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PONTIFÍCIO CONSELHO PARA AS COMUNICAÇÕES SOCIAIS

APRESENTAÇÃO DA CARTA APOSTÓLICA
DO SUMO PONTÍFICE JOÃO PAULO II
"O RÁPIDO DESENVOLVIMENTO"
AOS RESPONSÁVEIS DAS COMUNICAÇÕES SOCIAIS

21 de Fevereiro de 2005


INTERVENÇÃO DE D. JOHN PATRICK FOLEY

INTERVENÇÃO DE D. RENATO BOCCARDO


INTERVENÇÃO DE D. JOHN PATRICK FOLEY

Colegas comunicadores

Há cerca de um ano, o Santo Padre convidou gentilmente o nosso Subsecretário, Dr. Angelo Scelzo, o então Secretário D. Pierfranco Pastore e eu para almoçar com ele e para falar, entre outras coisas, sobre o 40º aniversário da promulgação do Decreto conciliar sobre as comunicações sociais, Inter mirifica. João Paulo II sentiu-se feliz por recordar que ele mesmo se encontrava presente na Basílica de São Pedro, no dia 4 de Dezembro de 1963, por ocasião da promulgação daquele Decreto e da Constituição Apostólica sobre a Liturgia, Sacrosanctum concilium.

Recordei com prazer que também eu estava presente naquela ocasião, na qualidade de sacerdote-jornalista para escrever artigos sobre o Concílio Vaticano II. O meu Ordinário, D. John J. Krol, Arcebispo de Filadélfia, que foi um dos quatro Subsecretários do Concílio, deu-me um bilhete especial para participar na cerimónia conclusiva daquela sessão do Concílio. Em 1967, D. Krol foi nomeado Cardeal juntamente com o então Arcebispo de Cracóvia, D. Karol Wojtyla.

Antes da promulgação do Decreto Inter mirifica aproximaram-se de mim alguns dos meus colegas jornalistas, que me pediram para assinar um documento de protesta contra o mesmo Decreto. Rejeitei, porque pela primeira vez um Concílio da Igreja tinha abordado especificamente o tema das comunicações sociais, porque o Decreto exigia a preparação de uma instrução pastoral sobre as comunicações sociais e porque o mesmo documento propunha a constituição de um departamento especial do Vaticano que se ocupasse de todos os instrumentos de comunicação social. Tudo isto me parecia um milagre virtual, que dificilmente merecia uma protesta! Eu nem podia imaginar que vinte anos mais tarde viria a ser nomeado Presidente precisamente do departamento que então tinha sido proposto pelo Decreto Inter mirifica.

O Santo Padre sorriu ao ouvir as minhas recordações daquele que eu ainda considerava como um dia histórico e perguntou se o nosso Pontifício Conselho estava interessado a publicar de um documento pontifício sobre as comunicações sociais para comemorar, com um ligeiro atraso, o quadragésimo aniversário do Decreto Inter mirifica. Obviamente, ficámos felizes por este seu interesse e agora estamos extremamente satisfeitos com o resultado da sua decisão.

O documento intitulado "O rápido desenvolvimento" é uma obra-prima de intuição acerca do significado dos instrumentos de comunicação social na nossa época.

Prestai atenção a estas frases citadas no parágrafo n. 3:

Os meios de comunicação social alcançaram tal importância, que se tornaram para muitos o principal instrumento de guia e de inspiração para os comportamentos individuais, familiares e sociais. Trata-se de um problema complexo, visto que esta cultura nasce, antes ainda do que os conteúdos, do próprio facto de que existem novos modos de comunicar com técnicas e linguagens inéditas.

A nossa é uma época de comunicação global, onde muitos momentos da existência humana se desenvolvem através de processos mediáticos, ou pelo menos devem confrontar-se com eles.

Na minha opinião, este conceito está estreitamente ligado ao seguinte, nesse mesmo parágrafo:

Os critérios supremos da verdade e da justiça, na prática madura da liberdade e da responsabilidade, constituem o horizonte em cujo âmbito se situa uma autêntica deontologia na fruição dos modernos e poderosos meios de comunicação social (n. 3).

No parágrafo n. 4 ele observa que também o mundo dos mass media tem necessidade da redenção de Cristo e que o estudo das Sagradas Escrituras, entendido como um grande código de comunicação de uma mensagem que não é temporária mas fundamental, pelo seu valor salvífico nos pode ajudar a ver com os olhos da fé os desenvolvimentos e o valor dos meios de comunicação social.

Depois, o Santo Padre declara:

No Verbo feito carne, o evento comunicativo adquire o máxima significado salvífico (n. 4); A comunicação entre Deus e a humanidade alcançou, portanto, a sua perfeição no Verbo feito homem (n. 5).

No corrente Ano da Eucaristia, o Santo Padre recorda-nos:

Há, depois, um momento culminante em que a comunicação se faz comunhão plena: é o encontro eucarístico. Reconhecendo Jesus na "fracção do pão" (cf. Lc 24, 30-31), os fiéis sentem-se levados a anunciar a sua morte e ressurreição e a tornar-se testemunhas corajosas e alegres do seu Reino (cf. Lc 24, 35).

