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INTERVENÇÃO DO CHEFE DA DELEGAÇÃO DA SANTA SÉ
NA CONFERÊNCIA DA DAS NAÇÕES UNIDAS
SOBRE OS PAÍSES MENOS DESENVOLVIDOS

DISCURSO DE MONS. WILLIAM F. MURPHY

Paris, 7 de Setembro de 1981

 

1. Senhor Presidente. Antes de iniciar a minha intervenção permiti que exprima sinceras congratulações pela vossa eleição como Presidente desta Conferência. A vossa preparação e a vossa experiência, como também a solicitude pelas finalidades desta Conferência, são de bom auspício para o frutuoso êxito de um encontro que tanta esperança suscitou em numerosíssimos membros da comunidade mundial.

2. Todos nós aqui reunidos somos conscientes do trabalho realizado para preparar esta Conferência. Agora é oportuno dar a conhecer os resultados deste trabalho e estudar o modo de chegar a decisões e programas que serão frutuosos para todos. A Igreja, embora reconheça não ter particular experiência nestes aspectos técnicos e económicos que interessam esta Assembleia, veio para colaborar com todos e para trazer o próprio contributo. O contributo da Igreja é baseado na sua concepção da dignidade de cada pessoa humana e na fraternidade e solidariedade de toda a família humana.

O Papa João Paulo II disse-o em muitos discursos durante as suas visitas pastorais em todo o mundo. Exprimiu-o na sua primeira Encíclica. Em continuidade com a tradição da carta de Paulo VI Populorum Progressio, o Papa tomou em exame os problemas e as instâncias reais que são o objectivo desta Conferência, e escreveu: "O princípio de solidariedade, em sentido lato, deve inspirar a busca eficaz de instituições e de mecanismos apropriados: quer se trate do sector dos intercâmbios, em que é necessário deixar-se conduzir pelas leis de uma sã competição, quer se trate do plano de uma mais ampla e imediata distribuição das riquezas e dos controlos sobre as mesmas, a fim de que os povos que se encontram em vias de desenvolvimento económico possam, não apenas satisfazer às suas exigências essenciais, mas também progredir gradual e eficazmente" (Redemptor Hominis, 6).

3. Fundamento da minha relação de hoje nesta sede é a preocupação pelo homem na sua totalidade, membro da família humana, unida pela fraternidade e pela solidariedade.

É uma preocupação, não motivada por qualquer interesse egoísta, que todavia se esforça — como disse o Papa o ano passado na Sessão Especial para o Desenvolvimento — por oferecer uma esperança sólida e realista para cada pessoa deste mundo, dirigindo um apelo a todos nós a fim de lutarmos com as realidades do mundo de hoje para a criação de um "futuro que há-de construir-se mediante os esforços de todos para assegurar o bem comum pela cooperação e colaboração mútuas" (João Paulo II, Mensagem à ONU sobre a Estratégia de desenvolvimento, 22 de agosto de 1980, 6).

O primeiro passo neste processo exigirá uma mudança ou conversão do coração e da mentalidade. Pois que a tarefa não é fácil e porque muito deve ser feito, cada pessoa e Nação devem examinar-se a si mesmas para garantir aquela disposição de mente e espírito que as levarão a uma efectiva solicitude em enfrentar com os outros estes problemas de liberdade e solidariedade. Esta conversão de coração interessa todos nós, o rico e o pobre, o poderoso e o fraco. Dado que esta Conferência procura, com honestidade e realismo, reexaminar as prementes exigências económicas, técnicas e financeiras, descobrirá e reafirmará aqueles valores capazes de promover a fraternidade e a solidariedade de todos aqueles que povoam o planeta terra. De muitos modos e a diversos níveis, a Igreja tomou e continuará a tomar parte neste processo.

4. A Igreja não se resignará nunca a limitar-se a declarações, embora válidas e importantes. A sua tarefa educativa foi sempre acompanhada de programas e actividades concretas. No compromisso cristão para a liberdade e a dignidade de cada ser humano e na busca cristã para o bem comum da sociedade, grupos religiosos e organizações que se inspiram na religião — algumas das quais estão presentes nesta Conferência — estão continuamente a desenvolver programas concretos no campo da saúde, da instrução, da educação, cooperativas, projectos de desenvolvimento rural e programas promocionais nas aldeias, procurando melhorar as condições de muitos que vivem nas regiões mais pobres e menos desenvolvidas da terra, em toda a parte onde tenham a possibilidade de entrar em contacto directo com quem tem necessidade deles.

