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DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II
AOS BISPOS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL
 DA ESCANDINÁVIA EM VISITA
"AD LIMINA APOSTOLORUM"

19 de Abril de 1997

 

Caros Irmãos no Episcopado!

1. É com grande alegria que dou as boas-vindas à «casa de Pedro» a vós que sois encarregados, na Escandinávia, da pastoral do povo de Deus. A visita «ad Limina» traz-vos para junto dos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo, a fim de revigorar a consciência da vossa responsabilidade de sucessores dos Apóstolos, e de confirmar a vossa comunhão com o Bispo de Roma de modo ainda mais intenso. Com efeito, as visitas «ad Limina » têm um significado particular na vida da Igreja: «constituem como que o ápice das relações dos Pastores de cada Igreja particular com o Romano Pontífice » (Pastor bonus, 29). Agradeço de coração ao Bispo de Helsínquia e Presidente da vossa Conferência Episcopal, D. Paul Verschuren, as comoventes palavras que me dirigiu em nome de todos vós. Elas expressaram não só informações, mas também a unidade e a fidelidade que unem o «extremo Norte» a Roma.

É viva em mim a recordação dos diversos encontros que, juntamente convosco, tive com os vossos fiéis. Penso na minha visita pastoral em 1989, assim como no sexcentésimo aniversário da beatificação de Brígida da Suécia, evento que, dois anos mais tarde, vos ofereceu a oportunidade de realizar uma peregrinação a Roma, «centrum unitatis» (Cipriano, De unitate, n. 7), o centro da unidade. Por ocasião da vossa última visita «ad Limina», que se realizou há cinco anos, reflectimos juntos sobre o mandato e as tarefas conexas com o vosso múnus episcopal. Hoje, convido-vos a retomar as reflexões de então e a continuá-las, a partir do ponto de vista da ideia e da realidade da Igreja, tal como a viveis na Dinamarca, na Finlândia, na Islândia, na Noruega e na Suécia, como contribuís para a edificar enquanto «servos de Cristo» (cf. Rom. 1, 1) e como a guiais «como modelos para o rebanho» (1 Ped. 5, 3). Os dias que transcorreis em Roma  servirão não apenas  para um debate, mas serão também ocasião de peregrinação e profissão de fé: profissão da Igreja, fundada por Jesus Cristo sobre  Pedro, a pedra,  «o  perpétuo e visível  princípio e fundamento  da unidade da multidão dos fiéis» (Lumen gentium, 23).

2. Eu creio numa Igreja. No «Credo» fazemos profissão de crer numa Igreja, mas não dizemos que cremos na Igreja, para não confundirmos Deus e a sua Igreja, mas fazemos claramente remontar à bondade de Deus todos os dons que Ele concedeu à sua Igreja (cf. Catecismo da Igreja Católica, nn. 1, 10 e 22). Por isso, a nossa profissão em relação à Igreja depende do artigo de fé no Espírito Santo. Como diz um Padre, a Igreja é o lugar em que «floresce o espírito » (Hipólito, Traditio apostolica, n. 35). Do mesmo modo, o Concílio Vaticano II afirma: «Cristo é a luz dos povos » (Lumen gentium, 1). A Igreja não se ilumina por si mesma. Não há outra se ilumina por si mesma. Não há outra luz senão a de Cristo. Por isso, pode ser comparada à lua, cuja luz é um reflexo do sol.

Caros Irmãos. Agradeço-vos porque, provistos dos dons do Espírito Santo, estais dispostos a levar a «luz de Cristo» àqueles Países em que a natureza com o seu jogo de luzes e de sombras, de sol e de lua, descreve a imagem usada pelo Concílio de modo expressivo e muitas vezes dramático.

Ainda que por vezes o vosso coração possa entristecer-se porque a luz de Cristo, não obstante todos os esforços, se acende pouco, encorajo-vos a não abandonar o vosso zelo, pois a luz de Cristo é mais forte do que a escuridão mais profunda. Da experiência pessoal obtida da minha visita pastoral, assim como da leitura dos vossos relatórios quinquenais, estou a par das muitas luzes que, juntamente com os vossos sacerdotes, diáconos, religiosos e inúmeras mulheres e homens empenhados, acendestes ao longo dos anos. Deste modo, as vossas Igrejas particulares, embora muitas vezes pequenas e pobres, ou dispersas ( cf. Lumen gentium, 26), reflectem as características expressas no «Credo».

