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VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO
AO QUÉNIA, UGANDA E REPÚBLICA CENTRO-AFRICANA

(25-30 DE NOVEMBRO DE 2015)

ENCONTRO COM O CLERO, OS RELIGIOSOS,
AS RELIGIOSAS E OS SEMINARISTAS

DISCURSO DO SANTO PADRE

Campo Esportivo da Escola de Santa Maria, Nairobi (Quénia)
Quinta-feira, 26 de Novembro de 2015

[Multimídia]


 

V. Tumisufu Yesu Kristu! [Louvado seja Jesus Cristo!]

R. [Milele na Milele. Amina (Agora e sempre. Amen)]

Muito obrigado pela vossa presença. Gostaria muito de vos falar em inglês, mas o meu inglês é pobre! Tomei nota e quero dizer-vos tantas coisas a todos vós, a cada um de vós, mas sinto-me inseguro se vo-las disser em inglês; prefiro falar na minha língua materna. Mons. Miles é o tradutor. Obrigado pela vossa compreensão.

Quando estava a ser lida a carta de São Paulo, impressionaram-me estas palavras: «É exactamente nisto que ponho a minha confiança: Aquele que em vós deu início a uma boa obra há-de levá-la ao fim, até ao dia de Cristo Jesus» (Flp 1, 6).

O Senhor escolheu-vos a todos; escolheu-nos a todos. E Ele deu início à sua obra no dia em que nos fixou no Baptismo e, depois, no dia em que nos fixou quando nos disse: «Se quiseres, vem comigo». Então pusemo-nos na fila [dos seus seguidores] e começámos o caminho. Mas o caminho foi Ele que o iniciou, não nós. Não fomos nós. No Evangelho, lemos que uma pessoa por Ele curada queria segui-Lo ao longo do caminho, mas Jesus disse-lhe: «Não». No seguimento de Jesus Cristo – tanto no sacerdócio como na vida consagrada – entra-se pela porta; e a porta é Cristo. Ele chama, Ele começa, Ele vai-nos trabalhando. Há alguns que querem entrar pela janela; mas isso não resulta. Por favor, se alguém vir que um companheiro ou uma companheira entrou pela janela, abraçai-o e explicai-lhe que é melhor ir embora e servir a Deus noutro lado, porque nunca chegará ao fim uma obra cujo início não foi dado por Jesus, por Ele mesmo, através da porta.

Isto há-de levar-nos à consciência de ser escolhidos: «Ele fixou-me, fui escolhido». Faz-me impressão o início do capítulo 16 de Ezequiel: «Eras filha de estrangeiros, uma recém-nascida abandonada; mas Eu passei, lavei-te e tomei-te comigo». Temos aqui o caminho, a obra que o Senhor começou, quando pousou o seu olhar sobre nós.

Há alguns que não sabem para que os chama Deus, mas sentem que Deus os chamou. Ficai tranquilos, Deus vos fará compreender para que vos chamou. Há outros que querem seguir o Senhor por conveniência, por interesse. Lembremos a mãe de Tiago e João: «Senhor, peço-te que, ao dividires o bolo, dês o pedaço maior aos meus filhos. Que um fique à tua direita, e o outro a tua esquerda». Esta é a tentação de seguir Jesus por ambição: a ambição do dinheiro, a ambição do poder. Talvez todos nós possamos dizer: «Quando comecei a seguir Jesus, isso nem sequer me passou pela cabeça». Mas a qualquer outro passou, e pouco a pouco foi-o semeando no teu coração como cizânia.

Na vida do seguimento de Jesus, não há lugar para ambições próprias, nem para riquezas, nem para ser uma pessoa importante no mundo. A Jesus segue-se até ao último passo da sua vida terrena: a Cruz. Depois Ele encarrega-Se de te ressuscitar, mas tu deves ir até lá. Isto que vos digo é sério, porque a Igreja não é uma empresa, não é uma ONG. A Igreja é um mistério: é o mistério do olhar de Jesus pousado sobre cada um, que lhe diz: «Segue-me».

Então, que fique claro: quem chama é Jesus; entra-se pela porta, não pela janela; e segue-se o caminho de Jesus.

Evidentemente, quando Jesus nos escolhe, não nos «canoniza»; continuamos a ser os mesmos pecadores. Pedir-vos-ia, por favor, que, se houvesse aqui algum sacerdote, alguma religiosa ou algum religioso que não se sinta pecador, levantasse a mão. Todos somos pecadores, a começar por mim e depois vós; mas animam-nos a continuar a ternura e o amor de Jesus.

«Aquele que deu início a uma boa obra, há-de levá-la ao fim». É isto que nos faz continuar: foi o amor de Jesus que a começou. Lembrais-vos de ler no Evangelho, quando o apóstolo Tiago chorou? Há algum de vós que se lembra ou não? Não! E quando chorou o apóstolo João? Não. E quando chorou um dos outros apóstolos? Apenas um – diz-nos o Evangelho – chorou: aquele que se deu conta de ser pecador. Era tão pecador que tinha renegado o seu Senhor e, quando se deu conta disso, chorou. Depois Jesus fê-lo Papa. A Jesus, quem O entende? É um mistério!

