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VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE À ÁFRICA
(2-12 DE MAIO DE 1980)

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II
NO ENCONTRO COM OS BISPOS DO ZAIRE

Sede do Centro Internacional de Quinxassa
Sábado, 3 de Maio de 1980

 

Caríssimos Irmãos em Cristo

1. Que alegria para mim encontrar-me convosco todos juntos! Que reconforto! Há um século pode-se dizer que a verdadeira evangelização começava mesmo do início; e eis que hoje a fé cristã está implantada quase em toda a parte neste país, a hierarquia eclesiástica encontra-se organizada e filhos deste país, "ex hominibus assumpti", tomaram na mão o governo da Igreja, em união com a Igreja que está em Roma. O aparecimento das vossas comunidades cristãs e a vitalidade deste povo de Deus constituem uma maravilha da graça que renova no nosso tempo o que esta realizava no tempo dos Apóstolos Pedro e Paulo.

Há períodos, datas que ninguém pode esquecer:

— a ordenação do primeiro padre zairense, Estêvão Kaoze (1917);
— a consagração do primeiro bispo zairense, D. Pedro Kimbondo (1956);
— a chamada do primeiro bispo zairense para entrar no Sacro Colégio dos Cardeais, o Cardeal José Malula (1969).

Vim dar graças convosco a Deus, celebrar o centenário da evangelização.

Vim reconhecer convosco o trabalho apostólico, paciente e esclarecido, dos numerosos missionários, bispos, padres, religiosos e religiosas: amaram-vos a ponto de consagrarem as suas vidas para iniciar os vossos pais no Evangelho, Evangelho que eles mesmos tinham recebido por graça, e tiveram confiança bastante neles para os julgar também capazes de constituir uma Igreja local e para eles virem fornecer os Pastores da mesma. Vim reconhecer o bom trabalho a que vós mesmos vos abalançastes, continuando-os ou acompanhando-os, isto último na medida em que eles vos prestam ainda hoje um serviço indispensável. Vim manifestar o meu respeito, a minha estima e o meu afecto pelas vossas pessoas, pelo vosso corpo episcopal e pela Igreja que se reúne na vossa pátria.

E vim robustecer o vosso santo ministério, como Jesus pediu a Pedro que o fizesse.

2. A finalidade deste ministério é sempre a evangelização. Vale isto para todos os países, para as velhas cristandades como para as Igrejas jovens. Porque a evangelização comporta etapas e aprofundamentos e é obra que se tem de retomar incansavelmente. Sem dúvida, cerca da metade dos vossos concidadãos agregaram-se à Igreja pelo baptismo, e outros preparam-se para ele. Mas há ainda vasto campo de apostolado, a fim de que a luz do Evangelho brilhe também aos olhos dos outros. E, sobretudo, é preciso realizar a penetração em profundidade deste Evangelho nos espíritos, nos costumes, na fé e na caridade quotidiana das pessoas, das famílias e das comunidades, e é preciso assegurar a perseverança de todos. É o problema que encontravam o Apóstolo Paulo, nas comunidades que visitava, e o Apóstolo João, nas comunidades que mantinha com as suas cartas na terceira geração de cristãos (cfr. Apoc 1-3), ou ainda o meu predecessor São Clemente de Roma. E o problema que também conheceram os bispos corajosos da minha nação, como Santo Estanislau.

3. A este propósito, notei o zelo, a coragem e a coesão de que vós soubestes dar prova, para esclarecer e guiar o vosso povo cristão, quando as circunstâncias o exigiam. Porque as provações não vos foram poupadas. Vós elaborastes, por exemplo, e publicastes documentos sobre a fé em Jesus Cristo em 1974, depois "sobre a situação presente". Em 1977, estimulastes os vossos fiéis, "todos solidários e responsáveis", a que vencessem o desânimo e a imoralidade. No mesmo ano, exortastes os vossos sacerdotes, religiosos e religiosas à conversão. Chamastes mesmo o conjunto dos vossos compatriotas "ao restauro da nação". Tais actos da Conferência Episcopal, sem contar os dos bispos nas suas dioceses próprias, manifestam o vosso sentido da responsabilidade pastoral. Juntamente convosco desejo que esses apelos, unidos a uma leitura assídua da Palavra de Deus, sejam retomados, meditados e sobretudo vividos, nas suas consequências e com perseverança, por aqueles de quem vós queríeis formar ou despertar. a consciência. Porque, vós sabei-lo como eu, esta educação da fé pede não somente textos claros mas uma proximidade, uma pedagogia, que distribui este ensino, que persuade e sustém, com paciência e amor inseparáveis da autoridade pastoral, graças a sacerdotes e educadores que dão eles mesmos o exemplo. Queria, com estas palavras simples, manifestar-vos apreço e comunicar-vos incentivo pela vossa obra de evangelização.