3. Creio na Igreja una. Para vós o ecumenismo e a vida eclesial pertencem- se assim como os peixes pertencem à água. O diálogo interconfessional estende- se do âmbito privado ao nível dos guias eclesiais, e não só por palavras. É para mim uma alegria que na Suécia Santa Brígida seja honrada, ao mesmo tempo, quer pelos luteranos quer pelos católicos. Deveríeis considerar-vos verdadeiramente afortunados por esta «santa mulher ecuménica»! A sua vida e as suas obras constituem uma herança que vos irmana. «Senhor, mostrai-me a via e disponde-me a segui-la!». Esta invocação deriva duma sua oração, que ainda hoje é recitada na Suécia. Tudo aquilo a que esta «profetisa da época moderna» deu início, pode constituir o programa do movimento ecuménico. Permiti-me repetir aquilo que eu disse a 5 de Outubro de 1991, junto do túmulo de São Pedro, por ocasião do encontro de oração pela unidade dos cristãos: «O ecumenismo é uma viagem que se faz em conjunto e da qual, porém, não é possível fixar o percurso ou a duração. Não sabemos se o caminho é fácil ou difícil. Sabemos apenas que é nosso dever prosseguir juntos esta viagem» (L’Oss. Rom., ed. port. de 13/10/1991, pág. 2, n. 3).

Muito me alegram as múltiplas iniciativas que de maneira incansável promoveis nas vossas Igrejas particulares, a nível teológico, espiritual e litúrgico. Graças a elas, tornastes-vos interlocutores competentes e confiáveis para os representantes das outras Igrejas e Comunidades eclesiais. Prossegui com coragem e determinação este caminho de conhecimento e de aproximação recíprocos, com fidelidade «à verdade que recebemos dos Apóstolos e dos Padres» (Unitatis redintegratio, 24). A visão comum de Cristo é mais forte do que todas as divisões da História que, com a ajuda de Deus, é preciso superar com paciência. Como expliquei no dia 9 de Junho de 1989, por ocasião da solenidade ecuménica em Upsália, «nem tudo pode ser feito imediatamente, mas devemos fazer hoje aquilo que podemos, na esperança daquilo que será possível amanhã». Neste sentido trabalha hoje a Comissão mista para o diálogo entre luteranos e católicos, e isto faz-me esperar que, no futuro, possa ser alcançada «aquela plenitude com a qual o Senhor quer que cresça o Seu corpo no decurso dos séculos» (Unitatis redintegratio, 21). No limiar do Ano 2000 estão-me particularmente a peito dois aspectos: «É preciso continuar o diálogo sobre a doutrina, mas sobretudo dedicar-se à oração ecuménica » (cf. Tertio millennio adveniente, 34). A busca comum da verdade é tão importante quanto o testemunho comum; contudo, mais importante ainda é a adoração comum d’Aquele que «é a luz verdadeira, a que ilumina todo o homem » (Jo. 1, 9). Do espírito de adoração nasce o ecumenismo do testemunho, que hoje é mais urgente do que nunca (cf. Redemptoris missio, 50).

Depois o Credo diz:

4. Creio na Igreja santa. A Igreja é santificada através de Cristo, pois está unida a Ele. Apesar disto, existe uma diferença essencial entre Cristo e a sua Igreja. Enquanto Cristo é santo, pois não conheceu o pecado, no seio da Igreja vivem também pecadores. Por isso, tendes necessidade de uma constante purificação: «A Igreja é, pois, santa, embora compreendendo no seu seio pecadores, uma vez ela não possui outra via senão a da graça» (Paulo VI, Credo do Povo de Deus, n. 19). Nos vossos relatórios descrevestes de modo eficaz os obstáculos que a Igreja e os seus membros encontram na tentativa de satisfazer as exigências da santidade, numa época de agitações sociais.

