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HOMILIA DO CARDEAL TARCISIO BERTONE
NA SOLENE CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA
PARA A BEATIFICAÇÃO
DE ESTANISLAU DE JESUS MARIA (1631-1701)

Domingo, 16 de Setembro de 2007

Senhores Cardeais
Venerados Irmãos
Bispos e Sacerdotes
Ilustres Autoridades civis e militares
Queridos membros da Família religiosa fundada pelo novo Beato
Queridos irmãos e irmãs!

Antes de tudo agradeço ao Senhor porque me ofereceu, pela segunda vez, a feliz oportunidade de visitar, no espaço de poucos meses, a vossa querida Pátria, a Pátria do Beato Estanislau Papczynski e do Servo de Deus João Paulo II, que todos o esperamos possa dentro em breve ser também ele elevado à glória dos altares. Agradeço também ao Senhor porque precisamente neste santuário, onde ontem à noite nos encontrámos para a liturgia das Vésperas, hoje posso presidir à solene celebração eucarística durante a qual, em nome de Sua Santidade Bento XVI, tive a honra de proclamar Beato o Padre Estanislau Papczynski. Significativo e também comovedor é que tudo isto se realize neste famoso santuário de Nossa Senhora de Lichen, onde há muitos anos os Padres e os Irmãos Marianos, filhos espirituais do novo Beato, desempenham o seu ministério pastoral, seguindo fielmente o carisma do seu Fundador.

Com estes sentimentos de profunda gratidão ao Senhor, gostaria de saudar cordialmente os Senhores Cardeais, os Arcebispos e os Bispos presentes, com uma menção particular e reconhecida ao Bispo D. Wieslaw Mering, Pastor desta Diocese, o qual com espírito de verdadeira fraternidade me acolheu a mim e a quantos me acompanharam. Saúdo com deferência as Autoridades civis e militares locais, regionais e do Estado começando pelo Presidente da República da Polónia, o Sr. Lech Kaczynski. Hoje realiza-se o desejo do Sejm [parlamento] da Res Pubblica das duas Nações [Polónia-Lituânia], o qual no ano de 1764 apresentou à Sé Apostólica o pedido para elevar rs honras dos altares "Estanislau Papczynski, um polaco famoso pelos seus milagres" (Volumina Legum, vol. VII, Sampetersburgo 1860, pág. 168, n. 105). Saúdo todos os presbíteros e diáconos, as pessoas consagradas, e entre elas de modo particular os Padres e os Irmãos Marianos com o seu Superior-Geral, Padre Jan Mikolaj Rokosz. Saúdo os peregrinos que vieram aqui de várias partes do mundo, alguns de muito longe. Por fim, dirijo uma saudação aos que, graças às ligações da televisão e da rádio penso sobretudo nos idosos, nos doentes, nos encarcerados podem unir-se espiritualmente a este sugestivo rito litúrgico.

A palavra de Deus, que nos propõe a hodierna liturgia do XXIV Domingo do tempo comum, apresenta-nos o mistério do homem pecador e a atitude divina de extrema e infinita misericórdia.

"O Senhor arrependeu-Se das ameaças que proferira contra o Seu povo" (Êx 32, 14). A primeira leitura, há pouco proclamada, mostra-nos Moisés que depois de ter estabelecido a aliança com Deus, sobe ao Monte Sinai para receber as tábuas da Aliança e detém-se em diálogo com Ele por 40 dias. Os Israelitas, cansados de o esperar, voltam as costas a Deus esquecendo os prodígios realizados para os libertar da escravidão egípcia. O cenário que o autor sagrado descreve torna-se comovedor: Moisés, ao qual Javé revela o pecado dos Israelitas e a sua intenção de os punir, faz-se advogado e implora com fervor o perdão para aquele povo ingrato e pecador.

Não invoca a justiça de Deus, mesmo sabendo bem que Israel se manchou com a culpa mais grave caindo na tentação da idolatria, mas apela-se à misericórdia divina e à aliança que por sua iniciativa Deus estabeleceu com Abraão, com Isac e Jacob. E Deus ouve a oração de Moisés: paciente e misericordioso, abandona o propósito de punir o seu povo, que lhe voltou as costas.

Quantos ensinamentos nos oferece esta página do livro do Êxodo! Ajuda-nos a descobrir o verdadeiro rosto de Deus; ajuda-nos a compreender o mistério do seu coração bom e misericordioso. Por muito grande que possa ser a nossa falta, será sempre maior a misericórdia divina, porque Deus é Amor.

