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CONGREGAÇÃO PARA OS BISPOS

DISCURSO DO CARDEAL GIOVANNI BATTISTA RE
NA ASSEMBLEIA PLENÁRIA DA PONTIFÍCIA
COMISSÃO PARA A AMÉRICA LATINA

20 de Janeiro de 2005

 

Eminentíssimos Senhores Cardeais
Excelentíssimos Senhores
Arcebispos e Bispos
Dilectos Irmãos

1. Depois da Celebração Eucarística, com o pensamento e com o coração voltados para Cristo, damos início à Sessão Plenária da Pontifícia Comissão para a América Latina.

Trata-se de um encontro não tanto entre estudiosos de problemas que dizem respeito à América Latina, como sobretudo entre Pastores solícitos em vista do bem dos homens e das mulheres da América Latina.

Saúdo todos vós com profundo afecto: dirijo uma saudação aos Pastores que vieram de vários países latino-americanos e uma saudação a quantos prestam o seu serviço aqui na Cúria Romana.
Todos nós somos animados pelo mesmo amor a Jesus Cristo e à Igreja que peregrina na América Latina.

O Santo Padre João Paulo II encoraja o nosso trabalho e ficará feliz por nos receber e dirigir a sua palavra.

2. O tema do nosso encontro é o seguinte: "A missa dominical é o centro da vida cristã na América Latina".

Este tema não só está em sintonia com o Ano da Eucaristia, que estamos a celebrar, como também o compromisso em favor da Missa dominical corresponde a um dos objectivos primordiais a alcançar, que o Santo Padre João Paulo II indicou para o início do terceiro milénio. Com efeito, na sua Carta Apostólica Novo millennio ineunte, o Sumo Pontífice pede que os Pastores e os fiéis se comprometam com todas as suas forças para recuperar e conservar a centralidade do domingo na vida cristã (cf. n. 36). Além disso, o Papa afirma que "a participação na Eucaristia deve constituir o coração do domingo". E especifica também que se trata de "um compromisso irrenunciável, a viver não só para absolver a um preceito, mas como necessidade de uma vida cristã verdadeiramente consciente e coerente".

O tema da Missa dominical é um tema fulcral da fé cristã e fundamental para o futuro da Igreja que está no Continente latino-americano.

Na América Latina contemporânea é motivo de preocupação a baixa percentagem - salvo poucas excepções - do número daqueles que participam na Missa dominical. O Excelentíssimo Mons. Secretário do CELAM falar-nos-á proximamente acerca deste tema.

Todavia, aquilo que nos preocupa ainda mais é que se está a difundir uma mentalidade e uma cultura que tendem a não ter em consideração de maneira suficiente o dia do domingo e, sobretudo, a frequência da Missa dominical. Os domingos tornaram-se dias não muito diferentes dos outros dias da semana. Devemos ser realistas e reconhecer que se está a verificar uma perda do sentido do domingo e da sua importância fundamental para a vida cristã.

Ao longo dos séculos passados foi sempre uma preocupação da Igreja comprometer-se a fim de que os cristãos participassem na Missa dominical e nos dias de festa. O domingo é o dia da identidade dos cristãos e a festividade da nossa pertença à Igreja.

O domingo cristão, totalmente voltado para a elevação do espírito, a frequência da Missa - em que se presta o culto devido a Deus - a recordação das finalidades supremas da vida, a bondade, os encontros em família e o descanso depois do cansaço físico dos outros dias, está a ser substituído por um domingo que é exclusivamente "fim-de-semana", ou seja, um dia destinado ao lazer que, mesmo quando não é pecaminoso, significa apenas dissipação, dado que lhe falta o conteúdo vivificador da oração, da escuta da palavra de Deus, da luz e da força que provêm da Eucaristia.

Como Pastores solícitos pelo bem das almas, devemos ajudar os cristãos da América Latina a redescobrir a centralidade do domingo na vida eclesial e social no Continente e a compreender que sem a Missa dominical vem a faltar o próprio impulso da vida cristã.

3. O domingo é o dia em que os cristãos se encontram para professar a fé em conjunto e para se alimentar da Palavra de Deus e da Eucaristia.