Deveis testemunhar a Igreja santa nas sociedades pluralistas em que viveis. Ainda que se tornem cada vez mais teatro de embates dos vários estilos de vida, elas são ao mesmo tempo «areópagos » do diálogo entre Estado e Igreja (cf. Redemptoris missio, 37). Não só nas culturas plasmadas religiosamente, mas também nas sociedades seculares, muitas pessoas estão em busca da dimensão espiritual da vida, como meio de salvação contra a desumanização que experimentam quotidianamente. Este chamado fenómeno do «retorno à religião » não está isento de ambiguidades, mas contém também um apelo. A Igreja possui inestimáveis bens espirituais que deseja oferecer aos homens. Para poder exercer o seu mandato e promover um constante melhoramento das relações entre Estado e Igreja, esta última tem necessidade do pleno reconhecimento e da tutela dos direitos civis, que lhe competem enquanto comunidade. Somente assim a Igreja santa pode defender «o povo da vida e pela vida» e contribuir «para a renovação da sociedade, através da edificação do bem comum» (Evangelium vitae, 101).

A santidade dos membros da Igreja, por exemplo, é posta à dura prova no âmbito do respeito pela vida. O que já agora indicais nos vossos relatórios quinquenais, no futuro tornar-se-á para vós um grande desafio: a tutela da santidade da vida. Lá onde o fundamento cristão é progressivamente removido, a sociedade lesa-se a si mesma de maneira grave. Observamo-lo na gradual dissolução do casal como forma fundamental de convivência humana, à qual segue um mercantilismo da esfera sexual que já não é vista na sua dignidade pessoal, mas como meio de satisfação do desejo ou como própria «necessidade». Daí resulta, inevitavelmente, a luta entre os sexos e entre as gerações. Observamos o mesmo processo de dissolução na atitude para com os nascituros. Afirmar que se pode interromper uma gravidez porque a criança é deficiente, para poupar a ela mesma e aos outros o peso da existência, significa escarnecer de todos os deficientes! O que vale para o início, vale também e sobretudo para o final da vida humana. Ninguém é tão doente, idoso ou deficiente a ponto de consentir que outro homem se arrogue o direito de dispor da sua vida.

Por isso vos exorto, caros Irmãos, ao testemunho ecuménico da santidade da vida: isto significa não só respeitar o outro na diversidade, mas amar na convicção de que precisamos uns dos outros, que nos doamos reciprocamente, que vivemos uns para os outros e somos cristãos uns para os outros, para realizarmos juntos a «viragem cultural» numa sociedade marcada «pela dramática luta entre “a cultura da vida” e a “cultura da morte”» (Evangelium vitae, 95). Repito o meu «ardente apelo dirigido a cada um e a todos, em nome de Deus: respeita, defende, ama e serve a vida, cada vida humana!» (ibid., 5).

Para poder actuar de modo amplo é ao mesmo tempo urgentemente necessário «renovar a cultura da vida no seio das próprias comunidades cristãs» (cf. ibid., 95). Um relevo particular reveste a formação da consciência. Com efeito, a fé cristã desperta a consciência e funda a ética. É louvável que a vossa pastoral preste particular atenção à obra de formação. Nos anos passados pudestes publicar a tradução do Catecismo da Igreja Católica nas línguas norueguesa e sueca. Virão depois as traduções em dinamarquês e em finlandês. Apesar dos escassos meios financeiros não quereis renunciar também no futuro à administração de algumas escolas católicas. Considero particularmente digna de mérito a disponibilidade, por vós demonstrada, a unir-vos aos vossos sacerdotes e catequistas quando ministrais a vossa lição de fé e aceitais convites para ir às escolas. A respeito disso, desejo mencionar a obra generosa de muitas mulheres e de muitos homens que nas paróquias e, quando estas não são disponíveis, nas próprias casas oferecem uma «catequese domiciliar», para plantar no coração dos jovens a semente da fé e recuperar aquilo de que as escolas estatais privam as novas gerações. Uma família que transmite a Palavra de Deus torna-se uma «comunidade crente e evangelizadora» com uma «tarefa profética» (Familiaris consortio, 51). A sua casa é uma «pequenina igreja», uma «igreja doméstica» (Lumen gentium, 11).

