Quarta-feira, 6 de Agosto de 2008
Santo Padre
Excelência, queridos irmãos, obrigado por esta reunião familiar nesta bonita Catedral da Diocese de Bolzano-Bressanone.
Para mim é uma grande alegria estar com os sacerdotes: afinal o Bispo de Roma é bispo e irmão de todos os sacerdotes. O seu mandato consiste em confirmar os irmãos na fé. Hoje, nesta bonita festa, vemos também aqui na Catedral e com a linda música, algo do esplendor do rosto de Cristo, e rezamos ao Senhor para que nos ajude a trazer em nós também nos dias obscuros, esta sua luz para levar a luz aos outros, para iluminar o mundo e a vida neste mundo. Infelizmente, não sou capaz de falar em ladino, mas perdoai-me: no domingo disporei de um texto para falar também na vossa língua ladina.
Michael Horrer, seminarista
Santo Padre, chamo-me Michael Horrer e sou seminarista. Por ocasião da XXIII Jornada Mundial da Juventude de Sidney, na Austrália, na qual participei juntamente com outros jovens da nossa Diocese, Vossa Santidade reiterou continuamente aos 400 mil jovens ali presentes a importância da obra do Espírito Santo em nós, jovens, e na Igreja. o tema da Jornada Mundial da Juventude foi: "Recebeis a força do Espírito Santo, que descerá sobre vós e sereis minhas testemunhas" (Act 1, 8).
Pois bem, nós jovens regressámos – revigorados pelo Espírito Santo e pelas suas palavras –aos nossos lares, à nossa Diocese e à nossa vida quotidiana.
Santo Padre, como podemos viver concretamente aqui, no nosso país e na nossa vida quotidiana, os dons do Espírito Santo e dar testemunho dos mesmos aos outros, de tal maneira que também os nossos parentes, amigos e conhecidos sintam e experimentem a força do Espírito Santo e nós possamos cumprir a nossa missão de testemunhas de Jesus Cristo? O que nos pode aconselhar a fazer para que a nossa Diocese permaneça jovem, não obstante o envelhecimento do clero, e fique também aberta à obra do Espírito de Deus que orienta a Igreja?
Santo Padre
Obrigado por esta pergunta. Estou feliz por ver um seminarista, um candidato ao sacerdócio desta Diocese, em cujo rosto, num certo sentido, posso encontrar o rosto jovem da Diocese, e estou contente por ouvir que o senhor, juntamente com outros, esteve em Sydney, onde numa grande festa da fé pudemos experimentar em conjunto precisamente a juventude da Igreja. Também para os australianos foi uma grande experiência. Inicialmente, olhavam para esta Jornada Mundial da Juventude com um grande cepticismo, porque obviamente teria acarretado consigo muitos impedimentos na vida de todos os dias, muitas inconveniências, como por exemplo o trânsito, etc. Mas no final – vimos também através dos meios de comunicação, cujos preconceitos se fragmentaram gradualmente – todos se sentiram envolvidos por esta atmosfera de alegria e de fé; viram que os jovens chegam e não criam problemas de segurança e nem sequer de outros tipos, mas sabem estar juntos com alegria. Viram que também nos dias de hoje a fé é uma força presente, que é uma força capaz de oferecer a justa orientação às pessoas, e por isso houve um momento no qual pudemos verdadeiramente sentir o sopro do Espírito Santo que afasta todos os preconceitos, que faz compreender aos homens que aqui encontramos aquilo que nos toca de perto, que esta é a direcção em que temos que caminhar; e deste modo é possível viver, é assim que se abre ao futuro.
O senhor justamente disse que foi um momento forte, do qual trouxemos para casa uma pequena centelha. No entanto, na vida quotidiana é muito mais difícil sentir concretamente a acção do Espírito Santo, ou mesmo tornar-se pessoalmente um instrumento a fim de que Ele possa estar presente, a fim de que se verifique aquele sopro que afasta os preconceitos do tempo, que na obscuridade cria a luz e nos faz sentir que a fé não somente tem um futuro, mas que é o futuro. Como podemos realizar isto? Sem dúvida, não somos capazes de fazer isto sozinhos. No final, é o Senhor que nos ajuda, mas nós temos que ser instrumentos disponíveis. Diria simplesmente: ninguém pode dar aquilo que não possui pessoalmente, ou seja: não podemos transmitir o Espírito Santo de modo eficaz, torná-lo perceptível, se nós mesmos não lhe estivermos próximos. Eis por que motivo julgo que a coisa mais importante é que nós mesmos permaneçamos, por assim dizer, no raio do sopro do Espírito Santo, em contacto com Ele. Somente se formos continuamente sensibilizados dentro de nós pelo Espírito Santo, só se Ele estiver presente em nós, somente então poderemos, também nós, transmiti-lo aos outros, só então Ele nos concederá a fantasia e as ideias criativas sobre o modo de agir; ideias que não se podem programar, mas que nascem na situação concreta, porque é ali que o Espírito Santo entra em acção. Por conseguinte, o primeiro ponto é: nós mesmos temos que permanecer no raio do sopro do Espírito Santo.
