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VISITA PASTORAL
DE SUA SANTIDADE BENTO XVI
A VERONA POR OCASIÃO DO
IV CONGRESSO NACIONAL DA IGREJA ITALIANA

DISCURSO DO SANTO PADRE
AOS PARTICIPANTES NO CONGRESSO

Feira de Verona
Quinta-feira, 19 de Outubro de 2006

 

Queridos irmãos e irmãs

Estou feliz por me encontrar convosco hoje, nesta bonita e histórica cidade de Verona, para participar activamente no IV Congresso nacional da Igreja na Itália. Transmito a todos vós e a cada um a mais cordial saudação no Senhor. Agradeço ao Cardeal Camillo Ruini, Presidente da Conferência Episcopal, e à Doutora Giovanna Ghirlanda, representante da Diocese de Verona, as amáveis palavras de boas-vindas que me dirigiram em nome de todos vós e as notícias que me deram acerca do desenvolvimento do Congresso. Agradeço ao Cardeal Dionigi Tettamanzi, Presidente da Comissão preparatória, e a quantos trabalharam pela sua realização. Agradeço de coração a cada um de vós, que aqui representais, em feliz harmonia, os vários componentes da Igreja na Itália: o Bispo de Verona, D. Flávio Roberto Carraro, que nos hospeda, os Bispos aqui reunidos, os sacerdotes e os diáconos, os religiosos e as religiosas, e vós fiéis leigos, homens e mulheres, que dais voz às múltiplas realidades do laicado católico na Itália.

Este IV Congresso nacional é uma nova etapa do caminho de actuação do Vaticano II, que a Igreja italiana empreendeu desde os anos imediatamente seguintes ao grande Concílio: um caminho de comunhão, antes de tudo com Deus Pai e com o seu Filho Jesus Cristo no Espírito Santo, e portanto em comunhão entre nós, na unidade do único Corpo de Cristo (cf. 1 Jo 1, 3; 1 Cor 12, 12-13); um caminho orientado para a evangelização, para conservar viva e sólida a fé no povo italiano; portanto, um testemunho tenaz de amor pela Itália e de solicitude diligente pelo bem dos seus filhos. A Igreja na Itália percorreu este caminho em estreita e constante união com o Sucessor de Pedro: é-me grato recordar convosco os Servos de Deus Paulo VI, que quis o I Congresso no já longínquo ano de 1976, e João Paulo II, com as suas intervenções fundamentais recordamo-nos de todas elas nos Congressos de Loreto e de Palermo, que fortaleceram na Igreja italiana a confiança de poder trabalhar a fim de que a fé em Jesus Cristo continue a oferecer, também aos homens e às mulheres do nosso tempo, o sentido e a orientação da existência, e assim tenha "um papel-guia e uma eficácia que atraia" no caminho da Nação rumo ao futuro (cf. Discurso no Congresso de Loreto, 11 de abril de 1985, n. 7).

Foi no mesmo espírito que hoje vim a Verona, para rezar ao Senhor juntamente convosco, compartilhar mesmo brevemente o vosso trabalho destes dias e propor-vos uma minha reflexão sobre aquilo que parece verdadeiramente importante para a presença cristã na Itália. Fizestes uma escolha muito feliz, pondo Cristo ressuscitado no centro da atenção do Congresso e de toda a vida e do testemunho da Igreja na Itália. A ressurreição de Cristo é um facto que se verificou na história, de que os Apóstolos foram testemunhas e certamente não criadores. Ao mesmo tempo, ela não é de modo algum um simples retorno à nossa vida terrena; é, a contrário, a maior "mudança" jamais ocorrida, o "salto" decisivo rumo a uma dimensão de vida profundamente nova, o ingresso numa ordem decididamente diferente, que diz respeito sobretudo a Jesus de Nazaré, mas com Ele também a nós, a toda a família humana, à história e a todo o universo: por isso, a ressurreição de Cristo é o centro da pregação e do testemunho cristão, desde o início e até ao fim dos tempos.