4. Um dos aspectos desta evangelização é a inculturação do Evangelho, a africanização da Igreja. Várias pessoas me indicaram que a tendes muito a peito, e com razão. Faz  isto parte dos esforços indispensáveis para encarnar a mensagem de Cristo. O Evangelho, é claro, não se identifica com as culturas e transcendem-nas a todas. Mas o Reino que o Evangelho anuncia é vivido por homens profundamente ligados a uma cultura; a construção do Reino não pode prescindir de ir buscar elementos às culturas humanas (cfr. Evangelii nuntiandi, 20). Mais: a evangelização deve ajudar estas a fazer surgir, das suas próprias tradições vivas, expressões originais de vida, de celebração e de pensamento cristão (cfr. Exortação Catechesi tradendae, 53). Vós desejais ser, ao mesmo tempo, plenamente cristãos e plenamente africanos. O Espírito Santo pede, com efeito, acreditarmos que o fermento do Evangelho, na sua autenticidade, tem força para fazer surgir cristãos nas diversas culturas, com todas as riquezas do seu património, purificadas e transfiguradas.

A este propósito, o Concílio Vaticano II bem expressara alguns princípios que iluminam sempre o caminho que deve seguir-se neste campo: "A Igreja... fomenta e apropria as possibilidades, os recursos e o estilo de vida dos povos naquilo que têm de bom e, ao assumi-los, purifica-os, consolida-os e eleva-os...

"Por força desta catolicidade, cada parte contribui com os seus dons peculiares para as demais e para toda a Igreja, de modo que o todo e cada parte crescem por comunicação mútua e pelo esforço comum em ordem a alcançar a plenitude na unidade, "A Sé de Pedro... preside à comunhão universal da caridade, protege as diferenças legítimas e vela por que as particularidades, longe de serem nocivas, antes contribuam unicamente para a unidade" (Lumen gentium, 13).

A africanização abrange campos vastos e profundos, que não foram ainda suficientemente explorados quer se trate da linguagem para dar a conhecer a mensagem cristã de maneira que atinja o espírito e o coração dos zairenses, da catequese, da reflexão teológica, da expressão mais apta na liturgia ou na arte sacra, de formas comunitárias de vida cristã.

5. É a vós, bispos, que toca promover e harmonizar o avanço neste particular, ao cabo de madura reflexão, com grande harmonia entre vós, em união também com a Igreja universal e com a Santa Sé. A inculturação, para o conjunto do povo, não poderá aliás ser fruto senão de uma progressiva maturidade na fé. Porque vós estais convencidos como eu, de que esta obra, na qual desejo exprimir-vos toda a minha confiança, requer muita lucidez teológica, muito discernimento espiritual, muita sabedoria e prudência, e ainda tempo.

Permiti-me evocar, entre outros exemplos, a experiência da minha própria pátria: na Polónia, estabeleceu-se aliança profunda entre as maneiras de pensar e de viver as características da nação e o catolicismo; esta impregnação exigiu séculos. Aqui, atendendo a uma situação diferente, deve ser possível ao Cristianismo aliar-se com o que é o mais profundo na alma zairense para uma cultura original, ao mesmo tempo africana e cristã.

No que diz respeito à fé e à teologia, toda a gente reconhece que estão em campo problemas importantes: o conteúdo da fé, a busca da sua melhor expressão, a relação entre a teologia e a fé, e a unidade da mesma fé. O meu venerado predecessor Paulo VI fez alusão ao caso no fim do Sínodo de 1974 (cfr. AAS 66 [1974], pp. 636-637). E lembrou certas regras aos delegados do S.C.E.A.M. em Setembro de 1975.

a) Quando se trata da fé cristã, é preciso atermo-nos ao 'património idêntico, essencial e constitucional da mesma doutrina de Cristo, professada pela tradição autêntica e autorizada da única e verdadeira Igreja';

b) importa entregarmo-nos a uma investigação aprofundada das tradições culturais das 'diversas populações, e dos dados filosóficos que as subentendem, para nelas descobrir os elementos que não se encontram em contradição com a religião cristã e ainda os contributos capazes de enriquecer a reflexão teológica" (AAS 67 [1975], p. 572).