Testemunho maravilhoso deste mistério é a experiência humana e espiritual do apóstolo Paulo. Na segunda Leitura, tirada da sua primeira Carta a Timóteo, ele confessa que Cristo, o tocou no mais profundo da alma e, de perseguidor dos cristãos, o fez instrumento da graça divina para a conversão de muitos. Jesus, o verdadeiro bom Pastor, não abandona as suas ovelhas, mas deseja reconduzi-las todas ao redil do Pai. Não é esta, queridos irmãos e irmãs, também a nossa experiência? Quando com o pecado nos afastamos da recta via perdendo a alegria da amizade de Deus, se voltamos para Ele arrependidos sentimos não a dureza do seu juízo e da sua condenação, mas a doçura do seu amor que nos renova interiormente.

"Assim, digo-vos, há alegria entre os anjos de Deus por um só pecador que se arrepende" (Lc 15, 10). Estas palavras de Jesus, que o evangelista Lucas narra na página evangélica agora proclamada, confirmam ulteriormente em nós a certeza do amor misericordioso do Senhor. A Divina Misericórdia é a boa notícia que não devemos cansar-nos de proclamar e testemunhar neste nosso tempo difícil. Só Cristo, que conhece o ser humano no seu íntimo, pode falar ao coração do homem e restituir-lhe a alegria e a dignidade de homem criado à imagem de Deus. E por isto tem necessidade de colaboradores fiéis e de confiança; tem necessidade de santos e nos chama a ser santos, isto é, verdadeiros amigos e arautos do seu Evangelho.

Autêntico amigo de Cristo e seu apóstolo incansável foi o Beato Estanislau de Jesus Maria Papczynski. Nascido em Podegrodzie numa pobre família camponesa, viveu num tempo em que a Polónia, atormentada por numerosas guerras e pestes, estava a afundar cada vez mais no caos e na miséria. Formado nos sadios princípios do Evangelho, o jovem Estanislau desejava doar-se a Deus sem limites e desde a adolescência sentiu-se orientado para a Imaculada Virgem Mae de Deus.

Com o passar do tempo, o Senhor transformou o pequeno pastor, que gostava pouco de estudar e de frágil constituição física, num pregador que atraía as multidões com a sua sabedoria cheia de erudição e de misticismo profundo; num confessor cujo conselho espiritual era procurado até pelos dignitários da Igreja e do Estado; num professor cuidadosamente instruído e autor de diversas obras publicadas em numerosas edições; no fundador do primeiro Instituto masculino polaco, precisamente a Congregação dos Clérigos Marianos da Imaculada Conceição da Bem-Aventurada Virgem Maria.

Quem o orientou durante toda a existência foi precisamente Maria. No mistério da sua Imaculada Conceição o novo Beato admirava o poder da Redenção realizada por Cristo. Na Imaculada vislumbrava a beleza do homem novo, entregue totalmente a Cristo e à Igreja. Deixava-se fascinar a tal ponto por esta verdade de fé, que estava disposto a dar a vida para a defender. Sabia que Maria, obra-prima da criação divina, é a confirmação da dignidade de cada homem, amado por Deus e destinado à vida eterna no céu. Ele queria que o mistério da Imaculada Conceição distinguisse a Comunidade religiosa que tinha fundado, fosse o seu apoio constante e a verdadeira alegria. Quantas vezes, precisamente aqui, neste Santuário de Maria Mãe das Dores onde se recolhem em oração multidões de peregrinos, ressoou e continua a ser repetida esta comovedora invocação do Beato Estanislau: "Maria, tu consolas, confortas, amparas, libertas os oprimidos, os que choram, que são tentados, os deprimidos [...]. Ó doce Virgem! Mostra-nos Jesus, fruto bem-aventurado da tua vida!".

Animado pelo amor de Deus, o Beato Estanislau ardia de uma forte paixão pela salvação das almas e dirigia-se aos seus ouvintes com tons prementes como este: "Volta portanto para o teu Pai! Porque andas errante pelo longínquo país das paixões, privado dos sentimentos de amor do Sumo Bem? Volta para o Pai! Cristo chama-te, vai para Ele" (Inspectio cordis, 1, 25, 2).

Seguindo o exemplo do Bom Samaritano, detinha-se ao lado de quantos estavam feridos na alma, aliviava os seus sofrimentos, confortava-os infundindo neles esperança e serenidade, conduzia-os à "pousada do perdão", que é o confessionário, ajudando-os assim a recuperar a sua dignidade crista perdida ou recusada.