Sem dúvida, trata-se de um grande mistério, do mistério da nossa salvação, que na ressurreição do Verbo encarnado encontra o seu cumprimento e, ao mesmo tempo, a antecipação e o penhor da nossa esperança. Mas a chave de leitura deste mistério é o amor e somente na lógica do amor ele pode ser aproximado e de certo modo compreendido: Jesus Cristo ressuscita dos mortos porque todo o seu ser é perfeita e íntima união com Deus, que é amor verdadeiramente mais forte do que a morte. Ele era um só com a Vida indestrutível e portanto podia dar a própria vida deixando-se matar, mas não podia sucumbir definitivamente à morte: de modo concreto, na última Ceia Ele antecipou e aceitou por amor a própria morte na cruz, transformando-a assim no dom de si, aquele dom que nos dá a vida, nos liberta e salva. Por conseguinte, a sua ressurreição foi como que uma explosão de luz, uma explosão do amor que desata as cadeias do pecado e da morte. Ela inaugurou uma nova dimensão da vida e da realidade, da qual sobressai um mundo novo, que penetra continuamente no nosso mundo, o transforma e o atrai a si.

Tudo isto acontece concretamente através da vida e do testemunho da Igreja; aliás, a própria Igreja constitui a primícia desta transformação, que é obra de Deus e não nossa. Ela chega até nós mediante a fé e o sacramento do Baptismo, que é realmente morte e ressurreição, renascimento, transformação numa vida nova. É aquilo que releva São Paulo na Carta aos Gálatas: "Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim" (2, 20). Assim mudou a minha identidade essencial, através do Baptismo, e eu continuo a existir somente nesta mudança. Sou privado do meu próprio eu, que é inserido num novo sujeito maior, em que o meu eu existe novamente, mas transformado, purificado, "aberto" mediante a inserção no outro, em quem adquire o seu novo espaço de existência. Assim, tornamo-nos "um só em Cristo" (Gl 3, 28), um único sujeito novo, e o nosso eu é libertado do seu isolamento. "Eu, mas já não eu": esta é a fórmula da existência cristã fundada no Baptismo, a fórmula da ressurreição dentro do tempo, a fórmula da "novidade" cristã chamada a transformar o mundo. Aqui está a nossa alegria pascal. A nossa vocação e a nossa tarefa de cristãos consistem em cooperar para que chegue ao cumprimento efectivo, na realidade quotidiana da nossa vida, aquilo que o Espírito Santo empreendeu em nós com o Baptismo: com efeito, somos chamados a tornar-nos homens e mulheres novos, para podermos ser verdadeiras testemunhas do Ressuscitado e, deste modo, portadores da glória e da esperança cristã no mundo, concretamente naquela comunidade de homens e de mulheres em cujo contexto vivemos. E assim, desta mensagem fundamental da Ressurreição, presente em nós e nas acções quotidianas, chego ao tema do serviço da Igreja na Itália à Nação, à Europa e ao mundo.

A Itália de hoje apresenta-se-nos como um terreno profundamente necessitado e, ao mesmo tempo, favorável para tal testemunho. Profundamente necessitado, porque participa daquela cultura que predomina no Ocidente e que gostaria de apresentar-se como universal e auto-suficiente, gerando um novo estilo de vida. Daqui deriva uma nova onda de iluminismo e de laicismo, para a qual só seria racionalmente válido aquilo que é experimentável e calculável, enquanto no plano da prática a liberdade individual é erigida em valor fundamental ao qual todos os outros deveriam sujeitar-se. Assim Deus permanece excluído da cultura e da vida pública, e a fé nele torna-se mais difícil, também porque vivemos num mundo que se apresenta quase sempre como nossa obra, onde, por assim dizer, Deus já não aparece directamente e parece ter-se tornado supérfluo, aliás alheio. Em estreita relação com tudo isto, tem lugar uma redução radical do homem, considerado um simples produto da natureza, como tal não realmente livre e por si só susceptível de ser tratado como qualquer outro animal. Verifica-se assim uma autêntica inversão do ponto de partida desta cultura, que era uma reivindicação da centralidade do homem e da sua liberdade. Nesta mesma linha, a ética é reconduzida até aos confins do relativismo e do utilitarismo, com a exclusão de todo o princípio moral que seja válido e vinculante por si mesmo. Não é difícil ver como este tipo de cultura representa uma ruptura radical e profunda não só com o cristianismo, mas de modo mais geral com as tradições religiosas e morais da humanidade: portanto, não é capaz de instaurar um verdadeiro diálogo com as demais culturas, nas quais a dimensão religiosa está fortemente presente, além de não poder responder às interrogações fundamentais sobre o sentido e a direcção da nossa vida. Por isso, esta cultura caracteriza-se por uma profunda carência, mas também por uma grande e inutilmente escondida necessidade de esperança.

