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  CONGREGAÇÃO PARA AS CAUSAS DOS SANTOS

REFLEXÕES TEOLÓGICO-PASTORAIS
DO CARDEAL JOSÉ SARAIVA MARTINS SOBRE
 A EXORTAÇÃO APOSTÓLICA DE JOÃO PAULO II
"ECCLESIA IN EUROPA"

 

Jesus Cristo fonte de esperança para a Europa

 

 
No dia 28 de Junho passado, vigília da Solenidade litúrgica dos Santos Pedro  e  Paulo,  João  Paulo  II  assinou  a Exortação  Apostólica  "Ecclesia  in  Europa"  sobre  Jesus  Cristo,  vivo  na sua Igreja, fonte de esperança para a Europa.

O importante documento, de rico conteúdo teológico-pastoral, é uma grande meditação sobre a Igreja no Continente europeu, à luz de quanto apareceu na última Assembleia sinodal que lhe foi dedicada (1-23 de Outubro de 1999). O texto contém um novo e premente convite a oferecer, com renovado impulso, aos homens e mulheres europeus, a mensagem libertadora do Evangelho, fonte inexaurível de genuína esperança; um novo e premente convite para enfrentar, com coragem evangélica, o fascinante desafio da nova evangelização do "velho" Continente, no início do terceiro milénio e num momento decisivo para o seu futuro.

1. A Europa e o anúncio do Evangelho

Não faltam certamente na Europa de hoje sinais positivos que abrem para a esperança. Aliás, eles são numerosos e encontram-se, seja no seio da Igreja seja na sociedade civil.

A nível eclesial recordamos, entre outros, sobretudo os seguintes, sublinhados pelos Padres sinodais:  a recuperação da liberdade da Igreja do Leste europeu, com as novas possibilidades pastorais que lhe foram abertas; a concentração da Igreja na sua missão espiritual e o seu compromisso de viver o primado da evangelização mesmo nas relações com as realidades humanas, para as transformar e levar até Deus; a consciência cada vez maior da missão própria de todos os baptizados, segundo os carismas e os deveres de cada um;  por  fim,  a  presença  cada  vez maior  da  mulher  nas  várias  estruturas e sectores da Comunidade cristã (cf. EiE, 11).

A nível social enumeramos entre os sinais positivos que caracterizam a Europa de hoje:  a crescente abertura dos povos uns aos outros, a queda progressiva dos muitos "muros" ou barreiras; a reconciliação entre as nações por longo tempo hostis, o alargamento do processo de união aos Países da Europa Central e Oriental; uma consciência europeia cada vez maior; uma sensibilidade crescente à dignidade da pessoa humana e seus direitos irrenunciáveis fundamentais; por fim, a procura de uma melhor qualidade de vida também a nível espiritual (cf. ibid., 12).

De qualquer modo, apesar dos mencionados sinais positivos, notam-se na Europa contemporânea também sinais negativos, lembrados também eles, por várias vezes, na sala sinodal. Entre esses, o Papa recorda "a crise da memória e heranças cristãs, acompanhada por uma espécie de agnosticismo prático e indiferentismo religioso, fazendo com que muitos europeus dêem a impressão de viver sem substrato espiritual e como herdeiros que delapidaram o património que lhes foi entregue pela história" (ibid., 7). Explicam-se assim as tentativas, a que se assiste, de excluírem do rosto da Europa a herança religiosa e a sua indelével alma cristã.

Recordamos também "a afirmação lenta e progressiva do secularismo" (ibid.) que pode levar a considerar os símbolos, mesmos os mais prestigiosos da presença cristã como "meros vestígios do passado".

Na base de tudo isso está "a tentativa de fazer prevalecer uma antropologia sem Deus e sem Cristo" (ibid., 9). Este tipo de antropologia, nos antípodas da bíblico-cristã, levou o homem a ocupar o lugar de Deus, com todas as graves consequências no campo filosófico e moral. Da negação de Deus, de facto, nasce "o niilismo no campo filosófico, do relativismo no campo gnoseológico e moral, do pragmatismo e também do hedonismo cínico na configuração da vida quotidiana" (ibid. 9). A cultura europeia aparece assim como uma "apostasia silenciosa" por parte do homem que vive como se Deus não existisse (ibid.; cf. Alocução no Angelus de 13 de Julho de 2003). Assim, observa o Papa, acontece que "paradoxalmente, o berço dos direitos humanos corre o risco de perder o seu fundamento, desvirtuado pelo relativismo e pelo utilitarismo" (ibid.). Tenha-se em conta, além disso, que em muitos Países europeus de tradição cristã é cada vez mais elevado o número de não-baptizados. Isto é devido a factores que caracterizam a sociedade de hoje:  a crescente presença de imigrados pertencentes a outras religiões, o facto de os pais católicos nem sempre baptizarem os seus filhos, e a dominação comunista nas nações europeias, onde impôs a sua ideologia ateia. No Continente europeu existem, portanto, "extensas áreas sociais e culturais, onde se torna necessária uma verdadeira e própria "missio ad gentes"" (ibid., 46; RM 37).

