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Queridos irmãos no Episcopado,
sacerdotes, religiosos e religiosas,
irmãos e irmãs, bom dia! Bom dia! (em árabe)

É com grande alegria que vos encontro durante esta viagem, cujo lema é “Felizes os pacificadores” (Mt 5, 9). A Igreja no Líbano, unida nas suas múltiplas fisionomias, é um ícone destas palavras, como afirmava São João Paulo II, que era tão afeiçoado ao vosso povo: «Do Líbano de hoje – dizia ele – vós sois responsáveis pela esperança» (Mensagem a todos os libaneses, 1 de maio de 1984); e acrescentava: «Criai, nos locais em que viveis e trabalhais […] um ambiente fraterno. Esforçai-vos sem ingenuidade, por confiar nos outros e sede criativos de modo a fazer triunfar a força regeneradora do perdão e da misericórdia» (ibid.).

Os testemunhos que ouvimos – obrigado a cada um de vós! – dizem-nos que estas palavras não foram em vão, pelo contrário, encontraram acolhimento e resposta, porque aqui continuamos a construir comunhão na caridade.

Nas palavras do Patriarca, a quem agradeço sinceramente, podemos compreender a origem desta tenacidade, simbolizada pela gruta silenciosa onde São Charbel rezava diante da imagem da Mãe de Deus e pela presença deste Santuário de Harissa, sinal de unidade para todo o povo libanês. É estando com Maria junto à Cruz de Jesus (cf. Jo 19, 25) que a nossa oração, ponte invisível que une os corações, dá-nos a força para continuar a esperar e a trabalhar, mesmo quando ao nosso redor ressoa o barulho das armas e as próprias exigências da vida quotidiana se tornam um desafio.

Um dos elementos que constituem o símbolo desta viagem é a âncora. O Papa Francisco evocava-a frequentemente nos seus discursos como sinal da fé, que permite ir sempre mais além, até ao céu, mesmo nos momentos mais sombrios. Ele dizia: «A nossa fé é a âncora no céu. Mantemos a nossa vida ancorada no céu? Que devemos fazer? Segurar a corda […]. E vamos em frente, porque estamos certos de que a nossa vida tem a sua âncora no céu, naquela margem onde chegaremos» (Audiência Geral, 26 de abril de 2017). Se queremos construir a paz, ancoremo-nos ao Céu e, firmemente direcionados para lá, amemos sem medo de perder o que passa e doemos sem medida.

A partir destas raízes, fortes e profundas como as dos cedros, o amor cresce e, com a ajuda de Deus, surgem obras de solidariedade concretas e duradouras.

O Padre Youhanna falou-nos sobre Debbabiyé, a pequena aldeia onde exerce o seu ministério. Ali, apesar da extrema necessidade e sob a ameaça dos bombardeamentos, cristãos e muçulmanos, libaneses e refugiados vindos do outro lado da fronteira, convivem pacificamente e ajudam-se mutuamente. Paremos para refletir sobre a imagem, sugerida por ele mesmo, da moeda síria encontrada na bolsa de esmolas com as ofertas libanesas. É um detalhe importante: lembra-nos que, na caridade, cada um de nós tem algo a dar e a receber, e que a nossa entrega recíproca a todos enriquece e aproxima de Deus. O Papa Bento XVI, durante a sua viagem a este país, falando do poder unificador do amor também nos momentos de provação, disse: «Mas é precisamente então que é necessário celebrar a vitória do amor sobre o ódio, do perdão sobre a vingança, do serviço sobre a prepotência, da humildade sobre o orgulho, da unidade sobre a divisão. […] de saber converter os nossos sofrimentos em grito de amor a Deus e de misericórdia para com o próximo». (Discurso durante a visita à Basílica de São Paulo em Harissa, 14 de setembro de 2012).

