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ENCONTRO DO PAPA FRANCISCO
COM AS COMUNIDADES DE VIDA CRISTÃ (CVX) -
LIGA MISSIONÁRIA DE ESTUDANTES DA ITÁLIA

Sala Paulo VI
Quinta-feira, 30 de Abril de 2015

[Multimídia]


 

A primeira questão foi apresentada por Paola que, baseando-se na sua experiência pessoal de serviço no cárcere de Arghillà (Reggio Calabria), perguntou ao Santo Padre como falar de esperança a alguém que foi condenado à prisão perpétua e de que modo quem está chamado a ocupar-se de quantos sofrem, pode afinar a própria consciência.

Papa Francisco:

Paola, tenho aqui comigo as duas perguntas que tu escreveste: são duas! Tu sabes que eu gosto de dizer — é um modo de dizer, mas é a verdade do Evangelho — que devemos sair e ir até às periferias. Sair também para ir à periferia da transcendência divina na oração, mas sair sempre. A prisão é uma das periferias mais desagradáveis, onde há mais dor. Ir para a prisão significa, antes de tudo, dizer a si mesmo: «Se eu não estou aqui, como ela, como ele, é por pura graça de Deus!». Pura graça de Deus! Se nós não caímos nestes erros, se não cometemos estes delitos ou crimes, alguns graves, foi porque o Senhor me segurou pela mão. Não se pode entrar no cárcere com o espírito de «eu venho aqui para te falar de Deus porque, tem paciência, tu és de uma classe inferior, és um pecador...». Não, não! Eu sou mais pecador do que tu, e este é o primeiro passo. Na prisão pode-se dizer isto com grande coragem; mas devemos dizê-lo sempre. Quando vamos anunciar Jesus Cristo a pessoas que não o conhecem, ou que levam uma vida que não parece muito moral, devemos pensar que somos mais pecadores do que elas, porque se nós não caímos naquela situação foi pela graça de Deus. Trata-se de uma condição indispensável. Nós não podemos ir às periferias sem ter esta consciência. Paulo tinha esta consciência. Ele diz de si mesmo que é o maior pecador. Pronuncia também uma palavra muito desagradável acerca de si mesmo: «Eu sou um aborto» (cf. 1 Cor 15, 8). Mas isto está na Bíblia, é a Palavra de Deus, inspirada pelo Espírito Santo! Não se trata de fazer a cara de santinho, como dizem dos santos. Os santos sentiam-se pecadores, porque entendiam isto! É a graça do Senhor que nos sustenta. Se tu, se eu, se cada um de vós não tiver esta atitude não poderá receber o mandato de Jesus, a missão de Jesus: «Ide até aos confins do mundo, a todas as nações, às periferias» (cf. Mt 28, 20). E quem são aqueles que foram incapazes de receber isto? As pessoas fechadas, ou doutos, aqueles doutores da lei, aquelas pessoas fechadas que não aceitavam em Jesus, que não aceitavam a sua mensagem de sair. Pareciam justos, pareciam pessoas de Igreja, mas Jesus dirige-lhes uma palavra não muito bonita: «Hipócritas!». É assim que Jesus lhes chama. E para nos fazer entender como são aquelas pessoas, o retrato que Jesus faz delas é este: «Vós sois sepulcros caiados!» (cf. Mt 23, 27). Quem está fechado não pode receber, é incapaz de receber esta coragem do Espírito Santo, permanece fechado e não consegue ir às periferias. Tu, pede ao Senhor para permanecer aberta à voz do Espírito, para ir àquela periferia. E amanhã talvez Ele te peça para ir a outras periferias, tu não sabes... Mas é sempre o Senhor que nos envia. E no cárcere é preciso dizer sempre isto, inclusive a tantas pessoas que sofrem: por que razão sofre esta pessoa, e não eu? Por que motivo esta pessoa não conhece Deus, não tem esperança na vida eterna e pensa que tudo termina aqui, e eu sim? Por que esta pessoa é acusada nos tribunais pela sua corrupção, por que aquela outra pessoa... e eu não? Pela graça do Senhor! Esta é a melhor preparação para partir rumo às periferias.