Nunca deixeis de chorar. Quando secam as lágrimas a um sacerdote, a um religioso ou a uma religiosa, algo está errado. Chorar pelas próprias infidelidades, chorar pelo sofrimento do mundo, chorar pelas pessoas que são descartadas, pelos velhinhos abandonados, pelas crianças assassinadas, pelas coisas que não entendemos; chorar quando nos perguntam «porquê?». Nenhum de nós tem todas as respostas para os «porquês».

Um autor russo questionava-se por que sofrem as crianças. E sempre que saúdo uma criança com um câncer, um tumor ou – como se diz – uma doença rara, pergunto-me: Por que sofre aquela criança. E não tenho resposta; limito-me a olhar para Jesus na cruz. Há situações na vida perante as quais só nos resta chorar, olhando para Jesus na cruz; e esta é a única resposta para certas injustiças, para certos sofrimentos, para certas situações da vida.

São Paulo dizia aos seus discípulos: «Lembrai-vos de Jesus Cristo; lembrai-vos de Jesus Cristo crucificado». Quando um consagrado, uma consagrada, um sacerdote se esquece de Cristo crucificado, ai dele porque caiu num pecado muito feio, um pecado que dá nojo a Deus, que O faz vomitar: o pecado da tibieza. Queridos sacerdotes, irmãs e irmãos, tende cuidado em não cair no pecado da tibieza.

Bem! Que mais vos posso dizer como mensagem que brote, para vós, do meu coração? Nunca vos afasteis de Jesus. Por outras palavras: nunca deixeis de rezar. «Mas, padre, às vezes é tão chato rezar; cansamo-nos, adormecemos!» Pois bem, dormi diante do Senhor: é uma maneira de rezar. Mas permanecei ali, diante d’Ele. Rezai! Não deixeis a oração!

Se um consagrado deixa a oração, a alma seca; seca como os figos secos, que são feios, têm um aspecto feio. A alma duma religiosa, dum religioso, dum sacerdote que não reza, é uma alma feia! Desculpai, mas é assim...

Deixo-vos esta pergunta: tiro tempo ao sono, tiro tempo ao rádio, à televisão, às revistas para rezar? Ou prefiro estas coisas? Portanto, coloquemo-nos diante d’Aquele que deu início à obra e que a está levando a termo em cada um de nós... A oração.

Queria dizer-vos uma última coisa (antes de vos dizer outra...): todos aqueles que se deixaram escolher por Jesus, foi para servir; para servir o povo de Deus, servir os mais pobres, os mais descartados, os mais humildes; para servir as crianças e os idosos; para servir também aquelas pessoas que não têm consciência do orgulho e do pecado em que vivem; para servir Jesus. Deixar-se escolher por Jesus é deixar-se escolher para servir e não para ser servido.

Há cerca de um ano, mais ou menos, houve um encontro de sacerdotes – neste caso, salvam-se as religiosas! – e cada dia, durante aquele Retiro, havia um grupo de sacerdotes que tinha de servir à mesa. Alguns deles lamentaram-se: «Não está certo! Devíamos ser servidos! Nós pagamos, podemos pagar para que nos sirvam». Por favor, que isto nunca aconteça na Igreja! Servir. Não servir-se dos outros, mas servir.

Isto é o que vos queria dizer, o que improvisamente senti quando ouvi aquela frase de São Paulo: «Aquele que em vós deu início a uma boa obra há-de levá-la ao fim, até ao dia de Cristo Jesus».

Dizia-me um cardeal – um cardeal idoso; na realidade, tinha apenas mais um ano que eu! – que, quando vai ao cemitério onde vê missionários, missionárias, sacerdotes, religiosos, religiosas que deram a sua vida, questiona-se: Por que não os canonizam já amanhã? Passaram a vida a servir! E eu próprio me sinto emocionado quando, depois duma Missa, saúdo um sacerdote, uma religiosa que me diz: «Há 30, 40 anos que estou neste hospital para crianças com autismo, que estou nas missões da Amazónia, que estou neste lugar ou naquele. Toca-me a alma! Esta mulher ou este homem compreendeu que seguir Jesus é servir os outros e não servir-se dos outros.

Bem, agradeço-vos imenso. Se o não fizesse, poderiam pensar: Que Papa mal-educado é este! Deu-nos conselhos, chegou-nos a roupa ao pêlo e nem um «obrigado» nos diz. Eu quero – é a última coisa que tenho para vos dizer, é a cereja no cimo do bolo – quero deveras agradecer-vos! Obrigado pela coragem que tendes em seguir Jesus. Obrigado por cada vez que vos sentis pecadores. Obrigado por cada toque de ternura que dais a quem dela precisa. Obrigado por todas as vezes que ajudastes as pessoas a morrerem em paz. Obrigado por queimarem a vida na esperança. Obrigado por vos deixardes ajudar, corrigir e perdoar todos os dias.

Ao mesmo tempo que vos agradeço, peço que não vos esqueçais de rezar por mim, porque preciso. Muito obrigado!

(Palavras improvisadas, no final do encontro)

Agradeço-vos este pedaço de tempo que passamos juntos, mas agora tenho que ir; e vou sair por esta porta, porque estão crianças doentes de câncer e quero vê-las e fazer-lhes uma carícia. A vós, o meu muito obrigado! Agradeço a vós todos, nomeadamente aos seminaristas que não nomeei mas estão incluídos em tudo o que eu disse; e, se algum já há tempo não se sente com ânimo para prosseguir neste caminho, então procure outra ocupação, case-se e forme uma boa família. Obrigado!

 



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