Só assim não se fica esmagado pela injustiça e opressão, mesmo quando, como ouvimos, se é traído por pessoas e organizações que especulam sem escrúpulos sobre o desespero daqueles que não têm alternativas. Só assim é possível voltar a ter esperança no amanhã, ainda que na dureza de um presente difícil de enfrentar. A este respeito, penso na responsabilidade que todos temos para com os jovens. É importante favorecer a sua presença, também nas estruturas eclesiais, valorizando as suas contribuições inovadoras e dando-lhes espaço. E é necessário também, no meio das ruínas de um mundo que tem os seus dolorosos fracassos, oferecer-lhes perspectivas concretas e viáveis de renascimento e crescimento para o futuro.

Loren falou-nos do seu empenho em ajudar os migrantes. Ela própria migrante, há muito que se dedica a apoiar aqueles que, não por escolha, mas por necessidade, tiveram de deixar tudo para trás em busca de uma possibilidade de futuro longe de casa. A história de James e Lela, que ela nos contou, toca-nos profundamente e mostra o horror que a guerra provoca na vida de tantas pessoas inocentes. O Papa Francisco lembrou-nos várias vezes, nos seus discursos e escritos, que diante de dramas semelhantes não podemos permanecer indiferentes, e que a dor deles nos diz respeito e nos interpela (cf. Homilia no Dia Mundial do Migrante e do Refugiado, 29 de setembro de 2019). Por um lado, a coragem deles fala-nos da luz de Deus que, como disse Loren, brilha mesmo nos momentos mais sombrios; por outro lado, porém, o que eles viveram obriga-nos a esforçar-nos a fim de que ninguém mais tenha de fugir do seu país por causa de conflitos absurdos e impiedosos e para que quem bate à porta das nossas comunidades nunca se sinta rejeitado, mas acolhido com as palavras que a própria Loren citou: “Bem-vindo a casa!”.

Sobre isso também fala-nos o testemunho da irmã Dima, que, diante da explosão da violência, escolheu não abandonar o campo, mas manter a escola aberta, tornando-a um local de acolhimento para os refugiados e um centro educativo de extraordinária eficácia. Nessas salas, com efeito, além de prestar assistência e ajuda material, aprende-se e ensina-se a partilhar “pão, medo e esperança”, a amar no meio do ódio, a servir mesmo no cansaço e a acreditar, para além de todas as expectativas, num futuro diferente. A Igreja no Líbano sempre se preocupou muito com a educação. Encorajo todos vós a continuar esta obra louvável, indo ao encontro sobretudo daqueles que mais necessitam e não têm meios, e de quem se encontra em situações extremas, com escolhas marcadas pela caridade mais generosa, para que a formação da mente seja sempre acompanhada pela educação do coração. Lembremo-nos de que a nossa primeira escola é a Cruz e que o nosso único Mestre é Cristo (cf. Mt 23, 10).

Sobre isso, Padre Charbel, falando da sua experiência de apostolado nas prisões, disse que precisamente ali, onde o mundo vê apenas muros e crimes, nos olhos dos detidos, por vezes perdidos, por vezes iluminados por uma nova esperança, nós vemos a ternura do Pai que nunca se cansa de perdoar. E é exatamente assim: vemos o rosto de Jesus refletido naqueles que sofrem e naqueles que cuidam das feridas que a vida causou. Daqui a pouco, faremos o gesto simbólico da entrega da Rosa de Ouro a este Santuário. É um gesto antigo, que tem entre os seus significados o de exortar-nos a ser perfume de Cristo com a nossa vida (cf. 2 Cor 2, 14). Perante esta imagem, vem-me à mente o perfume que brota das mesas libanesas, típicas pela variedade de alimentos que oferecem e pela forte dimensão comunitária de os partilhar. É um perfume feito de mil aromas, que impressionam pela sua diversidade e, por vezes, pelo seu conjunto. Assim é o perfume de Cristo. Não é um produto caro e reservado a poucos que podem comprá-lo, mas o aroma que emana de uma mesa generosa, onde se encontram muitos pratos diferentes e da qual todos juntos podem servir-se. Que este seja o espírito do rito que nos preparamos para realizar e, acima de tudo, aquele com o qual nos esforçamos todos os dias para viver unidos no amor.