O Evangelho de João narra-nos que, depois da Ressurreição, o Senhor vai ao encontro dos seus discípulos, sopra sobre eles e diz: "Recebei o Espírito Santo". Trata-se de um texto paralelo ao Génesis, onde Deus sopra sobre a argila, que adquire vida e se torna homem. Agora o homem, que interiormente é obscurecido e meio morto, volta a receber o sopro de Cristo, e é este sopro de Deus que lhe dá uma nova dimensão de vida, que lhe infunde a vida com o Espírito Santo. Por conseguinte, podemos dizer: o Espírito Santo é o sopro de Jesus Cristo e nós, num certo sentido, temos que pedir a Cristo que sopre sempre sobre nós a fim de que em nós este sopro se torne vivo e forte, e que actue no mundo. Isto significa, portanto, que devemos permanecer próximos de Cristo. E nós fazemo-lo, meditando a sua Palavra. Nós sabemos que o principal autor das Sagradas Escrituras é o Espírito Santo. Quando, através dela, nós falamos com Deus, quando nela não buscamos unicamente o passado, mas verdadeiramente o Senhor presente que nos fala, então é como se nós nos encontrássemos – como afirmei também na Austrália – a passear no jardim do Espírito Santo; nós falamos com Ele, e Ele fala connosco. Então, aprender a sentir-se à vontade neste âmbito, no contexto da Palavra de Deus, é algo muito importante que, num certo sentido, nos introduz no sopro de Deus. E depois, naturalmente, este ouvir, este caminhar no âmbito da Palavra de Deus deve transformar-se numa resposta, numa resposta na oração, no contacto com Jesus Cristo. E, naturalmente, em primeiro lugar no Santo Sacramento da Eucaristia, no qual Ele vem ao nosso encontro e entra em nós, como que se funde connosco. Mas depois, também no Sacramento da Penitência, que sempre nos purifica, que elimina as obscuridades que a vida quotidiana deposita em nós.
Em síntese, uma vida com Cristo no Espírito Santo, na Palavra de Deus e na comunhão da Igreja, na sua comunidade viva. Santo Agostinho dizia: "Se queres o Espírito de Deus, deves estar no Corpo de Cristo". É no Corpo místico de Cristo que se encontra o âmbito do seu Espírito.
Tudo isto deveria determinar o desenvolvimento do nosso dia, de tal modo que se torne uma jornada estruturada, um dia em que Deus tem sempre acesso a nós, em que continuamente se verifica o contacto com Cristo, em que precisamente por isso recebemos continuamente o sopro do Espírito Santo. Se fizermos isto, se não formos demasiado ociosos, indisciplinados ou indolentes, então acontecer-nos-á algo, então o dia adquirirá uma forma e assim nela a nossa própria vida assumirá uma forma e esta luz emanará de nós sem que tenhamos de nos preocupar demasiado ou que tenhamos de adoptar um modo de agir – por assim dizer – "propagandístico": é espontâneo, porque reflecte o nosso ânimo.
Além disso, a esta eu acrescentaria uma segunda dimensão, logicamente ligada à primeira: se vivermos com Cristo, também nas realidades humanas seremos bem sucedidos. Com efeito, a fé não comporta unicamente um aspecto sobrenatural, pois volta a construir o homem, restituindo-o à sua humanidade, como demonstra aquele paralelo entre o Génesis e o cap. 20 de João; ela baseia-se precisamente nas virtudes naturais: a honestidade, a alegria, a disponibilidade para ouvir o próximo, a capacidade de perdoar, a generosidade, a bondade e a cordialidade entre as pessoas. Estas virtudes humanas são indicativas do facto de que a fé está verdadeiramente presente, que nós realmente estamos com Cristo. E creio que deveríamos prestar muita atenção a isto, também no que se refere a nós mesmos: fazer amadurecer em nós a humanidade autêntica, porque a fé comporta a plena realização do ser humano, da humanidade. Deveríamos prestar atenção a desempenhar bem e de maneira correcta as tarefas humanas, também na profissão, e no respeito pelo próximo, preocupando-nos com o próximo, que constitui o melhor modo para nos preocuparmos connosco mesmos: efectivamente, "estar presente" para o próximo é o melhor modo de "estar presente" para nós próprios. E então, disto nascem aquelas iniciativas que não se podem programar: as comunidades de oração, as comunidades que lêem coralmente a Bíblia ou ainda a ajuda efectiva às pessoas que se encontram em necessidade, que são carentes, que se encontram às margens da vida, aos enfermos, aos portadores de deficiência e ainda a muitas outras pessoas... Eis que se nos abrem os olhos para vermos as nossas capacidades pessoais, para tomarmos as iniciativas correspondentes e para sabermos infundir nos outros a coragem de agir do mesmo modo. E são precisamente estas realidades humanas que depois nos fortalecem, pondo-nos de certo modo novamente em contacto com o Espírito de Deus.
O Grão-Mestre da Ordem dos Cavaleiros de Malta em Roma disse-me que no Natal foi com alguns jovens à estação para levar um pouco de Natal às pessoas abandonadas. Depois, quando ele mesmo estava a retirar-se, ouviu um dos jovens dizer ao outro: "Isto é melhor do que a discoteca. Aqui é verdadeiramente bonito, porque posso fazer algo pelos outros!". Estas são as iniciativas que o Espírito Santo suscita em nós. Sem muitas palavras, elas fazem-nos sentir a força do Espírito Santo e tornam-nos mais atentos a Cristo.
Pois bem, talvez agora eu tenha dito pouco de concreto, mas penso que a coisa mais importante é que, antes de tudo, a nossa vida seja orientada para o Espírito Santo, porque vivemos no âmbito do Espírito, no Corpo de Cristo, e que então a partir disto experimentamos a humanização, cuidamos das virtudes humanas simples e assim aprendemos a ser bons no sentido mais amplo da palavra. Deste modo adquirimos sensibilidade diante das iniciativas de bem que em seguida, naturalmente, desenvolvem uma força missionário e num certo sentido preparam aquele momento em que se torna sensato e compreensível falar de Cristo e da nossa fé.
Pe. Willibald Hopfgartner, O.F.M.
Santo Padre, chamo-me Willibald Hopfgartner, sou franciscano e trabalho na escola e em vários âmbitos de guia da Ordem. No seu Discurso de Regensburg, Vossa Santidade sublinhou o vínculo substancial entre o Espírito divino e a razão humana. Por outro lado, também sempre ressaltou a importância da arte e da beleza, da estética. Então, juntamente com o diálogo conceitual sobre Deus (na teologia), não deveria ser sempre de novo reiterada a experiência estética da fé no âmbito da Igreja, para o anúncio e a liturgia?
