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VISITA PASTORAL A PALESTRINA - ITÁLIA
(18 DE AGOSTO DE 1983)

SANTA MISSA NA CATEDRAL DE SANTO AGAPITO

HOMILIA DO PAPA JOÃO PAULO II

Quinta-feira, 18 de Agosto de 1983

 

1. "Se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, ficará só; mas se morrer, dará muito fruto" (Jo. 12. 24).

Com esta afirmação sublinhada pelas autorizadas palavras: "Em verdade, em verdade vos digo", Jesus anuncia um irrenunciável postulado do Evangelho: a vida, cada vida, mas de modo especial aquela do Espírito, aquela que tem em Deus a sua fonte e o seu centro, aquela que Cristo veio dar-nos, promana da doação de si mesmo, e exige sempre empenho, sofrimento, sacrifício, também até ao supremo heroísmo.

É sobre esta realidade do mistério cristão que entendo reflectir convosco, na solenidade do vosso Padroeiro, Santo Agapito, cujo túmulo, desde os primeiros séculos do cristianismo, constituiu um ponto de constante referência da Comunidade cristã da Palestrina.

2. Grande é a minha alegria de me encontrar convosco e sobretudo de poder celebrar convosco e para vós o Sacrifício da Santa Missa. É esta uma visita esperada, pensada há tempo e que desejei vivamente realizar para suster e confortar a vossa vida cristã, o vosso testemunho na sociedade presente. De coração dou graças ao Senhor por esta ocasião de ministério pastoral e agradeço a todos vós o vosso acolhimento e a vossa devoção. Apresento, portanto, a todos a minha saudação que nasce do profundo amor que em Cristo sinto por vós.

Apraz-me dirigir-me, antes de mais, com pensamento deferente e cordial, ao Senhor Cardeal Carlo Confalonieri, agraciado com o Titulo desta gloriosa Diocese Suburbicária, Decano do Sacro Colégio, partícipe há mais de dez anos na vida eclesial de Palestrina e que no mês passado atingiu a aspirada meta de serena e sapiencial longevidade: o nonagésimo aniversário. A Ele as minhas renovadas felicitações e os meus gratos sentimentos pelo tão grande trabalho realizado ao serviço da Igreja e da Sé Apostólica.

Saúdo depois o vosso zeloso Pastor, Mons. Renato Spallanzani, que há anos dedica a sua generosa actividade ao bem espiritual e social da Diocese. Renovo a saudação às Autoridades civis, e dirijo um particular pensamento ao Clero, aos Religiosos e às Religiosas, assegurando a todos vós o meu afecto e a minha proximidade no Senhor, desejando a cada um a plenitude de todas as graças e uma vida rica de bênção do Alto.

3. "Se o grão de trigo... morrer, dará muito fruto" (Jo. 12, 24); "... quem neste mundo odeia a sua vida, guardá-la-á para a vida eterna" (Ibid v. 25). A vida cristã, caros Irmãos e Irmãs, desenvolve-se segundo o plano da vida mesma de Jesus nesta terra, do seu mistério de Morte e de Ressurreição: "Se alguém Me quer servir, siga-Me; e onde Eu estiver, estará ali também o Meu servo" (ibid. v. 26). Ele, Redentor do homem, de cada um de nós, ofereceu a sua vida em holocausto ao Pai para que deste acto supremo de amor brotasse a vida nova para todos, isto é, a vida de Deus, a vida segundo o Espírito. A Redenção do homem é obra de sofrimento e de amor; a Redenção no homem não se realiza sem pessoal participação no sofrimento e no amor de Cristo.

Lendo, com efeito, os trechos da Liturgia de hoje, ficamos impressionados com a exigente serenidade da Palavra de Deus, que faz referência a sofrimentos, a perseguição e a martírio, sublinhando que o grão de trigo para poder dar fruto deve cair na terra e morrer.