Eu próprio, o ano passado, na exortação sobre a catequese, chamei a atenção para o facto de a Mensagem evangélica não se poder isolar, pura e simplesmente, da cultura bíblica em que primeiro se inseriu, nem ainda, sem perdas graves, das culturas em que ela se exprimiu através dos séculos; e, por outro lado, de a força do Evangelho ser em toda a parte transformadora e regeneradora (cfr. n. 53).

No campo da catequese, podem e devem tentar-se apresentações mais adaptadas à alma africana, contando porém com as permutas culturais cada vez mais frequentes com o resto do mundo; é preciso atender unicamente a que os trabalhos sejam feitos em conjunto e verificados pelo episcopado, para a expressão ser correcta e toda a doutrina ser apresentada.

No campo dos gestos sagrados e da liturgia, é possível um enriquecimento completo (cfr. Sacrosanctum Conciliam, 37-38), contanto que a significação do rito cristão seja sempre bem conservada e o aspecto universal, católico, da Igreja apareça claramente ("a unidade substancial do rito romano"), em união com as outras Igrejas locais e de acordo com a Santa Sé.

No campo ético, é preciso pôr em ressalto todos os recursos da alma africana que são como pedras de espera do Cristianismo: Paulo VI já as evocou na sua mensagem à Africa de 29 de Outubro de 1967, e vós conhecei-las melhor que ninguém, no que diz respeito à visão espiritual da vida, do sentido da família e dos filhos, da vida comunitária, etc. Como em todas as civilizações, há outros aspectos menos favoráveis. Apesar de tudo, como vós o lembrastes tão bem, há sempre uma conversão que se deve operar a respeito da pessoa de Cristo, Salvador único, e do Seu ensino, tal como a Igreja no-lo transmite: é então que se produzem a libertação, a purificação, a transfiguração e a elevação que Ele veio trazer e realizou no Seu mistério pascal, de morte e ressurreição. É preciso considerar ao mesmo tempo a Encarnação de Cristo e a Sua Redenção. Vós próprios insististes em precisar que o recurso à autenticidade não permite "opor os princípios da moral cristã aos da moral tradicional" (Carta de 27 de Fevereiro de 1977). Num sentido, o Evangelho satisfaz as aspirações humanas, mas contestando as profundezas do humano para fazer que ele se abra ao apelo da graça e em particular a uma aproximação de Deus mais confiante, a uma fraternidade humana ampliada, universal. A autenticidade não afastará o homem africano do seu dever de conversão. Numa palavra, trata-se de que ele se torne cristão autêntico e autenticamente africano.

6. Nesta obra de inculturação, de indigenização, já bem começada, como no conjunto da obra de evangelização, múltiplas questões particulares surgirão no caminho, a respeito de tal ou tal costume — penso em particular nos problemas difíceis do casamento —, tal ou tal gesto religioso, tal ou tal método. Questões difíceis, para as quais a busca de solução está confiada à vossa responsabilidade pastoral, aos vossos bispos, em diálogo com Roma: vós não podeis prescindir dele. Requer-se primeiro coesão perfeita entre vós. Cada Igreja tem os seus problemas, mas em toda a parte, como eu dizia aos Bispos da Polónia "é esta unidade que é fonte de força espiritual". Tal solidariedade aplica-se em todos os campos: o da investigação, o das grandes decisões pastorais, igualmente o da estima mútua, qualquer que seja a vossa origem, sem esquecer o do apoio mútuo, na vida exemplar que vos é pedida e pode exigir monições fraternas.

7. Não vos passa igualmente despercebido até que ponto a solidariedade com a Igreja universal, nas coisas que devem ser comuns, e em particular a comunhão confiada com a Santa Sé, são necessárias para a autenticidade católica da Igreja no Zaire, para a sua força e para a sua avançada harmoniosa. Mas elas são necessárias também à vitalidade da Igreja universal, em que vós apresentareis o testemunho da vossa solicitude pastoral e a contribuição do vosso zelo evangelizador sobre pontos importantes para toda a Igreja. São as exigências, ou antes, a graça da nossa catolicidade (cfr. Lumen gentium, 13, citado mais acima). Deus seja louvado que permite à Sua Igreja esta troca vital e esta comunhão entre todos os membros do mesmo Corpo, o Corpo de Cristo. A Santa Sé não vos libertará de nenhuma responsabilidade; pelo contrário, ela há-de responsabilizar-vos; e ajudar-vos-á a encontrar as soluções mais conformes com a vossa vocação. Quanto a mim, estou certo que as vossas preocupações serão lá acolhidas com compreensão.

8. Agora, desejava dizer também uma palavra sobre alguns problemas pastorais concretos: refiro-os para manifestar a parte que tomo na vossa responsabilidade.