Sem a participação na Mesa da Palavra e na Mesa da Eucaristia não existe a possibilidade de uma Igreja viva.

Como bem sabemos, a Igreja edifica-se principalmente:

1) com uma coordenada espacial, que é a comunidade cristã, principalmente a comunidade paroquial; e
2) com uma coordenada temporal, que é o domingo, vivido em primeiro lugar mediante a participação na Santa Missa. Aliás, na Celebração Eucarística dominical a Paróquia encontra o ponto mais elevado e mais belo da sua vida.

Se uma destas duas coordenadas se debilitar, ou até mesmo chegar a faltar, a transmissão da fé perderá o seu vigor e a construção da Igreja definhará.

Para muitos cristãos que vivem na América Latina, o único contacto com a Igreja, a única fonte que alimenta a sua vida cristã é a Missa dominical. Por isso, quando deixamos de frequentar a Missa dominical, não podemos definir-nos cristãos porque, gradualmente, também Cristo nos faltará: com efeito, na Santa Missa nós encontramos Cristo vivo e presente no seu Corpo e no seu Sangue, que se oferece por todos nós. Falta-nos a Palavra de Deus, que dá verdade e sentido à nossa vida quotidiana. Falta-nos o relacionamento com a comunidade cristã e, assim, sem a Santa Missa, encontramo-nos cada vez mais sozinhos e isolados num mundo secularizado que tende a ignorar Deus. Em última análise, faltam-nos a luz e a força da fé, o sustentáculo da esperança e o calor da caridade.

Quando se deixa de cumprir o preceito dominical debilita-se a fé e sufoca-se o testemunho cristão.
Se o domingo perder o seu significado fundamental de "Dia do Senhor" e se transformar num "fim-de-semana", ou seja, num dia de pura evasão e diversão, o fiel permanecerá prisioneiro de um horizonte terrestre, tão limitado que não lhe deixará espaço para vislumbrar o céu (cf. Dies Domini, 4).

Quando, no ano 303, os 49 mártires de Abissínia, pequena cidade nos arredores de Cartago, foram interrogados e depois condenados pelo juiz por ter assistido à Missa, eles responderam: "Nós não podemos viver sem a celebração do domingo".

E nem sequer nós podemos ser cristãos sem nos reunirmos no domingo para celebrar a Eucaristia.
É necessário redescobrir e acolher em toda a sua riqueza o sentido do domingo como dia do Senhor, como um dia da alegria dos cristãos. Como Bispos, nós devemos procurar salvar e fazer reviver profundamente a identidade religiosa deste dia. É de importância capital que cada fiel se convença de que não pode viver a sua própria fé sem participar regularmente na assembleia eucarística dominical e que não pode contrastar os influxos nocivos da "cultura da morte" sem se alimentar com regularidade do "Pão da Vida". Trata-se de uma exigência inscrita no mais profundo da existência cristã. E é a condição para poder viver bem a espiritualidade cristã.

A fidelidade à Eucaristia dominical gera um dinamismo cristão que leva a contemplar o céu sem se esquecer da terra, e a olhar a terra na perspectiva celestial.

A fidelidade à Eucaristia dominical vivifica semanalmente a fé e aumenta a sede de Deus e a necessidade da oração.

A cultura da nossa sociedade secular e globalizada tende a esvaziar o domingo do seu significado religioso e originário e a fazer perder o significado e importância da Santa Missa dominical.

Daqui brota o nosso compromisso obrigatório de salvar o domingo, recuperando-o como dia do Senhor e dia da oração, dia da Igreja, dia do descanso e por conseguinte dia dedicado ao bem do homem, dia da família, da caridade e da solidariedade.

4. Contudo, existe um motivo e uma razão mais profundos para colocar a Santa Missa dominical no cerne da actividade pastoral: é a consciência de que a celebração da Eucaristia é o encontro com Cristo ressuscitado. E este é o aspecto específico que inspira esta nossa Sessão Plenária da Pontifícia Comissão para a América Latina.