Santo Padre
Obrigado. Sim, penso que estas duas categorias caminham juntas: a razão, a exactidão, a honestidade da reflexão sobre a verdade e a beleza. Uma razão que de alguma forma quisesse despojar-se da beleza, ficaria reduzida a metade, seria uma razão obcecada. Só as duas categorias unidas formam o conjunto, e precisamente para a fé esta união é importante. A fé deve enfrentar continuamente os desafios do pensamento desta época, a fim de que ela não se pareça com um tipo de lenda irracional que nós conservamos viva, mas que seja verdadeiramente uma resposta às grandes interrogações; a fim de que não seja apenas hábito, mas verdade – como certa vez pôde dizer Tertuliano. São Pedro, na sua primeira Carta, tinha escrito aquela frase que os teólogos na Idade Média fizeram legitimamente sua, quase como um encargo para o seu trabalho teológico: "Estai sempre prontos a explicar a razão do sentido da vossa esperança" – apologia do logos da esperança, ou seja, a transformação do logos, da razão da esperança da apologia, numa resposta aos homens. Evidentemente, ele estava persuadido do facto de que a fé é logos, que ela é uma razão, uma luz que provém da Razão criadora, e não uma grande mistura, fruto do nosso pensamento. E eis por que motivo é universal, por isso pode ser comunicada a todos.
Mas precisamente este logos criador não é somente um logos técnico – voltaremos a falar sobre este aspecto com uma outra resposta – é amplo, é um logos que é amor e por conseguinte pode exprimir-se na beleza e no bem. E, na realidade, uma vez disse que para mim, a arte e os Santos constituem a maior apologia da nossa fé. Os argumentos apresentados pela razão são absolutamente importantes e irrenunciáveis, mas depois, sob certos aspectos permanece sempre a dissensão. Contudo, se contemplamos os Santos, este grande rasto luminoso com que Deus atravessou a história, vemos que ali verdadeiramente existe uma força do bem que resiste ao longo dos milénios, ali existe verdadeiramente a luz da luz. E do mesmo modo, se contemplamos as belezas criadas pela fé, eis que diria são simplesmente a prova viva da fé. Se olho esta bonita catedral, vejo que é um anúncio vivo! Ela mesma nos fala, e iniciando da beleza da catedral conseguimos anunciar visivelmente Deus, Cristo e todos os seus mistérios: aqui eles adquiriram forma e olham-nos. Todas as grandes obras de arte, as catedrais – as catedrais góticas e as maravilhosas igrejas barrocas – todas constituem um sinal luminoso de Deus e, portanto, são verdadeiramente uma manifestação, uma epifania de Deus. E no Cristianismo trata-se precisamente desta epifania: que Deus se tornou uma Epifania – oculta aparece e resplandece. Acabamos de ouvir o órgão em todo o seu esplendor, e na minha opinião a grande música que nasceu na Igreja consiste em tornar audível e perceptível a verdade da nossa fé: desde o gregoriano até à música das catedrais, e até Palestrina e à sua época, até Bach e portanto a Mozart e Bruckner, e assim por diante... Ouvindo todas estas obras – as Paixões de Bach, a sua Missa em Si bemol e as grandes composições espirituais da polifonia do século XVI, da escola vienense, de toda a música, inclusive daquela dos compositores menores – repentinamente sentimos: é verdade! Onde nascem realidades deste tipo existe a Verdade. Sem uma intuição que descubra o verdadeiro centro criativo do mundo, tal beleza não pode nascer. Por isso, penso que deveríamos fazer com que estas duas categorias permanecessem sempre juntas, levando-as unidas entre si. Quando, nesta nossa época, discutimos sobre a racionalidade da fé, debatemos precisamente sobre o facto de que a razão não termina onde se concluem as descobertas experimentais, pois ela não termina no positivismo; a teoria da evolução vê a verdade, mas vê somente metade da mesma: não vê que por detrás existe o Espírito da criação. Nós lutamos pela ampliação da razão e, portanto, por uma razão que, precisamente, esteja aberta também à beleza e não tenha que a deixar de lado, como algo totalmente diferente e irracional. A arte cristã é uma arte racional – pensemos na arte do gótico, ou então na grande música ou também, precisamente, na nossa arte barroca – mas constitui uma expressão artística de uma razão muito ampliada, na qual se encontram o coração e a razão. Eis a questão. Na minha opinião, esta é de certa maneira a prova da verdade do Cristianismo: coração e razão encontram-se, beleza e verdade tocam-se. E quanto mais nós conseguirmos viver na beleza da verdade, tanto mais a fé poderá voltar a ser criativa também no nosso tempo e a exprimir-se numa forma artística convincente.
Então, estimado Padre Hopfgartner, obrigado pela pergunta; procuremos fazer com que as duas categorias, a estética e a noética, permaneçam unidas, e que nesta grande amplidão se manifeste a integridade e a profundidade da nossa fé.
Pe. Willi Fusaro
Santo Padre, sou o Padre Willi Fusaro, tenho 42 anos de idade e estou doente desde o ano da minha ordenação sacerdotal. Fui ordenado no mês de Junho de 1991; sucessivamente, em Setembro desse mesmo ano, diagnosticaram-me a esclerosa múltipla. Sou cooperador paroquial na paróquia de "Corpus Domini" de Bolzano. Fiquei muito impressionado com a figura de João Paulo II, sobretudo no último período do seu Pontificado, quando suportava com coragem e humildade a sua debilidade humana diante do mundo inteiro.