Este é o corajoso diagnóstico (cf. EiE, 46) que a Igreja faz da actual situação religiosa da Europa. Ele torna necessária e urgente uma nova e vigorosa evangelização do Continente, como foi repetidamente afirmado pelos Padres sinodais. O anúncio do Evangelho da esperança para a Europa de hoje tem de ser feito com determinação, zelo e coragem. Falando da nova evangelização, o actual Pontífice diz que "é necessário reacender em nós o zelo das origens, deixando-nos invadir pelo ardor da pregação apostólica que se seguiu ao Pentecostes. Devemos reviver em nós o sentimento ardente de Paulo, que o levava a exclamar:  "ai de mim se não evangelizar!" (1 Cor 9, 16)"; (Nmi, 40). É preciso, pois, encontrar o entusiasmo pentecostal do anúncio. É este o espírito que deve animar e acompanhar a Igreja ao anunciar, com novo vigor à Europa, aquele que o Evangelho marcou, fecundou e tornou grande a sua história.

2. Um anúncio centrado sobre a pessoa de Cristo

O anúncio do Evangelho, para ser autêntico deve ser sempre centrado sobre a Pessoa de Jesus Cristo. A absoluta centralidade de Cristo vem afirmada com clareza extrema pelo texto do documento pontifício:  "a pregação da Igreja, em todas as suas formas deve ser cada vez mais centrada sobre a pessoa de Jesus e orientar sempre mais para Ele" (ibid., 48).
Exprimindo-se assim o Papa não faz senão retomar, sublinhando-o, quanto por ele foi dito em Novo millennio ineunte. Falando da acção pastoral da Igreja nos alvores do terceiro milénio, Ele observa que, para responder aos desafios que a Igreja é chamada a enfrentar, não é necessário inventar nenhum novo "programa". E isto porque "o programa já existe:  é o mesmo de sempre, expresso no Evangelho e na Tradição viva. Concentra-se, em última análise, no próprio Cristo, que temos de conhecer, amar, imitar, para n'Ele viver a vida trinitária e com Ele transformar a história até à sua plenitude... É um programa que não muda com a variação dos tempos e das culturas, embora se tenha em conta o tempo e a cultura para um diálogo verdadeiro e uma comunhão eficaz. Este programa de sempre é o nosso programa para o terceiro milénio" (Nmi, 29). O Papa não poderia ser mais explícito e categórico acerca da centralidade de Cristo no anúncio do Evangelho. O Evangelho é Cristo. E Cristo é o Evangelho. O conteúdo das palavras é, de facto, a Palavra.
O Cristo do Evangelho, porém, deve ser representado na integridade ou totalidade, e não de maneira parcial, fragmentária. É o próprio Pontífice que adverte contra toda a deturpação da figura de Cristo, contra todo o modo unilateral de apresentar a sua Pessoa. "É preciso vigiar são as suas palavras para que seja apresentado na sua integridade" (EiE, 48).

Portanto, apresentar Cristo na sua integridade significa apresentá-Lo "não só como modelo ético, mas primariamente como o Filho de Deus", como a própria Palavra do Pai, feita tempo e história. Significa apresentá-Lo como o Cristo da Páscoa, como o Senhor morto e ressuscitado, pondo em evidência o inseparável laço entre a sua morte na cruz e a sua ressurreição. Significa apresentá-Lo "como o Salvador único e necessário de todos", recusando toda a tentativa de tornar relativa a universalidade da sua obra redentora. Significa, por fim, apresentá-Lo como Aquele que "vive e actua na sua Igreja", mediante a qual Ele continua, através dos séculos, a sua obra de salvação. A Igreja, de facto, não é outra coisa, no fundo, como comunidade de fé, de esperança e de amor, que o Corpo terrestre do Senhor Ressuscitado (cf. ibid., 48).

