PAPA FRANCISCO
MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE
Como se muda
Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 12 de 19 de Março de 2015
Somos nós o «sonho de Deus», que como verdadeiro apaixonado, quer «mudar a nossa vida». Precisamente por amor. A nós pede unicamente que tenhamos fé e que o deixemos agir. E assim «podemos unicamente chorar de alegria» diante de um Deus que nos «recria».
Na primeira leitura, tirada de Isaías (65, 17-21) «o Senhor diz-nos que cria novos céus e novas terras, ou seja, “recria” as coisas», observou Francisco, recordando também que «muitas vezes falámos destas “duas criações” de Deus: a primeira, a que foi feita em seis dias, e a segunda, quando o Senhor “refaz” o mundo, arruinado pelo pecado, em Jesus Cristo». E, esclareceu, «dissemos tantas vezes que esta segunda é mais maravilhosa do que a primeira». Com efeito, explicou o Papa, «a primeira já é uma criação maravilhosa; mas a segunda, em Cristo, é ainda mais maravilhosa».
Contudo, na meditação Francisco escolheu aprofundar «outro aspecto», a partir precisamente do trecho de Isaías no qual, explicou, «o Senhor fala do que fará»: um novo céu, uma nova terra». E «vemos que o Senhor tem tanto entusiasmo: fala de alegria e diz uma palavra: “Alegro-me com o meu povo”». Em síntese, «o Senhor pensa no que fará, pensa que ele mesmo estará na alegria com o seu povo». Assim «é como se fosse um “sonho” do Senhor, como se o Senhor “sonhasse” connosco: como será bom quando todos nos encontrarmos, quando estaremos ali, ou quando aquela pessoa caminhar...».
Esclarecendo ainda mais o seu raciocínio, Francisco recorreu a «uma metáfora que nos pode fazer compreender: é como se uma jovem com o seu namorado ou um jovem com a sua namorada pensassem: quando estivermos juntos, quando casarmos...». Eis, precisamente, «”o sonho” de Deus: Deus pensa em cada um de nós, gosta de nós, sonha a alegria da qual gozará connosco». E é precisamente «por isto que o Senhor nos quer “recriar”, renovar o nosso coração, “recriar” o nosso coração para fazer triunfar a alegria».
Tudo isto levou o Papa a sugerir algumas perguntas: «Alguma vez pensastes: o Senhor sonha comigo? Pensa em mim? Estou na sua mente, no coração do Senhor? O Senhor é capaz de mudar a minha vida?». Isaías, acrescentou, diz-nos também que o Senhor «faz tantos planos: fabricaremos casas, plantaremos vinhas, comeremos juntos: todos aqueles projectos típicos de um apaixonado».
De resto, «o Senhor manifesta-se apaixonado pelo seu povo» chegando até a dizer: «Mas eu não te escolhi porque tu és o mais forte, o maior, o mais poderoso; mas escolhi-te porque és o mais pequeno de todos». E mais, «poder-se-ia dizer: o mais miserável de todos. Mas eu escolhi-te assim, e isto é amor».
«Eis por que — afirmou o Papa — esta contínua vontade do Senhor, este seu desejo de mudar a nossa vida. E nós podemos dizer, se ouvirmos este convite do Senhor: “Transformaste a minha lamentação em dança”», ou seja, as palavras «que rezamos» no salmo 29. «Exaltar-te-ei, Senhor, porque me levantaste» diz ainda o salmo, reconhecendo assim que o Senhor «é capaz de nos mudar, por amor: está apaixonado por nós».
«Penso que não há nenhum teólogo que possa explicar isto: não tem explicação» frisou Francisco. Porque «sobre isto pode-se unicamente reflectir, ouvir e chorar de alegria: o Senhor pode transformar-nos». A este ponto é espontâneo perguntar: que devo fazer? A resposta é clara: «Acreditar, crer que o Senhor nos pode mudar, que ele pode». Exactamente o que fez aquele funcionário do rei que tinha um filho doente em Cafarnaum, como narra João no seu Evangelho (4, 43-54). Aquele homem, lê-se, «pedia a Jesus que curasse o seu filho, porque estava para morrer». E Jesus respondeu-lhe: «Vai, o teu filho vive!». Portanto aquele pai «acreditou na palavra que Jesus lhe disse e pôs-se a caminho: acreditou, acreditou que Jesus tinha o poder de curar o seu filho. E tinha razão».
«A fé — explicou Francisco — é dar espaço a este amor de Deus; é dar espaço ao seu poder, ao poder de Deus, ao poder de alguém que ama, que está apaixonado por mim e que deseja a alegria comigo. Esta é a fé. Isto é crer: dar espaço ao Senhor para que venha e me mude».
O Papa concluiu com uma significativa anotação: «É curioso: foi este o segundo milagre que Jesus fez. E fê-lo no mesmo lugar no qual tinha feito o primeiro, em Caná da Galileia». No trecho do Evangelho de hoje lê-se: «Foi, portanto, de novo a Caná da Galileia, onde tinha transformado a água em vinho». De novo «em Caná da Galileia muda também a morte desta criança em vida». Deveras, disse Francisco, «o Senhor pode transformar-nos, quer transformar-nos, gosta de nos transformar. E isto, por amor». A nós, concluiu, «pede unicamente a nossa fé: ou seja, dar espaço ao seu amor para que possa agir e fazer uma mudança de vida em nós».
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