Porém, como eu dizia, a Itália constitui ao mesmo tempo um terreno muito favorável para o testemunho cristão. Com efeito, aqui a Igreja é uma realidade muito viva e vêmo-lo! que conserva uma presença profunda no meio das pessoas de todas as idades e condições. As tradições cristãs ainda estão com frequência arraigadas e continuam a dar fruto, enquanto está em acto um grande esforço de evangelização e catequese, dirigido em particular às novas gerações, mas hoje cada vez mais às famílias. Além disso, sente-se com crescente clareza a insuficiência de uma racionalidade fechada em si mesma e de uma ética demasiado individualista: de forma concreta, sente-se a gravidade do risco de se desapegar das raízes cristãs da nossa civilização. Esta sensação, que está difundida no povo italiano, é formulada expressamente e com vigor por parte de muitos e importantes homens de cultura, também entre aqueles que não compartilham ou pelo menos não praticam a nossa fé. Por conseguinte, a Igreja e os católicos italianos são chamados a aproveitar esta grande oportunidade e em primeiro lugar a estar conscientes da mesma. Portanto, a nossa atitude nunca deverá ser a de um fechamento renunciatário em nós mesmos: pelo contrário, é necessário manter vivo e, se possível, incrementar o nosso dinamismo; é preciso abrir-se com confiança a novas relações, sem descuidar qualquer das energias que podem contribuir para o crescimento cultural e moral da Itália. Efectivamente, cabe-nos a nós não com os nossos pobres recursos, mas com a força que vem do Espírito Santo dar respostas positivas e convincentes às expectativas e às interrogações do nosso povo: se soubermos fazê-lo, a Igreja na Itália prestará um grande serviço não somente a esta Nação, mas também à Europa e ao mundo, porque a insídia do secularismo está presente em toda a parte e é igualmente universal a necessidade de uma fé vivida em relação aos desafios do nosso tempo.

Amados irmãos e irmãs, agora devemos perguntar-nos como, e com que base, cumprir esta tarefa. Neste Congresso julgastes, justamente, que é indispensável dar ao testemunho cristão conteúdos concretos e praticáveis, examinando como ela pode actuar-se e desenvolver-se em cada um destes grandes âmbitos em que se desenrola a experiência humana. Assim, seremos ajudados a não perder de vista na nossa acção pastoral a ligação entre a fé e a vida quotidiana, entre a proposta do Evangelho e aquelas preocupações e aspirações que estão mais a peito das pessoas. Por isso, nestes dias reflectistes sobre a vida afectiva e a família, sobre o trabalho e a festa, sobre a educação e a cultura, sobre as condições de pobreza e de enfermidade, sobre os deveres e as responsabilidades da vida social e política.

Quanto a mim, gostaria de sublinhar como, através deste testemunho multiforme, deve emergir sobretudo aquele grande "sim" que em Jesus Cristo Deus deu ao homem e à sua vida, ao amor humano, à nossa liberdade e à nossa inteligência; como, portanto, a fé em Deus com rosto humano traga alegria ao mundo. De facto, o cristianismo está aberto a tudo aquilo que de justo, verdadeiro e puro existe nas culturas e nas civilizações, àquilo que alegra, consola e fortalece a nossa existência. Na Carta aos Filipenses, São Paulo escreveu: "Tudo o que é verdadeiro, tudo o que é nobre, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é respeitável, tudo o que possa ser virtude e mereça louvor, tende tudo isto em mente" (4, 8). Portanto, os discípulos de Cristo reconhecem e acolhem de bom grado os autênticos valores da cultura do nosso tempo, como o conhecimento científico e o desenvolvimento tecnológico, os direitos do homem, a liberdade religiosa e a democracia. Porém, não ignoram nem subestimam a perigosa fragilidade da natureza humana, que é uma ameaça para o caminho do homem em todos os contextos históricos; em particular, não descuidam as tensões interiores nem as contradições da nossa época. Por isso, a obra de evangelização nunca é uma simples adaptação às culturas, mas constitui sempre também uma purificação, uma ruptura corajosa que se torna amadurecimento e purificação, uma abertura que permite o nascimento daquela "nova criação" (2 Cor 5, 17; Gl 6, 15), que é o fruto do Espírito Santo.