Considerando a proximidade de Vossa Santidade ao seu amado predecessor, e com base na sua experiência pessoal, que palavras me pode dirigir, bem como a todos nós, para ajudar verdadeiramente os sacerdotes idosos e enfermos a viverem bem e fecundamente o seu sacerdócio no presbitério e na comunidade cristã? Obrigado!
Santo Padre
Obrigado, Reverendo Padre. Pois bem, também eu diria que para mim as duas partes do Pontificado do Papa João Paulo II são igualmente importantes. A primeira parte, na qual o vimos como um gigante da fé: com uma coragem incrível, com uma força extraordinária, com uma verdadeira alegria da fé e com uma grandiosa lucidez levou até aos extremos confins da terra a mensagem do Evangelho. Falou com todos, abriu novos caminhos com os Movimentos, com o diálogo inter-religioso, com os encontros ecuménicos, com o aprofundamento da escuta da Palavra Divina, com tudo... com o seu amor pela Sagrada Liturgia. Ele realmente podemos dizer fez ruir não os muros de Jericó, mas os muros entre dois mundos, precisamente com a força da sua fé, e este testemunho permanece inesquecível, permanece uma luz para este novo milénio.
Todavia, devo dizer que para mim também estes últimos anos do seu Pontificado não foram de menor importância, por causa deste testemunho humilde da sua paixão. Como ele carregou a Cruz do Senhor diante de nós e como pôs em prática a palavra do Senhor: "Segui-me, carregando a Cruz juntamente comigo"! Esta humildade, esta paciência com que aceitou praticamente a destruição do seu corpo, a crescente incapacidade de utilizar a palavra, ele que tinha sido um mestre da palavra. E assim indicou-nos parece-me visivelmente esta profunda verdade que o Senhor nos redimiu com a sua Cruz, com a Paixão como gesto extremo do seu amor. Mostrou-nos que o sofrimento não é apenas um não, algo de negativo, a falta de alguma coisa, mas também é uma realidade positiva. Que o sofrimento aceite no amor a Cristo, no amor a Deus e ao próximo constitui uma força redentora, uma força do amor e não menos poderosa do que os grandes gestos que ele mesmo tinha realizado na primeira parte do seu Pontificado. Ele ensinou-nos um novo amor por aqueles que sofrem, levando-nos a compreender o que significa dizer que "fomos salvos na Cruz e pela Cruz". Inclusivamente na vida do Senhor nós encontramos estes dois aspectos. A primeira parte, onde Ele ensina a alegria do Reino de Deus, transmite os seus dons aos homens e depois, na segunda parte, a imersão na Paixão, até ao último clamor da Cruz. E foi precisamente deste modo que ele nos ensinou quem é Deus, que Deus é amor e que é na sua identificação com o nosso sofrimento de seres humanos que nos pega pela mão e nos faz mergulhar no seu amor, e que somente o amor é o banho de redenção, de purificação e de renascimento.
Por isso, parece-me que todos nós – e sempre de novo num mundo que vive de activismo, de juventude, do facto de ser jovem, forte e bonito, de conseguir alcançar grandes realizações – temos que aprender a verdade do amor que se torna paixão e precisamente assim redime o homem, unindo-o ao Deus amor. Por conseguinte, gostaria de manifestar o meu agradecimento a todos aqueles que aceitam o sofrimento, que padecem com o Senhor, e quereria encorajar todos nós a ter um coração aberto aos sofredores e aos idosos, e a compreender que precisamente a sua paixão constitui uma nascente de renovação para a humanidade e cria em nós o amor e nos une ao Senhor. No entanto, no final é sempre difícil sofrer. Lembro-me da irmã do Cardeal Mayer: estava muito doente e, quando perdia a paciência, ele dizia-lhe: "Vê, pois, agora estás com o Senhor!". E ela retorquiu-lhe: "Para ti é fácil dizer isto, porque estás bem; quanto a mim, estou a viver na paixão". É verdade, na paixão verdadeira torna-se sempre difícil unir-se realmente ao Senhor e permanecer nesta disposição de união com o Senhor que sofre. Por conseguinte, oremos por todos aqueles que sofrem e façamos tudo o que pudermos para os ajudar, demonstrando a nossa gratidão pelo seu sofrimento e assistindo-os na medida das nossas possibilidades, com este grande respeito pelo valor da vida humana, precisamente da vida de sofrimento, até ao fim. Trata-se de uma mensagem fundamental do cristianismo, que deriva da teologia da Cruz: que o sofrimento, a paixão é presença do amor de Jesus Cristo, é um desafio a unirmo-nos mediante esta sua paixão. Temos que amar os sofredores não apenas com as palavras, mas com toda a nossa acção e com todo o nosso compromisso. Parece-me que somente deste modo seremos realmente cristãos. Escrevi na minha Carta Encíclica "Spe salvi" que a capacidade de aceitar o sofrimento e os sofredores é a medida da humanidade que possuímos. Lá onde esta capacidade vem a faltar, o homem permanece reduzido e redimensionado. Portanto, oremos ao Senhor para que nos ajude no nosso sofrimento e nos leve a permanecer próximos de todos aqueles que sofrem neste mundo.
Pe. Karl Golser
Santo Padre! Chamo-me Karl Golser, sou professor de teologia moral aqui em Bressanone e inclusive director do Instituto para a justiça, a paz e a salvaguarda da criação; também sou cónego. Apraz-me recordar o período em que pude trabalhar com Vossa Santidade na Congregação para a Doutrina da Fé.
Como Vossa Santidade sabe, a Igreja católica forjou profundamente a história e a cultura do nosso país. No entanto, às vezes hoje temos a sensação de que, como Igreja, nos retiramos um pouco na sacristia. As declarações do magistério pontifício a respeito das grandes problemáticas sociais não encontram a justa correspondência a níveis de paróquias e de comunidades eclesiais.