Na verdade, sabemos bem — e disto cada dia fazemos experiência — como o sofrimento é uma trágica herança da humanidade inteira, da vida de cada homem, e como ele acompanha e quase impregna com todas as suas formas o inteiro desenrolar da história.

Mas o verdadeiro problema não diz respeito ao sofrimento mesmo inevitável companheiro do caminho humano, mas antes ao comportamento diante dele, à sua finalidade e valor. Afirma, com efeito, S. Pedro no trecho da Epístola que escutámos, que se pode sofrer também "por ser homicida ou ladrão, ou malfeitor ou delator" (1 Ped. 4, 15). Sofrimento este bem triste! Mas, o essencial é sofrer como cristãos: "Se alguém sofre, como cristão, não se envergonhe, antes glorifique a Deus por esse nome" (ibid. 16), afirma ainda o Apóstolo.

Existem sofrimentos inerentes ao empenho da vida quotidiana, mas outros estão ligados directamente ao próprio testemunho de fé, como a solidão, a segregação, a perseguição, a luta contra todos os tipos de tentação, e além disso o sacrifício pela aquisição e o exercício das virtudes humanas e cristãs, como a inocência, o pudor, a paciência, o perdão, a caridade. Qual deverá ser então a atitude do cristão perante tais sofrimentos?

Eis a resposta sempre actual do Apóstolo Pedro: "Na medida em que participais no sofrimento de Cristo, podereis alegrar e exultar no dia em que for manifestada a sua glória" (ibid. 13). Aliás, o cristão não está só nesta luta, que supera as forças humanas, e somente a graça divina permite sustê-la, pelo que é necessário sem cessar e com confiança recorrer a ela. Escutámos o Livro da Sabedoria afirmar que: "as almas dos justos estão nas mãos de Deus" (Sáb. 3, 1); a estas palavras correspondem aquelas de S. Pedro: "Aqueles que sofrem segundo a vontade de Deus, encomendem as suas almas ao Criador fiel, praticando o bem" (ibid. 19).

Quando a dor tormenta a nossa vida, quando o ser discípulo de Cristo custa muito e a cruz se torna pesada aos ombros, é preciso estarmos conscientes que o amor atinge a sua mais alta expressão na dor, no sacrifício e na doação de si mesmos. As almas se salvam no Calvário. Cada um de nós deve aceitar ser o grão de trigo, talvez desconhecido e humilde que, semeado no lugar do seu trabalho e da sua onerosa responsabilidade, se desagrega numa oferenda dolorosa e alegre de amor, para realizar com Cristo a obra misteriosa mas real da Redenção da humanidade.

Neste contexto de intensa espiritualidade, encontrando-nos unidos ao redor do Altar do Sacrifício Eucarístico, no qual se imolará a Vitima divina, desejo dirigir um particular e afectuoso pensamento àqueles que sofrem nesta Cidade, nesta Diocese — qualquer que seja o seu motivo — aos doentes, aos desempregados, aos desalentados e também àqueles que se encontram talvez sem fé e sem esperança, para lhes assegurar a minha constante oração por eles, a fim de que o Senhor dê a todos a luz da sua Palavra, o seu auxilio, o seu conforto.

4. A Palavra divina ressoa sem dúvida transtornante para uma mentalidade hedonista, imbuída de superficialidade e de egoísmo, bem como para tantas ideologias que prescindem da fé em Deus e, portanto, da responsabilidade que os nossos actos assumem para a eternidade. Todavia, a Palavra de Deus permanece a única verdadeira, ainda que frequentemente desconcertante e exigente, enquanto tudo passa e se dissolve, não trazendo consigo o sigilo da autenticidade e o fundamento estável da verdade.

Para adquirir de maneira duradoura uma tal mentalidade cristã a respeito dos problemas tão vitais, é necessário conhecer a Palavra de Deus, é necessário aprofundá-la mediante uma catequese contínua, inteligente, sustentada pelo empenho de todos os membros da Comunidade cristã, como muitas vezes o vosso Bispo tem recomendado, delineando para tanto precisos programas pastorais.

