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69ª SESSÃO DA ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDOS

DISCURSO DO SECRETÁRIO DE ESTADO
 CARDEAL
PIETRO PAROLIN 

Nova York
Segunda-feira, 29 de Setembro de 2014

 

Senhor Presidente

Ao dirigir as felicitações da Santa Sé pela sua eleição para a presidência da 69ª sessão da Assembleia Geral, desejo transmitir as cordiais saudações de Sua Santidade o Papa Francisco, ao senhor e a todas as delegações participantes. Ele garante-vos a sua proximidade e as suas orações pelo trabalho desta sessão da Assembleia Geral, na esperança de que possa decorrer num clima de colaboração produtiva, para a construção de um mundo mais fraterno e unido, identificando as formas para resolver os graves problemas que hoje afligem toda a família humana.

Em continuidade com os seus predecessores, recentemente o Papa Francisco reafirmou a estima e o apreço da Santa Sé pelas Nações Unidas como meio indispensável para construir uma autêntica família de povos. A Santa Sé aprecia os esforços desta ilustre instituição, «realizados a favor da paz mundial e do respeito pela dignidade humana, pela protecção da pessoa, sobretudo dos mais pobres ou débeis, e pelo desenvolvimento económico e social harmonioso» (Discurso aos Membros do Conselho dos Chefes Executivos para a Coordenação das Nações Unidas, 9 de Maio de 2014). Nesta linha, e em numerosas ocasiões, Sua Santidade encorajou os homens e as mulheres de boa vontade a pôr de forma eficaz a própria capacidade ao serviço de todos, trabalhando juntos em colaboração com a comunidade política e com todos os sectores da sociedade civil (cf. Mensagem ao World Economic Forum, 17 de Janeiro de 2014).

Mesmo recordando os dons e as capacidades da pessoa humana, o Papa Francisco observa que hoje existe o perigo de uma indiferença generalizada. Na medida em que esta indiferença diz respeito ao campo da política, atinge também os sectores económico e social, «considerando que uma parte importante da humanidade continua a ser excluída dos benefícios do progresso e, de facto, relegada a seres humanos de segunda categoria» (Discurso aos Membros do Conselho dos Chefes Executivos para a Coordenação das Nações Unidas, 9 de Maio de 2014). Por vezes, esta apatia é sinónimo de irresponsabilidade. Este é o caso hoje, quando uma união de Estados, criada com o objectivo fundamental de salvar as gerações do horror da guerra que trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade (cf. Preâmbulo da Carta das Nações Unidas, 1), permanece passiva diante das hostilidades da quais foram vítimas populações indefesas.

Desejo recordar as palavras que Sua Santidade dirigiu ao Secretário-Geral no início de Agosto: «Com o coração aflito e angustiado segui os eventos dramáticos destes últimos dias no norte do Iraque», pensando nas «lágrimas, nos sofrimentos e nos brados de desespero dos cristãos e de outras minorias religiosas da amada terra do Iraque». Na mesma carta o Papa renovou o seu apelo urgente à comunidade internacional a fim de «que intervenha para pôr fim à tragédia humanitária em curso». Além disso, encorajou «todos os organismos competentes das Nações Unidas, em particular os responsáveis pela segurança, paz, direito humanitário e assistência aos refugiados, a continuar os seus esforços em conformidade com o Preâmbulo e os Artigos pertinentes da Carta das Nações Unidas» (Carta do Santo Padre ao Secretário-Geral da Onu sobre a situação no Norte do Iraque, 9 de Agosto de 2014).

Hoje, sou obrigado a reiterar o sincero apelo de Sua Santidade e a propor à Assembleia Geral, assim como aos outros organismos competentes das Nações Unidas, que esta organização aprofunde a sua compreensão do momento difícil e complexo que estamos a viver.

Com a situação dramática no norte do Iraque e nalgumas partes da Síria, constatamos um fenómeno totalmente novo: a existência de uma organização terrorista que ameaça todos os Estados prometendo dissolvê-los e substituí-los com um governo mundial pseudo-religioso. Infelizmente, como disse há pouco tempo o Santo Padre, também hoje há quem pretenda exercer o poder forçando as consciências e tirando a vida, perseguindo e assassinando em nome de Deus (cf. «L’Osservatore Romano», 3 de Maio de 2014). Estas acções ferem inteiros grupos étnicos, populações e culturas antigas. É necessário recordar que esta violência nasce do desprezo de Deus e trata-se de uma «falsificação da própria religião, uma vez que esta visa reconciliar o homem com Deus, iluminar e purificar as consciências e tornar claro que cada homem é imagem do Criador» (Bento XVI, Discurso aos Membros do Corpo Diplomático acreditado junto da Santa Sé, 7 de Janeiro de 2013).