Emocionei-me sinceramente ao ler as palavras do Papa João Paulo II, na sua Carta Apostólica "O rápido desenvolvimento". Para mim, este documento constitui uma meditação pessoal, um desafio e, ao mesmo tempo, um plano de acção.

Antes de deixar a palavra a Sua Ex.cia D. Renato Boccardo, Secretário do nosso Pontifício Conselho, gostaria de concluir, lendo inteiramente o parágrafo n. 6, que considero como uma maravilhosa e comovedora reflexão com que dar início à Assembleia Plenária do nosso Pontifício Conselho para as Comunicações Sociais, que começará hoje à tarde:

Graças à Redenção, a capacidade comunicativa dos fiéis é sanada e renovada. O encontro com Cristo constitui-os em novas criaturas, permite que entrem a fazer parte daquele povo que Ele conquistou com o seu sangue, morrendo na Cruz, e introdu-los na vida íntima da Trindade, que é comunicação contínua e circular de amor perfeito e infinito entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo.

A comunicação permeia as dimensões essenciais da Igreja, chamada a anunciar a todos a Boa Nova da salvação. Por isso, ela assume as oportunidades oferecidas pelos instrumentos da comunicação social como percursos dados providencialmente por Deus nos dias de hoje, para aumentar a comunicação e tornar o anúncio mais incisivo. Os mass media permitem manifestar o carácter universal do Povo de Deus, favorecendo um intercâmbio mais intenso e imediato entre as Igrejas locais, alimentando o conhecimento recíproco e a colaboração.

Damos graças a Deus pela presença destes meios poderosos que, se forem usados pelos crentes com o génio da fé e na docilidade à luz do Espírito Santo, podem contribuir para facilitar a difusão do Evangelho e para tornar mais eficazes os vínculos de comunhão entre as comunidades eclesiais.


INTERVENÇÃO DE D. RENATO BOCCARDO

1. "Inter mirifica": o decreto conciliar menos lido e pior interpretado". Esta é a resposta dada por "L'Osservatore Romano" de 5 de Maio de 1969, àqueles que, por vários motivos, consideravam Inter mirifica o último dos documentos da elaboração conciliar.

A atenção dedicada pela Igreja ao mundo da comunicação e da cultura, de facto, não pode ser reconduzida simples e simplisticamente à promulgação do decreto conciliar. De facto, já naquela época, a Igreja se movia no mundo da cultura e dos mass media com mais familiaridade e com menor perplexidade do que lhe atribuíam observadores e peritos de todas as partes da terra antes do Concílio Vaticano II. Foi Pio XII quem pediu que se estudasse uma eventual retomada do Concílio Vaticano I e numa das primeiras reuniões da comissão restrita foi realçada precisamente a necessidade de instituir um grupo ad hoc "para a acção e a cultura cristã", de forma a dar início também à preparação remota de um novo Órgão ao qual deveriam fazer referência, entre as outras competências, como a escola confessional e a Acção Católica, também o uso do cinema e da rádio.

Por conseguinte, a Inter mirifica representa um momento significativo na reflexão da Igreja universal em redor do qual se irão desenvolvendo nos anos seguintes uma multiplicidade de intervenções e de reflexões cada vez mais apropriadas ao contexto.

2. Esta riqueza é o que nos anos do pós-Concílio emergiu como património partilhado pela Igreja nos vários documentos. A Carta Apostólica que hoje apresentamos parece-me que é, de certa forma, a sua chave de leitura.

Várias vezes nas suas intervenções João Paulo II afirmou que as questões apresentadas pelas comunicações sociais no seu âmago são de natureza eminentemente antropológica. Dado que existe um vínculo estreito entre as estruturas dos mass media e a construção dos processos culturais, existem alguns aspectos problemáticos que exigem uma reflexão atenta e profundo discernimento.

Assim, se os meios de comunicação social alcançaram tal importância a ponto de serem para muitos o principal instrumento de orientação e inspiração para os comportamentos individuais, familiares, sociais, é necessário afirma a Carta Apostólica assumir como âmbitos de vigilância "a formação da personalidade e da consciência, a interpretação e a estruturação dos vínculos afectivos, a articulação das fases educativas e formativas, a elaboração e a difusão de fenómenos culturais, o desenvolvimento da vida social, política e económica".

João Paulo II pensa nos mass media como agentes activos na construção de horizontes culturais e de valores dentro dos quais cada homem e mulher se inclui a si mesmo, os outros e o mundo.
Em primeiro lugar, a mídia vai construindo modelos de percepção da realidade que muitas vezes obedecem a visões antropológicas já não cristãmente determinadas. Sem pretender ser apocalípticos mas também sem cair em visões ingénuas demasiado optimistas, não podemos deixar de nos manifestar em relação à representação do sentido da vida que eles hoje lançam na arena do debate público, porque ela está quase totalmente fora de qualquer compreensão cristã da própria vida. De facto, a indústria cultural deu início àquele processo de uma perspectiva cristã imperfeita sobre a vida e a dignidade da pessoa humana da qual o cinema, os talk show ou algumas fiction são dramáticos testemunhos. Além disso, é suficiente recordar como, com demasiada frequência, a televisão se torna instrumento poderoso de agressões pessoais, ocasião de difamações e por vezes de batalhas com frequência vulgares e privadas de bom gosto. Deste processo degenerativo não se exime a publicidade, assim como não falta a responsabilidade de quantos presidem as estruturas produtivas e comerciais cujos critérios-guia dificilmente se compreendem.