Falei da vossa unidade entre bispos, da vossa co-responsabilidade colegial que deu provas de si em momentos especialmente difíceis. Animo-vos igualmente a que favoreçais do melhor modo, em cada uma das vossas dioceses, a unidade das forças vivas da evangelização, e primeiramente dos vossos padres. Alguns são Zairenses e é grande sorte para o futuro da vossa Igreja. Muitos outros, padres seculares e muitas vezes religiosos, vieram como "missionários" ou ficaram para vos ajudar, sabendo embora que devem, à medida que se apresentem as possibilidades, ceder o primeiro lugar aos pastores indígenas. Vós todos reconheceis que o serviço deles foi capital para a evangelização de que festejamos o centenário, que ele se mantém importante e actualmente indispensável, dada a amplidão mesmo numérica dos fiéis e a complexidade das necessidades apostólicas. Eles mantêm-se junto de vós como expressão da universalidade e das trocas necessárias entre as Igrejas. Oxalá todos, Zairenses ou não, formem apenas um presbitério à volta de vós. Oxalá tudo se faça para aplanar e multiplicar os caminhos da estima mútua, da fraternidade e da colaboração. Oxalá seja banido tudo o que possa ser causa de sofrimentos ou afastamentos, para uns ou para outros. Todos estejam penetrados de sentimentos de humildade e de serviço mútuo. Pela causa de Cristo! Pelo testemunho da Igreja! Todos cheguem a dizer: "Vede como eles se amam"! Pela avançada da evangelização! Já foram conseguidos progressos. Estou certo que tudo fareis para criar este clima.

Por outro lado, vós chamastes várias vezes o conjunto dos vossos sacerdotes e das vossas religiosas a uma grande dignidade de vida. Notei uma passagem que vós citáveis na sua forma poética: "Vós próprios sede os primeiros a reformar-vos. Vesti-vos de virtudes, não de seda. Tende a corpo casto, simples a consciência. Quer de dia quer de noite aprendei a ciência. Conservai para com o povo uma dignidade humilde e juntai a doçura com a gravidade" (Exortação de 10 de Junho de 1977). Pois bem, o amor radical — que as almas consagradas dedicaram ao Senhor, para Ele mesmo e para um serviço mais à disposição de todos os seus irmãos e para o anúncio do mundo vindouro, com a disciplina de vida que ele exige deve brilhar como a luz, ser como o sal e conservar "no meio do povo de Deus a energia indispensável que o ajude a levedar a massa humana" (ibid.). Em especial, os sacerdotes, os religiosos — e também as religiosas — devem ter sólidas convicções sobre os valores positivos e essenciais da castidade no celibato, e manter-se muito vigilantes no seu comportamento para serem fiéis sem ambiguidade a este compromisso que tomaram — pelo Senhor e pela Igreja — e que é capital, na África como fora dela, como testemunho e para arrastar o povo cristão na caminhada laboriosa para a santidade. Tudo isto é possível com a graça de Deus, sobretudo caso se tomem a peito os meios espirituais e as múltiplas necessidades que solicitam o zelo pastoral. Os sacerdotes têm certamente grande necessidade da vossa ajuda fraterna, da vossa proximidade, do vosso exemplo pessoal e do vosso afecto.

9. A santidade e o zelo dos vossos padres muito facilitarão também o despertar das vocações sacerdotais, e eu julgo tocar neste ponto urna das vossas solicitudes dominantes. Como enfrentará a Igreja do Zaire o futuro se não dispuser de sacerdotes em maior número, vindos da sua terra, seculares ou religiosos? Por isto precisamos de orar e fazer que se ore. Precisamos de "chamar" para o serviço do Senhor, fazer compreender às famílias e aos jovens a beleza deste serviço. Mas o problema é também o da formação destes seminaristas ou noviços: oxalá eles gozem sempre da presença, do diálogo e do exemplo de directores espirituais, experimentados na condução das almas.

Julgo aliás que muitas vocações religiosas floresceram entre vós, quer no ambiente das Congregações missionárias, quer agora no ambiente de Institutos nascidos no vosso solo. Oxalá elas — graças a uma sólida formação, graças à sua dedicação às obras apostólicas e graças ao seu testemunho transparente — escrevam nova página na vida das religiosas dentro da Igreja. Não esqueço aquela que deixou rasto tão luminoso que levou a que falasse da sua beatificação, a Irmã Anwrite.

