VISITA PASTORAL À REGIÃO DA LOMBARDIA
20-22 DE MAIO DE 1983
DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II
NO ENCONTRO COM AS RELIGIOSAS
Palácio dos Desportos
Sexta-feira, 20 de Maio de 1983
Caríssimas Religiosas de Milão e da Lombardia!
1. A minha visita a esta Arquidiocese, por ocasião do Congresso Eucarístico Nacional, tem uma característica bem definida e significativa: é um itinerário de testemunho, de catequese e de adoração do Santíssimo Sacramento do Altar. Não podia, por conseguinte, faltar um especial encontro convosco, Religiosas, que precisamente estais consagradas a Cristo, presente na Eucaristia, e que vos preparastes para este grande acontecimento com intensa oração.
Saúdo-vos cordialmente e exprimo-vos o meu reconhecimento e a minha estima pela vasta e cuidadosa obra realizada por vós e pelas vossas Congregações singularmente, ao serviço desta Igreja local da terra Lombarda. Quantos frutos espirituais e também sociais produziu o vosso amor a Cristo e aos irmãos! Uma imensa plêiade de almas consagradas de século em século difundiu em toda a parte bondade, amor, caridade, consolo, alegria, bem-estar, consolação: as crianças foram acolhidas e educadas, os pais ajudados e aconselhados, os jovens amados e guiados, os doentes curados e confortados, os pobres socorridos e consolados, os marginalizados e os extraviados amorosamente hospedados e alojados. Certamente, não foi possível socorrer todo o sofrimento e eliminar toda a miséria; talvez possa ter havido faltas e defeitos: mas não se pode deixar de reconhecer lealmente o imenso trabalho realizado nesta terra, com amor e com dedicação algumas vezes heróica, pelas Religiosas das várias Congregações; por vós, que encontrais força e alegria, serenidade e coragem na íntima união com Jesus Eucarístico. Onde quer que passe o vosso amor e o vosso sorriso, com a graça de Deus, frutifica o bem! Por tudo isto agradeçamos juntos ao Senhor, que vos chamou e escolheu para tanta dignidade e vos deu missão tão nobre e sempre válida; e ao mesmo tempo peçamos-lhe que, também mediante o vosso fervoroso testemunho, dê à Igreja de hoje numerosas e santas vocações, tão precisas para a actual sociedade necessitada sobretudo de amor, de compreensão, de misericórdia e de esperança.
A minha saudação torna-se portanto auspício e exortação a serdes cada vez mais ardentes no empenho da vossa santificação e da caridade fraterna, e torna-se extensiva a todas as vossas Irmãs que não puderam estar presentes no encontro, devido a empenhos inderrogáveis e de saúde, e dirige-se, com especial afecto, às numerosas Claustrais, que, em contínua oração e oferta, são parte insubstituível e fecunda da Igreja e do próprio organismo social.
2. O importante acontecimento do Congresso Eucarístico que me impeliu a vir como peregrino à Lombardia sugere-me também a recomendação que vos deixo esta tarde: a vossa espiritualidade eucarística seja sempre profundamente dogmática.
O dogma eucarístico afirma a presença verdadeira, real e substancial de Cristo que se oferece ao Pai como sacrifício em nosso nome e se une intimamente a nós na Comunhão.
O Concilio Tridentino, recordando e interpretando com autoridade definitiva as palavras ditas por Jesus quer sobre o Pão da Vida (Jo. 6) quer na Última Ceia, exprimia-se deste modo: "A Igreja de Deus teve sempre esta fé: imediatamente depois da consagração, sob as espécies do pão e do vinho está o verdadeiro Corpo de nosso Senhor e o verdadeiro Sangue, juntamente com a sua alma e a sua divindade. O Corpo existe sob as espécies do pão e o Sangue sob as espécies do vinho em virtude das palavras da consagração. O Corpo está sob as espécies do vinho, o Sangue sob as espécies do pão e a alma sob ambas as espécies em virtude daquela relação e concomitância natural que tem unidas todas as partes de Cristo Senhor, que ressuscitou da morte para nunca mais morrer; por fim, a divindade encontra-se presente pela sua admirável união hipostática com o seu corpo e a sua alma. Portanto, é bem verdade que está contido tanto sob uma das duas espécies como sob as duas. De facto, como Cristo está todo inteiro sob as espécies do pão e sob cada parte da mesma espécie, assim também , está todo inteiro, sob as espécies do vinho e sob a suas partes" (Sess. XIII, 3).