Aqui no Alto Ádige, por exemplo, as autoridades e muitas associações chamam vigorosamente a atenção para os problemas ambientais, e de modo particular a respeito das mudanças climáticas: os principais temas são o derretimento das geleiras, os desabamentos na montanha, os problemas do custo da energia, o trânsito e a poluição atmosférica. São numerosas as iniciativas a favor da salvaguarda do meio ambiente.
No entanto, na consciência média dos nossos cristãos tudo isto tem muito pouco a ver com a fé. O que podemos fazer para incutir mais vigorosamente na vida das comunidades cristãs o sentido de responsabilidade em relação à criação? Como podemos chegar a ver cada vez mais unidas, a Criação e a Redenção? Como podemos viver de modo exemplar um estilo de vida cristão, que seja duradouro? E como podemos uni-lo a uma qualidade de vida, que seja atraente para todos os homens da nossa terra?
Santo Padre
Estou-lhe profundamente grato, estimado Professor Golser: sem dúvida, o senhor poderia responder muito melhor do que eu a tais questões, mas seja como for, procurarei dizer algo. Portanto, o senhor referiu-se ao Tema da Criação e da Redenção, e julgo que este vínculo inseparável deve receber muito relevo. Ao longo das últimas décadas, a doutrina da Criação tinha praticamente desaparecido na teologia, era quase imperceptível. Agora damo-nos conta dos prejuízos que daqui derivam. O Redentor é o Criador, e se nós não anunciarmos Deus nesta sua grandeza total – de Criador e de Redentor – tiraremos valor também da Redenção. Com efeito, se Deus nada tem a dizer na Criação, se é simplesmente relegado a um âmbito da história, como pode realmente compreender toda a nossa vida? Como poderá trazer verdadeiramente a salvação para o homem na sua integridade e para o mundo na sua totalidade? Eis por que motivo para mim, a renovação da doutrina da Criação e uma nova compreensão da inseparabilidade entre Criação e Redenção reveste uma grandíssima importância. Temos que reconhecer mais uma vez: Ele é o creator Spiritus, a Razão que está no princípio e da qual tudo nasce e da qual a nossa razão não é senão uma centelha. E é Ele, o próprio Criador, que também entrou na história e pode entrar na história e agir no seu interior precisamente porque Ele é o Deus da totalidade e não unicamente de uma parte. Se reconhecermos isto, daqui derivará obviamente que a Redenção, o facto de sermos cristãos, simplesmente a fé cristã hão-de significar sempre e de qualquer maneira também responsabilidade em relação à Criação. Há vinte-trinta anos acusavam-se os cristãos – não sei se esta acusação ainda é mantida – de serem os verdadeiros responsáveis pela destruição da Criação, porque a palavra contida no Génesis – "Dominai a terra" – teria levado àquela arrogância em relação à criação, cujas consequências hoje em dia podemos experimentar. Na minha opinião, temos que aprender novamente a compreender esta acusação em toda a sua falsidade: enquanto a terra era considerada criação de Deus, a tarefa de "dominá-la" nunca fora compreendida como um mandato de a tornar escrava, mas sobretudo como tarefa de ser guardiães dos dons da criação e de os desenvolver; de colaborarmos, nós mesmos, de modo activo para a obra de Deus, para a evolução que Ele inseriu no mundo, de tal maneira que as dádivas da criação sejam valorizadas e não espezinhadas nem destruídas.
Se observamos aquilo que nasceu ao redor dos mosteiros, como naqueles lugares nasceram e ainda continuam a nascer pequenos paraísos, oásis da criação, torna-se evidente que tudo isto não são só palavras, mas onde a Palavra do Criador foi compreendida de uma maneira correcta, onde houve vida com o Criador Redentor, ali houve compromisso em vista de salvar a criação, e não de a destruir. Deste contexto faz parte também o capítulo 8 da Carta aos Romanos, onde se afirma que a criação sofre e geme devido à submissão em que se encontra e que espera a revelação dos filhos de Deus: sentir-se-á livre, quando vierem criaturas, homens que são filhos de Deus e que a tratarem a partir de Deus. Julgo que é precisamente isto que nós, hoje em dia, podemos constatar como realidade: a criação geme – vemo-lo, quase que o sentimos – e espera pessoas humanas que a considerem a partir de Deus. O consumo brutal da criação começa lá onde Deus não está, onde a matéria já é somente material para nós, onde nós mesmos somos a última instância, onde o conjunto é simplesmente nossa propriedade e onde o consumimos somente para nós mesmos. E o desperdício da criação começa onde já não reconhecemos qualquer instância acima de nós, mas vemo-nos unicamente a nós mesmos; tem início lá onde já não existe qualquer dimensão da vida acima da morte, onde nesta vida temos que nos apoderar de tudo e possuir a vida na máxima intensidade possível, onde temos que possuir tudo aquilo que é possível possuir.
Portanto, julgo que instâncias verdadeiras e eficazes contra o desperdício e a destruição da criação podem ser realizadas e desenvolvidas, compreendidas e vividas somente lá onde a criação é considerada a partir de Deus; onde a vida é considerada a partir de Deus e tem maiores dimensões – na responsabilidade diante de Deus – e um dia nos será plenamente concedida por Deus e jamais tirada: se doarmos a vida, nós haveremos de recebê-la.