Os mass media estão relacionados com o homem e com a sua visão do mundo e da vida, com a fadigosa e fascinante aventura do aprender a ser homem. Por este motivo afirma o Papa é necessário iniciar quanto antes uma séria reflexão do grande alcance ético que seja garantia para a prática da responsabilidade pessoal e social. Uma ética dos trabalhadores dos mass media só poderá ser uma ética de profissões formativas e mover-se-á necessariamente no campo educativo.

3. Outro problema que o documento pontifício realça é o da opinião pública. O sistema da mídia, complexo e heterogéneo, constitui hoje um grande poderio de construção e de multidirecções. A Igreja olha favoravelmente e com simpatia para os meios de comunicação, mas seria ingénuo além de gravemente danoso para o bem comum não se interrogar sobre a relação entre os mass media e a construção da opinião pública. Com efeito, o sistema orienta e cultiva atitudes, designa imagens, defende escolhas de valores.

Isto depende, ainda antes do que dos conteúdos, dos próprios instrumentos. Não esqueçamos, por exemplo, que internet redifine de maneira radical a relação psicológica de uma pessoa com o espaço e com o tempo. Chama a atenção para o que é tangível, útil, imediatamente disponível. Pode vir a faltar o estímulo para um pensamento ou para uma reflexão mais profundos, enquanto que os seres humanos têm vital necessidade de tempo e de tranquilidade interior para ponderar e examinar a vida e os seus mistérios e para adquirir gradualmente um domínio maduro de si e do mundo que o circunda.

O homem on line é o homem do presente, da satisfação imediata, das relações descaracterizadas, o homem ao qual é continuamente subtraída a necessidade da escolha porque a grande Rede é armazém de experiências sempre disponíveis. Assim, o homem pode tornar-se o indivíduo sem memória, disperso na multidão de solidões. Na nossa época "está difundida em muitas pessoas a convicção de que o tempo das certezas tenha irremediavelmente passado: o homem deveria aprender a viver num horizonte de total ausência de sentido, no seguimento do provisório e do passageiro".

"Precisamente porque influem sobre a consciência dos indivíduos, formam a sua mentalidade e determinam a visão que eles têm das coisas, é necessário recordar de modo forte e claro que os instrumentos de comunicação social constituem um bem primário para a pessoa e para a humanidade e representam um património a ser tutelado e promovido".

4. Diante deste cenário, como é possível para a Igreja ajudar os homens e as mulheres que trabalham nos mass media, e os que deles fazem uso, a empreender o caminho de um novo humanismo, de uma renovada centralidade da pessoa humana?

Entre os muitos caminhos, João Paulo II indica três: a formação, a participação e o diálogo. Em primeiro lugar, a formação: trata-se de sair das situações de ocasionalidade e promover investimentos de recursos humanos que saibam enraizar na reflexão propriamente teológico-pastoral os aspectos e as competências especificamente profissionais. Muitas vezes e em numerosos documentos é recordada a urgência da formação de sacerdotes, religiosos e leigos. Estamos hoje numa época em que esta escolha já não é procrastinável.

Depois, a participação. Trata-se de iniciar projectos de cooperação entre as Igrejas para promover e coordenar instrumentos de comunicação social que se tornem espaços possíveis de comunicação segundo perspectivas cristãs. Desta forma, ter-se-á também a ocasião para se opor, entre outras coisas, ao processo de construção da opinião pública, que hoje é regulada com frequência por interesses e poderes económicos: "É necessário fazer crescer a cultura da co-responsabilidade".
Por fim, o diálogo, que os meios de comunicação podem favorecer precisamente a diversos níveis, os quais "são veículos de conhecimento recíproco, de solidariedade e de paz. Eles constituem um recurso positivo poderoso, se forem postos ao serviço da compreensão entre os povos; ao contrário, serão uma "arma" destruidora, se forem usados para alimentar injustiças e conflitos".

Confrontar-se com estes desafios e com os recursos necessários, quer humanos quer económicos, poderia levar ao desencorajamento. Mas João Paulo II repete com vigor o convite desde o início do seu pontificado: "Não tenhais medo! Não tenhais medo das novas tecnologias! Não tenhais medo das vossas debilidades e da vossa preparação insuficiente!".

Aos crentes, homens e mulheres que se preocupam com o destino da humanidade, está confiada a responsabilidade do discernimento cultural. No fundo, não nos é pedido que possuamos uma armadura luzente para vencer Golias, mas simplesmente que saibamos escolher poucas pedras, mas justas, com a sabedoria e com a coragem de David.

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