Depois, tu dizes: «De que esperança falo eu com as pessoas que estão na prisão?». Muitas são condenadas à morte... Não, na Itália não há a pena de morte, mas a prisão perpétua... Mas a prisão perpétua é uma condenação à morte, porque se sabe que dali não se sai. É difícil! O que posso dizer àquele homem? O que posso dizer àquela mulher? Talvez... seja melhor não dizer nada. Pegar na sua mão, acariciá-lo, chorar com ele, chorar com ela... Assim, ter os mesmos sentimentos de Jesus Cristo. Aproximar-se do coração que sofre. Muitas vezes nós não podemos dizer nada, nada, porque qualquer palavra seria uma ofensa. Somente gestos. Gestos que manifestem o amor. «Tu foste condenado à prisão perpétua, aqui, mas eu compartilho contigo este fragmento de vida da tua prisão perpétua». É necessário partilhar com amor, nada mais. Nisto consiste a sementeira do amor.

Em seguida, põe o dedo na chaga: «Como afinar a nossa consciência, para que a presença ao lado de quantos sofrem não seja para nós uma simples beneficência, mas converta o nosso coração e nos torne capazes de lutar com coragem por um mundo mais justo?». A beneficência é um degrau: tens fome? — sim — dou-te de comer, hoje. A beneficência é o primeiro passo rumo à promoção. E isto não é fácil. Como promover as crianças famintas? Como promover... Agora falemos de crianças: como promover as crianças sem uma educação? Como promover as crianças que não sabem rir e que, se tu as acaricias, te dão uma bofetada, porque em casa vêem que o pai dá bofetadas à mãe? Como promovê-las? Como promover as pessoas que perderam o trabalho, como acompanhá-las e promovê-las, percorrer o caminho com elas, com quantos precisam de um trabalho, porque sem o trabalho as pessoas sentem-se sem dignidade? Sim, muito bem, dá-lhes de comer. Mas a dignidade consiste em fazer com que ele, ela, levem o pão para casa: isto confere dignidade! É a promoção — o presidente falou sobre isto [refere-se ao presidente das Comunidades de vida cristã, que antes proferiu um discurso, ndr]: muitas coisas que vós já fazeis... Algo que se diferencia da beneficência habitual — não me refiro à beneficência para sair das dificuldades mais graves — entre a beneficência habitual e a promoção, é que a beneficência habitual tranquiliza a nossa alma: «Hoje dei de comer, agora vou dormir tranquilo!». A promoção inquieta a nossa alma: «Tenho que fazer mais... Amanhã isto, depois de amanhã aquilo, e depois...». Trata-se da sadia inquietação do Espírito Santo.

Era isso que eu queria dizer. Que isto não seja para nós uma simples beneficência, mas que converta o nosso coração. E esta inquietação que te inspira o Espírito Santo, para encontrar modos de ajudar, de promover os irmãos e as irmãs, une-te a Jesus Cristo: isto é penitência, é cruz, mas é também alegria. Uma grandíssima alegria que o Espírito te concede quando ofereces isto. Não sei se te ajuda aquilo que eu te disse... pois quando me dirigem perguntas como estas, o perigo — também o perigo para o Papa — é julgar que pode responder a todas as questões... Todavia, o Único que pode responder a todas as perguntas é o Senhor. A minha função consiste simplesmente em ouvir e em dizer aquilo que me brota de dentro. Mas é demasiado insuficiente, é muito pouco.

Tiziana, por sua vez, confessou ao Pontífice uma fragilidade comum a muitos jovens, a perda da esperança. Por isso, pediu uma ajuda para compreender cada vez melhor que Deus nunca nos abandona.

Papa Francisco:

Gosto de dizer aos jovens: «Não deixeis que vos roubem a esperança!». Contudo, a tua pergunta vai mais além: «Mas de que esperança estás a falar, Padre?». Alguns podem pensar que a esperança consiste em levar uma vida favorável, uma existência tranquila, em alcançar metas... É uma esperança controlada, uma esperança que só pode funcionar num laboratório. Mas se tu estás na vida e trabalhas na vida, com tantos problemas, com tanto cepticismo que a vida te proporciona, com tantos fracassos, «de que esperança falas, Padre?». Sim, posso dizer-te: «Mas todos iremos para o Céu». Sim, é verdade. O Senhor é bom, mas eu desejo um mundo melhor e sou frágil; não vejo como isto se possa concretizar. Por exemplo, desejo «intrometer-me» no trabalho da política, ou da medicina... Mas às vezes também ali encontro a corrupção, e assim os trabalhos que são para servir transformam-se em negócios. Quero «intrometer-me» na Igreja, e até ali o diabo semeia a corrupção, que muitas vezes existe... Recordo-me daquela Via-Sacra do Papa Bento xvi, quando nos convidou a eliminar as sujeiras da Igreja... Até na Igreja há corrupção. Há sempre algo que desilude a esperança, e assim não se pode... Mas a verdadeira esperança e um dom de Deus, é uma dádiva que nunca desilude. Mas como se faz para compreender que Deus não nos abandona, que Deus está ao nosso lado, que percorre o caminho connosco? Hoje, no início da Missa, foi lido o versículo de um Salmo realmente muito bonito: «Quando Tu, Senhor, caminhavas no meio do teu povo, quando Tu lutavas ao nosso lado, a Terra estremecia e os Céus rorejavam» (cf. Sl 68, 8-9.20). Sim, mas isto nem sempre é evidente. Só existe uma coisa da qual estou convicto; estou persuadido disto, mas nem sempre consigo senti-lo: estou certo de que Deus caminha com o seu povo. Deus nunca abandona o seu povo. Ele é o Pastor do seu povo. Mas quando cometo um pecado, quando faço um erro, quando pratico algo injusto, quando vejo muitas coisas, interrogo-me: «Senhor, onde estás? Onde estás?». Hoje em dia, há tantos inocentes que morrem: onde estás, Senhor? É possível fazer algo? A esperança é uma das virtudes mais difíceis de entender, e alguns grandes — acho que foi Péguy, um daqueles que diziam que a esperança é a mais humilde de todas as virtudes, porque é a virtude dos humildes. mas é necessário abaixar-se muito para que o Senhor no-la conceda, a fim de que o Senhor no-la ofereça. É Ele quem nos sustenta. Contudo, diz-me: que esperança pode ter, sob o ponto de vista natural, pensando num hospital, uma religiosa que há quarenta anos trabalha no departamento de doenças terminais, e cada dia vê morrer um, mais um, mais um, e ainda outro... Sim, creio em Deus, mas o amor que aquela mulher oferece termina, acaba sempre... e numa certa altura aquela mulher pode dizer a Deus: «Mas é este o mundo que Tu criaste? Pode-se esperar algo de ti?». Eis a tentação quando estamos em dificuldade, quando vemos as brutalidades que acontecem no mundo, e a esperança parece esmorecer. Mas no coração humilde ela persiste. É difícil entender isto, porque a tua pergunta é muito profunda. Como não abandonar a luta para levar uma vida despreocupada, assim, sem esperança, é mais fácil... O serviço é trabalho de pessoas humildes, como ouvimos no Evangelho de hoje. Jesus veio para servir, não para ser servido. E a esperança é a virtude dos humildes. Penso que este pode ser o caminho. Digo-te sinceramente: não posso dizer-te outra coisa. Humildade e serviço: são estas duas realidades que conservam a pequena esperança, a virtude mais humilde, mas aquela que nos dá vida.

Bartolo — sacerdote diocesano, formador de seminaristas e professor no seminário inter-regional da Campânia, gerido pelos jesuítas — perguntou que contribuição específica pode oferecer um movimento de inspiração inaciana a favor da formação cristã de agentes no campo da pastoral, da participação e da educação dos jovens para a mundialidade?

Papa Francisco:

O presidente recordou um lema inaciano: «Contemplativo na acção». Ser contemplativo na acção não significa caminhar na vida olhando para o céu, porque se o fizeres certamente cairás num buraco... É necessário entender o que significa esta contemplação. Disseste algo, uma palavra que me impressionou: toquei com a mão as feridas do Senhor na pobreza dos homens do nosso tempo. E, a meu ver, este é um dos melhores remédios para uma enfermidade que nos atinge muito, a indiferença. Também o cepticismo: julgar que não se pode fazer nada. O padroeiro dos indiferentes e dos cépticos é Tomé: Tomé teve que tocar as feridas. Há um lindíssimo discurso, uma boa meditação de são Bernardo sobre as chagas do Senhor. Tu és presbítero, podes encontrá-la na terceira semana de Quaresma, no Ofício das Leituras, mas não me recordo em que dia. Entrar nas feridas do Senhor: nós servimos um Senhor ferido de amor; as mãos do nosso Deus são mãos chagadas de amor. Devemos ser capazes de entrar nelas... E Bernardo acrescenta: «Tem confiança, entra na chaga do seu lado e contemplarás o amor daquele Coração». Se te aproximares, se tocares as feridas da humanidade — e nisto consiste a doutrina católica — tocarás o Senhor ferido. Encontrarás isto no capítulo 25 de Mateus, e não sou herege quando o digo. Quando tocares as chagas do Senhor, entenderás um pouco mais o mistério de Cristo, do Deus encarnado. É precisamente esta a mensagem de Inácio, na espiritualidade: uma espiritualidade em cujo âmago está Jesus Cristo, e não as instituições, nem as pessoas, não! Jesus Cristo, mas Cristo encarnado! E quando fizeres os Exercícios espirituais, ele dir-te-á que vendo o Senhor que sofre, as feridas do Senhor, deverás esforçar-te por chorar e sofrer. É a espiritualidade inaciana que sugere ao vosso Movimento este caminho, indica esta vereda: entrar no Coração de Deus através das feridas de Jesus Cristo. Cristo ferido nos famintos, nos ignorantes, nos descartados, nos idosos sozinhos, nos doentes, nos presos, nos loucos... Ele está ali. E qual poderia ser o maior erro para um de vós? Falar de Deus, descobrir Deus, encontrar Deus, mas um «Deus spray», um Deus diluído, um Deus etéreo... Inácio queria que tu encontrasses o Senhor Jesus Cristo, que te ama e que deu a sua vida por ti, por todos, ferido por causa dos teus pecados, dos meus pecados... E as chagas do Senhor estão em toda a parte. A chave está precisamente naquilo que tu disseste. Nós podemos falar tanto de teologia, muito... coisas boas, falar acerca de Deus... mas o caminho consiste em ser capaz de contemplar Jesus Cristo, em ler o Evangelho, aquilo que fez Jesus Cristo: Ele é o Senhor! Apaixonar-te por Jesus Cristo e pedir a Jesus Cristo que te escolha para o seguir, para ser como Ele. E isto faz-se mediante a oração, mas também tocando as chagas do Senhor. Nunca conhecerás Jesus Cristo, se não tocares as suas chagas, as suas feridas. Ele foi ferido por nós. Este é o caminho, a senda que a espiritualidade inaciana oferece a todos nós: o caminho... E vou inclusive um pouco além: tu és formador de futuros sacerdotes. Por favor, se vires um jovem inteligente, bom, mas que não tem esta experiência de tocar o Senhor, de abraçar o Senhor, de amar o Senhor ferido, aconselha-o a partir, a tirar umas boas férias de um ou dois anos... e isto far-lhe-á bem. «Mas, Padre, nós somos poucos sacerdotes: temos necessidade de presbíteros...». Por favor, que a ilusão da quantidade não nos engane, levando-nos a perder de vista a qualidade! Precisamos de sacerdotes que rezem. Mas que orem a Jesus Cristo, que desafiem Jesus Cristo a favor do seu povo, como Moisés que teve o atrevimento de desafiar Deus e salvar o povo que Deus queria destruir, com aquela intrepidez demonstrada diante de Deus; presbíteros que tenham inclusive a coragem de sofrer, de suportar a solidão e de oferecer um grande amor. Também para eles é válido o discurso de Bernardo sobre as chagas do Senhor. Entendeste? Obrigado!

Gianni perguntou que discernimento pode derivar da espiritualidade inaciana, como ajuda para manter viva a relação entre a fé em Jesus Cristo e a responsabilidade para agir sempre em prol da construção de uma sociedade mais justa e solidária.

