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APELO DO PAPA BENTO XVI
ASSINADO PELO SECRETÁRIO DE ESTADO,
TARCISIO BERTONE, AO PRESIDENTE
DA CONFERÊNCIA SOBRE MINAS ANTIPESSOAIS
REALIZADA EM CARTAGENA, COLÔMBIA

 

À Excelentíssima Presidente
da 2ª Conferência de revisão da Convenção sobre a proibição
de utilização, armazenamento produção e transferência
de minas antipessoais e a sua destruição

Sua Santidade Bento XVI saúda cordialmente os organizadores e os participantes nesta Conferência, manifestando interesse e atenção pelos seus trabalhos, que tentam não só responder aos graves problemas humanitários representados pelas minas antipessoais e reforçar o direito humanitário internacional, mas também favorecer a busca de um desenvolvimento humano integral autêntico.

Após dez anos de um resultado notável, que abriu o caminho para um mundo sem minas antipessoais, os Estados que fazem parte da Convenção sobre estas minas encontram-se novamente para avaliar o caminho percorrido e reconhecer os desafios que ainda se devem enfrentar, antes de poder garantir que os riscos destas armas insidiosas já não existam e que todas as suas vítimas sejam dignamente assistidas. Neste, como noutros campos, a vontade política e humanitária, como também o empenho concreto, devem renovar-se todos os dias. As causas nobres merecem um esforço contínuo e persistente.

Tanto na política, como na economia ou no campo do desarmamento, é indispensável colocar novamente a pessoa no centro das nossas preocupações. Todas as vezes que os objectivos se concentraram sobre outras coisas, o preço para as pessoas e os povos foi exorbitante, pagaram-no com a sua vida, o seu desenvolvimento e o futuro das suas famílias e comunidades. A Convenção sobre as minas antipessoais foi pioneira neste campo. As vítimas e as suas famílias estiveram no centro da nossa atenção e deveriam continuar a estar, não só para que recebam assistência, mas também considerando-as interlocutoras e artífices na consecução conjunta dos objectivos da Convenção.

Certamente, a atenção está centrada principalmente na Convenção que se celebra esta semana. Porém, é indispensável não renunciar a uma visão mais ampla para não excluir campos tão próximos que seria fútil tentar separar. Como se podem discriminar entre as vítimas de minas antipessoais e de bombas de fragmentação ou de armas ligeiras e de pequeno calibre? Como se pode desenvolver uma acção de eliminação de apenas uma destas armas sem ter em conta as outras? Como é possível proibir as minas antipessoais e continuar a contaminar impunemente amplas áreas com armas desumanas, como as bombas de fragmentação, que em boa parte funcionam como minas antipessoais? A defesa dos interesses nacionais nunca pode, nem deve, ir em detrimento das populações civis, em especial das mais débeis.

A Santa Sé mostra a sua satisfação pelos êxitos inegáveis que se conseguiram alcançar em comum. E é para elogiar e encorajar a colaboração entre os Estados, as Nações Unidas, as Organizações Internacionais, a Comissão Internacional da Cruz Vermelha e a sociedade civil. Esta Convenção também é pioneira num modelo que pode ser qualificado como multilateralismo renovado, que com o tempo demonstrou a sua validade, em particular e recentemente no âmbito da Convenção sobre as bombas de fragmentação. A crescente tomada de consciência da própria dignidade e direitos por parte das pessoas e populações mais atingidas, assim como a vontade de trabalhar juntos a seu favor, também é garantia de outros sucessos em diversos campos do desarmamento.

Há que apreciar os esforços realizados neste campo para cumprir as obrigações previstas na Convenção, particularmente no que se refere à assistência às vítimas, a destruição dos arsenais e a eliminação das minas nas regiões afectadas. Num mundo cada vez mais globalizado e interdependente, a paz e o desenvolvimento são inseparáveis. Uns não podem ser beneficiados sem os outros, e menos ainda em detrimento dos outros. A este respeito, são indispensáveis a cooperação internacional e a inclusão dos países menos favorecidos, com o fim de aumentar as oportunidades de paz no mundo e criar as condições necessárias para a construção da prosperidade e o desenvolvimento integral da família humana. "A cooperação internacional precisa de pessoas que partilhem o processo de desenvolvimento económico e humano, através da solidariedade feita de presença, acompanhamento, formação e respeito" (Caritas in veritate, 47). Nestes momentos de crise, é imperativo não esquecer o nosso dever de ser solidários, de compartilhar e de agir com justiça em relação aos países mais afectados e menos favorecidos.

Desde a sua adopção, a Convenção conseguiu a aprovação da maioria dos Estados do mundo, embora, infelizmente, a adesão ainda não seja universal. A Santa Sé faz nesta ocasião um apelo a todos os Estados para que reconheçam as deploráveis consequências humanitárias das minas antipessoais. Com efeito, a experiência mostra que estas armas causaram mais vítimas e danos entre a população civil, que se deveria defender, do que serviram para tutelar os Estados. As milhares de vítimas que continuam a provocar lembram-nos, caso ainda fosse necessário repeti-lo, a quimera de querer construir a paz e a estabilidade com uma visão exclusivamente militar. É oportuno repetir nesta circunstância que a paz, a segurança e a estabilidade não podem existir só em função da segurança militar, mas que dependem sobretudo da realização de todas as condições que permitem o pleno desenvolvimento da pessoa humana, que tantas vezes se vêem impedidas pelo uso e a presença de minas antipessoais.

O Santo Padre expressa nesta ocasião a sua proximidade a todas as vítimas, às suas famílias e a todos os países afectados. Todos eles necessitam de força de vontade e coragem para empreender um processo de reabilitação, e precisam também da nossa ajuda e proximidade humana. O Santo Padre manifesta também a sua satisfação pelo valioso trabalho levado a cabo pela presidência norueguesa e pessoalmente por Vossa Excelência, Senhora Presidente. Deste modo, renova o apoio sem reservas da Santa Sé àqueles que estão comprometidos na grande tarefa de libertar o nosso mundo das minas antipessoais, ao mesmo tempo invoca sobre todos os participantes nesta Conferência, abundantes bênçãos divinas.

 

Tarcisio Card. Bertone
Secretário de Estado de Sua Santidade

 
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