Como escrevi na Encíclica Deus caritas est, no início do ser cristão e portanto na origem do nosso testemunho de crentes não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com a Pessoa de Jesus Cristo, "que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo" (n. 1).

A fecundidade deste encontro manifesta-se, de maneira peculiar e criativa, em primeiro lugar em relação à razão que deu vida às ciências modernas e às relativas tecnologias. Com efeito, uma característica fundamental destas últimas é o recurso sistemático aos instrumentos da matemática para poder actuar com a natureza e pôr ao nosso serviço as suas imensas energias. A matemática como tal é uma criação da nossa inteligência: a correspondência entre as suas estruturas e as estruturas reais do universo que é o pressuposto de todos os modernos desenvolvimentos científicos tecnológicos, já expressamente formulados por Galileu Galilei com a célebre afirmação que o livro da natureza está escrito em linguagem matemática suscita a nossa admiração e levanta uma grande interrogação. De facto, implica que o próprio universo seja estruturado de maneira inteligente, de modo que exista uma profunda correspondência entre a nossa razão subjectiva e a razão objectivada na natureza. Então, torna-se inevitável perguntar se não deve existir uma única inteligência originária, que é a fonte comum de uma e da outra. Assim, precisamente a reflexão sobre o desenvolvimento das ciências conduz-nos rumo ao Logos criador. Inverte-se a tendência a dar o primado ao irracional, ao acaso e à necessidade, a orientar para ele também a nossa inteligência e a nossa liberdade. Com estas bases torna-se também de novo possível ampliar os espaços da nossa racionalidade, reabri-la às grandes questões da verdade e do bem, unir entre si a teologia, a filosofia e as ciências, no pleno respeito pelos seus próprios métodos e pela sua autonomia recíproca, mas também na consciência da unidade intrínseca que as conserva unidas.

Trata-se de uma tarefa que está à nossa frente, de uma aventura fascinante em que vale a pena comprometer-se, para dar um novo impulso à cultura do nosso tempo e para restituir nela a plena cidadania à fé cristã. Em vista desta finalidade, o "projecto cultural" da Igreja na Itália, é sem dúvida, uma feliz intuição e uma contribuição muito importante.

A pessoa humana não é, por outro lado, somente razão e inteligência, que todavia são os seus elementos constitutivos. Ela traz dentro de si, inscrita no mais profundo do seu ser, a necessidade de amor, de ser amada e, por sua vez, de amar. Por isso, interroga-se e muitas vezes confunde-se diante das tribulações da vida, do mal que existe no mundo e que parece tão forte e, ao mesmo tempo, radicalmente sem sentido. Em particular na nossa época, apesar de todos os progressos alcançados, o mal não está de modo algum derrotado; ao contrário, o seu poder parece revigorar-se, e todas as tentativas de o esconder são depressa desmascaradas, como demonstram tanto a experiência quotidiana como as grandes vicissitudes históricas. Portanto, volta com insistência a pergunta se na nossa vida pode existir um espaço seguro para o amor autêntico e, em última análise, se o mundo é verdadeiramente a obra da sabedoria de Deus. Aqui, muito mais do que qualquer raciocínio humano, somos socorridos pela extraordinária novidade da revelação bíblica: o Criador do céu e da terra, o único Deus que é a fonte de todo o ser, este único "Logos" criador, esta razão criadora sabe amar pessoalmente o homem; aliás, ama-o de maneira apaixonada e, por sua vez, quer ser amado. Por isso esta razão criadora, que é ao mesmo tempo amor, dá vida a uma história de amor com Israel, o seu povo, e nesta vicissitude, diante das traições do povo, o seu amor mostra-se rico de fidelidade e misericórdia inesgotáveis, é o amor que perdoa para além de todo o limite. Em Jesus Cristo, tal atitude alcança a sua forma extrema, inaudita e dramática: com efeito, nele Deus faz-se um de nós, nosso irmão em humanidade, e chega mesmo a sacrificar a sua vida por nós. Portanto, na morte na cruz aparentemente, o maior mal da história cumpre-se "aquele virar-se de Deus contra si próprio, com o qual Ele se entrega para levantar o homem e salvá-lo o amor na sua forma mais radical", em que se manifesta o que significa que "Deus é amor" (1 Jo 4, 8) e compreende-se também como deve definir-se o amor autêntico (cf. Deus caritas est, nn. 9-10 e 12).

