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RADIOMENSAGEM DO PAPA PIO XII
POR OCASIÃO DO I CONGRESSO NACIONAL
DOS HOMENS DA ACÇÃO CATÓLICA PORTUGUESA
(*)

Domingo, 10 de Dezembro de 1950

 

Quando o Senhor Cardeal vosso digníssimo Presidente Nos dava a grata notícia de que vos ieis reunir em um grande Congresso na cidade de Lisboa, e, interpretando o vosso vivo desejo, Nos convidava a tomar parte nele, dirigindo-vos a palavra e implorando sobre as vossas deliberações as bênçãos da Altíssimo, surgia em Nosso espírito, numa auréola de glória, a visão magnífica daquela época heroica em que Portugal era como um vasto seminário de arautos do Evangelho, e Lisboa a porta áurea, por onde cada ano saíam, na esteira do grande pioneiro que foi S. António, legiões de apóstolos a evangelizar o Mundo.

Então gloriava-se Lisboa de que nas ribeiras do Tejo se fabricassen e pela sua barra saissem as pacíficas armadas, conquistadoras do império de Cristo (cfr. Vieira, Sermões v. 2 [1907] p. 16).

Então sucedia não raro, que mercadores, usados mais ao lucro das especiarias que ao das almas, e homens de armas, afeitos só a manejar a espada e não a Cruz, sabiam transformar-se em catequistas e lançar em terras maninhas a primeira semente, que os Missionários, por eles convidados, iriam depois cultivar.

E acudia-Nos à memória aquela sentença do príncipe dos vossos oradores, que, apontando precisamente para S. António, exclamava : Os outros homens têem obrigação de ser católicos ; os portuguêses têem a obrigação de ser católicos e de ser apostólicos (cfr. Vieira, Sermões v.7 [1908] p. 58); já que para arautos da Fé os escolheu o Rei divino, quando nas Quinas lhes deu por brazão as suas Chagas; e cruzados seus os armou, quando lhes deu por divisa a Cruz de Cristo.

Perante tal visão de um passado hoje tão remoto, confortava-Nos a esperança de o ver reflorir em breve pela grande cruzada, em que vemos empenhados os Homens da Acção Católica.

Amados Filhos ! este vosso primeiro Congresso, ora prestes a terminar, se, como afirmação pública e desassombrada de vossa fé foi um belo exemplo de acção católica, foi e é ao mesmo tempo penhor das mais risonhas esperanças para o futuro.

Iniciativa verdadeiramente oportuna para fazer o balanço do bem realizado e dar por ele as devidas graças ao Altíssimo; para passar em revista as forças com que a Igreja militante pode contar na luta pelo bem; para, à luz da experiência adquirida, estudar novos planos de acção e animar-se a maiores empresas.

E Nós, como Pai comum dos fiéis, longe com o corpo mas presente com o espírito e coração em meio de vós, com todos e cada um Nos congratulamos pelo bem realizado, singular e colectivamente, nestes primeiros dezasete anos de vida da vossa organização; e convosco levantamos a alma a Deus, princípio e autor de todo o bem, para convosco entoarmos o Te Deum do eterno reconhecimento.

Preenchido este sagrado dever, exortar-vos-emos, ou diremos que tudo vos exorta a não vos contentar com os loiros merecidos, mas a tirar deles novo incentivo ao vosso zelo, novos estímulos a progredir sempre de bem em melhor.

Já a inércia podia ter como consequência frustrarem-se em poucos dias as conquistas de muitos anos, tanto mais que o rápido evoluir da sociedade está suscitando cada dia novos problemas, que exigem um continuado Alerta, para os prevenir, ou para os enfrentar a tempo e solucionar convenientemente.

Mas aí está o problema fundamental estudado no Congresso, « A responsabilidade do Homem católico na hora presente », que vos deve ter falado bem alto ao espírito.

A responsabilidade que pesa sobre todo o católico : grande sempre e em todo o tempo, como prègava o Apóstolo das gentes ao primeiros fiéis. Membros uns dos outros, porque todos Corpo místico de Cristo, a lei da caridade, fundamental e essencial da vida cristã, obriga-os a serem solícitos do bem uns dos outros, como a lei da natureza obriga os membros do mesmo corpo físico a interessar-se, a ajudar-se, a servir-se mutuamente.

Hoje em dia porém, dada a organização da sociedade e a parte que todos são chamados a exercer na vida da mesma, a responsabilidade aparece maior e mais urgente, visto que do modo como cada um desempenha a sua quota parte depende o bom ou mau andamento da coisa pública.

Em volta de nós as forças do mal, solidamente organizadas, trabalhan incansáveis. Os seus agentes especializados sabem inspirar em almas ardentes o fanatismo, que os não deixa descansar, que os faz arrostar os perigos, que os leva a excogitar as mais subtis industrias para conseguirem os seus funestos intentos. E vós que não fareis pela santíssima causa do bem, ao serviço do Rei divino? Lembrai o exemplo de vossos maiores, e não degenereis de seus altos pensamentos.