A caridade divina estimulava o Beato Estanislau a fazer-se evangelizador especialmente dos pobres, do povo simples, socialmente discriminado e descuidado sob o ponto de vista espiritual, de quantos se encontram em perigo de morte. Consciente de como estava difundida na época a chaga do alcoolismo, com a palavra e com a vida ensinava a sobriedade e a liberdade interior como um antídoto eficaz contra qualquer tipo de dependência. Animado depois por um profundo sentimento de amor pátrio pela República das Nações polaca, lituana e rutena, não hesitava em estigmatizar a busca do próprio interesse em quantos geriam o poder, o abuso da liberdade nobiliária e a promulgação de leis injustas. Ainda hoje o novo Beato lança à Polónia, à Europa, que fadigosamente procura os caminhos da unidade, um convite sempre actual: só lançando bases sólidas em Deus pode haver verdadeira justiça social e paz estável.

Queridos irmãos e irmãs, o amor do Beato Estanislau pelo homem alargava-se também aos defuntos. Depois de ter vivido a experiência mística do sofrimento de quantos se encontravam no purgatório, rezava com fervor por eles e exortava todos a fazer o mesmo. Ao lado da difusão do culto da Imaculada Conceição e do anúncio da Palavra de Deus, a oração pelos defuntos torna-se assim uma das finalidades principais da sua Congregação. O pensamento da morte, a perspectiva do paraíso, do purgatório e do inferno ajudam a "empregar" de modo sábio o tempo que transcorremos na terra; encorajam-nos a considerar a morte como etapa necessária do nosso itinerário para Deus; estimulam-nos a acolher e respeitar sempre a vida como dom de Deus, desde a concepção até ao seu fim natural. Que sinal significativo para o mundo dos nossos dias é o milagre da "inesperada continuação da gravidez entre a 7ª e a 8ª semana de gestação" que se verificou por intercessão do Padre Papczynski. O dono da vida humana é Deus!

O segredo da vida é a caridade: o inefável amor de Deus, que ultrapassa a fragilidade humana, leva o coração do homem a amar a vida, a amar o próximo e até os inimigos. Aos seus filhos espirituais o novo Beato confiou desde o início esta recomendação: "Um homem sem caridade, um religioso sem a caridade, é uma sombra sem o sol, um corpo sem a alma, simplesmente é uma nulidade. Aquilo que a alma é no corpo, na Igreja, nas ordens religiosas e nas casas religiosas, é a caridade". Portanto, não admira verificar que, entre tantas contrariedades e cruzes, diversos discípulos seus se tenham distinguido pela sua perfeição evangélica. É suficiente recordar o venerável Servo de Deus Pe. Kazimierz Wyszynski (1700-1755), fervoroso promotor do culto mariano, o Beato Arcebispo Giorgio Matulaitis-Matulewicz (1871-1927), providencial renovador e reformador da Congregação dos Clérigos Marianos e padroeiro da reconciliação entre a Nação polaca e a lituana; os Beatos mártires de Rosica (Bielo-Rússia), Jerzy Kaszyra (1904-1943) e Antoni Leszczewicz (1890-1943), os quais, durante a segunda guerra mundial entregaram livremente a vida pela fé em Cristo e por amor aos homens. Até nos momentos dramáticos da perseguição, a obra do beato Estanislau não foi cancelada. O Beato Jorge Matulaitis-Matulewicz voltou a dar-lhe impulso, testemunhando, mais uma vez, que o Amor vence tudo.

Queridos Padres e Irmãos Marianos, é-vos hoje confiada a preciosa herança espiritual do vosso Fundador: acolhei-a e sede em toda a parte, como ele, incansáveis anunciadores do amor misericordioso de Deus, mantendo o olhar fixo em Maria Imaculada para que se realize em cada um de vós o projecto divino.

Queridos devotos e peregrinos, a Igreja na Polónia está em festa pela elevação aos altares deste seu filho eleito. O exemplo da sua vida santa e a sua celeste intercessão sirvam de encorajamento a todos para abrir sempre o coração confiante à omnipotência do amor de Deus. Repletos de alegria e de esperança, damos graças a Deus pelo dom do novo Beato e louvemo-lo com as palavras do apóstolo Paulo: "Ao Rei dos séculos, imortal, invisível, Deus único, honra e glória pelos séculos dos séculos. Amém" (1 Tm 1, 17).

 

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