Papa Francisco:

A meu ver, a esta pergunta que tu me dirigiste responderia muito melhor do que eu o padre Bartolomeo Sorge — não sei se ele está aqui; não, não o vi... — Ele era muito hábil! É um jesuíta que abriu o caminho neste campo da política. Mas ouve-se dizer: «Nós devemos fundar um partido católico!». O caminho não é este. A Igreja é a comunidade dos cristãos que adora o Pai, que percorre a senda do Filho e recebe o dom do Espírito Santo. Não se trata de um partido político. «Não, não digamos partido, mas... um partido somente dos católicos». Não é útil e não terá a capacidade de envolvimento, porque fará o que não foi chamado a fazer. «Mas o católico pode fazer política?» — «Deve!» — «Mas o católico pode intrometer-se na política?» — «Deve!». Se não me engano, o beato Paulo vi afirmou que a política é uma das formas mais elevadas da caridade, porque procura o bem comum. «Mas Padre, não é fácil fazer política porque, neste mundo corrupto... no fim não se consegue ir em frente...». O que queres dizer-me, que fazer política é um pouco como um martírio? Sim! Sim, é uma espécie de martírio! Mas trata-se de um martírio quotidiano: promover o bem comum, sem te deixares corromper. Buscar o bem comum, pensando nos modos mais úteis para isto, nos instrumentos mais profícuos. Procurar o bem comum, trabalhando nas realidades de menor importância, que contam pouco... mas é preciso fazê-lo. É importante fazer política: a política pequena e a política grande. Na Igreja há muitos católicos que promoveram uma política não suja, mas boa; favorecendo também a paz entre as nações. Pensai nos católicos, aqui na Itália do pós-guerra: pensai em De Gasperi. Pensai na França: em Schumann, cuja causa de beatificação está em andamento. É possível tornar-se santo, fazendo política. E não quero mencionar outros nomes: são válidos estes dois exemplos, para quantos quiserem ir em frente no caminho do bem comum. Fazer política é um martírio: trata-se verdadeiramente de um trabalho para mártires, porque é necessário ter sempre, todos os dias, o ideal de construir o bem comum. É preciso também carregar a cruz de muitos fracassos, e inclusive suportar a cruz de numerosos pecados, porque no mundo é difícil praticar o bem no meio da sociedade, sem sujar um pouco as próprias mãos ou até o coração; mas deves pedir perdão por isto, pedir perdão e dar continuidade à obra. Mas que isto não te desanime! «Não, Padre, não faço política porque não quero pecar!» — «Mas assim não praticas o bem! Vai em frente, pede ao Senhor que te ajude a não pecar; contudo, se te sujares as mãos, pede perdão e vai em frente!». Mas continua, continua...

E lutar por uma sociedade mais justa e solidária. Qual é a solução que, hoje, este mundo globalizado nos oferece para a política? É simples: no centro, o dinheiro. Não o homem e a mulher, não, mas o dinheiro. O deus dinheiro. É ele que está no centro. Todos ao serviço do deus dinheiro. Mas para isto, descarta-se o que não é útil para o deus dinheiro. E o que o mundo globalizado hoje nos oferece é a cultura do descartável: descarta-se aquilo que não é útil. Descartam-se as crianças, porque já não se fazem crianças ou porque se matam as crianças antes do nascimento. Descartam-se os idosos, porque... não são úteis... Mas agora que há falta de trabalho, vai-se à procura dos avós, para receber ajuda da sua pensão! Mas eles são úteis só momentaneamente. Os idosos são descartados, até abandonados. E agora o trabalho deve diminuir, porque o deus dinheiro não pode fazer tudo, e assim descartam-se também os jovens: aqui na Itália, dos jovens com menos de 25 anos — não quero errar, corrige-me — 40-41 por cento estão desempregados. Descarta-se... Mas este é o caminho da destruição. Eu, católico, olho da varanda? Não se pode olhar da varanda. Intromete-te! Dá o melhor de ti! Se o Senhor te chama para aquela vocação, vai em frente, faz política! Far-te-á sofrer, talvez te leve a pecar, mas o Senhor está contigo. Pede perdão e vai em frente. Mas não deixemos que esta cultura do descartável nos descarte todos! Descarta até a criação, porque a criação é destruída cada vez mais. Não nos esqueçamos daquela palavra do beato Paulo vi: a política é uma das formas mais elevadas da caridade. Não sei se respondi...

Eu tinha escrito um discurso... talvez tedioso, como todos os discursos; e entregar-vo-lo-ei, mas preferi este diálogo...

[Em seguida, juntamente com toda a assembleia, o Papa Francisco recitou uma oração a Nossa Senhora da Estrada.]

E por favor, não vos esqueçais de rezar por mim. Obrigado!

