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CIMEIRA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE OS MIGRANTES

DISCURSO DO SECRETÁRIO DE ESTADO
CARDEAL PIETRO PAROLIN

Nova Iorque, 19 de setembro de 2016

 

Diálogo global único caminho a percorrer

 

Senhor Presidente!

A Santa Sé expressa a sua gratidão a Vossa Excelência e ao Secretário-Geral por ter convocado este histórico encontro de líderes mundiais a fim de fazer face a um dos maiores problemas humanitários, políticos e económicos do presente, ou seja, os vastos movimentos de refugiados e migrantes. Trata-se de um imperativo moral que quantos têm a responsabilidade pelo bem-estar dos povos não podem evitar nem ignorar.

Os valores expressos na Carta das Nações Unidas, sobretudo o respeito pelos direitos fundamentais do homem e a dignidade e o valor da pessoa humana, devem estar no centro da nossa resposta à emergência dos refugiados e dos migrantes. Estes mesmos princípios fundamentais são afirmados pela maior parte das principais tradições religiosas no mundo e pelas pessoas de boa vontade. A regra de ouro impõe que tratemos os refugiados e os migrantes do mesmo modo como gostaríamos de ser tratados se estivéssemos na situação deles.

Por conseguinte, enquanto procuramos encontrar as maneiras mais eficazes para responder aos desafios apresentados pelos movimentos sem precedentes de refugiados e de migrantes, tendo em conta as preocupações legítimas de sociedades e países, não devemos perder de vista as pessoas reais, com um nome e um rosto, que estão por detrás das assustadoras estatísticas. Os refugiados precisam da nossa proteção, mas também os migrantes têm necessidade, além da solidariedade e da compaixão, que os seus direitos sejam respeitados. Esta abordagem exige o compromisso total de «uma humanidade que sabe reconhecer, antes de tudo, o irmão e a irmã, uma humanidade que quer construir pontes e evita a ilusão de levantar cercas para se sentir mais segura» (Papa Francisco, Encontro com as autoridades e a população. Memória das vítimas das migrações, Lesbos, 16 de abril de 2016).

Com efeito, a nossa presença nesta Instituição é um sinal de que reconhecemos que os muros e as cercas — quer físicas quer legislativas — entre pessoas e povos nunca são uma solução aceitável para os problemas sociais. Estas cercas dividem as pessoas e os povos, causam tensões entre eles e debilitam ou impedem o progresso. Ao contrário, apesar das dificuldades, dos interesses eleitorais e das preocupações compreensíveis e legítimas, as nossas responsabilidades exigem que superemos receios e obstáculos e trabalhemos por um mundo no qual as pessoas e os povos possam viver com liberdade e dignidade.

Os enormes e complexos desafios apresentados pelos vastos movimentos de refugiados e migrantes só podem ser enfrentados se trabalharmos todos juntos. A minha Delegação insiste sobre a necessidade de um diálogo transnacional e de cooperação entre as nações, as organizações internacionais e as agências humanitárias. A este respeito, a colaboração com as organizações religiosas e as comunidades de fé é particularmente útil, dado que se trata de interlocutores interessados e competentes, que muitas vezes são os primeiros a responder aos movimentos transfronteiriços de refugiados e migrantes e às pessoas inteiramente deslocadas.

Cada indivíduo tem o direito de viver em paz e em segurança na própria pátria e país de origem. Contudo, milhões de pessoas arriscam tudo, vivem em condições terríveis, milhares perderam a vida na tentativa de fugir de conflitos, violência, pobreza extrema, exclusão social, perseguição aberta e diversas formas de discriminação. Quarenta e oito milhões de crianças são obrigadas a deixar as suas casas e milhares de crianças migrantes não acompanhadas desaparecem e tornam-se presa de pessoas que abusam delas e de exploradores.

A Santa Sé deseja reafirmar mais uma vez o seu apelo urgente para que sejam feitos esforços políticos e multilaterais para fazer face às causas que estão na origem dos grandes movimentos e da deslocação forçada de populações, sobretudo os conflitos e a violência, as numerosas violações de direitos humanos, a degradação ambiental, a pobreza extrema, o comércio e o tráfico de armas, a corrupção e os obscuros planos financeiros e comerciais relacionados com tudo isto. Ao mesmo tempo, é necessário garantir que os fundos para o desenvolvimento sejam atribuídos de maneira equitativa e transparente, entregues e utilizados de maneira adequada.

A Santa Sé frisa a importância desta cimeira, que faz eco às admoestações do Papa Francisco em relação à globalização da indiferença. Ao fazê-lo, é motivada por um compromisso reiterado para proteger todas e cada uma das pessoas da violência e da discriminação, para garantir cuidados de saúde adequados e de qualidade e para proteger quem é vulnerável, em particular as mulheres e as crianças.

A minha Delegação observa que a Declaração política inclui compromissos urgentemente necessários para ajudar quer os refugiados quer outros migrantes forçados, pois partilham as mesmas causas fundamentais que exigem uma resposta comum. Além disso, a Declaração tem em consideração as realidades nacionais, as capacidades, as prioridades e os níveis de desenvolvimento de uma forma que é coerente com os direitos e as obrigações dos Estados segundo o direito internacional. Nesta linha, apreciamos o forte convite a todos os Estados a trabalhar pela eliminação da prática da detenção infantil, que nunca é em benefício do interesse da criança.

A Santa Sé aprecia o acordo para uma estreita relação operativa entre a Organização Internacional para as Migrações e as Nações Unidas, e deseja expressar o seu interesse e participar nos esforços permanentes do Fórum Global sobre Migrações e Desenvolvimento e do Global Migration Group. Fazemos votos sinceros de que estas iniciativas levem a uma melhor gestão de respostas centradas sobre a pessoa aos movimentos de refugiados e de migrantes a nível global, nacional e local.

Senhor Presidente!

Permita-me concluir com as palavras do Papa Francisco, que expressam a sua mensagem a esta cimeira: «Convido sobretudo os governantes e os legisladores, assim como toda a Comunidade internacional, a considerar a realidade das pessoas erradicadas com a força, mediante iniciativas eficazes e abordagens renovadas para tutelar a sua dignidade, melhorar a sua qualidade de vida e enfrentar os desafios que derivam de formas modernas de perseguição, de opressão e de escravidão. Quero frisar que se trata de pessoas humanas que fazem apelo à solidariedade e à assistência, que têm necessidade de intervenções urgentes, mas também e sobretudo de compreensão e bondade» (Papa Francisco, Discurso aos participantes na Plenária do Pontifício Conselho para a Pastoral dos Migrantes e Itinerantes, 24 de maio de 2013).

Obrigado, Senhor Presidente.