Diversos são os modos com que o anúncio de Cristo pode ser realizado. O documento detém-se, em particular, sobre o testemunho pessoal que é o anúncio mais eficaz de Cristo aos irmãos. "A Europa exige evangelizadores credíveis, cuja vida, em sintonia com a cruz e a ressureição de Cristo, irradie a beleza do Evangelho" (ibid., 49).

O Papa refere-se, a propósito, ao pensamento de Paulo VI, segundo o qual "o homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as testemunhas do que os mestres, ou então, se escuta os mestres, é porque eles são testemunhas" (EN, 41). Mais do que nas palavras, o homem de hoje acredita nas acções.  A  linguagem  do  testemunho é e  será  sempre,  a  mais  inteligível, mais incisiva e, por consequência, a mais eficaz.

Não basta, pois, que Jesus Cristo seja proclamado com a palavra e a celebração dos sacramentos; é necessário que Ele seja acolhido e vivido no dia-a-dia da vida. Cristo é anunciado, vivendo-O. Tornado "nova criatura", o baptizado deve viver e agir com tal. Seja a nível pessoal, seja comunitário. Sobre o seu rosto deve resplandecer o próprio rosto do Cristo. Esta é uma verdadeira e própria exigência da sua vital incorporação n'Ele, no sacramento do baptismo.  O  Papa  vê  neste  forte  e  convicto testemunho "uma das maiores apostas que esperam a Igreja que está na Europa neste início do novo milénio" (ibid., 49).

É óbvio que tal testemunho pressupõe, sobretudo na actual situação cultural e religiosa europeia, uma fé mais pessoal e adulta. Um fé sustentada não só por eventuais hábitos sociais e tradicionais, embora apreciáveis, mas por profundas opções interiores. Uma fé, em suma, pessoal, convicta, madura e iluminada.

Somente uma fé assim permitirá aos crentes, aos cristãos, aos católicos, confrontar-se criticamente, observa o texto do Papa, com a cultura de hoje, "resistindo às suas seduções" (ibid., 62), incidir, de maneira eficaz, nos diversos âmbitos da sociedade de hoje, transmitir com alegria às novas gerações, que são o futuro do Continente, o tesouro inestimável da fé e da visão aberta e transcendente do homem que dela deriva, ajudar a construir uma cultura cristã, capaz de iluminar com o Evangelho o vasto e variado mundo cultural em que vivemos. Esta é uma das grandes responsabilidades dos católicos  na  Europa  de  hoje  e  na  de amanhã.
Este seu dever cumpre-se, para atingir a sua finalidade, no contexto insubstituível de uma fraterna e convicta colaboração ecuménica. O futuro da evangelização na Europa, como noutros lugares, está, de facto, intimamente ligado ao testemunho de uma verdadeira unidade entre todos os cristãos, no contexto de um "profundo e inteligente" diálogo inter-religioso, em particular com o Hebraísmo e o Islão. Este diálogo levará, entre outras coisas, a um melhor conhecimento daqueles que aderem a essas religiões e que vivem, cada vez em maior número, na Europa de hoje. Entendido "como método e meio para um conhecimento e enriquecimento recíproco, o diálogo não está em contraposição com a missão ad gentes; pelo contrário, tem laços especiais com ela e constitui uma sua expressão" (RMS, 53; EiE, 55).

3. Uma catequese renovada

Entre as vias da evangelização, a Exortação Apostólica Ecclesia in Europa indica uma particularmente eficaz, a da catequese. Dela e da sua importância para a Igreja, já antes se tinha ocupado o Pontífice numa Exortação Apostólica, publicada no início do seu Pontificado (Exortação Apostólica Catechesi Tradendae, 16 de Outubro de 1979).