Assim, penso, temos que tentar com todos os meios de que dispomos, apresentar a fé em público, especialmente lá onde já existe alguma sensibilidade no que se lhe refere. E julgo que a sensação de que o mundo talvez esteja a sair do nosso controle – porque nós mesmos o expulsamos – e o facto de nos sentirmos oprimidos pelos problemas da criação, é precisamente isto que nos oferece a ocasião adequada em que a nossa fé pode falar publicamente, e pode fazer-se valer como uma instância propositiva. Efectivamente, não se trata apenas de encontrar técnicas que previnam os prejuízos, embora seja importante encontrar energias alternativas. No entanto, tudo isto não será suficiente, se nós mesmos não encontrarmos um novo estilo de vida, uma disciplina feita também de renúncias, uma disciplina do reconhecimento do próximo, a quem a criação pertence tanto quanto a nós, que podemos dispor da mesma mais facilmente; uma disciplina da responsabilidade em relação ao futuro dos outros e do nosso próprio futuro, porque se trata da responsabilidade diante Daquele que é o nosso Juiz e, enquanto Juiz, é Redentor, mas por isso também verdadeiramente nosso Juiz.
Por conseguinte, penso que é necessário unir de qualquer maneira estas duas dimensões – Criação e Redenção, vida terrena e vida eterna, responsabilidade em relação à criação e responsabilidade a propósito dos outros e do futuro – e que a nossa tarefa consista em intervir assim, de maneira clara e decidida, na opinião pública. Para sermos ouvidos, temos que demonstrar contemporaneamente mediante o nosso próprio exemplo, com o nosso próprio estilo de vida, que estamos a falar de uma mensagem em que nós próprios acreditamos e segundo o qual é possível viver. E queremos pedir ao Senhor que ajude todos nós a viver a fé, a responsabilidade da fé, de tal maneira que o nosso estilo de vida consiga tornar-se testemunho e, em seguida, a falar de tal forma que as nossas palavras apresentem de modo credível a fé como orientação nesta nossa época.
Pe. Franz Pixner, Decano em Kastelruth
Santo Padre, chamo-me Franz Pixner e sou pároco de duas grandes paróquias. Eu mesmo, juntamente com muitos irmãos e também leigos, preocupamo-nos pela crescente responsabilidade no cuidado pastoral, por exemplo por causa das unidades pastorais que se estão a criar: a forte pressão do trabalho, a falta de reconhecimento, as dificuldades em relação ao Magistério, a solidão e a diminuição do número de sacerdotes, mas também das nossas comunidades de fiéis. Muitos perguntam o que Deus nos está a pedir, nesta situação, e de que maneira o Espírito Santo nos deseja encorajar. Neste contexto nascem interrogações, por exemplo a propósito do celibato dos sacerdotes, da ordenação ao sacerdócio de "viri probati", do envolvimento dos carismas, de modo particular também dos carismas das mulheres na pastoral, do encargo a colaboradoras e colaboradores formados em teologia, de conferir o baptismo e pronunciar homilias. Coloca-se também a pergunta sobre o modo como nós, presbíteros, diante dos novos desafios, podemos ajudar-nos uns aos outros numa comunidade fraterna, e isto nos vários níveis de diocese, decanato, unidade pastoral e paróquia.
Santo Padre, pedimos-lhe que nos dê um bom conselho a respeito de todas estas interrogações. Obrigado!
Santo Padre
Estimado Decano, o senhor abriu todo o leque de perguntas que preocupam os pastores e todos nós nesta nossa época, e sem dúvida, o senhor sabe que neste momento não sou capaz de dar uma resposta a tudo. Imagino que o senhor tem a possibilidade de raciocinar reiteradamente sobre tudo isto também com o seu Bispo e nós, por nossa vez, falamos a este propósito durante os Sínodos dos Bispos. Julgo que todos nós temos necessidade deste diálogo entre nós, do diálogo da fé e da responsabilidade, para encontrarmos o recto caminho nesta época sob muitos aspectos difícil para a fé e cansativo para os sacerdotes. Ninguém dispõe de uma receita pronta, e todos nós a procuramos em conjunto.
Com esta reserva, ou seja, que juntamente com todos vós também eu estou no meio deste processo de afã e de luta interior, tentarei dizer algumas palavras, precisamente como parte de um diálogo mais amplo.
Na minha resposta gostaria de considerar dois aspectos fundamentais. Por um lado, a insubstituibilidade do sacerdote, o significado e a forma do ministério presbiteral hoje; por outro lado – e hoje em dia isto é mais evidente do que o era precedentemente – a multiplicidade dos carismas e o facto de que todos juntos são a Igreja, edificam a Igreja, e por isso temos o dever de nos comprometer em vista de despertar os carismas, temos que cuidar deste conjunto vivo, que sucessivamente também sustém o sacerdote. Ele ajuda os outros, enquanto também os outros o ajudam, e somente neste conjunto complexo e diversificado a Igreja pode crescer hoje e rumo ao futuro.
Por um lado, haverá sempre necessidade do sacerdote que é completamente consagrado ao Senhor e por isso mesmo inteiramente dedicado ao homem. No Antigo Testamento há o chamamento à santificação, que corresponde mais ou menos àquilo que nós queremos alcançar com a consagração, e também com a ordenação sacerdotal: existe algo que é entregue a Deus e por este motivo é tirado da esfera do que é comum e oferecido a Ele. Além disso, isto significa que agora está a disposição de todos. Porque foi tirado e entregue a Deus, precisamente por esta razão agora não está isolado, tendo sido elevado ao "para", ao "para todos". Na minha opinião, isto pode dizer-se também do sacerdócio da Igreja. Significa que, por um lado, somos confiados ao Senhor, tirados do comum, mas por outro, somos entregues a Ele para que desta maneira possamos pertencer-lhe totalmente, para pertencer também inteiramente aos outros. Penso que deveríamos, de modo incessante, procurar mostrar isto aos jovens – a eles, que são idealistas, que desejam realizar algo para o conjunto – mostrar que precisamente esta "extracção do comum" significa "entrega ao conjunto", e que isto é um modo importante, o modo mais importante para servir os irmãos. Além disso, disto faz parte também o acto de se pôr à disposição do Senhor, verdadeiramente na integridade do próprio ser, e de se encontrar portanto totalmente à disposição dos homens. Penso que o celibato é uma expressão fundamental desta totalidade e já por isso mesmo constitui um grande exemplo neste mundo, porque só terá um sentido se nós acreditarmos verdadeiramente na vida eterna e se crermos que Deus nos empenha e que nós podemos viver para Ele.