Precisamente porque nos ama de verdade, Deus respeita e salva a nossa liberdade. Ao poder do mal e do pecado não opõe um poder maior mas como nos disse o nosso amado Papa João Paulo II, na Encíclica Dives in misericordia e, por último, no livro Memória e Identidade, o seu testamento espiritual prefere pôr o limite da sua paciência e da sua misericórdia, aquele limite que é, de modo concreto, o sofrimento do Filho de Deus. Assim, também o nosso sofrimento é transformado a partir de dentro, é introduzido na dimensão do amor e encerra uma promessa de salvação.

Estimados irmãos e irmãs, em tudo isto João Paulo II não só pensou e nem sequer só acreditou com uma fé abstracta: ele compreendeu-o e viveu-o com uma fé amadurecida no sofrimento. Ao longo deste caminho, como Igreja, somos chamados a segui-lo no mundo e na medida que Deus dispõe para cada um de nós. Justamente, a cruz assusta-nos, como causou medo e angústia a Jesus Cristo (cf. Mc 14, 33-36): porém, ela não é negação da vida, da qual para ser fiel é necessário libertar-se. Ao contrário, é o "sim" extremo de Deus ao homem, a expressão suprema do seu amor e a nascente da vida plena e perfeita: por conseguinte, contém o convite mais convincente a seguir Cristo pelo caminho do dom de si. Aqui, é-me grato dirigir um pensamento de especial afecto aos membros sofredores do corpo do Senhor: tanto na Itália como em toda a parte no mundo, eles completam na sua carne aquilo que falta aos padecimentos de Cristo (cf. Cl 1, 24) e assim contribuem da maneira mais eficaz para a salvação de todos. Eles são as testemunhas mais convincentes daquela alegria que provém de Deus e que incute a força de aceitar a cruz no amor e na perseverança.

Sabemos bem que esta opção da fé e do seguimento de Cristo nunca é fácil: ao contrário, é sempre contrastada e controversa. Portanto, a Igreja permanece como "sinal de contradição", no sulco do seu Mestre (cf. Lc 2, 34), também no nosso tempo. Mas nem por isso nos desencorajamos. Pelo contrário, devemos estar sempre prontos a responder (apo-logia) a quem quer que nos pergunte a razão (logos) da nossa esperança, como nos convida a fazer a primeira Carta de São Pedro (cf. 3, 15), que muito oportunamente escolhestes como guia bíblica para o caminho deste Congresso. Devemos responder "com mansidão e respeito, mantendo limpa a consciência" (3, 16), com aquela força dócil que provém da união com Cristo. Devemos fazê-lo plenamente, nos planos do pensamento e da acção, dos comportamentos pessoais e do testemunho público. A forte unidade que se realizou na Igreja dos primeiros séculos, entre uma fé amiga da inteligência e uma prática de vida caracterizada pelo amor recíproco e pela atenção cuidadosa aos pobres e aos sofredores, tornou possível a primeira grande expansão missionária do cristianismo no mundo helenista-romano. Assim tornou-se também sucessivamente, em vários contextos culturais e situações históricas. Este permanece o caminho principal para a evangelização: o Senhor nos oriente para vivermos esta unidade entre a verdade e o amor nas condições próprias do nosso tempo, para a evangelização da Itália e do mundo de hoje. Assim, chego a um ponto importante e fundamental, ou seja, a educação.

Concretamente, para que a experiência da fé e do amor cristão seja acolhida e vivida, e se transmita de uma geração a outra, uma questão fundamental e decisiva é a da educação da pessoa.