Num mundo de comunicações globais, este novo fenómeno encontrou sequazes em muitos lugares e conseguiu atrair jovens do mundo inteiro, muitas vezes desiludidos por causa de uma indiferença generalizada e da falta de valores nas sociedades opulentas. Este desafio, em todos os seus aspectos trágicos, deveria impelir a comunidade internacional a promover uma resposta unificada, baseada em sólidos critérios jurídicos e na vontade colectiva de cooperar para o bem comum. Para este fim, a Santa Sé considera útil concentrar a atenção sobre dois âmbitos importantes. O primeiro consiste em enfrentar as origens culturais e políticas dos desafios contemporâneos, reconhecendo a necessidade de estratégias inovadoras para resolver os problemas internacionais em que os factores culturais desempenham um papel fundamental. O segundo âmbito sobre o qual reflectir é um estudo ulterior acerca da adequação do direito internacional hoje, ou seja, a eficácia da sua actuação por parte dos mecanismos utilizados pelas Nações Unidas para prevenir a guerra, deter os agressores, proteger as populações e ajudar as vítimas. Depois dos ataques de 11 de Setembro de 2001, quando o mundo despertou para a realidade de uma nova forma de terrorismo, alguns meios de comunicação e centros de pensamento simplificaram de modo excessivo aquele trágico momento interpretando todas as situações subsequentes e problemáticas em termos de choque de civilizações. Esta visão não levava em consideração as antigas e profundas experiências de boas relações entre culturas, grupos étnicos e religiões, e interpretava através desta mesma lente outras situações complexas como a questão do Médio Oriente e os conflitos civis actualmente em curso noutros lugares. De igual modo, houve tentativas de encontrar os chamados remédios legais a fim de contrastar e prevenir o crescimento desta nova forma de terrorismo. Por vezes, foram preferidas soluções unilaterais em relação às fundadas sobre o direito internacional. Também os métodos adoptados nem sempre respeitaram a ordem constituída nem as particulares circunstâncias culturais de povos que, muitas vezes involuntariamente, se encontraram no centro desta nova forma de conflito global. Estes erros, e o facto de terem sido aprovados pelo menos de modo tácito, deveriam levar-nos a um sério e profundo exame de consciência. Os desafios apresentados pelas novas formas de terrorismo não devem fazer-nos sucumbir a visões exageradas nem a extrapolações culturais. O reducionismo que deriva da interpretação de situações em termos de um confronto de culturas, jogando com os temores e os preconceitos existentes, só leva a reacções de natureza xenófoba que, paradoxalmente, servem para fortalecer aqueles sentimentos que estão no centro do próprio terrorismo. Os desafios com o qual nos deparamos devem estimular um renovado apelo ao diálogo religioso e intercultural e novos desenvolvimentos no direito internacional, a fim de se promover iniciativas de paz justas e corajosas.

Portanto, quais são os caminhos que devemos percorrer? Em primeiro lugar, há o caminho da promoção do diálogo e da compreensão entre culturas, que já está implicitamente contido no Preâmbulo e no primeiro artigo da Carta das Nações Unidas. Este caminho deve tornar-se um objectivo cada vez mais explícito da comunidade internacional e dos Governos, se realmente quiserem estar comprometidos a favor da paz no mundo. Ao mesmo tempo, devemos recordar que não cabe às organizações internacionais nem aos Estados inventar a cultura nem é possível fazê-lo. Da mesma forma, não compete aos Governos impor-se como porta-vozes de culturas nem ser os principais protagonistas responsáveis do diálogo cultural e inter-religioso. O crescimento natural e o enriquecimento da cultura são, ao contrário, fruto de todos os componentes da sociedade civil que trabalham juntos. As organizações internacionais e os Estados têm a tarefa de promover e apoiar, de maneira decisiva e com os meios financeiros necessários, as instituições e os movimentos que promovem o diálogo e a compreensão entre culturas, religiões e povos. No final das contas, a paz não é o fruto de um equilíbrio de poderes, mas o êxito da justiça a todos os níveis e, mais importante, responsabilidade compartilhada dos indivíduos, das instituições civis e dos Governos. Com efeito, isto significa compreender-se reciprocamente e apreciar a cultura e as circunstâncias do outro. Implica também preocupar-se uns com os outros, compartilhando os patrimónios espirituais e culturais e oferecendo oportunidades para o enriquecimento humano.