O pensamento do Papa sobre a função do ensinamento catequético na vida e na missão da Igreja, pode reassumir-se nalgumas afirmações de fundo, que adquirem todo o seu significado à luz do seu incansável ministério petrino, em que a catequese ocupa, sem dúvida, um lugar de grande relevo.
O Santo Padre insiste acima de tudo na necessidade da catequese. "É preciso, diz ele, que as comunidades cristãs procurem propor uma catequese adaptada aos diferentes itinerários espirituais dos fiéis segundo as respectivas idades e estados de vida" (EiE, 51). O ensinamento da catequese é necessário na Igreja, como o é a própria evangelização, de que é um capítulo específico e extremamente importante. Os apóstolos já tinham associado ao seu dever de ensinar, também simples cristãos que "andavam pelas aldeias e anunciavam a palavra de Deus" (Act 8, 4). Dos Padres, depois, sobretudo os dos séculos III e IV, recebemos obras catequéticas que são, ainda hoje, para nós, verdadeiros modelos e, por isso, pontos essenciais de referência neste sector fundamental da vida da comunidade cristã.

Mas o Papa vai mais longe, afirmando a prioridade da actividade da catequese nos programas pastorais da Igreja. Ele fala a propósito da "inegável prioridade" na acção pastoral e da necessidade de "cultivar e eventualmente reintroduzir o ministério da catequese, enquanto educação e desenvolvimento da fé de cada pessoa" (ibid., 51), para que a semente da nova vida depositada pelo Espírito Santo no baptizado, cresça e atinja a sua plena maturação.

Desta prioridade da catequese, já João Paulo II tinha falado na Catechesi Tradendae. Quanto mais a Igreja, lê-se aí, "se demonstrar capaz de dar prioridade à catequese em relação a outras obras e iniciativas cujos resultados seriam mais espetaculares tanto mais ela encontrará na catequese um meio para a consolidação da sua vida interna de comunidade de fiéis... Ela é convidada a consagrar à catequese os seus melhores recursos de pessoal e de energias sem poupar esforços, trabalhos e meios materiais, a fim de a organizar melhor e de formar para a mesma pessoas qualificadas" (CT, 15).

Mas, para ser eficaz, a catequese deve ser antes de tudo essencialmente cristocêntrica. O seu objecto primordial é, para dizer com São Paulo e, como gosta de dizer a teologia contemporânea, o "Mistério de Cristo":  o que Ele é e o que Ele nos revelou, a sua vida e a sua doutrina. O catequista tem, por isso, o dever de fazer conhecer Cristo, de conduzir os irmãos a penetrar cada vez mais no seu Mistério e não de lhes transmitir eventuais interpretações, opiniões ou opções pessoais a esse respeito. Todo o catequista deveria poder dizer de Cristo aquilo que este diz sobre o Pai:  "a minha doutrina não é minha, mas d'Aquele que me enviou" (Jo 7, 16; CT, 6).

Em segundo lugar, a catequese deve ser adaptada aos destinatários a que se dirige:  isto quer dizer que, no caso das Igrejas que estão na Europa, a catequese deve estar ligada com a própria vida dos europeus e, por isso, deve ter presentes os seus problemas, as suas aspirações, as suas inquietudes, as suas desiluções e as suas esperanças. Aquele a quem a Igreja se dirige não é, efectivamente, um homem abstracto, mas um homem concreto, que vive num determinado contexto histórico.

Para ser adaptada ao homem de hoje, a catequese deve, além disso, servir-se de uma linguagem compreensível para ele. A Igreja tem a obrigação de preservar, em toda a sua pureza o património imutável da fé, mas também de o oferecer aos homens que se sucedem no tempo, de maneira que lhes seja acessível. Somente assim, a mensagem de Cristo será compreendida em toda a sua força transformadora e libertadora. Somente assim ela influenciará verdadeiramente a vida dos seus destinatários.

4. Evangelho e cultura europeia

Não basta anunciar Cristo ao homem europeu contemporâneo. É preciso que ele penetre e ilumine, transformando a sua cultura, bastante diversa, sob muitos aspectos da do passado, seja em si própria, seja nas suas múltiplas expressões.

