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SECRETARIA DE ESTADO

CONFERÊNCIA INTERNACIONAL PROMOVIDA
PELA ORGANIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA
E A COOPERAÇÃO NA EUROPA (OSCE)
«ANTI-SEMITISMO
E OUTRAS FORMAS DE INTOLERÂNCIA»

DISCURSO DE D. ANTÓNIO CAÑIZARES
NA 5ª SESSÃO

Senhora Moderadora!

1. Depois do Conselho Ministerial de Sófia, a Santa Sé sentiu mais impelente a urgência de examinar com atenção e serena objectividade a natureza e tipologia das discriminações e a intolerância contra os cristãos e contra os membros das outras religiões. Além disso, ele sintoniza-se com a trajectória tradicional e com o reconhecido compromisso da OSCE de dar voz aos fiéis das outras confissões religiosas.

Foi observado que as problemáticas debatidas na presente sessão não se referem apenas aos cristãos individualmente, mas também às confissões religiosas como tais; não prejudicam só os grupos religiosos minoritários, mas também os que formam a maioria. É simplista imputar sistematicamente às religiões maioritárias a falta ou a escassa tutela das outras comunidades religiosas da parte das autoridades estatais.

Foi realçado também que tudo o que ameaça as identidades religiosas existe tanto a Leste como a Oeste de Viena, mesmo se com modalidades diferentes e tonalidades mais ou menos intensas, segundo os lugares, os tempos e as circunstâncias.

2. Apesar dos compromissos adoptados pelos Estados-Membro da OSCE no campo da liberdade religiosa, nalguns Países subsistem normativas, decisões ou comportamentos de acção ou de omissão que negam a mencionada liberdade e são de carácter intolerante, ou até discriminatório, em relação às Igrejas e comunidades cristãs, às outras comunidades religiosas, assim como aos seus fiéis. Persistem restrições indevidas ao reconhecimento legal de tais Igrejas e comunidades, à importação e à difusão do seu material religioso. Permitem-se certos atrasos de maneira injustificada, e até se contrasta abertamente a devolução das propriedades que lhes tinham sido confiscadas ou destinadas a sujeitos diferentes dos seus legítimos proprietários. Fazem-se ingerências na sua autonomia organizativa, impedindo assim a sua coerência com as próprias convicções morais. Verificam-se algumas pressões que contrastam a liberdade dos funcionários da administração pública de agir de acordo com o ditame da própria consciência.

Por vezes acontece que, na presença de uma religião maioritária, as Autoridades civis não reconhecem a personalidade jurídica das Igrejas ou comunidades minoritárias, e que a sua própria vida interna é objecto de limitações: na formação do clero, na aquisição de propriedades, etc. Por vezes verificam-se carências na educação cívica no que se refere ao respeito da identidade e dos princípios cristãos e das outras religiões, e resistências ao reconhecimento do papel público da religião. E, sem dúvida, o compromisso tradicional da OSCE em favor da liberdade religiosa nasce precisamente de uma clara tomada de consciência de que essa liberdade caracteriza uma dimensão fundamental do homem e não diz respeito apenas à sua vida privada. Também João Paulo II recordou isto no início de 2004, dirigindo-se ao Corpo Diplomático acreditado junto da Santa Sé.

De facto, naquela ocasião o Pontífice fez notar que mesmo se todos concordam em respeitar o sentimento religioso das pessoas, não se pode dizer o mesmo [...] da dimensão social das religiões, esquecendo nisto os compromissos assumidos naquela que então se chamava a "Conferência sobre a Cooperação e a Segurança na Europa"".

Senhora Moderadora!

3. É do conhecimento de todos que o cristianismo representa a religião maioritária em muitos Países-membro da OSCE; além disso, é um elemento que caracteriza a história e marca a identidade, a cultura, a vida social e as instituições dos seus Povos. A contribuição específica dada pelos cristãos para a construção e para o bom funcionamento dos nossos sistemas democráticos é, portanto, mais um valor para a sociedade, de forma que valorizá-lo é uma garantia e a expressão de um pluralismo correcto. De facto, a distinção entre poder espiritual e civil não implica afastamento ou incomunicabilidade, mas diálogo e confronto ao serviço do autêntico bem da pessoa humana. Laicidade não é laicismo, realçou o Papa João Paulo II no mencionado discurso.

Acrescentou, além disso, que o Estado laico garante o livre exercício das actividades do culto, espirituais, culturais e caritativas das comunidades de crentes. Numa sociedade pluralista, a laicidade é uma oportunidade de comunicação entre as diversas tradições espirituais e a nação.

Por este motivo, se as comunidades religiosas manifestam reservas ou propõem alternativas em relação a decisões legislativas ou disposições administrativas, não deve ser considerado ipso facto como uma forma de intolerância, a não ser que essas comunidades, em vez de propor, queiram impor as suas convicções e exercer pressões sobre a consciência dos demais. Por outro lado, seria intolerante procurar impedir que essas comunidades se expressem da maneira indicada, ou denegri-las pelo simples facto de não partilharem as decisões que são contrárias à dignidade humana.

O relativismo ético que nada reconhece como definitivo não pode ser considerado como uma condição da democracia, como se fosse a única que garante a tolerância, o respeito recíproco entre as pessoas e a adesão às decisões da maioria. Uma sã democracia promove a dignidade de cada pessoa humana e o respeito dos seus direitos intangíveis e inalienáveis. Sem uma base objectiva, nem sequer a democracia pode garantir uma paz estável (cf. Evangelium vitae, 70).

4. Não faltam também nos meios de comunicação atitudes intolerantes e em certas ocasiões até difamatórias em relação aos cristãos e aos membros das outras religiões. O pluralismo efectivo nos meios de comunicação exige uma informação correcta dos factos religiosos, a garantia de que também as comunidades religiosas tenham acesso a eles e que nos mesmos meios de comunicação se prescinda dos hate-speeches sobre os cristãos e os membros das outras religiões. No pleno respeito da liberdade de expressão, devem ser dispostos mecanismos ou instrumentos coerentes com a ordem jurídica de cada País, que defendam as mensagens das comunidades religiosas contra a manipulação e evitem a apresentação desrespeitadora dos seus membros.

Portanto, a Santa Sé deseja que a Conferência de Córdova seja uma ocasião para que a OSCE se comprometa a estabelecer instrumentos e mecanismos eficientes para combater e contrastar preconceitos e falsas representações dos cristãos e dos membros das outras religiões nos mass media e no âmbito dos processos educativos, e incremente a contribuição concreta das Igrejas e das comunidades religiosas na vida pública dos Países, garantindo-lhes a sua identidade específica e reconhecendo a sua contribuição fundamental para a construção de uma sociedade ao serviço da pessoa humana.

Obrigado, Senhora Moderadora.

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