5. Então, a força da nossa fé não se manifesta só com clamor, mas também no silêncio. Nas vossas Igrejas particulares inúmeras comunidades e institutos religiosos trabalham de modo incansável para a edificação do Reino de Deus. Enquanto por regra os ramos femininos seguem a tendência geral e apresentam problemas no que se refere aos novos rebentos, existem também plantas tenras que, ao contrário, dão muita esperança. Além da reconstrução de dois conventos beneditinos na Suécia, penso no «Carmelo mais setentrional do mundo », que foi fundado no dia 8 de Setembro de 1990 em Tromsø. Naquela época doze religiosas transferiram-se da Islândia para a Noruega setentrional. Nesse ínterim, o número das religiosas aumentou para vinte. Com o Carmelo manifestou- se um aspecto essencial da existência cristã: a vida contemplativa que confere prioridade à oração. Ancorado no seu centro, que é Jesus Cristo, o convento irradia a sua luz às comunidades paroquiais que o circundam. A agir sobre as pessoas de modo eficaz não são só os grandes títulos dos jornais, mas também esta discreta e ao mesmo tempo segura presença das religiosas, que constitui outro aspecto completamente diverso, mas não por isto menos missionário da «Igreja santa». Pois «é a santidade da Igreja a fonte secreta e a medida infalível da sua operosidade apostólica e do seu dinamismo missionário» (Christifideles laici, 17). Algo pequeno, como um grão de mostarda, pode conter em si as potencialidades de crescimento duma grande árvore. Nisto deveríamos repor a nossa esperança quando recitamos o «Credo»:

6. Creio na Igreja católica. A propósito do número de membros das vossas Igrejas particulares, exíguo em relação à população total, podereis às vezes ser tentados a pôr-vos o preocupante interrogativo: «somos talvez um pobre vermezinho  » (Is. 41, 14). Sobretudo, somos nós todos católicos no pleno sentido da palavra  Posso compartilhar estes sentimentos e estes pensamentos e dirijo-vos, caros Irmãos, uma exortação que Jesus dirigiu aos seus discípulos desencorajados: «Não temas, pequenino rebanho, porque aprouve ao vosso Pai dar-vos o Reino» (Lc. 12, 32). Com isto Ele queria fazer com que tivessem esperança não só no além, mas também no presente: «Pois o Reino de Deus está dentro de vós» (Lc. 17, 21). O Reino de Deus já está no meio de vós na Dinamarca, na Finlândia, na Islândia, na Noruega e na Suécia. Embora sob o ponto de vista exterior as vossas Igrejas particulares sejam muito dispersas e numericamente exíguas, nelas, através do vosso serviço episcopal, está presente Jesus Cristo. «A Igreja católica encontra-se lá onde está Cristo» (Inácio de Antioquia, Ad Smyrn. 8, 2). Ela possui «de forma plena e total os meios de salvação» (Ad gentes, 6): a justa e completa profissão de fé, que plasmou inteiramente a vida sacramental e o serviço santificado na sucessão apostólica. Neste sentido fundamental, a Igreja era católica já no dia de Pentecostes e permanecê-lo-á até ao dia em que Cristo, enquanto Cabeça do Corpo da Igreja, Se realizar inteiramente (cf. Ef. 1, 22-23). Reconheço com gratidão o vosso empenho pela Igreja católica na Escandinávia e, em particular, os vossos esforços ao serviço do anúncio e para administrar os sacramentos. Além disso, é íntegro o vosso zelo em ordem a visitar, juntamente com os vossos Pastores, comunidades paroquiais por vezes muito distantes e dispersas. Encorajo-vos a difundir entre os vossos fiéis a catolicidade através de encontros e manifestações, que ultrapassem os confins de cada paróquia. Com grande alegria tomei  conhecimento de que tendes intenção de organizar um «Katholikentag» para a Escandinávia inteira, por ocasião do Ano 2000. Com esta iniciativa desejais preparar para o Norte da Europa «uma grande primavera cristã, cuja aurora já se entrevê» (Redemptoris missio, 86).

Por fim, mostrais, juntamente com mulheres e homens generosos, que o vosso coração pulsa por um autêntico tempo católico, quando, daquele pouco que tendes à disposição para fins caritativos e pastorais, contribuís de modo solidário para promover projectos de missão. Não poderia passar em silêncio o vosso empenho em amar o próximo, seja em pequena ou em grande medida, o que não por último se repercute no facto de o nosso Irmão D. Kennecy já há anos ocupar o cargo de Presidentre da Cáritas europeia.