Olhai o campo de acção, que é imenso, e o trabalho urgentíssimo.

Primeiro que tudo, — jà vo-lo lembrava Nosso Predecessor de feliz memoria na Epistula Apostólica « Ex officiosis litteris » de 10 de novembro de 1933 (Acta Apost. Sedis vol. 26 pag. 628-633) importa avivar e reforçar a convincção, que todos tendes, de que os Homens da Acção Católica devem ser sinceramente, praticamente católicos de fé e de mandamentos, para serem eficazmente católicos de acção. Aliás como exercer o apostolado, se as palavras ressoassem vazias de espírito, e as obras contradissessem as palavras? O zelo é fruto espontáneo da vida impregnada de espírito cristão.

Este zelo tem naturalmente o seu imediato campo de acção no seio da própria família. Grandemente beneméritos da Igreja e da sociedade são aqueles que, compenetrados da sua imensa responsabilidade, se esmeram em ser os primeiros educadores dos próprios filhos com palavra e exemplo, instruindo-os nos elementos da doutrina cristã e na sua prática quotidiana. Onde esta responsabilidade se não sente, onde a vida de família não é toda vivida à luz do Evangelho, a Religião será sempre considerada como algo de acessório, de que facilmente se prescinde. Felizmente que em Portugal a família é geralmente sã. Mas também até lá chega a propaganda deletéria; também lá não faltam germes patológicos, que, se inobservados se deixam agir, podem produzir epidemias devastadoras.

À acção católica no seio da família segue a acção em favor da juventude. E aqui quantos problemas que reclamam a acção prudente, vigilante, persistente dos Homens católicos!

É o problema da instrução catequética da infância, promovida com todos os meios que a arte e a pedagogia proporcionam, em casa, na egreja, nas escolas primárias. Para ele chamava particularmente as vossas atenções Nosso Predecessor na mencionada Epístula, carta fundamental da Acção Católica Portuguesa.

É depois o gravíssimo problema da instrução religiosa e moral, mais progredida, da juventude, e sobretudo da estudiosa, que amanhã terá na mão os destinos da Pátria. Sem ela não ha formação literaria ou científica, por mais perfeita, que não seja absolutamente incompleta e deficiente.

Ha ainda todos os problemas que envolve a chamada Questão social. Se hoje entre vós não se apresenta tão vasta e aguda, como noutras partes, apresentar-se-á tal Amanhã, à medida que se desenvolve a indústria. A propaganda deletéria é impossivel estancá-la. É o « inimicus homo » sempre pronto a semear a zizânia no campo do pai de famílias. Se não se prevê e previne o problema, se não se preparam os contravenenos eficazes, que impeçam o germinar da má semente, pode aparecer de repente todo o campo inçado das más ervas.

Enfim o problema das Missões propriamente ditas nos vastos territórios ultramarinos. Para elas é preciso encaminhar, seleccionar, cultivar vocações, ressuscitando aquele espírito missionário dos vossos maiores, quando as famílias se honravam de consagrar pelo menos um filho ao serviço do altar e à conquista das almas, quando havia terras que nas Missões tinham dois por cento dos seus naturais.

Amados Filhos! o campo é imenso, a tarefa ingente e dificil, poucos os operários. Nosso grande Predecessor ha dezassete anos, recomendava: « Crescei antes em qualidade que em número ». Era o moto da infância. Hoje, em plena juventude, dir-vos-emos: Redobrai de zelo, crescei em qualidade; mas crescei também em número, e não cesseis de rogar ao Senhor da messe, que vos mande muitos e bons colaboradores.

Em boa hora não faltam em Portugal outros organismos católicos, que trabalham alacremente na vinha do Senhor, e que, esmerando-se na formação interior dos seus membros, lhe juntam vontade pronta a exercer o apostolado. É precisamente hoje a responsabilidade de todo a homem católico. Em boa harmonia pois, em colaboração amiga e bem ordenada, como corpos especializados do mesmo exército ao serviço do Rei divino, combatei alegramente as batalhas do Senhor.

Não vos escasseara a sua graça, e tendes segura a assistência materna de Nossa Senhora da Fátima, especial Padroeira da Acção Católica Portuguesa; a qual, com a sua peregrinação de maravilha atravez de Portugal e do Mundo, parece estar estimulando o vosso zelo e prometendo o mais feliz êxito ao vosso apostolado.

Con estes votos damos a Bênção Apóstolica a vós, às vossas famílias, a todas as pessoas que vos são queridas e a toda a amadíssima Acção Católica Portuguesa.


(*) Discorsi e Radiomessaggi di Sua Santità Pio XII, vol. XII, pág. 359-365.

 



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