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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

O Evangelho ao alcance de todos

Terça-feira, 3 de Fevereiro de 2015

 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 6 de 5 de Fevereiro de 2015

Ler todos os dias uma página do Evangelho por «dez, quinze minutos e não mais», mantendo «o olhar em Jesus» para «me imaginar na cena e falar com ele, como me vem do coração»: estas são as características da «oração de contemplação», verdadeira fonte de esperança para a nossa vida, afirmou o Santo Padre.

Na primeira leitura, frisou Francisco, «o autor da Carta aos Hebreus (12, 1-4) evoca a memória dos primeiros dias depois da conversão, após o encontro com Jesus, e também a memória dos nossos pais: “Quanto sofreram quando estavam a caminho”». Precisamente «observando esses pais diz: “Também nós circundados por essa multidão de testemunhas”». Portanto é «o testemunho dos nossos antepassados» que «ele evoca». E «evoca também a nossa experiência, quando éramos tão felizes no primeiro encontro com Jesus». Esta «é a memória, da qual falámos como uma referência da vida cristã».

Mas hoje, afirmou o Papa, «o autor da Carta fala de outra referência, isto é, da esperança». E «diz-nos que devemos ter coragem de ir em frente: “Continuemos com perseverança na corrida que temos à nossa frente”». Depois «diz qual é de facto o núcleo da esperança: “manter o olhar fixo em Jesus”». Eis o ponto: «se não mantivermos o olhar fixo em Jesus dificilmente podemos ter esperança». Talvez «possamos ser optimistas, positivos, mas a esperança?».

De resto, explicou Francisco, «só se aprende a esperança olhando para Jesus, contemplando Jesus; aprende-se com a oração de contemplação». E «sobre isto gostaria de falar hoje», disse, alimentando a sua reflexão através de uma pergunta: «Posso perguntar-vos como rezais?». Alguém, disse, poderia responder: «Recito as orações que aprendi quando era criança». E comentou: «Isto é bom». Outro poderia acrescentar: «Recito também o terço, mas todos os dias!». E o Papa: «É bom rezar o terço todos os dias». Enfim, alguém poderia dizer: «Falo também com o Senhor, quando tenho uma dificuldade, ou com Nossa Senhora ou com os santos...». E também «isto é bom».

Contudo, o Pontífice fez outra pergunta: «Mas tu recitas a oração de contemplação?». Uma pergunta, talvez, um pouco constrangedora a ponto que alguém poderia dizer: «O que é isto, padre? Como é esta oração? Onde se compra? Como se faz?». A resposta de Francisco é clara: «Só pode ser feita com o Evangelho nas mãos». Na prática, sugeriu, «pegas o Evangelho, escolhes um trecho, lês duas vezes; imaginas, como se tu visses o que acontece e contemplas Jesus».

Para dar uma indicação prática, o Papa citou como exemplo exactamente o trecho do Evangelho de Marcos (5, 21-43) proposto pela liturgia, que «nos ensina muitas coisas boas». Partindo desta página, perguntou: «Como faço a contemplação com o Evangelho hoje?». E ao partilhar a sua experiência pessoal, propôs uma primeira reflexão: «Vejo que Jesus estava no meio da multidão que, ao seu redor, era muito numerosa. Neste trecho aparece a palavra «multidão» cinco vezes. Mas Jesus não descansava? Posso pensar: sempre com a multidão! Jesus passou a maior parte da vida nas ruas com a multidão. Mas não repousava? Sim, uma vez: o Evangelho diz que dormia no barco, mas veio a tempestade e os discípulos despertaram-no. Jesus estava continuamente no meio do povo». Por isso, sugeriu o Papa, «olha-se para Jesus assim, contemplo Jesus assim, imagino Jesus desta forma. E digo a Jesus o que me vem à mente».

Francisco prosseguiu a sua meditação com estas palavras: «No meio da multidão havia uma mulher doente e Jesus percebeu-se. Mas como faz Jesus, no meio de tantas pessoas, a sentir que uma mulher lhe tocou?». De facto, é ele quem faz a pergunta directa: «Quem me tocou?». Os discípulos dizem a Jesus: «Tu vês a multidão que se estreita ao teu redor e dizes: “Quem me tocou?”». A questão, afirmou o Papa, é que «Jesus não só compreende e sente a multidão, mas ouve o palpitar do coração de cada um de nós, de cada um: cuida de todos e de cada um, sempre!».

Continuando a reler o trecho de Marcos, o Papa explicou que a mesma situação se repete também quando se aproxima de Jesus «o chefe da sinagoga, para lhe dizer que a filha está gravemente doente. E ele deixa tudo e ocupa-se dela: Jesus no pouco e no muito, sempre!». Depois, prosseguiu, «podemos ver quando chega à casa, vê aquela confusão, as mulheres que tinham sido chamadas para chorar no velório do defunto: gritos, prantos». Mas Jesus diz: «Estai tranquilos: ela dorme!». E depois dessas palavras houve quem até zombou dele. Contudo «ele permanece quieto» e com a sua «paciência» consegue suportar a situação, não responder aos que o escarneciam.

A narração evangélica culmina com «a ressurreição da menina». E Jesus «em vez de dizer: “Muito bem, Deus!”, diz-lhes: “Por favor, dai-lhe de comer”». Porque Jesus, foi a conclusão do Papa, «tem sempre os pormenores diante de si».

«O que fiz com este Evangelho — explicou Francisco — é precisamente a oração de contemplação: tomar o Evangelho, ler e imaginar-me na cena, imaginar o que acontece e falar com Jesus, como me vem do coração». E «assim fazemos crescer a esperança, porque mantemos o olhar fixo em Jesus». Eis a proposta: «recitai esta oração de contemplação». E mesmo que tenhamos muitos compromissos, sugeriu, podemos sempre encontrar tempo, talvez quinze minutos em casa: «Pega no Evangelho, num trecho pequeno, imagina o que aconteceu e fala com Jesus sobre ele». Assim «o teu olhar permanecerá fixo em Jesus e não só nas telenovelas, por exemplo; a tua audição permanecerá fixa nas palavras de Jesus e não tanto nos mexericos do vizinho, da vizinha».

«A oração de contemplação ajuda-nos na esperança» e ensina-nos a «viver da substância do Evangelho», afirmou o bispo de Roma. Por isso é preciso «rezar sempre: recitar as orações, o terço, falar com o Senhor, mas também fazer esta oração de contemplação para manter o nosso olhar fixo em Jesus». Dela «vem a esperança». E assim também «a nossa vida cristã caminha naquele cenário, entre memória e esperança: memória de todo o caminho passado, de muitas graças recebidas do Senhor; e esperança, olhando para o Senhor, o único que me pode dar a esperança». E «a fim de olhar para o Senhor, para o conhecer, comecemos do Evangelho e recitemos esta oração de contemplação».

Concluindo, Francisco não deixou de propor de novo a experiência da oração de contemplação: «Hoje por exemplo — sugeriu — procurai dez, quinze minutos, não mais: lede o Evangelho, imaginai e dizei algo a Jesus. E nada mais. Assim o vosso conhecimento de Jesus será maior e a vossa esperança crescerá. Não vos esqueçais, mantende o olhar fixo em Jesus». É exactamente por isso que se chama «oração de contemplação».

 



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