A Igreja mostrou sempre, ao longo dos séculos, uma extraordinária fecundidade cultural, vivificando, com o poder do Evangelho, a cultura ou as culturas dos povos com que ela contactou. Isto aconteceu também na Europa. A sua cultura seria incompreensível sem a contribuição substancial do Cristianismo. As suas raízes são, de facto, profundamente cristãs. Negá-lo seria fazer uma grave ofensa à história do "velho" Continente. A história nunca deve ser interpretada em chave ideológica, mas simplesmente aceitada na inconfundível realidade dos seus factos.
Na esteira da sua tradição, a Igreja é chamada, também hoje, a encarnar o Evangelho na nova cultura europeia, mostrando que, também nela é possível vivê-lo em toda a sua plenitude; que a mensagem cristã, longe de empobrecer uma cultura, a enriquece, a eleva e a aperfeiçoa. "A evangelização da cultura lembra o actual Pontífice deve mostrar que hoje, nesta Europa, também é possível viver em plenitude o Evangelho enquanto itinerário que dá sentido à existência" (EiE, 58).
Para tal fim pede-se, sem dúvida, uma adequada pastoral da cultura nas Igrejas europeias. A elas diz respeito o dever de formar uma "mentalidade cristã" nos vários sectores da vida ordinária:  no da família, da escola, do trabalho, da economia, da política, dos meios de comunicação social, etc; quer dizer, em todas as realidades de que é formada a vida comum do homem moderno, em particular do europeu.

Um capítulo importante desta pastoral deve ser a promoção de um verdadeiro e sincero diálogo, de um confronto crítico com a situação cultural europeia de hoje, "avaliando as tendências salientes, os factos e as situações de maior relevância do nosso tempo à luz da centralidade de Cristo e da antropologia cristã" (ibid.).

E para que este diálogo e confronto atinjam o seu fim, é necessário que eles tenham sempre na devida conta, a causa da sua relevância no campo da cultura e da sociedade da Europa, das ciências e das realizações tecnológicas. No confronto com elas, a Igreja deve ter uma atitude positiva e propositiva. Não há, de facto, nenhuma oposição entre fé e razão, entre a Igreja e o mundo científico. Nem poderia haver. A Igreja foi sempre, através dos séculos, uma promotora convicta das ciências. E continua a sê-lo ainda hoje. Ela está plenamente consciente que são as novas descobertas científicas e as suas aplicações tecnológicas que estão na base do extraordinário progresso de que goza o homem de hoje.

As escolas católicas são chamadas a dar um contributo determinante para a evangelização da cultura europeia, segundo a Exortação Apostólica "Ecclesia in Europa". Para melhor atingir esta finalidade, porém, deve ser reconhecida "uma efectiva liberdade de educação e a igualdade jurídica entre escolas estatais e não estatais" (EiE, 59). Não devemos esquecer que as escolas católicas são, talvez, o único meio para propor a Mensagem cristã a quantos dela estão afastados. Um papel muito particular diz respeito depois, segundo o texto pontifício, às Universidades, que são outros tantos laboratórios de cultura, e àqueles cristãos que nelas se dedicam ao ensino e à pesquisa. Com o seu "serviço do pensamento" eles transmitem às novas gerações europeias os valores de um precioso "património cultural enriquecido por dois milénios de experiência humanista e cristã" (ibid.).

É, pois, indispensável, para uma encarnação do Evangelho na cultura europeia, a presença e a acção dos jovens. Por isso uma das principais preocupações das Igrejas que estão na Europa deve ser a de lhes oferecer uma sólida formação humana e cristã. Eles são a esperança da Igreja e do mundo. São os  cristãos  da  nova  Europa  que, embora  de  modo  fatigante,  se  está  a construir.
Para atingir tal finalidade, "é preciso observa o Papa renovar a pastoral juvenil, estruturando-a, segundo as faixas etárias, adaptando-as às exigências próprias de crianças, adolescentes e jovens" (ibid., 62). Uma pastoral juvenil orgânica e coerente, que tenha em conta o modo de ser dos jovens de hoje, das suas tendências, das suas aspirações e dos seus problemas.

Isto pressupõe, como é óbvio, um profundo conhecimento dos jovens, que só pode provir de uma proximidade com eles, de escuta das suas questões. O Papa, que os conhece bem, por os ter encontrado, em grande número, quer nas suas viagens apostólicas nos vários países, quer nas diversas Jornadas Mundiais da Juventude, oferece o seguinte identikit dos jovens de hoje:  "constata-se o desejo de estarem juntos para saírem do isolamento, uma sede mais ou menos consciente de absoluto:  encontra-se neles uma fé secreta que pede para ser purificada, pois deseja seguir o Senhor; intui-se a decisão de continuarem o caminho já abraçado e a exigência de partilharem a fé" (ibid., 61). Estes são os destinatários da pastoral juvenil.

