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INTERVENÇÃO DA DELEGAÇÃO DA SANTA SÉ
 NA REUNIÃO MUNDIAL SOBRE
 O ECOTURISMO

Quebeque, 21 de Maio de 2002

 

O mundo contemporâneo evolui rapidamente; impôem-se soluções urgentes para os seus problemas, num contexto em que o fenómeno da mundialização diz respeito não somente à esfera da política e da economia, mas também à dimensão social, cultural e espiritual do ser humano.
Em tal contexto, o sector do turismo desempenha um papel considerável, sector que, embora, "há pouco saído da adolescência" e embora apareça como uma indústria ainda frágil e em mudança, representa hoje a terceira indústria de exportação a nível mundial. O papel que o turismo desempenha no interior do fenómeno da mundialização reveste ainda uma maior importância quando se considera que se trata de uma insdústria que, em lugar de exportar mercadorias, importa consumidores. Esta constatação pôe em evidência o facto de que, numa óptica puramente económica para este sector, o "factor" mais importante é o lugar de produção, porque é ele mesmo que constitui o produto.

Todavia, se se alarga o campo de observação para lá da esfera económica e se se têm em conta as três dimensões antes citadas, as dimensões social, cultural e espiritual, dá-se conta de que elas fazem parte integrante e essencial do lugar; apesar disso, estas dimensões correm o risco de sofrer profundos condicionamentos e profundas mutações se os fluxos que derivam do turismo não são adequadamente orientados para salvaguardar estas dimensões, com o risco de provocar danos irremediáveis à "matéria prima" do turismo e, o que é ainda mais grave, de violar a dignidade humana das populações locais. Efectivamente, não se podem esquecer, como recentemente lembrou o Santo Padre, "as singulares ofertas turísticas de "paraísos artificiais", onde se exploram com finalidades meramente comerciais, populações e culturas locais, em benefício de um turismo que, em determinados casos, não respeita sequer os mais elementares direitos humanos das pessoas do lugar" (Alocução do Santo Padre aos Participantes na Assembleia plenária do Pontifício Conselho para a Pastoral dos Migrantes e das Pessoas desalojadas, n. 2, de 29 de Abril de 2002).

Uma tal constatação levou os peritos e as pessoas que trabalham neste sector a definir as estratégias a curto e a longo prazo, que permitiram, entre outras coisas, fazer aparecer uma nova tipologia do turismo: o ecoturismo, esboçado pelo Código mundial de Ética do Turismo, adoptado pela Organização mundial do Turismo, em Outubro de 1999.

O nosso encontro tem, precisamente, como objectivo contribuir para a definição de uma melhor compreensão deste conceito, ainda sujeito a interpretações diferentes. O desejo de numerosos participantes é o de que o debate que temos neste lugar ofereça interessantes pontos de reflexão na Reunião mundial sobre o Desenvolvimento duradouro, que terá lugar em Joanesburgo de 26 de Agosto a 4 de Setembro de 2002. Existem numerosas relações entre o ecoturismo e o desenvolvimento duradouro, que, como sabeis, está fundado sobre a ideia de ligar entre si três dimensões do desenvolvimento: económica, social e ambiental.

Da sua parte, também a Santa Sé quer contribuir para este debate, indicando alguns dos princípios e valores que estão, ou deviam estar, na base do ecoturismo. Efectivamente, este último não se deve limitar a pôr em contacto os turistas com uma natureza não poluída ou com as sociedades rurais; ele deve tornar-se, também, um meio concreto de salvaguadar o património natural e, sobretudo, as tradições culturais, espirituais e religiosas.

Isto significa que, para o desenvolvimento do ecoturismo, é indispensável ter como ponto de referência o carácter central do ser humano, lembrando o primeiro princípio adoptado pela Declaração do Rio sobre o Ambiente e o Desenvolvimento, de 1992, princípio segundo o qual "o ser humano está no centro das preocupações do desenvolvimento duradouro". Uma tal abordagem comporta inevitavelmente uma revisão e uma reorganização dos sistemas operacionais que têm em vista a obtenção de resultados económicos e financeiros imediatos, em detrimento de um ecoturismo duradouro, que requer a manutenção do património cultural comum. O ecoturismo oferece, com efeito, a ocasião de não privilegiar unicamente as iniciativas comerciais, mas a de reservar aos valores humanos, culturais e espirituais o seu justo lugar, com o apoio de todos os protagonistas interessados.

Nota-se, assim, que, para o ecoturismo, é urgente, em razão do princípio da subsidiariedade, poder apoiar-se sobre normas e iniciativas cada vez mais adaptadas, para garantir a participação das comunidades locais e indígenas na organização, controlo e gestão das actividades turísticas, assim como nos processos de decisão que lhes estão ligados. Em função destes comportamentos, será interessante avaliar o impacto do ecoturismo sobre a protecção do ambiente e sobre o desenvolvimento sócioeconómico das próprias comunidades locais.

O ponto de partida deve ser a salvaguarda da base cultural, espiritual e religiosa indispensável para sensibilizar para este problema os que pretendem comprometer-se neste sector. A população local não pode ser posta à margem deste processo inovador e produtivo, antes deve ser parte adquiridora dos novos valores que se apresentam, neles compreendendo os benefícios ligados a um equilibrado desenvolvimento social. Desta maneira, poderá chegar-se a uma harmoniosa associação entre o património cultural dos que são acolhidos e as tradições locais. Isto requer um processo prudente e equilibrado de recíproca abertura e de integração, com percursos adaptados de educação e de formação, logo no ponto de partida, a respeito da salvaguarda da criação e de outras culturas e civilizações, percursos que conduzem também a uma mudança progressiva dos modelos de produção e de consumo que são insustentáveis.

A fim de serem eficazes para um desenvolvimento correcto do ecoturismo, tais percursos de educação e de formação propostos às populações locais e mais particularmente aos que chegam, devem ser baseados sobre as exigências da responsabilidade, do cuidado pelo bem comum, da equidade entre as gerações e no interior de cada geração, da solidariedade universal e, como já foi dito, da subsidariedade.

 

 

 

 

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