Por conseguinte, o sacerdócio é insubstituível porque na Eucaristia ele, começando a partir de Deus, sempre edifica a Igreja, porque no Sacramento da Penitência sempre nos confere a purificação, porque no sacramento o sacerdócio é, precisamente, um ser comprometido no "para" de Jesus Cristo. No entanto, sei muito bem como hoje em dia é difícil – quando um sacerdote se encontra a orientar já não apenas uma paróquia de fácil gestão, mas diversas paróquias, unidades pastorais; quando deve colocar-se à disposição para este conselho e também para aquele outro, e assim por diante – como é difícil levar uma vida como esta. Acredito que nesta situação é importante ter a coragem de se limitar e a clarividência na hora de decidir as prioridades. Uma prioridade fundamental da existência sacerdotal consiste na sua permanência com o Senhor e, portanto no facto de dispor de tempo para a oração. São Carlos Borromeu dizia sempre: "Não poderás cuidar da alma dos outros, se permitires que a tua se debilite. No final, não farás mais nada nem sequer para os outros. Deves ter tempo também para permanecer com Deus". Portanto, gostaria de sublinhar: por mais empenhos que possam surgir, é uma verdadeira prioridade encontrar todos os dias, diria, uma hora de tempo para permanecer em silêncio para o Senhor e com o Senhor, como a Igreja nos propõe que façamos com o breviário, com as orações do dia, para deste modo poder enriquecer cada vez mais interiormente, para retornar – como eu disse ao responder à primeira pergunta – ao raio do sopro do Espírito Santo. E a partir disto, ordenar sucessivamente as prioridades: tenho que aprender a ver o que é verdadeiramente essencial, onde é exigida de maneira absoluta a minha presença de sacerdote e não posso delegar a ninguém. E ao mesmo tempo tenho que o aceitar humildemente, quando muitas coisas que gostaria de fazer e onde seria necessária a minha presença, não as posso realizar porque reconheço os meus limites. Julgo que tal humildade será compreendida pelas pessoas.
E agora, a este tenho que vincular outro aspecto: saber delegar, exortar as pessoas à colaboração. Tenho a impressão de que as pessoas compreendem isto e que também o apreciam, quando um sacerdote permanece com Deus, quando desempenha a sua tarefa de ser aquele que reza pelos outros: nós – dizem elas – não somos capazes de rezar em tal medida, mas o senhor deve fazê-lo por mim: em última análise, a sua profissão, por assim dizer, consiste em ser aquele que reza por nós. As pessoas querem um sacerdote que, honestamente, se comprometa a viver com o Senhor e, além disso, permaneça à disposição dos homens – os sofredores, os moribundos, as crianças, os jovens (estas, diria, são as prioridades) – mas depois que também saiba distinguir as coisas que os outros podem fazer melhor do que ele, dando deste modo espaço àqueles carismas. Penso nos movimentos e nas múltiplas outras formas de colaboração no seio da paróquia. Sobre tudo isto decide-se em conjunto também na própria Diocese, criando-se novas formas e promovendo-se intercâmbios. O senhor justamente disse que nisto é importante olhar para além da paróquia, rumo à comunidade da Diocese, aliás, rumo à comunidade da Igreja universal que, por sua vez, deve em seguida dirigir o seu olhar para ver o que é que acontece na paróquia e quais são as consequências que disto derivam para cada um dos sacerdotes individualmente.
Além disso, o senhor referiu-se a mais uma questão muito importante na minha opinião: não obstante talvez vivam geograficamente mais distantes uns dos outros, os presbíteros constituem uma verdadeira comunidade de irmãos que devem sustentar-se e ajudar-se uns aos outros. Esta comunhão entre os sacerdotes é hoje mais importante do que nunca. Precisamente para não cair no isolamento, na solidão com as suas tristezas, é importante que possamos encontrar-nos de maneira regular. Será tarefa da Diocese estabelecer o modo como realizar da melhor forma os encontros entre os sacerdotes – hoje em dia dispomos do carro, que facilita os deslocamentos – a fim de que, de qualquer modo, experimentemos sempre de novo o estarmos juntos, aprendamos uns dos outros, nos corrijamos reciprocamente e nos ajudemos mutuamente, para que nos animemos e nos consolemos, a fim de que nesta comunhão do presbitério, juntamente com o Bispo, possamos prestar o nosso serviço à Igreja local. Nomeadamente: nenhum presbítero é sacerdote sozinho; nós somos um presbitério e só nesta comunhão com o Bispo cada um pode prestar o próprio serviço. Pois bem, esta bonita comunhão, por todos reconhecida a nível teológico, deve traduzir-se na prática, nos modos determinados pela Igreja local. E deve ampliar-se, porque também nenhum Bispo é Prelado sozinho, mas só Bispo no seio do Colégio, na grande comunhão dos Bispos. É em prol desta comunhão que desejamos sempre comprometer-nos. E penso que este é um aspecto particularmente bonito do catolicismo: através do Primado, que não é uma monarquia absoluta, mas um serviço de comunhão, nós podemos ter a certeza desta unidade, de tal forma que numa grande comunidade de muitas vozes, todos juntos fazemos ressoar a grande música da fé neste mundo.
Rezemos ao Senhor para que nos console sempre, quando pensamos que não aguentamos mais; sustentemo-nos uns aos outros, e então o Senhor ajudar-nos-á a encontrar em conjunto os caminhos rectos.