7. Permiti-me enfrentar um problema que muito me preocupa: referis-me que no domingo, nalgumas Catedrais, a Eucaristia é celebrada também em sete línguas diversas. Desse modo, por causa do movimento migratório e da sociedade multicultural, encontrais-vos diante de uma catolicidade que recorda o primeiro Pentecostes. Esta internacionalidade comporta, por um lado, um enriquecimento mas, por outro, representa também um perigo para a unidade e a identidade. As críticas e as rejeições experimentadas por pessoas de outros Países fomentam o ódio racial e levantam barreiras. Isto é negativo, em particular para os refugiados provenientes da Ásia e da América do Sul. «Não seja assim entre vós» (Mt. 20, 26). Mostrai aos sacerdotes e aos fiéis que vos estão confiados, com a vossa empatia e o vosso exemplo,  como  a  multiplicidade  de dons da graça pode ser uma fonte de enriquecimento «para utilidade comum» (1 Cor. 12, 7). «Pois, como em um só corpo temos muitos membros, e nem todos os membros têm a mesma função, assim nós, que somos muitos, constituímos um só corpo em Cristo, sendo individualmente membros uns dos outros » (Rom. 12, 4-5). Não é o número de fiéis que faz a catolicidade da Igreja, mas a força, que vem do Alto e se difunde. O pequeno grão de mostarda possui precisamente isto. Não tenhas medo, portanto, pequeno rebanho! Cuida sempre para que nenhum ladrão nem nenhum salteador entre no teu redil (cf. Jo. 10, 7-10). Por isso vos recomendo que estejais atentos «neste tempo em que seitas cristãs e paracristãs semeiam a confusão» (Redemptoris missio, 50) e constituem uma ameaça para a Igreja católica e para todas as comunidades eclesiais, com as quais ela mantém diálogo. «Onde for possível e segundo as circunstâncias locais, a resposta dos cristãos poderá ser também ecuménica » (ibidem). Isto compete em particular a vós, que recebestes o múnus apostólico.

8. Creio na Igreja apostólica. Através de vós, caros Irmãos, Cristo prossegue o seu mandato: «Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós» (Jo. 20, 21). Contudo, o múnus apostólico não tem autoridade «a não ser em união com o Romano Pontífice, sua cabeça » (Lumen gentium, 22). Muito me alegra o facto de os vínculos da nossa comunhão apostólica serem tão estreitos, e asseguro-vos a participação interior do Sucessor de Pedro. Ponho em relevo esta certeza, precisamente porque deduzo dos vossos relatórios que o múnus apostólico é necessário nas vossas Igrejas, como uma espécie de escolho à prova da maré.

 Também nos vossos Países aumentam os casos de divórcio civil. O problema pastoral dos divorciados novamente casados torna-se cada vez mais premente. Repito o que disse a 24 de Janeiro deste ano, por ocasião da Assembleia plenária do Pontifício Conselho para a Família: a eles não pode ser concedida nem a comunhão eucarística nem a reconciliação no sacramento da penitência, contudo, estas mulheres e estes homens devem saber que a Igreja os ama, que está junto deles e que sofre por causa da sua situação. Os divorciados novamente casados são e continuam a ser seus membros, uma vez que receberam o baptismo e conservaram a fé cristã (cf. Familiaris consortio, 84). Os Pastores são convidados a estar junto deles com amor solícito, de maneira que perseverem na oração e mantenham a confiança no amor paterno de Deus (cf. ibid.).

As Igrejas luteranas recentemente permitiram às mulheres assumir papéis de guias, entre os quais também o do Episcopado. Reafirmo com vigor que «a Igreja não tem absolutamente a faculdade de conferir a ordenação sacerdotal às mulheres,  e  que  esta  sentença  deve ser considerada como definitiva por todos os fiéis da Igreja» (Ordinatio sacerdotalis, 4).