Os agentes desta pastoral não devem ter medo de propor aos jovens de hoje, valores fortes, metas exigentes. O Papa é muito explícito neste aspecto. "Não é preciso ter medo, diz ele, de ser exigentes com eles no que se refere ao seu crescimento espiritual. Seja-lhes indicado o caminho da santidade, animando-os a tomarem decisões empenhativas no seguimento de Jesus, sustentados por uma intensa vida sacramental. Assim, poderão resistir às seduções de uma cultura, que muitas vezes lhes propõe apenas valores efémeros ou mesmo contrários ao evangelho, e tornarem-se eles próprios capazes de mostrar uma mentalidade cristã em todos os âmbitos da existência" (ibid., 62), e de maneira a serem verdadeiros "protagonistas da evangelização e da edificação da sociedade" europeia (ibid.).

Não se pode, por fim, na evangelização da cultura europeia, prescindir dos massmedia, dada a sua grande influência na sociedade de hoje. Aliás, para eles "está reservada uma particular atenção" (ibid., 63).

É evidente o enorme impacto que têm os massmedia na sociedade de hoje. Eles provocaram uma verdadeira e própria revolução cultural. São o primeiro areópago do mundo moderno (cf. Rms, 37) em que é constante o intercâmbio de ideias e valores. Bem se pode dizer que com eles se mudou profundamente a sociedade em todos os campos e a todos os níveis.

É precisamente por isso que a Igreja não pode prescindir, no anúncio do Evangelho, desses extraordinários meios de comunicação social. O Concílio Vaticano II dedicou-lhes um documento completo, o Inter mirifica. São, pois, conhecidas as palavras de Paulo VI a propósito:  "a Igreja viria a sentir-se culpável diante do seu Senhor, se ela não lançasse mão destes meios potentes que a inteligência humana torna cada dia mais aperfeiçoados... neles se encontra uma versão moderna e eficaz do púlpito" (En 45).

É óbvio que, ao anunciar Cristo a Igreja deve servir-se, com verdadeira competência, antes de tudo, dos seus próprios meios de comunicação social. Os cristãos que trabalham nos media devem estar adequadamente formados para serem comunicadores "intrépidos e criativos". Contudo, na medida do possível, a Igreja deve também aproveitar as oportunidades que puder encontrar nos meios seculares de comunicação social (Mensagem para o 34º Dia Mundial das Comunicações Sociais, 4.6.2000).

Eis os caminhos que, segundo a Exortação Apostólica pós-sinodal "Ecclesia  in  Europa", deve seguir a Igreja deste Continente para anunciar ao mesmo Continente, com renovado empenho, o Evangelho da esperança e conduzi-lo deste modo a permanecer fiel às suas raízes incontestavelmente cristãs, àqueles valores espirituais e culturais de que é tecida a sua história, e de que estão impregnados a arte, a literatura, o pensamento e a cultura das nações que a formam. (cf. EiE, 120); a não delapidar o rico património herdado, mas, ao contrário, a reconquistá-lo, como diz Wolfgang Göethe:  "aquilo que herdaste dos Pais reconquista-o, se queres possui-lo verdadeiramente".

Já no fim da Exortação Apostólica, João Paulo II renova à Europa um caloroso e paternal convite à esperança baseada sobre a vitória, plena e definitiva, de Jesus Cristo sobre o pecado e sobre a morte:  "volta a encontrar-te. Se tu mesma. Descobre as tuas origens. Reaviva as tuas raízes" (Discurso às Autoridades europeias e aos Presidentes das Conferencias Episcopais da Europa . ed. port. de L'Osservatore Romano 21. 11. 1982 pág. 1, n. 4).

O Sumo Pontífice conclui, usando a sugestiva fórmula do diálogo directo:  "podes estar certa! O Evangelho da esperança não desilude! Nas vicissitudes da história de ontem e de hoje, é luz que ilumina e orienta o teu caminho; é força que te sustenta nas provações; é profecia de um mundo novo; é indicação de um novo início; é convite a todos, crentes e não-crentes, para traçarem caminhos sempre novos que desemboquem na "Europa do espírito" a fim de fazer dela uma verdadeira "casa comum" onde haja alegria de viver" (EiE, 121) e esperança no futuro.

O desejo mais sentido é que estas palavras angustiosas do Papa sejam acolhidas e que a Europa que se está a construir não seja uma simples agregação económica e política de povos, mas uma verdadeira família de Nações, "na qual se possam frutuosamente inspirar outras regiões do mundo" (ibid., 121).

 

 

 

 

 

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