 


DISCURSO PREPARADO PELO SANTO PADRE

 

Queridos irmãos e irmãs

Saúdo-vos todos, vós que representais a Comunidade de Vida Cristã na Itália, e os representantes dos vários grupos de espiritualidade inaciana, próximos da vossa tradição formativa e comprometidos na evangelização e na promoção humana. Dirijo uma saudação particular aos alunos e ex-alunos do Instituto «Massimo» de Roma, assim como às representações de outras escolas geridas pelos Jesuítas na Itália.

Conheço bem a vossa Associação, porque eu era assistente nacional na Argentina, no final dos anos setenta. As vossas raízes afundam nas Congregações marianas, que remontam à primeira geração dos companheiros de santo Inácio de Loyola. Trata-se de um longo percurso no qual a Associação se distinguiu no mundo inteiro pela intensa vida espiritual e pelo zelo apostólico dos seus membros, e antecipando sob certos pontos de vista os preceitos do Concílio Vaticano II acerca do papel e do serviço dos fiéis leigos na Igreja. Foi no sulco desta perspectiva que escolhestes o tema do vosso Congresso, que tem como título: «Além dos muros».

Hoje, gostaria de vos oferecer algumas indicações para o vosso caminho espiritual e comunitário.

A primeira: o compromisso para propagar a cultura da justiça e da paz. Diante da cultura da ilegalidade, da corrupção e do desencontro, vós sois chamados a dedicar-vos ao bem comum, inclusive através daquele serviço ao povo, que se identifica na política. Como afirmava o beato Paulo VI, ela «é a forma mais alta e exigente da caridade». Se os cristãos se desinteressassem do compromisso directo no campo da política, seria como se atraiçoassem a missão dos fiéis leigos, chamados a ser sal e luz do mundo, também através desta modalidade de presença.

Como segunda prioridade apostólica, indico-vos a pastoral familiar, na senda dos aprofundamentos do último Sínodo dos Bispos. Encorajo-vos a ajudar as comunidades diocesanas na atenção à família, célula vital da sociedade, e no acompanhamento dos noivos até ao matrimónio. Ao mesmo tempo, podeis colaborar para a recepção dos chamados «distantes»: entre eles encontram-se não poucos separados, que sofrem por causa do fracasso do seu programa de vida conjugal, como também devido a outras situações de dificuldade familiar, que podem tornar cansativo até o seu caminho de fé e de vida na Igreja.

A terceira indicação que vos sugiro é a missionariedade. Foi com prazer que recebi a notícia do início do vosso caminho comum com a Liga Missionária de Estudantes, que vos lançou pelas veredas do mundo, ao encontro dos mais pobres e das comunidades que mais têm necessidade de agentes no campo da pastoral. Animo-vos a manter esta capacidade de sair e de partir rumo às fronteiras da humanidade mais necessitada. Hoje convidastes delegações de membros das vossas comunidades presentes nos países das vossas geminações, de modo especial na Síria e no Líbano: povos martirizados por guerras terríveis; a eles renovo o meu carinho e a minha solidariedade. Estas populações continuam a experimentar a hora da cruz; por isso, façamos com que sintam o amor, a proximidade e o apoio da Igreja inteira. O vosso vínculo solidário com elas confirme a vossa vocação a lançar pontes de paz em toda a parte.

O vosso estilo de fraternidade, que vos compromete também em programas de hospitalidade aos migrantes na Sicília, vos torne generosos na educação dos jovens, tanto no interior da vossa Associação como no âmbito das escolas. Santo Inácio entendeu que para renovar a sociedade era necessário começar pelos jovens, e assim estimulou a abertura de colégios. E neles nasceram as primeiras Congregações marianas. No sulco luminoso e fecundo deste estilo apostólico, também vós podeis trabalhar na animação das várias instituições educativas, católicas e estatais, presentes na Itália, assim como já acontece em muitas regiões do mundo. Na base deste vosso trabalho pastoral haja sempre a alegria do testemunho evangélico, juntamente com a delicadeza da proximidade e do respeito pelo próximo.

A Virgem Maria, que com o seu «sim» inspirou os vossos fundadores, vos permita responder de modo incondicional à vocação de ser «luz e sal» nos ambientes onde viveis e trabalhais. Que vos acompanhe também a minha Bênção, que do íntimo do coração vos concedo a todos, bem como aos vossos familiares. E por favor, não vos esqueçais de rezar por mim!

 



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