Na minha opinião, é importante avaliar se entre as numerosas e apreciadas iniciativas pastorais, que se estão a tomar no âmbito das diversas dioceses da América Latina, existe uma que de certo modo resume todas as outras e se ela serve para ser a todas as comunidades católicas latino-americanas um sinal do modo como a vida cristã deve voltar a encontrar o seu "centro", para o qual fazer convergir as suas energias espirituais. Este "centro" é a Celebração Eucarística dominical e festiva, justamente definida pelo Concílio Ecuménico Vaticano II como "fonte e ápice da vida da Igreja" (Lumen gentium, 11). Em sintonia com as indicações que o Santo Padre João Paulo II emanou em ordem ao Ano da Eucaristia, gostaria de sugerir que este nosso encontro tivesse em vista propor a todas as dioceses latino-americanas, inclusive com a ajuda do CELAM, a centralização dos esforços, por um ou dois anos, numa importante iniciativa pastoral, relativa à Celebração Eucarística no Dia do Senhor.

A Santa Missa dominical não constitui um simples rito a celebrar: nos seus dois momentos - mesa da palavra e mesa da Eucaristia - ela é um encontro a realizar com Jesus Cristo ressuscitado. É entrar em comunhão com a força da palavra de Cristo e participar no banquete da ceia do Senhor.

Só se se alimentarem do Corpo e do Sangue de Cristo é que os cristãos podem ser apoiados no seu testemunho em favor da verdade do Evangelho e enfrentar com eficácia os desafios do nosso tempo. Não há dúvida de que o domingo é o centro da pastoral e a Santa Missa constitui o âmago do domingo, para renovar e refortalecer a fé e para sustentar a vida cristã. A escuta da palavra de Deus e a comunhão no Corpo de Jesus Cristo fazem-nos crescer no amor a Deus e na solidariedade para com os irmãos.

Desde o início os cristãos abandonaram o sábado, como dia a dedicar a Deus, e substituíram-no com o do "dia depois do sábado". Por que motivo o fizeram? Porque no domingo Cristo ressuscitou e no domingo teve lugar o Pentecostes. Além disso, Jesus Cristo deu importância ao domingo aparecendo aos Apóstolos na tarde de Páscoa e voltando ao cenáculo no domingo sucessivo, também na presença de São Tomé. Se da parte de todos os Bispos e sacerdotes latino-americanos houver, como fruto do Ano da Eucaristia, um compromisso unânime, o Domingo tornar-se-á de novo o coração da vida paroquial e a Santa Missa o âmago do domingo. Assim, a frequência da Missa dominical voltará a constituir um distintivo do cristão.

Os cristãos dos primeiros séculos consideravam a Santa Missa dominical como uma necessidade, sem a qual eles não podiam viver. A frequência da Missa dominical constituía um elemento que distinguia os cristãos das outras pessoas. Já no início do século II, Santo Inácio de Antioquia definia os cristãos como "aqueles que celebram o domingo".

Efectivamente, a Eucaristia dominical é o momento em que se edifica o nosso ser cristãos e o nosso ser Igreja.

Se desejarmos uma retomada do catolicismo na América Latina, a via-mestra consiste em "recomeçar a partir de Cristo, reconhecido ao partir o pão": ou seja, trabalhar a fim de que "a Missa dominical seja o centro da vida cristã na América Latina". É impossível viver realmente como cristãos, sem participar na Santa Missa dominical e nos dias de festa, porque gradualmente é o próprio Cristo que nos começa a faltar; ficamos desprovidos da Palavra de Deus, que alimenta a nossa vida de verdade e que lhe dá significado; falta-nos a força do pão eucarístico; e falta-nos o relacionamento com a comunidade cristã e o apoio que deriva deste mesmo relacionamento.

Por conseguinte, devemos multiplicar os esforços e as iniciativas em vista de fazer compreender que o tempo que reservamos a Deus, frequentando a Missa no domingo, é empregado da melhor forma.

De domingo em domingo, a frequência da Missa torna-se uma grande escola de vida cristã e um manancial inesgotável de luz e de força para vencer o mal com o bem.

Mas como é que devemos fazer para que as pessoas frequentem a Santa Missa no domingo? Esta missão foi-nos confiada a nós, Pastores da Igreja contemporânea. É uma tarefa que compete a todos os Bispos e a todos os presbíteros; é uma tarefa que cabe a nós também como Conselheiros e Membros da Pontifícia Comissão para a América Latina.

 

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