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 Pontifical Council for the Pastoral Care of Migrants and Itinerant People

People on the Move 

N° 94,  April 2004, pp. 211-212

“Responsabilidade Solidária Pelo Bem Comum”*

Os acidentes na estrada e o bem comum.

... 21. Face ao número gritante de mortos e feridos provocados pelos acidentes na estrada, 90% dos quais são devidos ao factor humano, queremos falar claramente sobre o drama dos sofrimentos por eles causados, apelando à responsabilidade de todos na melhoria desta área do bem comum. Em todo o mundo, no século XX morreram 35 milhões de pessoas e um bilião e meio de pessoas foram feridas em acidentes rodoviários.

Tudo isto é um desafio à nossa preocupação pastoral. Ainda recentemente, os participantes no primeiro encontro europeu da Pastoral da Estrada, organizado pela Santa Sé, lançaram a interpelação seguinte: “Diante desta tragédia deve tornar-se premente - diríamos urgente - o compromisso conjunto, por parte da sociedade civil, das Igrejas, das comunidades eclesiais e também dos ‘líderesÂ’ dos crentes das diversas religiões, em ordem a uma educação sobre a estrada, e não só, desde a primeira fase da infância, com vista a prestar atenção às famílias das pessoas mortas nas estradas e aos feridos, com disponibilidade à mútua compreensão e ao perdão”[1]

No nosso país, o elevado e cada vez maior índice de sinistralidade rodoviária coloca questões éticas na perspectiva do direito à vida, à integridade física e psicológica, à harmonia e bem‑estar dos cidadãos, à solidariedade.

O bem-estar das pessoas e o direito à vida implicam o dever das autoridades competentes de melhorar a rede de comunicações rodoviárias, conservar constantemente os próprios pavimentos, manter uma sinalização adequada nas rodovias e um porque automóvel seguro.

Mesmo considerando o deficiente traçado e o mau estado de muitas vias rodoviárias e veículos ou a falta de sinalização correcta, sabemos que o grande responsável por este drama é o próprio condutor. Sem formação técnica e humana, sem consciência cívica, sem responsabilidade solidária e respeito pelos outros, em suma, sem uma mudança de mentalidades, não há leis nem mecanismos possíveis que possam alterar o actual estado da situação.

As causas maiores de acidentes de viação situam-se quase sempre na irresponsabilidade do condutor: velocidade excessiva, ultrapassagens e outras manobras perigosas, condução sob o efeito do álcool e outras substâncias psicotrópricas, uso de telemóveis e audição de música em volume elevado, desrespeito pelas regras da cedência de passagem, desrespeito pelos direitos dos peões. Só numa muito reduzida percentagem os acidentes se devem a imponderáveis, não controláveis pelo condutor.

Perante esta situação dramática, as soluções devem procurar-se ao nível da prevenção, da intervenção e da coordenação das várias entidades envolvidas. Porém, a medida principal está na educação para a consciência cívica colectiva, na formação para a responsabilidade de todos (autoridades públicas, comunicação social, estabelecimentos de ensino), procurando-se criar uma atitude colectiva de cidadania contra o estado eticamente inaceitável do comportamento de grande porte dos condutores em Portugal e contribuindo, assim, para a sua responsabilização.

O condutor é um ser livre, que deve conduzir como pessoa consciente e responsável, observando o código da estrada. Nas suas regras, restrições e constrangimentos, o código da estrada favorece o respeito pelo outro e a própria liberdade do condutor. Este deve saber que, ao seguir as leis do código, procura evitar ao máximo o risco de acidentes e de colisões, além de diminuir, desse modo, o seu estado de preocupação e ansiedade.

Uma má condução, além de manifestar um profundo desprezo pela vida, é expressão de mero individualismo, trazendo ao de cima velhos instintos do ser humano, instinto do poder e da agressividade, da combatividade e seu espírito concorrencial. Em termos evangélicos, podemos dizer que uma boa condução, além de realização de um projecto pessoal, é uma ocasião para despertar e amar os outros utentes da estrada, considerados irmãos e irmãs...
 
* Carta Pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa, 15 de Setembro de 2003
[1] Cfr. Conselho Pontifício para a Pastoral dos Migrantes e Itinerantes, Conclusões do I Encontro Europeu dos Directores Nacionais para a Pastoral da Estrada (Vaticano, 3-4/ 02/ 2003).
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