10. Alegro-me também com tudo o que foi feito neste país para dotar a Igreja de catequistas leigos e de responsáveis por pequenas comunidades, que são as cavilhas mestras da evangelização, em ligação constante e directa com as famílias, as crianças e as diferentes categorias do povo de Deus. Urge seguramente favorecer todo este desenvolvimento da acção indispensável do laicado, em comunhão íntima com os pastores. Terei ocasião de tratar mais longamente este assunto durante a minha viagem.

Quanto à vida familiar, falei dela longamente esta manhã. Como levar a que os jovens e os casais caminhem no sentido da plena realização do projecto de Deus sobre os esposos e os pais, apesar de dificuldades certas, mas utilizando ao mesmo tempo os recursos da alma africana, a experiência secular da Igreja e a graça: nisto se encontra um objectivo pastoral de primeira importância. Será para a Igreja uma bênção e para o país um progresso de ordem principalíssima.

Uma coisa que devem ter a peito os pais, os pastores e todos os operários da evangelização é a educação religiosa das crianças, qualquer que seja o estatuto das escolas e sobretudo por causa do estatuto actual: iniciação familiar no Evangelho, continuada por catequese sistemática, como expus, completando o Sínodo dos Bispos, na exortação Catechesi tradendae.

11. Penso ainda em toda a participação que a Igreja oferece ao desenvolvimento do país, não só preparando a consciência dos cidadãos para o sentido da lealdade, do serviço gratuito, do trabalho bem feito e da fraternidade — o que forma directamente o seu papel — mas provendo em muitos planos às necessidades múltiplas das populações, agravadas muitas vezes pelas provas, nos planos da escola, do auxílio sanitário, dos meios de subsistência, etc. É um serviço auxiliar imposto pela caridade à Igreja — "caritas urget nos" — e que o sentido do bem comum da vossa pátria vos leva a que acheis normal.

12. Vós amais profundamente esta pátria. Compreendo estes sentimentos. Conheceis o amor que dedico àquela em que tenho as minhas raízes. A unidade de uma pátria forja-se aliás através das provações e dos esforços em que os cristãos têm a sua parte, sobretudo quando formam parte notável da nação. O vosso serviço de Deus compreende este amor da pátria. Concorre para o bem da pátria, como o poder civil está para ele ordenado no seu plano próprio. Mas distingue-se deste último e, respeitando embora a sua competência e a sua responsabilidade, deve poder exercer-se ele próprio numa liberdade plena, na sua esfera que é a educação da fé, a formação das consciências, a prática religiosa, a vida das comunidades cristãs, e a defesa da pessoa humana, das suas liberdades e dos seus direitos, da sua dignidade. Sei que esta foi a vossa solicitude. E faço votos por que daí resulte uma paz proveitosa para todos.

13. Um último ponto: para ajudar o escol cristão a enfrentar segundo a fé os problemas que não deixam de impor uma rápida evolução, e o contacto com outras civilizações e com outros sistemas de pensamento, é capital, no plano teológico, que sejam promovidos no vosso país a investigação e o ensino, segundo convém, isto é, juntando a um enraizamento profundo da tradição de toda a Igreja, que deu a própria seiva à vossa comunidade, a reflexão que requer o vosso enraizamento africano e os problemas novos que surgem. Quer dizer, formulo votos ardentes pela vossa Faculdade de teologia de Quinxassa, pelo seu alto nível intelectual, pela sua fidelidade eclesial e pela sua irradiação no vosso país e além dele.

14. Vou ficar hoje por aqui. Mas é diálogo que deverá sempre ser continuado com o Sucessor de Pedro, com os organismos da Santa Sé e com as outras Igrejas locais, que não têm senão um cuidado: permitir ao ardor da vossa Igreja continuar a sua corrida nas melhores condições, "com o maior desassombro e sem impedimento" (Act 28, 31). E ambiciono que este ardor não aproveite só a vós, mas que seja cada vez mais missionário. "Vós sois os vossos próprios missionários", dizia Paulo VI em Kampala, há onze anos. Realizou-se em parte. Mas acrescento: tende em vista ser missionários por vossa vez, não só neste país em que o Evangelho é ainda esperado, mas fora, em especial noutros países da África. Uma Igreja que dá, indo buscar mesmo aos seus recursos limitados, será abençoada pelo Senhor, porque sempre encontramos um pobre mais pobre do que nós.

O Espírito Santo constituiu-vos Pastores do vosso povo nesta hora importante da história cristã do Zaire. Robusteça Ele a fé e a caridade de todos os que vos estão confiados. E Maria, Mãe da Igreja, interceda por vós todos. Contai com a minha oração, como eu conto com a vossa. Com a minha afectuosa Bênção Apostólica.

 



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