Todavia, não enfrentamos o desafio do terrorismo e da violência só com a abertura cultural. Temos à nossa disposição também a via importante do direito internacional. A situação actual exige uma compreensão mais incisiva deste direito, prestando particular atenção à «responsabilidade de proteger». Com efeito, uma das características do recente fenómeno terrorista é que ignora a existência do Estado e, de facto, de toda a ordem internacional. O objectivo do terrorismo não consiste só em provocar mudanças nos Governos, em danificar as estruturas económicas ou simplesmente em cometer crimes. Procura controlar directamente áreas internas de um ou mais países, impor as próprias leis, que são distintas e opostas em relação às do Estado soberano. Além disso, prejudica e rejeita o sistema jurídico existente, procurando impor o seu domínio sobre as consciências e o controle total das pessoas.

A natureza global deste fenómeno, que não conhece fronteiras, é exactamente a razão pela qual o quadro do direito internacional oferece o único caminho percorrível para enfrentar este desafio urgente. Esta realidade exige que as Nações Unidas sejam renovadas, que se comprometam para promover e preservar a paz. Actualmente, os participantes activos e passivos de tal sistema são todos os Estados, os quais se submetem à autoridade do Conselho de Segurança e se comprometem para não empreender acções de guerra sem a aprovação deste mesmo Conselho. Neste âmbito, a acção militar realizada por um Estado em resposta a outro Estado só é possível no caso de autodefesa, quando ocorrer um ataque armado directo, até que o Conselho de Segurança tome as medidas necessárias para a manutenção da paz e da segurança internacionais (cf. Carta das Nações Unidas, art. 51). As novas formas de terrorismo realizam acções militares em ampla escala. Um só Estado não consegue detê-las, e eles tencionam declarar guerra explicitamente contra a comunidade internacional. Neste sentido, temos a ver com um comportamento criminoso não previsto pela configuração jurídica da Carta das Nações Unidas. Não obstante tudo, é necessário reconhecer que as normas em vigor para a prevenção da guerra e a intervenção do Conselho de Segurança são igualmente aplicáveis, com bases diversas, no caso de uma guerra provocada por um «actor não estatal».

É assim, em primeiro lugar, porque o objectivo fundamental da Carta é evitar o flagelo da guerra às gerações vindouras. A estrutura jurídica do Conselho de Segurança, mesmo com todos os seus limites e defeitos, foi estabelecida precisamente por esta razão. Além disso, o artigo 39 da Carta das Nações Unidas atribui ao Conselho de Segurança a tarefa de determinar as ameaças ou as agressões contra a paz internacional, sem especificar o tipo de actores que realizam estas ameaças ou agressões. Enfim, os próprios Estados, em virtude da sua adesão às Nações Unidas, renunciaram a qualquer uso da força que seja incompatível com os objectivos das Nações Unidas (cf. Carta das Nações Unidas, art. 2, 4).

Considerando que as novas formas de terrorismo são «transnacionais», elas já não se inserem no âmbito das competências das forças de segurança de um único Estado: dizem respeito aos territórios de vários Estados. Portanto, serão necessárias as forças conjuntas de diversas nações para garantir a defesa dos cidadãos desarmados. Dado que não existe uma norma jurídica que justifique acções de polícia unilaterais além das próprias fronteiras, não há dúvida alguma de que se trata de um âmbito de competência do Conselho de Segurança. Isso porque, sem o consentimento e a supervisão do Estado no qual se exerce o uso da força, esta traduzir-se-ia numa instabilidade regional ou internacional, e portanto inserir-se-ia nos cenários previstos pela Carta das Nações Unidas.