É preciso preocupar-se com a formação da sua inteligência, sem descuidar as da sua liberdade e capacidade de amar. E por isso é necessário o recurso também à ajuda da Graça. Só deste modo poderá contrastar-se eficazmente o risco para a sorte da família humana, que é constituído pelo desequilíbrio entre o crescimento tão rápido do nosso poder técnico e o crescimento muito mais cansativo dos nossos recursos morais. Uma educação verdadeira tem necessidade de despertar a coragem das decisões definitivas, que hoje são consideradas um vínculo que mortifica a nossa liberdade, mas na realidade são indispensáveis para crescer e alcançar algo de grande na vida, em particular para fazer amadurecer o amor em toda a sua beleza: portanto, para dar consistência e significado à própria liberdade. Desta solicitude pela pessoa humana e pela sua formação chegam os nossos "não" a formas frágeis e deturpadas de amor e às falsificações da liberdade, como também a redução da razão somente àquilo que é calculável e manipulável. Na verdade, estes "não" são sobretudo "sim" ao amor autêntico, à realidade do homem como foi criado por Deus.

Quero expressar aqui todo o meu apreço pelo grande trabalho formativo e educativo que as Igrejas individualmente não se cansam de realizar na Itália, pela sua atenção pastoral às novas gerações e às famílias: obrigado por esta atenção! Entre as múltiplas formas deste compromisso não posso deixar de recordar de maneira particular a escola católica, porque no que se lhe refere ainda subsistem, de certo modo, antigos preconceitos que geram atrasos prejudiciais, e não já justificáveis, ao reconhecer a sua função e permitir concretamente a sua actividade.

Jesus disse-nos que tudo o que fizéssemos aos seus irmãos mais pequeninos, teríamos feito a Ele (cf. Mt 25, 40). Por conseguinte, a autenticidade da nossa adesão a Cristo verifica-se especialmente no amor e na solicitude concreta pelos mais fracos e pobres, por aqueles que se encontram em maior perigo e em dificuldades mais graves. A Igreja na Itália tem uma grande tradição de proximidade, de ajuda e de solidariedade para com os necessitados, os enfermos e os marginalizados, que encontra a sua expressão mais alta numa maravilhosa série de "Santos da caridade". Esta tradição continua também hoje e responde às muitas formas de pobreza, morais e materiais, através da Cáritas, do voluntariado social, da obra frequentemente escondida de muitas paróquias, comunidades religiosas, associações e grupos, pessoas individualmente impelidas pelo amor a Cristo e aos irmãos. Além disso, a Igreja na Itália dá prova de uma extraordinária solidariedade para com as inúmeras multidões de pobres da terra. Portanto, é mais importante do que nunca que todos estes testemunhos de caridade conservem sempre alto e luminoso o seu perfil específico, alimentando-se de humildade e de confiança no Senhor, mantendo-se livres de sugestões ideológicas e de simpatias de partido, e sobretudo medindo o próprio olhar segundo o olhar de Cristo: então, a acção prática é importante, mas conta ainda mais a nossa participação pessoal nas necessidades e nos sofrimentos do próximo. Assim, queridos irmãos e irmãs, a caridade da Igreja torna visível o amor de Deus no mundo e assim torna convincente a nossa fé no Deus encarnado, crucificado e ressuscitado.

