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VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA JOÃO PAULO II
 A CABO VERDE, GUINÉ-BISSAU, MALI E BURKINA FASO

[25 DE JANEIRO - 1º DE FEVEREIRO]

MENSAGEM DO SANTO PADRE
PARA O «DIA MUNDIAL CONTRA O FLAGELO DA LEPRA»

Cumura, Guiné-Bissau
Domingo29 de janeiro de 1990

 

Amados irmãos e irmãs em Cristo,

1. A celebração anual do Dia Mundial contra o flagelo da lepra leva todos os homens de boa vontade e, em modo particular, os que se dizem cristãos, à reflexão sobre o dever da uma acção urgente e eficaz, para debelar essa gravíssima enfermidade que, nos dias de hoje, ainda atinge milhões de seres humanos. Estes, à condição de doentes, juntam, quase sempre, a de uma existência marcada pela pobreza, pela insuficiente assistência sanitária, pela marginalização e pelo abandono.

O Evangelho lembra-nos, referindo-se ao Profeta Isaías (Cfr. Is 35, 5), como, graças à actuação de Jesus, os cegos viam, os surdos ouviam e os leprosos eram limpos (Mt 11, 5). Os Apóstolos, por sua vez, tinham consciência de que cumpriam uma ordem explícita do Mestre, quando, nas suas peregrinações missionárias, se dedicavam à assistência e à cura dos leprosos (Cfr. Mt 10, 8).

A Igreja, que, durante toda a sua história, sempre considerou a solicitude para com os que sofrem como parte integrante da própria missão, há séculos que se tornou activa em primeira pessoa, quer na assistência àqueles que são vítimas da lepra, em todas as partes do mundo, quer na criação de condições capazes de preservar contra os riscos deste temível contágio.

2. De entre as iniciativas que associam a evangelização à promoção humana, a devida atenção e o cuidado para com os atingidos pela lepra podem considerar-se, ainda hoje, prioritários. Neste Dia especial, quero recordar os pastores, os sacerdotes, os religiosos, as religiosas, os leigos consagrados e o considerável grupo de voluntários, que, nas áreas mais difíceis, e muitas vezes, em situações de verdadeira emergência, fizeram a escolha de ficar junto dos doentes da lepra, assisti-los e favorecer condições mais humanas de vida nos leprosários, empenhando-se numa actividade sanitária tendente a conter e a delimitar a propagação desta doença endémica.

Ao lembrar todos estes, não posso esquecer a contribuição das Comunidades eclesiais dos países do mundo não atingidos por este flagelo: elas dão prova de se aperceberem cada vez mais das dimensões e da gravidade do problema; e, com generosidade exemplar, apoiam iniciativas públicas e privadas, instituições e organizações especificamente empenhadas no combate à lepra. Graças a esta prova tangível de solidariedade e de caridade cristã, foi possível limitar, de forma decisiva, a difusão do contágio, mesmo nas áreas de maior risco, de tal modo que agora, já há bases para se prever, ao menos em perspectiva, a possibilidade de uma derrota definitiva desta doença.

Não há problemas de um país que, hoje em dia, não envolvam a responsabilidade de todos os demais. Isto é válido também pelo que respeita a esta doença. O Dia Mundial de hoje tem a finalidade, antes de mais, de lembrar que não se agirá com pleno êxito em favor da saúde de um Povo, se não houver, ao mesmo tempo, um empenhamento pela saúde de todos. Também perante o problema dos leprosos, cujas imagens, de pessoas deformadas, num mundo marcado pela extensão e rapidez das comunicações, são apresentadas aos olhos de todos, a solidariedade internacional constitui a primeira e mais urgente resposta. Por outro lado, os índices numéricos do alastramento da doença, quando comparados com a módica quantidade dos recursos necessários para a sua definitiva extirpação, não podem deixar de considerar-se como um escândalo para toda a comunidade internacional.

3. Portanto, é urgente despertar a sensibilidade de cada pessoa e das instituições públicas em relação a este problema. Com efeito “ as instituições são muito importantes e indispensáveis; todavia, nenhuma instituição pode, por si só substituir o coração humano e a iniciativa humana, quando se trata de ir ao encontro do sofrimento de alguém. Isto tem aplicação quanto aos sofrimentos físicos; mas tem ainda mais cabimento quando se trata dos multiformes sofrimentos morais e, primeiro que tudo, quando é a alma que está a sofrer ” (Salvifici Doloris, 29). È importante, pois, dar-se bem conta do sofrimento em toda a sua dimensão física, moral e espiritual, causado pela lepra, nos milhões de pessoas que dela são vítimas.

Na antiga tradição bíblica, a cura da lepra anda constantemente associada à ideia de purificação, como que a querer lembrar-nos: a humanidade, para ser totalmente limpa desta doença, tem de purificar-se das múltiplas formas de egoísmo e de indiferença pelo sofrimento alheio, que deturpam o espírito. Quando o coração de cada um se abrir com maior generosidade às necessidades dos irmãos, abreviar-se-ão, certamente, os tempos para a cura definitiva também desta enfermidade. Sim, o extraordinário progresso da ciência e da técnica, se for posto sem reservas ao serviço do homem, será instrumento, mediante os dons divinos da inteligência e da graça, da força curativa de Jesus, médico das almas e dos corpos.

4. Neste dia de reflexão, de oração e de renovado empenho, o meu pensamento dirige-se, com profundo afecto, a todos aqueles que, nas diversas partes do mundo, vivem na própria carne o drama da lepra. Vêm-nos à mente as palavras que o leproso dirigiu ao Senhor Jesus: “ Se queres, podes curar-me ”; e a resposta consoladora do mesmo Jesus: “ Sim, eu quero, sê curado!  (Cfr. Mc 1, 40-41)”.

Amados irmãos que sofreis desta dolorosa enfermidade, perseverai na vossa oração ao Senhor, e nunca se apague a vossa esperança! Do tesouro precioso do vosso sofrimento brota, se souberdes aceitá-lo com abandono confiante em Deus e com esperança na Virgem Mãe, uma nascente de graça para a Igreja e para a humanidade. Assim vós saibais encontrar “ no amor... o sentido salvífico do vosso padecimento e respostas válidas para todas as vossas interrogações ” (Salvifici Doloris, 31).

Àqueles que, de várias formas, se encontram ao serviço dos doentes da lepra, chegue o devido reconhecimento de toda a Igreja, a qual, graças também à sua acção orgânica e vasta, se apercebe ainda mais da incumbência que tem de solicitar providências mais amplas e eficazes. A acção pastoral da Igreja no campo da sanidade e da saúde, como já várias vezes tenho repetido, coloca-se sob o signo da esperança, uma vez que, ao prestar assistência ao homem que sofre no corpo, ela se esforça por consolá-lo e dar esperança ao seu espírito.

Constitua, portanto, o “ Dia Mundial dos Doentes de Lepra ”, uma ocasião para todos, de oração e de renovado empenhamento concreto. Cada vitória sobre os males físicos é também uma vitória do espírito, pois é conseguida com o esforço da mente, a dedicação da vontade e a participação solícita do coração. Neste “ Dia ”, de bom grado invoco sobre todos os que padecem esta doença, sobre os agentes no campo da saúde, sobre a multidão anónima dos que estão ao serviço dos leprosos, e sobre as instituições e organizações empenhadas no combate à lepra, a especial bênção de Deus e a protecção de Maria, Aquela que, em Cristo seu Filho, olha para cada um com coração de Mãe.

Bissau, 28 de Janeiro de 1990.

IOANNES PAULUS PP. II

 



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