A minha delegação deseja recordar que é tanto lícito quanto urgente deter a agressão através da acção multilateral e de um uso proporcional da força. Como sujeito que representa uma comunidade religiosa mundial que abrange diversas nações, culturas e etnias, a Santa Sé espera seriamente que a comunidade internacional assuma a responsabilidade, reflectindo sobre os melhores meios para deter qualquer agressão e evitar a perpetração de injustiças novas e ainda mais graves. A situação presente, portanto, mesmo sendo de facto muito séria, é uma ocasião a fim de que os Estados membros da Organização das Nações Unidas honrem o próprio espírito da Carta das Nações Unidas, falando abertamente sobre os trágicos conflitos que estão a dilacerar inteiros povos e nações. É decepcionante que até agora a comunidade internacional tenha sido caracterizada por vozes contraditórias e até pelo silêncio relativo aos conflitos na Síria, no Médio Oriente e na Ucrânia. É importantíssimo que haja unidade de acção para o bem comum, evitando o fogo cruzado de vetos. Como Sua Santidade escreveu ao Secretário-Geral no passado dia 9 de Agosto, «a mais elementar compreensão da dignidade humana obriga a comunidade internacional, em particular através das normas e dos mecanismos do direito internacional, a fazer tudo o que estiver ao seu alcance para deter e prevenir ulteriores violências sistemáticas contra as minorias étnicas e religiosas».

Embora o conceito de «responsabilidade de proteger» esteja implícito nos princípios constitucionais da Carta das Nações Unidas e do Direito Humanitário, não favorece de forma específica o recurso às armas. Mas afirma a responsabilidade de toda a comunidade internacional, em espírito de solidariedade, de combater crimes odiosos como o genocídio, a purificação étnica e a perseguição por motivos religiosos. Aqui convosco, hoje, não posso deixar de mencionar os numerosos cristãos e as minorias étnicas que nos últimos meses foram vítimas de perseguições e de sofrimentos atrozes no Iraque e na Síria. O seu sangue exige de todos nós um compromisso firme a respeitar e a promover a dignidade de cada indivíduo por ter sido querido e criado por Deus. Isso significa também respeito pela liberdade religiosa, que a Santa Sé considera um direito fundamental, pois ninguém pode ser forçado «a agir contra a própria consciência» e cada um «tem o dever e consequentemente o direito de procurar a verdade em matéria religiosa» (Concílio Vaticano II, Dignitatis humanae, 3)

Em síntese, a promoção de uma cultura de paz exige esforços renovados a favor do diálogo, da valorização cultural e da cooperação, no respeito pela variedade das sensibilidades. É necessária uma abordagem política clarividente que não imponha de maneira rígida modelos políticos a priori, subestimando as sensibilidades de cada povo. Enfim, deve haver uma disponibilidade autêntica a aplicar de modo escrupuloso os actuais mecanismos do direito, permanecendo ao mesmo tempo aberto às implicações deste momento crucial. Isto garantirá uma abordagem multilateral que servirá melhor a dignidade humana e protegerá o desenvolvimento humano integral no mundo inteiro. Esta disponibilidade, sempre que for expressa de forma concreta através de novas formulações jurídicas, certamente trará uma renovada vitalidade às Nações Unidas. Ajudará também a resolver conflitos graves, tanto em curso quanto latentes, que ainda atingem algumas partes da Europa, da África e da Ásia, e cuja resolução definitiva exige o compromisso de todos.

Senhor Presidente

Com a Resolução a/68/6 da 68ª sessão da Assembleia Geral foi decidido que a presente sessão teria debatido a Agenda de desenvolvimento pós-2015, para que em seguida fosse formalmente adoptada durante a 70ª sessão em Setembro de 2015. O próprio Senhor Presidente escolheu oportunamente o tema da presente sessão: Delivering and Implementing a Transformative Post-2015 Development Agenda.

Durante o seu recente encontro com todos os chefes executivos das agências, fundos e programas das Nações Unidas (cf. Discurso aos Membros do Conselho dos Chefes Executivos para a Coordenação das Nações Unidas, 9 de Maio de 2014), Sua Santidade pediu que os objectivos futuros do desenvolvimento sustentável sejam formulados «com generosidade e coragem, para que consigam incidir efectivamente sobre as causas estruturais da pobreza e da fome, obtenham ulteriores resultados substanciais a favor da preservação do ambiente, garantam um trabalho decente para todos e protejam adequadamente a família, elemento essencial de qualquer desenvolvimento económico e social sustentável. Trata-se, em particular, de desafiar todas as formas de injustiça, opondo-se à “economia da exclusão”, à “cultura do descartável” e à “cultura da morte”». O Papa Francisco encorajou os chefes executivos a promover «uma verdadeira mobilização ética mundial, que além de cada diferença e de credo ou de opinião política, difunda e aplique um ideal comum de fraternidade e solidariedade, especialmente para com os mais pobres e os excluídos» (ibidem).