Paolo Rizzi, pároco e professor de teologia no Instituto Superior de Ciências Religiosas
Santo Padre, sou Paolo Rizzi, pároco e professor de teologia no Instituto Superior de Ciências Religiosas. Apreciaríamos o seu parecer pastoral a respeito da situação relativa aos sacramentos da primeira Comunhão e da Confirmação. Cada vez mais frequentemente as crianças, os rapazes e as moças que recebem estes sacramentos preparam-se com empenhamento, no que se refere aos encontros de catequese, mas não participam na Eucaristia dominical e então é espontâneo perguntar-se: que sentido tem tudo isto? Por vezes tem-se a vontade de dizer: "Mas então permanecei sempre em casa!". No entanto, como sempre continua-se a aceitá-los, pensando que de qualquer maneira é melhor não apagar o estopim da chama trémula. Ou seja, pensa-se que de qualquer forma o dom do Espírito Santo possa incidir mesmo para além daquilo que nós vemos e que numa época de transição como esta é mais prudente não tomar decisões drásticas.
De um modo mais geral, há trinta-trinta e cinco anos eu julgava que estávamos começando a tornar-nos uma pequena grei, uma comunidade de minoria mais ou menos em toda a Europa. E, por conseguinte, que era necessário comunicar os Sacramentos só àqueles que se comprometiam verdadeiramente na vida cristã. Depois, também pelo estilo do Pontificado de João Paulo II, voltei a considerar de outro modo esta situação. Se é possível fazer previsões para o futuro, qual é o parecer de Vossa Santidade? Que atitudes pastorais nos pode indicar? Obrigado.
Santo Padre
Pois bem, não posso dar uma resposta infalível neste momento, só posso tentar responder em conformidade com quanto posso ver. Devo dizer que percorri um caminho semelhante ao seu. Quando eu era mais jovem, fui bastante severo. E dizia: os Sacramentos são os Sacramentos da Fé, e por conseguinte onde a fé não existe, onde não subsiste a prática da fé, também o Sacramento não pode ser conferido. Além disso, quando era Arcebispo de Munique debatia sempre com os meus párocos: também neste caso havia duas facções, uma severa e outra aberta. E também eu, ao longo dos tempos, compreendi a necessidade de seguir sobretudo o exemplo do Senhor, que era muito aberto também em relação às pessoas que se encontravam às margens de Israel daquela época, era um Senhor da misericórdia, demasiado aberto – segundo muitas autoridades oficiais – aos pecadores, acolhendo-os ou deixando-se acolher por eles nas suas refeições, atraindo-os a si na sua própria comunhão.
Por conseguinte, diria substancialmente que os Sacramentos são de modo natural os Sacramentos da fé: onde não houvesse qualquer elemento de fé, onde a Primeira Comunhão fosse unicamente uma festa com um grande almoço, bonitas roupas e lindos presentes, então deixaria de ser um Sacramento da fé. No entanto, por outro lado, se ainda conseguimos ver uma pequena chama de desejo da comunhão no seio da Igreja, uma vontade também da parte destas crianças que querem entrar em comunhão com Jesus, parece-me que é justo permanecermos bastante abertos. Naturalmente, sem dúvida, deve constituir um aspecto da nossa catequese, fazer compreender que a Comunhão, a Primeira Comunhão, não é um acontecimento "pontual", mas exige uma continuidade de amizade com Jesus, um caminho com Jesus. Bem sei que as crianças muitas vezes teriam a intenção e o desejo de ir à Missa aos domingos, mas os pais não tornam possível este desejo. Se virmos que as crianças o querem, que têm o desejo de ir, parece-me que é como que um Sacramento de desejo, o "voto" de uma participação na Missa dominical. Neste sentido, naturalmente deveríamos fazer o possível no contexto da preparação para os Sacramentos, para alcançar também os pais e – digamo-lo – despertar assim também neles a sensibilidade pelo caminho que as crianças percorrem. Eles deveriam ajudar os seus filhos a seguir o próprio desejo de entrar em amizade com Jesus, que é a forma da vida, do futuro. Se os pais desejarem que os seus filhos possam receber a Primeira Comunhão, este seu desejo bastante social deveria ampliar-se até se tornar um desejo religioso, para tornar possível um caminho com Jesus.
Portanto, diria que, no contexto da catequese das crianças o trabalho com os pais é sempre muito importante. E precisamente esta é uma das ocasiões de encontro com os pais, tornando presente a vida da fé também aos adultos, porque através das crianças – parece-me – eles mesmos podem voltar a aprender a fé e compreender que esta grande solenidade somente tem sentido, e só é verdadeira e autêntica, se se realiza no contexto de um caminho com Jesus, no âmbito de uma vida de fé. Por conseguinte através dos filhos, convencer um pouco os pais acerca da necessidade de um caminho preparatório, que se demonstra na participação nos mistérios e começa a fazer amar estes mistérios. Diria que esta é, sem dúvida, uma resposta bastante insuficiente, mas a pedagogia da fé é sempre um caminho, e nós temos que aceitar as situações contemporâneas, mas também devemos abri-las a um acréscimo, para que no final não permaneça somente uma recordação externa de coisas, mas também o coração seja verdadeiramente sensibilizado. No momento em que nos convencemos, o coração é sensibilizado, sentiu um pouco do amor de Jesus, experimentou um pouco do desejo de mover-se nesta linha e nesta direcção. Naquele momento, parece-me, podemos dizer que realizámos uma verdadeira catequese. O próprio sentido da catequese, efectivamente, deveria ser este: levar a chama do amor de Jesus, ainda que seja pequena, aos corações das crianças e, através das crianças, aos seus pais, abrindo deste modo novamente os lugares da fé no nosso tempo.
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