentos do comunitarismo causados pelo mal-estar de determinados grupos na sociedade actual, os riscos de aplicações desumanas de certos progressos da ciência e da tecnologia, são de igual modo desafios que exigem respostas urgentes e adequadas, sob pena de graves desavenças entre as nossas sociedades.

3. O papel da cultura e dos intercâmbios culturais, a salvaguarda do património cultural e dos bens que são os seus portadores, a importância dos programas educativos nas escolas e nas universidades, a responsabilidade dos mass media e o respeito que devem à verdade da informação e à dignidade da pessoa humana, a contribuição das instituições particularmente adequadas para favorecer a unidade social, requerem uma atenção particular do Conselho da Europa. Onde quer que isto se manifeste necessário, o Conselho da Europa deve assumir a defesa do direito cultural próprio de cada povo, mesmo que seja uma minoria.

A Europa será convivência pacífica e de intercâmbio das riquezas culturais, materiais e imateriais, se souber apresentar-se como a casa comum de todos os Europeus, onde cada um poderá ser acolhido e sentir-se na própria casa, na qual ninguém possa ser objecto de discriminação, mas onde todos serão chamados a viver como membros responsáveis de uma única grande família dos povos.

4. O cristianismo foi para o continente europeu um factor primordial de unidade entre os povos e as culturas. Há milénios que não cessa de promover uma visão integral do homem e dos seus direitos, e a história de todas as nações do Continente afirma a sua extraordinária fecundidade cultural. Preocupando-se por honrar a exigência moderna de uma justa laicidade dos Estados, e por conseguinte da Europa em todos os seus componentes religiosos e leigos, em vez de um laicismo redutor, inspirador de certas políticas, a Santa Sé reafirma a disponibilidade e a capacidade das religiões de contribuir para a edificação da casa comum europeia, dando em particular a sua colaboração para enfrentar o desafio da desintegração social e conferir um sentido à vida e à história. A modernidade europeia que deu ao mundo o ideal democrático, o sentido da dignidade de todas as pessoas humanas e dos seus direitos inalienáveis, não baseou porventura os seus valores mais nobres na sua cultura milenária, herdeira do pensamento grego, das instituições romanas, e dos numerosos contributos culturais, sobretudo celtas, anglo-saxões, germânicos e eslavos, no crisol do cristianismo?

5. Após a segunda guerra mundial os Pais da Europa evidenciaram corajosamente o desafio da "justiça sem liberdade" . Hoje, uma utopia não menos arruinadora ameaça as nossas sociedades de desagregação: a indiferença que tudo relativiza, nada promete e, mascarada sob a aparência da tolerância, ameaça a humanidade do homem. Enfrentar juntos este novo desafio no alvorecer do terceiro milénio, a fim de construir a Europa como uma comunidade de homens, significa conferir à Convenção Cultural Europeia um novo impulso ao qual, por seu lado, a Santa Sé deseja dar a sua total contribuição.

 

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