O Concílio Tridentino além disso, interpretando as afirmações dos apóstolos, da Epístola aos Hebreus e de toda a Igreja primitiva, afirma e explica que a Eucaristia é a "presença sacrifical" de Cristo no tempo, ou seja é a renovação do Sacrifício da Cruz.
O Concílio Vaticano II reafirma a mesma verdade: "Todas as vezes que no altar é celebrado o sacrifício da Cruz, no qual Cristo imolado é a nova Páscoa. (1 Cor. 5, 7), actua-se a obra da nossa redenção" (Lumen gentium, 3; cf. Sacrosanctum Concilium, 47).
3. Alimentai portanto de verdades dogmáticas a vossa espiritualidade e a vossa catequese! Lede e meditai os grandes e fundamentais documentos doutrinais da Igreja referentes à Eucaristia, as Encíclicas, as exposições dos Mestres qualificados e autênticos, as experiências dos santos e dos místicos! Nenhuma confusão ou mistificação pode haver acerca da Eucaristia!
Dizia bem São Tomás de Aquino que a verdade da Eucaristia "não se pode aprender com os sentidos, mas apenas com a fé, a qual se apoia na autoridade de Deus" (S. Th. III, 75, 1). E Santo Ambrósio, o grande Bispo de Milão (334-397), escrevia: "Não é sem um significado que dizes 'Amém', porque confessas já no teu espírito que recebes o Corpo de Cristo. Por conseguinte, quando te aproximas para o pedir, o sacerdote diz-te: 'O Corpo de Cristo', e tu respondes: 'Amém', isto é: 'É verdadeiro'. A íntima persuasão guarda o que a boca confessa" (De Sacramentis V, 5, 25).
O cristão está convencido que, como criatura, deve rezar e adorar Deus, o Criador e Senhor do universo e da sua vida; mas iluminado pela fé sabe que a verdadeira "adoração" perfeitamente válida, digna da infinita santidade de Deus e da sua mesma inteligência pessoal, só é possível mediante o Sacrifício da Missa, ao qual toda a outra oração se une: não se pode viver sem adorar e, por conseguinte, não se pode viver sem a Missa! O cristão sabe que Jesus está presente em forma de "alimento" e de "bebida", porque se "deu" totalmente aos homens e quer unir-se intimamente connosco, para nos fortificar na fé é na vontade, para nos consolar nas atribulações, para nos transformar n'Ele, para nos inflamar de amor para com todas as criaturas. Só do dogma eucarístico, exactamente compreendido e totalmente vivido provêm o verdadeiro significado da existência cristã, a força da vocação religiosa, o autêntico empenho da transformação da sociedade, o iluminado sentido da unidade em Cristo, na verdade e na caridade.
Na mesma obra sobre os Sacramentos, Santo Ambrósio escrevia: "Recebe cada dia o que todos os dias te deve fazer bem! E vive de modo a seres digno de o receber cada dia!... Quem foi ferido, vai curar-se. A nossa ferida é esta, que estamos sob o pecado, e o remédio é o celeste e adorável sacramento" (ibid., V, 4, 25).
4. A Eucaristia, isto é a Santa Missa e a Santa Comunhão, seja verdadeiramente o centro afectivo e dinâmico da vossa vida consagrada e de todas as vossas Comunidades, de modo que resplandeçam sempre em vós as virtudes mesmas de Cristo: a fortaleza, a paciência, a bondade, a generosidade, a oferta total, a alegria sobrenatural. Tudo isto algumas vezes significa heróico e contínuo sacrifício! Mas significa também sentir cada vez mais a necessidade da Eucaristia e a nostalgia do Céu. Santa Teresa de Jesus escrevia assim no Caminho da perfeição: "A alma que deseja intensamente alimentar-se com este alimento, encontrará no Santíssimo Sacramento deleite espiritual e consolação, e assim que começar a saboreá-lo, não haverão mais provações, perseguições, ou tormentos que não possa suportar com toda a facilidade" (c. XXXIV, 2).
Caríssimas! Esteja junto de vós e acompanhe-vos a Virgem Santíssima. Seja ela, como exorta Santo Ambrósio, o "modelo da vossa vida" (cf. As Virgens, 1, II, 2, 6).
Numa das aparições a Santa Catarina Labouré, Nossa Senhora disse à jovem Irmã, atemorizada com a grandeza e as dificuldades da missão que lhe tinha sido confiada: "É aqui, aos pés do Tabernáculo, que deves procurar força e consolação!". As mesmas palavras dirige a Mãe celeste a cada uma de vós! Com a Eucaristia, junto do Tabernáculo, sede Irmãs santas e intrépidas, hoje e por toda a vossa vida!
Com este voto, dou-vos de coração a minha Bênção Apostólica.
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