A este respeito, a Santa sé aprecia os dezassete «Objectivos de Desenvolvimento Sustentável» propostos pelo grupo de trabalho (Grupo aberto de trabalhos sobre os objectivos sustentáveis), que procuram enfrentar as causas estruturais da pobreza, promovendo um trabalho digno para todos. Do mesmo modo, a Santa Sé aprecia que a maior parte dos objectivos e dos meios não reflicta os temores das populações ricas relativamente ao crescimento demográfico nos países mais pobres. Aprecia também o facto de que os objectivos e os meios não imponham aos Estados mais pobres estilos de vida que habitualmente são associados às economias avançadas e que tendem a mostrar o desprezo pela dignidade humana. Além disso, no que diz respeito à Agenda de desenvolvimento pós-2015, a incorporação dos resultados do Grupo aberto de trabalho sobre os objectivos de desenvolvimento sustentável, juntamente com as indicações oferecidas pelo Relatório do comité intergovernamental de peritos sobre o financiamento do desenvolvimento sustentável e as que sobressaem das consultas entre as agências, parece indispensável para a realização dos objectivos de desenvolvimento sustentável e da Agenda de desenvolvimento pós-2015.

Todavia, e apesar dos esforços das Nações Unidas e de muitas pessoas de boa vontade; o número de pobres e excluídos está a crescer não só nos países em vias de desenvolvimento, mas também nos desenvolvidos. A «responsabilidade de proteger», como foi afirmado antes, refere-se às agressões extremas contra os direitos humanos, aos casos de séria violação do direito humanitário ou às graves catástrofes naturais. De forma análoga, há a exigência de tomar medidas jurídicas para proteger as pessoas contra outras formas de agressão, que são menos evidentes mas igualmente graves e reais. Por exemplo, um sistema financeiro governado só pela especulação e pela maximização dos lucros, ou em que cada pessoa é considerada como objecto descartável numa cultura do desperdício, poderia equivaler, nalgumas circunstâncias, a uma ofensa contra a dignidade humana. Disso deriva, portanto, que as Nações Unidas e os seus Estados membros têm a responsabilidade urgente e grave para com os pobres e os excluídos, recordando sempre que a justiça social e económica é uma condição essencial para a paz.

Senhor Presidente

Cada dia da 69ª sessão da Assembleia Geral, e de facto também das próximas quatro sessões, até Novembro de 2018, trará consigo a triste e dolorosa recordação da fútil e desumana tragédia da primeira guerra mundial (um massacre inútil, como o definiu o Papa Bento XV),com os seus milhões de vítimas e a sua destruição indizível. Recordando o centenário do início do conflito, Sua Santidade o Papa Francisco formulou votos a fim de que «não se repitam os erros do passado, mas que sejam recordadas as lições da história, fazendo prevalecer sempre as razões da paz através de um diálogo paciente e intrépido» (Angelus, 27 de Julho de 2014). Naquela ocasião, o pensamento de Sua Santidade concentrou-se de modo particular sobre três áreas de crise: o Médio Oriente, o Iraque e a Ucrânia. Exortou todos os cristãos e as pessoas de fé a rezar para que o Senhor «conceda às populações e às Autoridades daquelas regiões a sabedoria e a força necessárias para prosseguir com determinação o caminho da paz, enfrentando todas as desavenças com a tenacidade do diálogo e da negociação, e com o vigor da reconciliação. No âmago de cada decisão não se devem pôr os interesses particulares, mas o bem comum e o respeito por todas as pessoas. Recordemos que tudo se perde com a guerra e nada se perde com a paz!» (ibidem).

Senhor Presidente

Fazendo meus os sentimentos do Santo Padre, espero fervorosamente que possam ser compartilhados por todos os presentes. Dirijo a todos vós os meus melhores votos para o vosso trabalho, confiante de que esta sessão não poupará esforços para pôr fim ao fragor das armas que caracteriza os conflitos em curso, e que continuará a promover o desenvolvimento da inteira raça humana, e em particular dos mais pobres entre nós.

Obrigado, Senhor Presidente!