O vosso Congresso enfrentou justamente também o tema da cidadania, ou seja, as questões das responsabilidades civis e políticas dos católicos. Efectivamente, Cristo veio para salvar o homem real e concreto, que vive na história e na comunidade, e portanto o cristianismo e a Igreja tiveram desde o início uma dimensão e um valor também públicos. Como escrevi na Encíclica Deus caritas est (cf. nn. 28-29), aos relacionamentos entre religião e política Jesus Cristo ofereceu uma novidade substancial, que abriu o caminho para um mundo mais humano e mais livre, através da distinção e da autonomia recíproca entre o Estado e a Igreja, entre o que é de César e o que é de Deus (cf. Mt 22, 21). A própria liberdade religiosa, que sentimos como um valor universal, particularmente necessário no mundo de hoje, encontra aqui a sua raiz histórica. Portanto, a Igreja não é e não tenciona ser um agente político. Ao mesmo tempo, tem um profundo interesse pelo bem da comunidade política, cuja alma é a justiça, e oferece-lhe a um nível duplo a sua contribuição específica. De facto, a fé cristã purifica a razão e ajuda-a a ser melhor ela mesma: portanto, com a sua doutrina social, argumentada a partir daquilo que é conforme a natureza de cada ser humano, a Igreja contribui para fazer com que aquilo que é justo possa ser eficazmente reconhecido e em seguida também realizado. Com esta finalidade, são claramente indispensáveis as energias morais e espirituais, que permitem antepor as exigências da justiça aos interesses pessoais, ou de uma categoria social, ou até de um Estado: aqui apresenta-se de novo para a Igreja um espaço muito amplo, para arraigar estas energias nas consciências, alimentá-las e fortalecê-las. A tarefa imediata de agir no âmbito político, para construir uma ordem justa na sociedade, não pertence portanto à Igreja como tal, mas aos fiéis leigos, que agem como cidadãos sob a sua própria responsabilidade: trata-se de uma tarefa da maior importância, à qual os cristãos leigos italianos são chamados a dedicar-se com generosidade e coragem, iluminados pela fé e pelo magistério da Igreja e animados pela caridade de Cristo.

Hoje uma atenção especial e um compromisso extraordinário são exigidos daqueles grandes desafios em que vastas porções da família humana estão em maior perigo: as guerras e o terrorismo, a fome e a sede, e algumas epidemias terríveis. Mas é necessário também enfrentar, com iguais determinação e clareza de intenções, o risco de opções políticas e legislativas que contradizem valores fundamentais e princípios antropológicos e éticos radicados na natureza do ser humano, de modo particular no que se refere à tutela da vida humana em todas as suas fases, desde a concepção até à morte natural, e à promoção da família fundada no matrimónio, evitando introduzir no ordenamento público outras formas de união que contribuiriam para a desestabilizar, obscurecendo o seu carácter peculiar e o seu papel social insubstituível. O testemunho aberto e corajoso que a Igreja e os católicos italianos deram e estão a dar a este respeito constituem um serviço precioso à Itália, útil e estimulante também para muitas outras nações. Sem dúvida, este compromisso e este testemunho fazem parte daquele grande "sim" que, como crentes em Cristo, dizemos ao homem amado por Deus.

Amados irmãos e irmãs, as tarefas e as responsabilidades que este Congresso eclesial põe em evidência são, certamente, grandes e múltiplas. Por isso, somos estimulados a ter sempre presente o facto de que não carregamos o seu peso sozinhos: com efeito, sustentamo-nos uns aos outros e sobretudo é o próprio Senhor que nos orienta e sustém a frágil barca da Igreja. Assim, voltamos ao ponto de onde partimos: decisivo é o nosso estar unidos a Ele, e portanto entre nós, o estar com Ele para poder partir no seu nome (cf. Mc 3, 13-15). Por conseguinte, a nossa verdadeira força é alimentar-nos da sua palavra e do seu corpo, unir-nos à sua oferta por nós, como faremos na Celebração desta tarde, adorá-lo presente na Eucaristia: efectivamente, antes de qualquer actividade e de cada um dos nossos programas deve haver a adoração, que nos torna verdadeiramente livres e nos oferece os critérios para o nosso agir. Na união a Cristo precede-nos e guia-nos a Virgem Maria, tão amada e venerada em todas as regiões da Itália. Nela encontramos, pura e não deformada, a verdadeira essência da Igreja e assim, através dela, aprendemos a conhecer e a amar o mistério da Igreja que vive na história, sentimo-nos até ao fundo como uma parte dela, tornamo-nos por nossa vez "almas eclesiais", aprendemos a resistir àquela"secularização interna" que ameaça a Igreja do nosso tempo, como consequência dos processos de secularização que assinalaram profundamente a civilização europeia.

Dilectos irmãos e irmãs, elevemos juntos ao Senhor a nossa oração, humilde mas repleta de confiança, a fim de que a comunidade católica italiana, inserida na comunhão viva da Igreja de todos os lugares e de todos os tempos, e estreitamente unida em redor dos seus Bispos, traga com renovado impulso a esta amada Nação, e a todos os recantos da terra, o alegre testemunho de Jesus Cristo, esperança da Itália e do mundo.

 

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