Desde os primeiros tempos da era cristã, Palestrina, já ilustre por gloriosos feitos, seguiu a mensagem evangélica, como bem o testemunha o martírio de Santo Agapito, jovem esclarecido e heróico. Tais fundamentos cristãos, que resistiram nos séculos a tantas atribuladas vicissitudes, devem ser para vós uma glória e ao mesmo tempo também um empenho e uma responsabilidade: vós sois chamados a manter, a transmitir e a defender com alegria e convicção a vossa fé cristã, conscientes de que só ela é verdadeiramente luz para as inteligências, vigor para a vontade, conforto para os corações e salvação total do homem. O mártir Santo Agapito, que pela fidelidade à mensagem de Cristo ofereceu com amor e coragem a sua vida, vos ajude e ilumine sempre.

5. Confio a recordação desta minha Visita Pastoral à vossa amada e nobre Cidade, no Ano Jubilar da Redenção, a um versículo do salmo responsorial que recitámos: "Tenho fé em Vós, ó Senhor; exultarei de alegria pela vossa graça".

Caríssimos, fazei que permaneça em vós sempre viva e fecunda a vossa fé, a fim de que a graça do Senhor vos alegre e conforte sempre. Hoje, a sociedade moderna, e sobretudo a Igreja têm necessidade de cristãos fervorosos e esclarecidos, "provados como ouro no cadinho" (Sab. 3, 6), grãos de trigo caídos na terra para darem muito fruto!

A Virgem Santíssima, por vós tanto amada, venerada e suplicada no Santuário de Genazzano sob o título de "Nossa Senhora do Bom Conselho", vos proteja sempre e faça descer sobre vós as consolações do Céu.


Saudação aos fiéis no final da Santa Missa

Caros Irmãos e Irmãs, da cidade, da diocese de Palestrina, agradeço muitíssimo as palavras pronunciadas pelo jovem ao término desta celebração, antes da bênção conclusiva.

Quero dar graças ao Senhor pelo dom que me concedeu de estar hoje aqui convosco em Palestrina; de consolidar o vínculo secular com esta Igreja suburbicária, estreitamente ligada à única Igreja de Roma.

Desejo juntamente convosco agradecer ter podido entrar na comunhão dos santos num "lugar" específico, diria carismático, da vossa cidade e da vossa Igreja. Este lugar chama-se Santo Agapito. Com a bênção conclusiva chega o momento de retornar à nossa vida quotidiana. Este "lugar", cada um de nós deve levá-lo a esta vida, porque ele significa plena participação, verdadeira participação espiritual, nesta realidade espiritual e sobrenatural que é a Eucaristia.

Caríssimos: ele era um jovem, chamava-se Agapito e deu o testemunho a Cristo com a sua vida e com a sua morte. E então, qual será o fruto para nós? Que devemos levar às nossas casas? Devemos dar testemunho a Cristo, porque somos chamados, nós todos — cristãos, na comunhão eucarística — somos chamados a viver este testemunho e a levá-lo. Este testemunho prestado a Cristo dá à nossa vida um carácter claro, um carácter profundo, cristão e humano.

Eis o que nos trouxe Cristo na celebração eucarística mediante o seu mártir e o Padroeiro da vossa comunidade.

Caríssimos, a bênção conclusiva deve quase encerrar, coroar a vossa participação. Deve conservar em nós os frutos espirituais desta participação. E agora, ao conceder na liturgia da Santa Missa a bênção final, peço ao Senhor que estes frutos sejam maturados na vossa vida, na vida da Igreja. E assim Jesus esteja sempre presente e vivo, n'Ele esteja também presente e vivo aquele que Lhe deu testemunho, o seu mártir Santo Agapito.

Amém.

 



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