9. No que se refere a todas estas questões, seríeis como «alguém que brada no deserto» (cf. Mc. 1, 3), se não houvessem mulheres e homens generosos que vos sustentam no esforço por introduzir os valores cristãos numa sociedade secularizada. Já o Concílio tinha reconhecido que a obra dos leigos é de tal modo necessária, «que sem ela o próprio apostolado dos Pastores não pode conseguir, na maior parte das vezes, todo o seu efeito» (Apostolicam actuositatem, 10). Isto, porém, não deve permanecer apenas um apelo feito com palavras bonitas. Uma passagem particularmente significativa da Exortação Apostólica Evangelii nuntiandi, do meu predecessor Paulo VI, merece ser recordada nesta ocasião: «Importa evangelizar — não de maneira decorativa, como que aplicando um verniz superficial, mas de maneira vital, em profundidade e isto até às suas raízes — a cultura e as culturas do homem, no sentido pleno e amplo que estes termos têm... A ruptura entre o Evangelho e a cultura é sem dúvida o drama da nossa época, como o foi também de outras épocas. Assim, importa envidar todos os esforços no sentido de uma generosa evangelização da cultura, ou mais exactamente das culturas» (Evangelii nuntiandi,, 20). Exorto-vos, homens e mulheres capazes de promover e de encorajar, a anunciar o Evangelho «por todas as estradas do mundo» (cf. Christifideles laici, 44). Uma importante estrada do mundo de hoje é a dos meios de comunicação social, no âmbito dos quais não deve faltar a voz da Igreja. Ainda que em todos os Países confiados à vossa solicitude pastoral existam publicações eclesiais, que informam os católicos acerca dos eventos na Diocese e no mundo, encorajo-vos a incorporar-vos ainda mais como sal, fermento e luz no âmbito dos meios de comunicação social. O mundo não tem necessidade de um vago sentimento religioso, mas da clareza daquela mensagem de «vida em abundância» (cf. Jo. 10, 10), que exige muito dos indivíduos, mas confere também sentido à sua existência e os torna dignos de ser homens. Não deis aos homens somente aquilo que desejam! Dai-lhes aquilo de que têm necessidade! Dedicar-se a esta tarefa significa exercer o serviço apostólico.

Caros Irmãos!  

10. Creio na Igreja una, santa, católica e apostólica. Reflectimos sobre o significado que esta profissão reveste para vós e para as vossas Igrejas particulares. O que seria desta Igreja sem os sacerdotes?  Entre vós não existe uma grave carência de sacerdotes, mas faltam forças autóctones. Por isso vos peço que tenhais particularmente a peito as novas gerações de sacerdotes, embora eu conheça os esforços que fizestes nos anos passados para conferir uma forma concreta às estruturas e aos processos de formação. O Colégio sueco em Roma, que acolhe estudantes provenientes de toda a Escandinávia, assim como a efectiva cooperação e o apoio financeiro que vos unem à Igreja na Alemanha, são uma base sobre a qual edificar. Mais do que as condições exteriores, devem funcionar os pressupostos interiores. Não somos capazes de criar vocações, mas podemos desejá-las.

Mais de três séculos separam-nos do naturalista, médico e Bispo Niels Stensen, que nasceu em Copenhaga e, na sua época, prestou o próprio trabalho como Vigário Apostólico nas missões do Norte. A partir de então a filosofia, a medicina e a teologia desenvolveram-se ulteriormente. A nós foi legada toda a responsabilidade de imprimir na vida a fé e a ética cristãs. Aquilo que o Bispo Niels Stensen escreveu outrora à Congregação da Propagação da Fé acerca do sucesso dos seus esforços, vale também hoje para nós: «Quanto menos a previsão humana esperar das coisas de Deus, tanto mais claramente se há-de manifestar, pouco a pouco, a Providência divina.  Nos  assuntos  apostólicos é preciso  comportar-se  de  modo apostólico  e  aproveitar  as  ocasiões  como se apresentam,  abandonando-se  ao sucesso da misericórdia divina» (Epistolae II, 809).

Deposito nas mãos de Deus as vossas múltiplas obras pastorais e as alegrias e os sofrimentos que os vossos sacerdotes, diáconos, religiosos, religiosas e leigos provam na sua vida de fé. Confio-vos, a vós e a todos aqueles de que vos ocupais, à intercessão de Maria, Mãe de Deus, que honramos também como Mãe da Igreja, e concedo a todos vós a minha Bênção Apostólica.

 

 

 



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