5. Dado que o compromisso cristão frente aos problemas concretos dos homens, onde quer que eles estejam, tem longa e frutuosa tradição, esta Delegação deseja compartilhar convosco, com o mesmo espírito, algumas das instâncias que ela considera de importância fundamental para o trabalho desta Assembleia.

Embora os problemas aqui debatidos sejam todos interdependentes — e por conseguinte tratando-se seriamente uns não se pode prescindir dos outros — é claro, em todo o caso, que o problema da fome está na base de cada discussão nesta sede. O ideal da auto-suficiência no que se refere à alimentação em sentido lato não é meta inatingível. A auto-suficiência que provê às necessidades de nutrição de um povo contribui muito para o sentido de soberania e dignidade de cada País, afastando o espectro da fome e permitindo maior liberdade em enfrentar outros problemas e em construir economias mais diversificadas para o bem do povo.

Além disso existe o constante e crucial problema da saúde, e o da prestação de assistência sanitária sobretudo nas áreas rurais onde, até hoje, são muitíssimos os que sofrem inutilmente em consequência de numerosas doenças. É também importante mencionar as necessidades concretas no campo da energia, que as Nações deverão enfrentar quando procurarem manter os recursos à sua disposição para constituir uma economia mais diversificada e criativa. É também sensata a preocupação com as necessidades das Nações menos desenvolvidas no campo das comunicações, especialmente no que diz respeito àqueles Países que ocupam uma vasta área geográfica ou cuja situação topográfica torna difíceis as comunicações. Seria um grande passo avante se nesta Conferência uma solução honesta e realista em tais áreas pudesse ser enfrentada com um consenso igualmente honesto, realista e generoso.

6. Quereria fazer uma última observação sobre a importância da instrução. O grande desperdício de energias e de recursos hoje, é também desperdício de inteligência e de criatividade da pessoa humana. A desnutrição, a falta de recursos, a ausência de infraestruturas, sobretudo no que se refere ao grave fenómeno dos novos centros urbanos superpovoados, tudo isto contribui para limitar o justo e completo desenvolvimento do maior recurso de cada uma e todas as Nações: a pessoa humana. A Santa Sé já deu um contributo a este problema com um estudo para a Conferência realizada em Viena em 1979. Um compromisso comum nesta Conferência poderia tornar efectiva a transferência de cultura e de tecnologia e a construção daquelas infraestruturas necessárias para a instrução. A constante colaboração para um intercâmbio mais intenso e mais amplo da instrução e compreensão libertará milhões de indivíduos que actualmente estão acorrentados pelo analfabetismo e dará um incentivo a milhões de outros indivíduos que desejam progredir no caminho da instrução para adquirirem novas especializações e novas técnicas, que lhes permitirão desfrutar a própria força e contribuir para o bem da humanidade mesma.

7. São estes os temas principais que a nossa Delegação deseja submeter hoje ao exame desta Conferência. Dado que todos os pareceres e compromissos foram estudados no Novo Programa Substancial de Acção, e que as necessidades reais dos 31 Países menos desenvolvidos foram postas em luz, fazemos votos por que a maior parte possível das legítimas aspirações e metas destes Países possam ser alcançadas, de modo que o bem comum de toda a humanidade venha a tirar proveito graças às decisões e aos compromissos que aqui forem tomados por todos os participantes, segundo as suas tarefas, capacidade e responsabilidade.

Quereria concluir com as palavras do Papa João Paulo II, pronunciadas o ano passado:

"Se há uma história para ser feita e nós somos responsáveis pelo bem comum agora e no futuro, devemos decidir juntos e pôr em prática as modificações que são necessárias agora, de maneira que o futuro, por que nós ansiamos, corresponda à esperança que nós temos em comum quanto a todos os indivíduos, povos e nações da terra" (Mensagem à ONU sobre a Estratégia de desenvolvimento, 22 de agosto de 1980, 6).

 

 

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